sábado, 12 de dezembro de 2015

O Rio Doce morreu com lágrimas, sem berro.
Rejeitos de minério chegam ao mar na foz do Rio Doce em Regência – ES. Foto: Fred Loureiro.

Por Lúcia Chayb e René Capriles –

A edição de novembro de 2015 da Eco21, uma das principais publicações sobre meio ambiente e sustentabilidade no Brasil, traz excelentes textos. Confira abaixo o editorial e o índice!

Editorial

O Rio Doce morreu, lamentou Sebastião Salgado insuflado de esperança pela recuperação do “seu” rio. Ele disse: “hoje o rio morreu, ecologicamente. Não existe mais nada, não existe vida no rio; primeiro morreu toda a fauna, a flora está terminando de morrer nestes dias. Essa tragédia me atingiu diretamente”. Habituado a registrar nas fotos dramas humanos e tragédias naturais viu destruída em minutos toda uma obra de décadas que passou revitalizando as margens do Rio Doce.

A tenacidade do fotógrafo virou um exemplo de empreendedorismo. Mesmo antes que o Governo e as empresas envolvidas na tragédia do rompimento da barragem tomassem alguma iniciativa, Salgado já tinha elaborado um projeto que contempla a regeneração dos quase 900 km de extensão do rio, o qual possui cerca de 370 mil nascentes. “Nós pretendemos recuperar todas elas”, afirmou. Por uma coincidência, “quando houve essa catástrofe, é claro que o único projeto estruturado de recuperação do Rio Doce, das nascentes, era o nosso”, destacou.

Mas a tragédia do dia 5 de Novembro, em Mariana, com toda a dimensão da destruição ambiental, aconteceu antes da outra, que ceifou centenas de vidas na fatídica sexta-feira 13, em Paris, quando a loucura da intolerância abalou como um tsunami o mundo inteiro. Não foi um massacre contra um país, uma ideologia ou uma religião, foi a sinalização de que a forma como a sociedade atual se estruturou está falida.

Não foi por acaso que esse crime aconteceu dias antes da COP-21 que, significativamente, é a maior conferência jamais realizada na França depois da reunião para aprovar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, fato que aconteceu em 1948. Esse ataque, que obrigou o governo francês e a própria ONU a repensar em quem poderia participar e como, levou a ativista ambiental Naomi Klein a se perguntar “Quem tem sua segurança garantida a qualquer custo? A segurança de quem é casualmente sacrificada, apesar de haver meios para fazer muito melhor? Essas são as questões que estão no fulcro da crise climática e as respostas são a razão pela qual as Conferências do Clima terminam tantas vezes em acrimônia e lágrimas”. Alguns analistas afirmam que as Conferências sobre o Clima já se assemelham às da ONU sobre o Desarmamento: nunca chegam a conclusão nenhuma.

A crise climática é uma arma de destruição em massa que afeta toda sociedade. Não é por acaso que o Pentágono, muito além de Obama, considera a questão climática um problema de segurança nacional, mas os especuladores da banca internacional veem neste campo um excelente meio de ganhar dinheiro e uma grande oportunidade de renovar as suas pastas de créditos.

Uma pesquisa recente da UFRJ revela que os eventos climáticos extremos atingem 1,1% da população brasileira todos os anos e custaram até R$ 355 bilhões entre 2002 e 2012. É nada menos que o equivalente a 0,87% do PIB acumulado no período. Na média, o custo anual dos desastres naturais naquela década foi de R$ 25,2 bilhões.

A catástrofe de Mariana custará alguns bilhões, mas não foi um desastre natural, foi produto da incompetência das empresas envolvidas, da ineficaz fiscalização dos poderes públicos, porém pode virar um bom negócio na etapa pós-rompimento da barragem. Alguns investidores já enxergam grandes investimentos com vultosos lucros.

Letícia Oliveira, do Movimento dos Atingidos por Barragens denunciou que “essas mineradoras lucram muito e a gente vê que não estão investindo na segurança dos seus empreendimentos. A Samarco já teve o rompimento de um mineroduto, em 2010, o que mostra que existe uma repetição dessas questões”. Mariana e Paris, duas tragédias anunciadas.

Duas advertências sobre um mundo que deve refletir profundamente sobre suas responsabilidades para com a sociedade. Carlos Drummond de Andrade reconforta poetizando sobre o Rio Doce: “Quantas toneladas exportamos / De ferro? / Quantas lágrimas disfarçamos / Sem berro?”.

Índice

04 Achim Steiner – Papa Francisco, um líder diante da mudança climática
05 José Eli da Veiga – A que preço emitir carbono?
06 Naomi Klein – As Marchas do Clima são proibidas na COP-21 de Paris
08 Denis Aguiton – Informe mostra patrocinaores poluidores por trás da COP-21
10 Emilio La Rovere – O compromisso brasileiro com a economia de baixo carbono
14 Mauro M. O. Santos – Metas climáticas do Brasil e falhas de governança
16 Diego Freire – Pesquisadores e lideranças fazem propostas para a COP-21
18 Andreia Verdélio – Saída para crise é a economia de baixo carbono
20 Felipe Vieira – Brasil amplia investimentos em energia renovável
22 Washington Novaes – O solo que desaparece sob nossos pés
24 Documento – Pelo fim dos agrotóxicos, Pronara Já!
28 Carlos Minc – A tragédia de Mariana teve alertas não levados a sério
29 Antônio Anastasia – Reconstruir
30 Maurício Guetta – Da lama ao caos: o País que não queremos
32 Márcia Brandão Carneiro Leão – Apenas uma fotografia
34 Oswaldo B. Souza – Comissão do Senado fragiliza licenciamento após Mariana
35 Tim Hollo – Greenpeace Austrália quer justiça para as vítimas da BHP
36 Álvaro R. dos Santos – Um caso de irresponsabilidade na gestão de riscos
37 Edézio T. de Carvalho – Rio Doce, amargo trânsito
38 PatriciaRibolliFachin – Entrevista com David Zee
40 Cintia Barenho – Do Rio Doce à lama tóxica, as mulheres resistem
42 Reinaldo Canto – Mariana: essa não é uma tragédia ambiental
44 Xico Graziano – Aquicultura de verdade
46 João Doria – O resgate da São Paulo limpa e agradável
48 José Monserrat Filho- EUA aprova Projeto de Lei para minerar asteróides
50 Marcus Eduardo de Oliveira – Planeta esgotado

**Acesse aqui a edição completa. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário