Lições para a Jamaica de uma seca
de US$ 1 bi.
por
Desmond Brown, da IPS
O rio Yallahs, uma das principais fontes de água do
depósito de Mona, há meses está seco. Foto: Desmond Brown/IPS.
Bahia Morant, Jamaica, 27/11/2014 – Enquanto a
Jamaica sofre uma das piores secas que já conheceu, especialistas afirmam que
garantir a segurança alimentar dos setores mais vulneráveis é um dos maiores
desafios apresentados pela mudança climática.
“A disparidade entre pessoas muito ricas e muito
pobres na Jamaica significa que os que vivem na pobreza ou pobreza extrema,
mulheres chefes de família com muitos filhos e idosos, sofrem uma grande
desvantagem nesse período”, afirmou Judith Wedderburn, diretora de projeto
neste país da fundação alemã Friedrich-Ebert-Stiftung (FES).
Wedderburn, que conversou com a IPS por ocasião de
um painel para jornalistas organizado pelo FES e pela Panos Caribe no começo
deste mês, acrescentou que “o que preocupa é como as consequências da
mudança climática se estendem por vários anos, e esse tipo de situação, com
maiores inundações e períodos de seca extrema, se torna cada vez mais grave”.
Ela afirmou que os países dessa região, que já
contam com um espaço delimitado para a produção de alimentos, agora têm o
desafio adicional de enfrentar episódios de precipitações ou secas extremas
devido à mudança climática. “Na Jamaica tivemos vários meses de seca que
afetaram as paróquias (divisão política) produtoras de alimentos mais
importantes”, destacou, acrescentando que o problema não acaba com o fim da
seca.
“Nos afetam os extremos de chuvas que derivam em
inundações. As comunidades agrícolas perdem seus cultivos durante as secas e as
famílias sofrem o impacto”, ressaltou Wedderburn. “A produção de alimentos fica
perturbada e o custo da comida aumenta, por isso numerosas famílias que já são
pobres têm ainda mais dificuldades para conseguir os produtos locais a um preço
razoável, o que contribui para a insegurança alimentar; isto é, as pessoas não
têm fácil acesso aos produtos necessários para que a família esteja bem
alimentada”, enfatizou.
Dale Rankine, candidato a doutorado na Universidade
das Índias Ocidentais, prevê que a situação pode piorar. Segundo disse à IPS,
os modelos de mudança climática indicam que a região se tornará mais seca entre
meados e finais deste século. “Vemos projeções que sugerem que podemos ter uma
redução de 40% ou mais na quantidade de precipitações, especialmente nos meses
de verão. Normalmente, estes coincidem com a típica estação de chuvas”,
apontou.
“Isso é particularmente importante porque terá
impacto especial na segurança alimentar. Também há indícios de que poderemos
experimentar maior frequência de secas e inundações, e esta grande
variabilidade seguramente prejudicará os cultivos”, destacou Rankine. E
ressaltou um “interessante padrão” de aumento de chuvas nas regiões centrais,
mas só nas regiões exteriores, enquanto no oeste e leste houve uma queda nas
precipitações.
“Isso é bem interessante porque os locais mais
importantes para a segurança alimentar, especialmente para as paróquias de
Saint Elizabeth e Manchester, por exemplo, experimentam uma redução na média de
chuvas e isso tem consequências sobre o quanto serão produtivas nossas regiões
produtoras”, observou Rankine.
A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos
Estados Unidos (NOAA) anunciou que setembro deste ano foi o mais quente nos 135
anos de que se tem registros. Nesse mês, a média de temperatura global foi de
15,72 graus, o que o converteu no quadrimestre recorde, junto com maio, junho e
agosto. Segundo o Centro Nacional de Dados Climáticos da NOAA, os primeiros
nove meses de 2014 registraram temperaturas globais médias de 14,78 graus,
competindo com 1998 pelos primeiros nove meses mais quentes.
O ministro de Mudança Climática, Ambiente, Água e
Terra da Jamaica, Robert Pickersgill, disse que mais de 18 mil pequenos
agricultores sofreram o impacto da atual seca extrema que este país sofre há
meses. A agricultura perdeu quase US$ 1 bilhão devido à seca e aos incêndios
florestais causados pelo calor extremo.
Pickersgill explicou que a redução de chuvas diminuiu
de forma significativa o fluxo de água, desde os riachos até os rios, em várias
partes do país. “Os dados preliminares das precipitações para junho deste ano
indicam que a Jamaica recebeu 30% menos água de chuva do que o habitual e todas
as paróquias, salvo partes de Westmoreland (54%), receberam menos da metade do
que recebiam normalmente”, acrescentou.
“As paróquias de Saint Elizabeth, Manchester,
Clarendon, Saint Catherine, Kingston e Saint Andrew e Saint Thomas, junto com
Saint Mary e Portland, foram as mais afetadas”, contou Pickersgill. Claredon
recebeu apenas 2% das chuvas normais, seguida de Manchester com 4%, Saint
Thomas com 6%, Saint Mary com 8% e Kingston e Saint Andrew com 12%,
acrescentou.
Além disso, Pickersgill disse que a entrada de água
no reservatório Mona, vinda dos rios Yallahs e Negro, atualmente é de 18,7
milhões de litros por dia, o menor volume desde a construção da tubulação de
Yallahs, em 1986. Já a entrada na represa de Hermitage está em 22,7 milhões de
litros por dia, abaixo dos mais de 68 milhões diários na estação úmida.
“Para mim está claro que a evidência científica
sobre a mudança climática ser um perigo claro e atual é mais forte do que
nunca. Por isso, a necessidade de mitigar e nos adaptarmos às suas
consequências é ainda maior, e por isso costumo dizer que com a mudança
climática também temos que mudar”, ressaltou Pickersgill à IPS.
A Jamaica tem de tomar medidas imediatas para
adaptar-se à mudança climática, concordou Wedderburn, do FES. “O desafio do
governo é explorar que tipo de adaptação pode servir para ensinar os
agricultores a melhorar a coleta de água, para que nos períodos de seca severa
possam continuar cultivando e vendendo seus produtos a preços razoáveis, como
forma de enfrentar a insegurança alimentar”, enfatizou.
Fonte: ENVOLVERDE
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