quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Clima seguirá elevando perdas no Caribe.
Praias afetadas pela erosão e infestadaspor algas Sargassum mortas fazem parte da paisagem comum na baía de Hellshire, na Jamaica. Os cientistas atribuem o fenômeno à mudança climática. Foto: Zadie Neufville/IPS.

Por Zadie Neufville, da IPS – 

Kingston, Jamaica, 8/12/2015 – Os moradores de Rocky Point, uma vila de pescadores na costa sul da Jamaica, acordaram em uma manhã de julho com seus jardins e ruas com água até os joelhos. Os fortes ventos e as grandes ondas fizeram com que o mar adentrasse 200 metros, inundasse as tubulações e obrigasse as pessoas a ficar em suas casas.“Há 43 anos que vivo aqui e nunca tinha visto algo assim”, declarou Sydney Thomas ao jornal Jamaica Observer.

Da praia de pescadores Hellshire, afastada da capital, a comunidade observou como desaparecia em questão de semanas. Agora o mar banha os edifícios. Os barcos que descansavam na areia ficaram à deriva na beira do que resta de areia branca.Em um extremo da baía de Hunts a comunidade de Seaview Gardens ficou à beira do lamaçal.

Durante décadas a população local sofreu o transbordamento das tubulações, quando a água do mar entra pelo encanamento, inunda a rede e gera um contrafluxo que faz com que o esgoto volte às casas e às ruas. As inundações nas comunidades costeiras da Jamaica não são um fenômeno novo, mas nos últimos anos o que era incomum se tornou frequente.

O especialista em gestão costeira Peter Wilson-Kelly percorreu várias áreas onde as mesmas histórias se repetem. “É uma combinação de aumento de fatores relacionados com a mudança climática, como a elevação do nível do mar, ede danos causados pelos furacões, que deram lugar a novas referências costeiras e influências da atividade humana, como estruturas demasiado próximas da costa”, explicou.

Em 2004, seis pessoas morreram quando uma onda causada pelo furacão Ivã inundou a área de Portland Cottage. E, no leste de Kingston, várias residências multimilionárias em Caribbean Terrace, uma comunidade à beira-mar, ficaram destruídas quando o fenômeno empurrou o mar terra adentro.As ondas imensas também destruíram as dunas de areia, que antes haviam servido de barreira natural para aestrada Palisadoes Road, que liga a histórica cidade de Port Royal e o aeroporto Norman Manley com o resto do país.

A responsabilidade do Caribe no aquecimento global é muito pouca, mas as nações insulares sofreram a pior parte dos danos, alertam especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU).Na Jamaica, a destruição dos pântanos, para dar lugar a projetos de desenvolvimento, e a sobrepesca reduziram a efetividade dos arrecifes de coral, deixando a faixa costeira exposta à ação descontrolada das ondas e prejudicando a efetividade dos mangues para limitar o impacto das marés altas.

Wilson-Kelly também atribui o dano na praia Hellshire ao aumento do número de construções. “Os arrecifes estão prejudicados há algum tempo, e os furacões Ivã, Dean Sandy e muitos outros fenômenos passaram e tiveram influência na costa. Mas também aumentou o número de construções instaladas em Hellshire”, afirmou.

Segundo o informe de 2010 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Modelando os Impactos Transformadores da Mudança Climática no Caribe, o aumento do nível do mar devido à mudança climática causou danos que chegam a milhares de milhões de dólares nos países insulares e varrerá com os melhores centros turísticos até meados do século”

Por isso, os países da região, como a Jamaica, defendem um acordo para que a elevação da temperatura global fique abaixo de 1,5 grau Celsius na 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), que começou no dia 30 de novembro e termina no dia 11.

O Informe de Síntese do quarto Informe de Avaliação do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) diz que o aquecimento global “amplificará os riscos existentes e criará novos para os sistemas natural e humano. Os riscos se distribuem de forma desigual e são geralmente maiores para as comunidades e as pessoas desfavorecidas dos países, independente do grau de desenvolvimento”.

O Caribe perdeu cerca de US$ 136 bilhões em danos por causa da mudança climática entre 1990 e 2008. O informe do Pnud alerta que, sem medidas de adaptação e mitigação, o Caribe poderá perder 5% de seu produto interno bruto, ou US$ 10,7 bilhões, até 2025, quantia que poderá mais do que dobrar até 2050, alcançando a arrepiante cifra de US$ 22 bilhões, ou cerca de 10% do PIB.

Em 2011, a segunda comunicação da Jamaica à CMNUCC projetava que o custo de proteger os centros turísticos costeiros nas áreas mais vulneráveis girava entre US$ 92,3 milhões e US$ 993,8 milhões.Alguns informes indicam que, até 2080, os 15 países membros da Comunidade do Caribe (Caricom) poderão enfrentar US$ 187 bilhões em custos de reparação e construção de alguns de seus melhores centros turísticos.

A perspectiva é preocupante pelos acontecimentos registrados na Jamaica nas últimas décadas, com destrutivas ondas causadas por ciclones e grandes incidentes em razão de inundações, que causaram prejuízos à infraestrutura e perda de vidas. Além das consequências insalubres dos transbordamentos de esgotos, o valor dos bens sociais e econômicos expostos aos perigos associados às inundações costeiras foi estimado em US$ 18,6bilhões.

O economista Maurice Mason explicou: “Tudo o que está acima de dez metros na costa da Jamaica, as principais instalações da ilha, como as usinas de geração elétrica, os portos, os grandes centros turísticos e os aeroportos”, que representam 70% do PIB, está em risco.Elevar em três metros cerca de quatro quilômetros da Palisadoes Road significou para a Jamaica cerca de US$ 65 milhões em 2010. Vários projetos de mitigação mais tarde, Rocky Point continua sofrendo as inundações costeiras.

Em Portland Cottage, os moradores replantaram mangues devastados para reforçar a barreira natural costeira à qual atribuíram uma menor perda de vidas em 2004.Na famosa praia Negril, o governo e seus moradores ainda discutem a forma mais efetiva de protegê-la, porque nenhum deles, nem o setor público nem o privado, pode enfrentar o custo total da proteção, e a comunidade internacional só ofereceu uma parte dos US$ 25 milhões considerados necessários.

Mas, como afirmam muitos especialistas, diversas opiniões de adaptação e mitigação podem ajudar a enfrentar o aquecimento global, mas nenhuma é suficiente por si só.  Dentro do Plano Visão 2030 da Jamaica, numerosas medidas de adaptação permitirão, com o tempo, mitigar alguns efeitos da mudança climática. Várias comunidades estão se beneficiando e continuarão sendo, mas somente a educação, a contínua preparação e a ação global poderão frear seus efeitos.


Fonte: ENVOLVERDE

Nenhum comentário:

Postar um comentário