Novo
ciclo de atividades criminosas na Terra do Meio.
Por Redação do ISA –
Por Redação do ISA –
O ISA lança esta semana o livro Rotas do Saque:
ameaças e violações à integridade territorial da Terra do Meio (PA), o mais
recente diagnóstico sobre roubo de madeira, grilagem e ameaças aos povos
indígenas e comunidades tradicionais que vivem no conjunto de áreas protegidas da
Terra do Meio. Leia a publicação aqui.
Localizada na Bacia do Rio Xingu, no sudoeste do
Pará, entre os rios Xingu e Iriri, a Terra do Meio configura um corredor de
oito milhões de hectares de áreas protegidas no coração da Amazônia, entre
Terras Indígenas e Unidades de Conservação.
A partir da década de 1990, a região ganhou espaço
nos noticiários por conta de um processo intenso de grilagem e exploração
madeireira ilegal, que avançava sobre a floresta e seus tradicionais ocupantes.
Após um amplo movimento de resistência e denúncia, articulado por comunidades
locais, movimentos sociais e organizações com atuação na Terra do Meio, a
principal resposta do governo foi a criação, nos anos 2000, de um conjunto de
UCs.
Madeireira no município de Uruará, onde se situam
muitas das madeireiras que recebem madeira ilegalmente extraída da Terra do
Meio.
Rotas do saque mostra que, uma década após a decretação da
maioria das UCs da região, o território e os povos e comunidades tradicionais
da Terra do Meio seguem sob um novo ciclo de pressões de grupos interessados na
apropriação ilegal de terras públicas e no roubo de madeira, deixando para trás
um rastro de degradação.
A publicação apresenta uma série de mapas,
identificando áreas atingidas e sob ameaça em cada porção do território. São 41
pontos de pressão destacados, entre estradas clandestinas, pastos ilegais
recém-queimados, desmatamento e degradação. O livro também detalha as
principais formas de atuação de cada um dos grupos envolvidos.
Com esse quadro em vista, Rotas do Saque passa da
denúncia à proposição, elencando ações governamentais prioritárias para o
combate às atividades criminosas em curso na Terra do Meio.
Métodos utilizados
Para analisar uma superfície equivalente a duas
vezes o Estado do Rio de Janeiro, a equipe de geoprocessamento do ISA se
debruçou sobre imagens dos sistemas de satélites que monitoram a Amazônia
brasileira. A equipe também realizou registros fotográficos feitos em sobrevoos
percorrendo 7.626 km na região. Como grande parte da Terra do Meio se compõe de
territórios tradicionalmente ocupados, as informações que dão substância e
precisão ao monitoramento remoto se originam, com frequência, nos relatos e
denúncias de beiradeiros e indígenas.
A interpretação de imagens de satélite e sobrevoos
na Resex Riozinho do Anfrísio, por exemplo, aponta a existência de 546 km de
estradas ilegais, utilizadas para o escoamento de madeira extraída ilegalmente.
Um dos alertas mais incisivos do livro se refere à
Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, que em 2014 registrou mais
de 12 mil hectares desmatados. Eis um grande paradoxo: a APA ocupa uma posição
central num dos maiores e melhor preservados corredores de áreas protegidas do
país e, ao mesmo tempo, é a Unidade de Conservação mais desmatada do Brasil.
A Estação Ecológica (Esec) da Terra do Meio, por
sua vez, é mencionada como uma das áreas na qual as medidas de proteção
conduzidas pelo governo foram mais coesas. Em 2005, ano de sua criação, o
desmatamento ultrapassava os 15 mil hectares. Após uma série de ações,
incluindo quatro grandes operações de fiscalização, o desmatamento caiu para
zero. A publicação ressalva, em contrapartida, a necessidade de medidas
endereçadas aos conflitos resultantes da implantação dessa UC sobre áreas
ocupadas por famílias beiradeiras.
Belo Monte
A demanda da usina por madeira, bem como para
construção de empreendimentos atraídos pela instalação da hidrelétrica em
Altamira e cidades vizinhas, tem feito disparar a exploração madeireira da
região. Do primeiro para o segundo ano de construção da usina, a exploração
ilegal saltou de 20 para 70 mil hectares na região sob influência da UHE Belo
Monte.
O monitoramento das áreas protegidas aponta que boa
parte dessa madeira pode estar vindo justamente das Terras Indígenas e Unidades
de Conservação. A situação mais grave é na Terra Indígena Cachoeira Seca, do
povo Arara, reconhecida pela Funai e que aguarda a homologação pelo Ministério
da Justiça. Uma fila de caminhões carregados entre as cidades de São Paulo e
Belo Horizonte é o que se calcula que foi extraído de madeira somente em 2014,
totalizando em torno de R$200 milhões em venda ilegal de madeira escoadas em
mais de 700 km de estradas ilegais.
Mosaico
A anistia aos desmatamentos realizados até 2008,
com o novo Código Florestal, e o início da construção de Belo Monte
contribuíram também para a ampliação da atividade agropecuária, abertura de
estradas e ações de ocupação ilegal na região.
Toras de Angelim vermelho e ipê, madeiras nobres
ilegalmente exploradas, são escoadas do interior da TI Cachoeira Seca em
direção à cidade de Uruará. Pablo Castellos, 2014.
É importante registrar que o corredor de florestas
da Terra do Meio, como parte de um corredor de áreas protegidas ao longo de
toda a Bacia do Rio Xingu, contribui de forma significativa no fornecimento de
água para a região sudeste do país. Para o corredor permanecer em pé,
garantindo a chuva para grande parte do país, será preciso ações urgentes do
Estado.
A análise dos dados reunidos em Rotas do Saque
aponta que houve uma renovação e readaptação das táticas dos grupos que
protagonizaram os ataques à Terra do Meio nas décadas de 1990 e 2000.
Contribuíram para isso fatores como a falta de punição a crimes ambientais, bem
como uma errática política ambiental e a falta de medidas para reversão do caos
fundiário da região.
Rotas do Saque mostra como é fundamental que o Estado formalize
um mosaico de áreas protegidas na região, implantando uma gestão integrada, com
recursos específicos, e capaz de assumir o controle de proteção desta
extraordinária usina de serviços ambientais chamada de Terra do Meio.
Fonte: Instituto Socioambiental
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