Clima
seguirá elevando perdas no Caribe.
Praias afetadas pela erosão e infestadaspor algas
Sargassum mortas fazem parte da paisagem comum na baía de Hellshire, na
Jamaica. Os cientistas atribuem o fenômeno à mudança climática. Foto: Zadie
Neufville/IPS.
Por Zadie Neufville, da IPS –
Kingston, Jamaica, 8/12/2015 – Os moradores de
Rocky Point, uma vila de pescadores na costa sul da Jamaica, acordaram em uma
manhã de julho com seus jardins e ruas com água até os joelhos. Os fortes
ventos e as grandes ondas fizeram com que o mar adentrasse 200 metros,
inundasse as tubulações e obrigasse as pessoas a ficar em suas casas.“Há 43
anos que vivo aqui e nunca tinha visto algo assim”, declarou Sydney Thomas ao
jornal Jamaica Observer.
Da praia de pescadores Hellshire, afastada da
capital, a comunidade observou como desaparecia em questão de semanas. Agora o
mar banha os edifícios. Os barcos que descansavam na areia ficaram à deriva na
beira do que resta de areia branca.Em um extremo da baía de Hunts a comunidade
de Seaview Gardens ficou à beira do lamaçal.
Durante décadas a população local sofreu o
transbordamento das tubulações, quando a água do mar entra pelo encanamento,
inunda a rede e gera um contrafluxo que faz com que o esgoto volte às casas e
às ruas. As inundações nas comunidades costeiras da Jamaica não são um fenômeno
novo, mas nos últimos anos o que era incomum se tornou frequente.
O especialista em gestão costeira Peter
Wilson-Kelly percorreu várias áreas onde as mesmas histórias se repetem. “É uma
combinação de aumento de fatores relacionados com a mudança climática, como a
elevação do nível do mar, ede danos causados pelos furacões, que deram lugar a
novas referências costeiras e influências da atividade humana, como estruturas
demasiado próximas da costa”, explicou.
Em 2004, seis pessoas morreram quando uma onda
causada pelo furacão Ivã inundou a área de Portland Cottage. E, no leste de
Kingston, várias residências multimilionárias em Caribbean Terrace, uma
comunidade à beira-mar, ficaram destruídas quando o fenômeno empurrou o mar
terra adentro.As ondas imensas também destruíram as dunas de areia, que antes
haviam servido de barreira natural para aestrada Palisadoes Road, que liga a
histórica cidade de Port Royal e o aeroporto Norman Manley com o resto do país.
A responsabilidade do Caribe no aquecimento global
é muito pouca, mas as nações insulares sofreram a pior parte dos danos, alertam
especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU).Na Jamaica, a destruição
dos pântanos, para dar lugar a projetos de desenvolvimento, e a sobrepesca
reduziram a efetividade dos arrecifes de coral, deixando a faixa costeira
exposta à ação descontrolada das ondas e prejudicando a efetividade dos mangues
para limitar o impacto das marés altas.
Wilson-Kelly também atribui o dano na praia
Hellshire ao aumento do número de construções. “Os arrecifes estão prejudicados
há algum tempo, e os furacões Ivã, Dean Sandy e muitos outros fenômenos
passaram e tiveram influência na costa. Mas também aumentou o número de
construções instaladas em Hellshire”, afirmou.
Segundo o informe de 2010 do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Modelando os Impactos Transformadores
da Mudança Climática no Caribe, o aumento do nível do mar devido à mudança
climática causou danos que chegam a milhares de milhões de dólares nos países
insulares e varrerá com os melhores centros turísticos até meados do século”
Por isso, os países da região, como a Jamaica,
defendem um acordo para que a elevação da temperatura global fique abaixo de
1,5 grau Celsius na 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das
Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), que começou no dia 30 de
novembro e termina no dia 11.
O Informe de Síntese do quarto Informe de Avaliação
do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) diz
que o aquecimento global “amplificará os riscos existentes e criará novos para
os sistemas natural e humano. Os riscos se distribuem de forma desigual e são
geralmente maiores para as comunidades e as pessoas desfavorecidas dos países,
independente do grau de desenvolvimento”.
O Caribe perdeu cerca de US$ 136 bilhões em danos
por causa da mudança climática entre 1990 e 2008. O informe do Pnud alerta que,
sem medidas de adaptação e mitigação, o Caribe poderá perder 5% de seu produto
interno bruto, ou US$ 10,7 bilhões, até 2025, quantia que poderá mais do que
dobrar até 2050, alcançando a arrepiante cifra de US$ 22 bilhões, ou cerca de
10% do PIB.
Em 2011, a segunda comunicação da Jamaica à CMNUCC
projetava que o custo de proteger os centros turísticos costeiros nas áreas
mais vulneráveis girava entre US$ 92,3 milhões e US$ 993,8 milhões.Alguns
informes indicam que, até 2080, os 15 países membros da Comunidade do Caribe
(Caricom) poderão enfrentar US$ 187 bilhões em custos de reparação e construção
de alguns de seus melhores centros turísticos.
A perspectiva é preocupante pelos acontecimentos
registrados na Jamaica nas últimas décadas, com destrutivas ondas causadas por
ciclones e grandes incidentes em razão de inundações, que causaram prejuízos à
infraestrutura e perda de vidas. Além das consequências insalubres dos
transbordamentos de esgotos, o valor dos bens sociais e econômicos expostos aos
perigos associados às inundações costeiras foi estimado em US$ 18,6bilhões.
O economista Maurice Mason explicou: “Tudo o que
está acima de dez metros na costa da Jamaica, as principais instalações da
ilha, como as usinas de geração elétrica, os portos, os grandes centros
turísticos e os aeroportos”, que representam 70% do PIB, está em risco.Elevar
em três metros cerca de quatro quilômetros da Palisadoes Road significou para a
Jamaica cerca de US$ 65 milhões em 2010. Vários projetos de mitigação mais
tarde, Rocky Point continua sofrendo as inundações costeiras.
Em Portland Cottage, os moradores replantaram
mangues devastados para reforçar a barreira natural costeira à qual atribuíram
uma menor perda de vidas em 2004.Na famosa praia Negril, o governo e seus
moradores ainda discutem a forma mais efetiva de protegê-la, porque nenhum
deles, nem o setor público nem o privado, pode enfrentar o custo total da
proteção, e a comunidade internacional só ofereceu uma parte dos US$ 25 milhões
considerados necessários.
Mas, como afirmam muitos especialistas, diversas
opiniões de adaptação e mitigação podem ajudar a enfrentar o aquecimento
global, mas nenhuma é suficiente por si só. Dentro do Plano Visão 2030 da
Jamaica, numerosas medidas de adaptação permitirão, com o tempo, mitigar alguns
efeitos da mudança climática. Várias comunidades estão se beneficiando e
continuarão sendo, mas somente a educação, a contínua preparação e a ação
global poderão frear seus efeitos.
Fonte: ENVOLVERDE
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