COP21
chega à metade sem saber aonde vai.
Definição
sobre objetivo de longo prazo do novo acordo do clima e sobre quem paga a conta
ficam nas mãos dos ministros, que assumem a negociação a partir de
segunda-feira.
Por Claudio Angelo e Cíntya Feitosa, do
OC, em Paris –
Um diplomata de um país em desenvolvimento
resumiu da seguinte forma o texto preliminar do Acordo de Paris, que foi
finalizado na manhã do sábado (05): “Ele só precisava de dois colchetes: um no
começo e um no final”.
A piada reflete o estado de indefinição que ainda
reina sobre os elementos centrais do novo acordo do clima, que precisa estar
pronto daqui a seis dias no centro de convenções montado em Le Bourget, nos
arredores da capital francesa. Colchetes são sinais gráficos que denotam
discordância entre os países, e o texto que será negociado entre ministros na
próxima semana ainda possui 939 pares deles, espalhados em 48 páginas.
Ficou no colo dos ministros, que assumem as
rédeas da COP21 a partir de segunda-feira, a tarefa de decidir sobre o que
realmente importa no novo regime de proteção do clima: como distinguir entre as
obrigações dos países desenvolvidos e em desenvolvimento; qual é o objetivo de
longo prazo da redução de gases de efeito estufa no planeta; e, o mais
importante de tudo, quem paga a conta.
Por outro lado, e pela mesma razão, o texto ainda
permite um resultado robusto em Paris. Ficaram no rascunho, dentro de
colchetes, propostas como a de manter a menção a 1,5oC como limite mínimo
desejável para o aumento da temperatura global neste século, a revisão de cinco
anos da ambição do acordo e o mecanismo de perdas e danos, uma exigência das
nações vulneráveis e dos países insulares.
Jennifer Morgan, diretora do World Resources
Institute, afirma que a dúvida sobre se haverá ou não acordo não existe mais.
“A questão agora é se será um acordo minimalista ou de alta ambição.”
Como as negociações na primeira semana foram
fechadas a observadores, ninguém tem a dimensão exata dos conflitos em torno do
texto. Sabe-se que a Arábia Saudita tentou bloquear as discussões em torno de
um dos temas espinhosos, o objetivo de longo prazo. Como resultado, não está
claro qual será a visão do acordo para 2050 e além. Ou seja, o texto de Paris
parte sem saber aonde quer chegar.
Indefinição também ronda a revisão dos
compromissos. O texto fala em fazer a primeira rodada de revisão para aumento
da ambição em 2024, o que vários estudos consideram tarde demais para
salvaguardar a meta de manter o aquecimento em menos de 2 graus Celsius.
De maneira geral, porém, os negociadores que
falaram com a imprensa neste sábado pareciam satisfeitos com o andamento do
processo – e teciam elogios ao presidente da COP21, o chanceler francês Laurent
Fabius. O espírito geral, até mesmo entre as nações insulares, parece ser o de
não criar problemas com detalhes e assegurar que haja uma decisão geral
aceitável.
“Estamos absolutamente otimistas em relação ao
acordo”, afirmou a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Izabella Teixeira, após
uma reunião já na noite de sábado com o secretário-geral das Nações Unidas, Ban
Ki-moon.
A ministra foi escolhida por Fabius para ser
co-facilitadora, juntamente com o ministro de Cingapura Vivian Balakrishnan, de
um grupo de trabalho que vai tentar superar os entraves políticos em torno da
diferenciação entre os países.
A diferenciação – ou seja, a atribuição de metas
a nações desenvolvidas e em desenvolvimento de acordo com suas capacidades e
responsabilidade pela mudança do clima – é um dos chamados “temas transversais”
do Acordo de Paris. Ela aparece em vários capítulos do documento, em temas como
mitigação (corte de emissões), financiamento e transparência.
Resolvendo o nó da diferenciação, diversos
colchetes “caem por atacado” no texto, como num dominó. A expectativa de Fabius
é que decisões políticas “facilitadas” por grupos de ministros de países-chave
durante a próxima semana possam destravar também outros três pontos
fundamentais do texto: a questão do financiamento, a ambição de longo prazo e a
aceleração das ações a adotar até 2020 – o chamado “Trilho 2” do acordo.
Uma das estratégias usadas pelos diplomatas para
facilitar o diálogo na primeira semana foi a divisão da negociação em grupos
menores para tratar de temas específicos – por exemplo, separar adaptação e
finanças. Porém, o que deveria ter deixado as negociações mais fáceis causou um
problema: alguns temas transversais, como transparência ou ações que dependem
de decisões em finanças, acabaram se pulverizando. O processo definido para a
segunda semana tem o objetivo de resolver isso.
“O texto que temos hoje representa um progresso.
Mas nós precisamos fazer coisas concretas antes de sexta-feira”, disse Fabius.
POTODOSO
O tema do financiamento segue eludindo a
negociação. O texto de Paris não define sequer o volume de recursos para o
fundo internacional de clima após 2020, embora defina um roteiro de como chegar
lá – um dos poucos pontos de avanço na negociação.
Uma das opções entre colchetes é que sejam US$
100 bilhões. Também não houve acordo sobre quem deve prover os recursos e quem
pode recebê-los, nem sobre mecanismos de transparência dos recursos. Os países
desenvolvidos querem ampliar o círculo de doadores, proposta que o G77, o grupo
de países em desenvolvimento, não aceita. A expressão “países em posição de
fazê-lo”, ou “Potodoso”, no jargão diplomático, segue no texto.
No entanto, há sinais de flexibilização no
horizonte. Brasil e China, por exemplo, sinalizam que concordam em financiar
ações de mitigação e adaptação em cooperação sul-sul – entre países em
desenvolvimento –, mas de forma voluntária, e não sob a convenção de mudanças
climáticas das Nações Unidas. Isso seria uma maneira de ampliar a base de
doadores, criando uma solução de compromisso com os países ricos.
“A China, por exemplo, deu mais de US$ 3 bilhões,
em uma base sul-sul. Isso é voluntário. Nós mesmos fazemos isso no Fundo
Amazônia. Esses arranjos não necessariamente vão deixar de existir. Ao
contrário. Se deseja que se amplie essa participação. O que não pode achar é
que ao fazer isso se determina obrigações para países que ainda não tempo o
mesmo peso de emissões, no tempo, que os países desenvolvidos têm”, afirmou a
ministra.
Um negociador sênior do G77 alertou, porém, que
será preciso que os países ricos apresentem números sobre quanto deve haver de
financiamento para o período após 2020. Até agora não há traço disso na mesa de
negociação.
Leia o documento oficial aqui.
Fonte: Observatório
do Clima
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