Poços e contaminação põem em
risco águas subterrâneas de SP.
por Malu
Ribeiro*
A bacia do Alto Tietê é justamente
a região mais crítica em relação ao uso das águas subterrâneas. Foto: Vagner
Campos/ A2 FOTOGRAFIA (16/05/2014)/ Fotos Públicas
O uso da água subterrânea como alternativa para a
grave crise hídrica em São Paulo requer cuidados e planejamento. Apesar dos
aquíferos formarem uma grande reserva estratégica de água para captações atuais
e futuras, o uso intensivo e contaminações já comprometem essa fonte em várias
regiões do Estado. Atualmente, 462 municípios paulistas, cerca de 72% do
Estado, são total ou parcialmente abastecidos por água subterrânea e atendem a
uma população de mais de 5,5 milhões de pessoas.
Dados do Mapa de Águas Subterrâneas do Estado de
São Paulo – produzido em 2004 pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica
(DAEE), Instituto Geológico (IG), Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado
de São Paulo (IPT) e Serviço Geológico do Brasil (CPRM) – estimam que as
reservas exploráveis dos aquíferos paulistas podem garantir uma disponibilidade
de 787 litros por habitante/dia. Porém, os mesmos estudos já alertavam para as
altas demandas e grandes concentrações de poços licenciados e clandestinos, o
que têm provocado acentuados rebaixamentos nos aquíferos ao longo desta década,
nas bacias dos rios Turvo/Grande, na região de Ribeirão Preto; do rio Pardo, na
região de São José do Rio Preto e na bacia do Alto Tietê, que abriga a região
metropolitana de São Paulo.
A bacia do Alto Tietê é justamente a região mais
crítica em relação ao uso das águas subterrâneas, situação agravada pela super
exploração, contaminação e falta de condições de recarga dos aquíferos em virtude
da intensa urbanização e impermeabilização do solo. A bacia conta com uma
disponibilidade de apenas 93 litros/habitante/dia, seguida pelas bacias do
Médio Tietê/Sorocaba (433 l/hab/dia) e Piracicaba/Capivari/Jundiaí (482
l/hab/dia).
Neste período de seca intensa vários usuários de
água subterrânea, de diferentes bacias paulistas, têm relatado quedas drásticas
nos níveis de poços de captação profunda utilizados para abastecimento público,
atividades rurais e industriais. Em meados de agosto, serviços autônomos de
água e esgoto do Médio Tietê, no interior paulista, revelavam que os poços de
captação de água para abastecimento público registravam rebaixamento de 30
metros.
Para que as reservas subterrâneas possam ser
reabastecidas e que o uso dessas águas ocorra de forma sustentável, é urgente
que as zonas de recarga dos aquíferos sejam preservadas e que ganhem
instrumentos efetivos de conservação. Esse zoneamento especial compete aos
municípios e ao Estado, que devem delimitar áreas estratégicas para a conservação
hídrica. Assim como os rios e os mananciais superficiais, os aquíferos também
dependem das florestas e matas para garantia de sua qualidade e quantidade da
água.
Desde 1997, os integrantes dos comitês de bacias
paulistas têm a disposição, para planejamento e gestão das águas subterrâneas,
o mapa de vulnerabilidade para contaminação dos aquíferos do Estado de São
Paulo. A partir de 2003, a bacia do Alto Tietê foi incluída na rede de
monitoramento da qualidade da água subterrânea a cargo da Companhia de
Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). Em 2009, a Cetesb passou a atuar
em conjunto com o DAEE na operação de uma rede integrada de qualidade e
quantidade das águas subterrâneas.
No período de 2010 a 2012 foram monitorados 240
pontos de coleta em diferentes aquíferos paulistas. O cruzamento dos dados de
monitoramento da água e de solos aponta que mais de sete bacias hidrográficas
se encontram em áreas vulneráveis, o que reforça a necessidade de maior cuidado
na perfuração de poços e na instalação de atividades potencialmente poluidoras,
principalmente na região de recarga do Aquífero Guarani, no oeste paulista.
As áreas urbanas reúnem milhares de fontes de
contaminação da água subterrânea, como postos de combustíveis, depósitos de
resíduos industriais, domésticos e comerciais. Nas áreas rurais a atenção fica
aos resíduos de insumos e defensivos agrícolas.
Certamente, com o crescimento das cidades e das
atividades econômicas, o quadro se agrava e reforça o alerta de que muitas
dessas águas, principalmente as que são provenientes de poços clandestinos ou
irregulares, podem estar contaminadas e oferecer riscos à população. Em muitos
casos não há como descontaminar os aquíferos. Por isso, vários poços são
lacrados e essas águas ficam indisponíveis para usos.
Embora São Paulo conte com estudos técnicos e
legislação que são referências para a gestão da água subterrânea, a defasagem
dos dados que sempre são elaborados com base nos monitoramentos de anos
anteriores, ou períodos de dois anos, o alto grau de clandestinidade nas
captações, a falta de informação traduzida para entendimento da sociedade em
geral e a gravidade da crise hídrica colocam o sistema de gestão de recursos
hídricos em xeque. É fundamental fortalecer os Comitês de Bacias para que a
sociedade participe ativamente do planejamento e da tomada de decisões em
relação ao uso da água, com base em dados e cadastros de outorgas e qualidade
da água atualizados.
A gravidade da escassez e a enorme demanda levaram
à suspensão temporária da emissão de outorgas para uso da água nas bacias do
Alto Tietê e Piracicaba/Capivari/Jundiaí e no município de Itu. Além disso, é
vedada a utilização de água subterrânea proveniente de processos de remediação
de áreas contaminadas que possam expor os usuários a riscos, tais como ingestão
humana, higiene pessoal, preparo de refeições, recreação em piscinas e banhos
em geral, lavagem de veículos e outros usos que levem ao contato dérmico.
Por
isso, muita atenção e responsabilidade em relação ao uso dessa água.
* Malu Ribeiro é coordenadora da Rede das
Águas da Fundação SOS Mata Atlântica.
Fonte: SOS Mata Atlântica
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