Energia:
fontes limpas e eficiência são as soluções.
Sistema de abastecimento de água da Região
Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Foto: Manoel Marques/ Imprensa
MG (29/01/2015).
Por Marcelo Pellegrini –
Especialistas pedem maior investimento em
tecnologia e políticas claras, que priorizem energias limpas e não apenas
hidrelétricas, para escapar de um apagão no futuro.
O Brasil gera quase dois terços de sua energia a
partir de hidroelétricas, uma matriz limpa, mas o momento atual deixa clara uma
fraqueza deste modelo: a suscetibilidade às mudanças climáticas. Com diversos
estados passando por crises hídricas, com reservatórios vazios ou perto disso,
o governo se viu obrigado a recorrer às termelétricas, que geram uma energia
mais cara e mais poluidora. Para solucionar este dilema, concluíram os
especialistas reunidos no evento Diálogos Capitais: Energia em Debate,
promovido por CartaCapital, nesta segunda-feira 31, o Brasil precisa apostar em
mais energias limpas e em eficiência.
Para Tania Cosentino, presidente da Schneider
Electric para América do Sul, o País vive uma situação paradoxal. “A demanda
por energia deve dobrar até 2050, no mundo. No entanto, acordos preveem que as
emissões de dióxido de carbono devem diminuir pela metade. É um paradoxo cuja
solução passa por ter mais eficiência energética”, afirma.
A Associação Brasileira de Empresas de Serviços de
Conservação de Energia (Abesco) estima que o Brasil desperdiça todo ano o
equivalente à produção de meia usina de Itaipu. “É muito desperdício para um
país que possui uma das energias mais caras do mundo”, afirma Consentino. Para
ela, é função do governo definir e incentivar uma política de eficiência
energética. “A eficiência energética não é prioridade nem do empreendedor nem
do governo. No Brasil, continuamos investindo apenas na expansão da oferta de
energia”, completa.
O diretor-presidente da Chesf, José de Miranda
Farias (esq) e a presidente da Schneider Electric para América do Sul, Tania
Cosentino (dir). Fotos: Greg Salibian.
A única forma de diminuir as perdas de energia é
investindo em tecnologia. Ainda raros no Brasil, mas muito comuns na Europa, os
programas governamentais de automação das redes de distribuição, chamados de
Smart Grid, são cruciais para evitar o desperdício de energia.
Segundo Sergio Jacobsen, gerente-geral da Siemens
no Brasil, com eles a rede de distribuição brasileira evitaria perdas, teria
controle operacional e permitiria que fontes de energia intermitentes, como a
solar, também alimentassem a rede. “Hoje, 6% da energia produzida no Brasil é
roubada no caminho entre a usina e o consumidor”, afirma. “Isso seria
completamente evitável com uma rede automatizada”.
O principal obstáculo para a modernização das redes
distribuidoras é, segundo os especialistas, a omissão do governo federal. Para
Paulo Bombassaro, diretor de engenharia da CPFL, sem uma regulação específica
do governo, não haverá interesse do setor privado em implementar esta
tecnologia. “No Brasil, o Smart Grid exige uma nova regulação que dê garantias
às empresas. Quando uma empresa investe em uma tecnologia nova, ela assume um
risco por essa inovação e os investimentos competem com os investimentos
tradicionais, como a manutenção por exemplo”, afirma.
Além das perdas, o modelo de energia que é
priorizado pelo governo também pode se tornar um problema no futuro. Alheio à
crise econômica, o setor elétrico irá investir 186 bilhões de reais entre
agosto de 2015 e dezembro de 2018 na expansão da geração e da transmissão de
energia. No entanto, a maior fatia destes investimentos é voltada para as
hidrelétricas, vulneráveis às crises climáticas.
O presidente da BF Capital, Renato Sucupira
(esquerda), e o superintendente de Energia do BNDES, Nelson Siffert (direita).
A explicação para isso é a dificuldade de
financiamento que as energias eólica, solar e de biomassa ainda possuem. “Há
uma dificuldade em acessar financiamento durante a fase de construção e a
desvalorização cambial também é um complicador, uma vez que a maioria dos
equipamentos são importados”, afirma Renato Sucupira, presidente da BF Capital.
“O último leilão solar, por exemplo, teve um um aumento do preço inicial porque
os produtos são todos em dólar. Ou seja, o risco aumenta”, explica Sucupira.
Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de
Pesquisa Energética, discorda. Para ele, os leilões realizados pelo governo
garantem às empresas do setor uma lucratividade mesmo em um cenário de queda de
demanda energética. “Nós tiramos o risco de mercado, ou seja, se houver uma
recessão e cair a demanda por energia, por exemplo, garantimos a lucratividade
do empreendedor pelos próximos 30 anos”, explica. “No entanto, outros riscos
são do empreendedor e não podem ser atribuídos ao financiador”.
Em 2015, o dólar se valorizou mais de 20% frente ao
real, o maior aumento desde 1999. Por isso, uma maior independência tecnológica
é vital para assegurar uma política de energia renovável no País. Isto é o que
pensa o superintendente de Energia do BNDES, Nelson Siffert. “O governo
brasileiro trabalha para conjugar uma política energética junto com uma
política industrial, ou seja queremos investir em diferentes matrizes
energéticas, mas gerando emprego local”, explica.
Siffert afirma que o BNDES não irá financiar quem
quer apenas importar e implantar tecnologia no Brasil. “Nossa linha de crédito
protege o investidor da desvalorização cambial, mas em troca o obriga a
investir na produção local e aquecer nossa economia”, explica.
Entre as dificuldade de se estruturar uma cadeia
industrial no setor, o Nordeste surge como um exemplo de sucesso na implantação
de energia solar e eólica. José Carlos de Miranda Farias, diretor-presidente da
Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), comemora o crescente
interesse de investidores nos campos eólicos nordestinos, um dos mais propícios
campos para a produção desta forma de energia do mundo.
A tendência de crescimento do investimento em
energias limpas no Nordeste é puxada pelo Fundo de Energia do Nordeste (FEN).
Criado em junho, o FEN dispõe de 13 bilhões de reais em investimentos para
alavancar a produção de energia e terá como prioridade a região Nordeste.
“É um investimento expressivo cujo foco será a
geração de energia eólica, que possui um enorme potencial no Nordeste”, afirma
Miranda. Além de este tipo de energia, o diretor-presidente da Chesf também
disse já estar em curso investimentos em projetos de energia solar e de
biomassa. “Queremos aproveitar todo o nosso potencial natural, inclusive os
resíduos desperdiçamos pelo agronegócio e setor sucro-alcooleiro”, explica.
Em meio a um ambiente de crise econômica, o setor
energético parece caminhar sem grandes quedas de investimento. No entanto, mais
do que um problema de dinheiro, a matriz energética brasileira depende de
políticas públicas claras para aumentar sua eficiência e avançar, sendo mais limpa
e eficiente.
Fonte: Carta Capital
Nenhum comentário:
Postar um comentário