terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Brics não está em risco de desaparecer.
O Estádio Nacional da Costa Rica, doado pela China como presente pelo estabelecimento de relações bilaterais em 2007, construído em 2009 e 2010 por uma companhia e mão de obra chinesas. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS.

Por N Chandra Mohan, da IPS – 

Nova Délhi, Índia, 30/11/2015 – O banco Goldman Sachs fechou seu fundo destinado a investimento nos cinco países que integram o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) porque lhe causava constantes perdas. Isso implica que se fechou a cortina para esse grupo que chegou a concentrar o interesse dos banqueiros pelos “mercados emergentes”? Parece que sim, depois que a queda do mercado de valores da China e sua economia em rápida desaceleração provocaram o temor de que o dragão chinês desencadeie a próxima recessão mundial.

A economia do Brasil passa por sua pior recessão nos últimos 25 anos. A Rússia também está em um período de contração, devido à queda do preço do petróleo e às sanções internacionais por causa do conflito armado com a Ucrânia. A Índia continua sendo um remanso de estabilidade. O crescimento da África do Sul é lento, com um desemprego de muito alto nível.

Nesse contexto sombrio, quais as perspectivas de que o Brics possa desempenhar um papel vital na economia mundial? Há 14 anos o Brics era em grande parte uma ideia para a qual havia chegado sua hora. O Goldman Sachs projetava os seus integrantes como os futuros motores de crescimento da economia mundial. O grupo logo se converteu em uma palavra de moda com vida própria.

A atenção dada a essas economias emergentes, sobretudo a partir de 2006, gerou atraentes benefícios que chegaram ao seu máximo em 2010. Porém, desde então, os ativos do Fundo Brics caíram, de US$ 842 milhões para US$ 98 milhões no final de setembro deste ano, segundo a agência de notícias Bloomberg.

Sem esperança de que no futuro próximo ocorra um “crescimento importante dos ativos”, o Goldman Sachs jogou a toalha no dia 23 de outubro, último dia em que o fundo foi negociado na bolsa. Essa situação reflete claramente a franca deterioração das perspectivas de crescimento das economias do Brics. Esperava-se que em conjunto as cinco superassem o tamanho da economia dos Estados Unidos este ano. Mas não é provável que isso aconteça.

A desaceleração da economia chinesa, de fato, ameaça com a primeira recessão mundial em 50 anos sem influência dos Estados Unidos, segundo um banco de investimento. Brasil e Rússia estão muito pior, já que dependem em grande parte das exportações de seus produtos básicos para impulsionar seu crescimento. Como a China é o maior importador mundial de petróleo, minério de ferro e outras matérias-primas, essa é uma má notícia para as perspectivas impulsionadas pelos produtos básicos. Somente os antecedentes da Índia levam a considerá-la a economia de crescimento mais rápido do mundo.

Essas preocupações só fazem com que o Brics (que concentra 20% do produto interno bruto, 42% da população, 17,3% do comércio, 41% das reservas de divisas e 45% da produção agrícola do mundo) perca coesão para exercer sua importância geoeconômica no planeta. Os analistas consideram que o grupo é uma aliança de economias de tamanho médio que poderiam liderar uma séria tentativa de contrapeso aos Estados Unidos, a economia mais poderosa do mundo.

Isso não é nada evidente, exceto, talvez, para a Rússia, que sofre o peso das sanções lideradas pelos Estados Unidos devido à sua intervenção na Ucrânia. O argumento se aplica menos à Índia, que está aprofundando suas relações com Washington.

Mas o Brics não está contente com a arquitetura financeira mundial liderada pelos Estados Unidos. Uma característica comum, que se destaca nas sete declarações divulgadas pelas cúpulas do grupo entre 2009 e 2015, é que seus integrantes têm como objetivo promover a paz, a segurança, a prosperidade e o desenvolvimento de uma ordem mundial multipolar, equitativa e democrática.

O Brics pretende ter mais voz e participação nas instituições de governança internacional, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio (OMC) e Organização das Nações Unidas (ONU). A cúpula realizada na cidade africana de Durban em 2013, por exemplo, assinalou que a OMC necessita de um líder novo que demonstre seu compromisso com o multilateralismo e que seja um representante de um país em desenvolvimento.

A formação do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) é, de fato, uma expressão concreta da vontade do Brics de estabelecer sua própria alternativa ao FMI e ao Banco Mundial liderados pelos Estados Unidos. O presidente do NBD, KV Kamath, indicou que o banco buscaria um caminho diferente ao das instituições de Bretton Woods, que impõem condições inaceitáveis para conceder seus empréstimos.

Em acentuado contraste, espera-se que o NBD priorize os interesses dos que tomam empréstimo e não os dos que emprestam, o que refletiria melhor as expectativas e aspirações dos países em desenvolvimento. Mas o Brics não tem desejos de apresentar o NBD como um rival do Banco Mundial ou do FMI. Em uma reunião do Brics, realizada antes da cúpula do Grupo dos 20 na Turquia, o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, afirmou que seu país guiará o NBD para que financie as necessidades das economias emergentes.

A Índia assumirá a presidência do Brics em fevereiro de 2016 e o tema de sua presidência será “Construção de soluções receptivas, inclusivas e coletivas”. Segundo Modi, houve um momento em que se questionou a lógica e a capacidade de duração do grupo. Mas seus integrantes deram demasiadas provas de sua relevância e seu valor com suas medidas em uma época de grandes desafios globais, acrescentou.

A boa notícia é que os países do Brics estão cooperando e competindo entre si para ocupar seu lugar no mundo. As sete cúpulas realizadas, de São Petersburgo a Ufa, são testemunha disso. Os cinco países são os novos motores de crescimento para os países de baixa renda, especialmente na África, se levarmos em conta a crescente importância de seu comércio e seu investimento estrangeiro direto nessas economias.

O Brics está passando por tempos difíceis, mas constitui um mercado de consumo importante. Sua renda cresce na medida em que cada vez mais pessoas se somam à classe média, o que resulta em maior demanda por petróleo, automóveis e produtos básicos nos principais países membros, como China e Índia.

Entretanto, o grupo deverá abordar seriamente os problemas que implica encaminhar seu ritmo de expansão para impulsionar o crescimento global como antes. É possível que o Brics não esteja gerando benefícios financeiros aos bancos de investimento, mas não estão em perigo iminente de desaparecer.

Afinal, seus países membros levam as coisas suficientemente a sério para criar um rival potencial ao Banco Mundial e ao FMI. Embora o Goldman Sachs tenha fechado o Fundo Brics, essas economias continuarão sendo relevantes no futuro.

Sua capacidade de recuperação somente destaca a profunda verdade, sobre a qual o famoso economista britânico John Maynard Keynes falou há muito tempo, de que as ideias dos economistas e dos filósofos políticos, estejam certas ou erradas, são mais poderosas do que se entende comumente. De fato, o mundo é regido por elas.


Fonte: ENVOLVERDE

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