G-20 busca centrar investimentos
privados em infraestrutura.
por Carey
L. Biron, da IPS
As águas
fluem com vigor na represa de Gariep, em Port Elizabeth, África do Sul.
Foto: Bigstock.
Washington, Estados Unidos, 19/11/2014 – Os países
industrializados concordaram em elaborar um novo programa para canalizar
significativos investimentos do setor privado em projetos mundiais de
infraestrutura, particularmente em nações em desenvolvimento. A Iniciativa de
Infraestrutura Global, acordada no dia 16 pelos líderes do Grupo dos 20 (G-20)
países industrializados e emergentes, não financiará, na verdade, novos
projetos. Por outro lado, buscará criar entornos de investimento mais
receptivos aos grandes investidores estrangeiros, e ajudará a conectar governos
com financiadores.
O funcionamento dessa iniciativa será vigiado por
uma secretaria na Austrália, país anfitrião da cúpula anual do G-20, que
aconteceu nos dias 15 e 16, na cidade de Brisbane e que fez do investimento em
infraestrutura uma prioridade. Esse escritório, conhecido como Centro de
Infraestrutura Global, fomentará a colaboração entre os setores público e
privado, bem como com os bancos multilaterais.
“Com mandato de quatro anos, o Centro funcionará
internacionalmente para ajudar os países a melhorar seus climas gerais de
investimento, reduzir barreiras aos investimentos, fazer crescer seus projetos
e combinar investidores com projetos”, afirmaram o primeiro-ministro
australiano, Tony Abbott, e o titular do Tesouro, Joe Hockey, em comunicado
conjunto divulgado no dia 16. “Isso ajudará a melhorar o funcionamento dos
mercados de infraestrutura”, acrescentaram.
Alguns estimam que, desta forma, nos próximos 15
anos será possível movimentar cerca de US$ 2 bilhões em novos investimentos
para infraestrutura. Esta soma se destinaria a redes elétricas, estradas e
pontes, portos e outros grandes projetos. O G-20 surgiu como a principal
agrupação multilateral encarregada de promover a colaboração econômica. Em
conjunto, seus membros representam 85% do produto interno bruto mundial.
Com o amplo objetivo de estimular o crescimento
econômico mundial, a Iniciativa de Infraestrutura Global trabalhará para
motivar grandes investidores institucionais – bancos, fundos de pensão e outros
– para capitalizar no longo prazo o crescente déficit de infraestrutura no
mundo. Só nos países do Sul em desenvolvimento, essas necessidades poderão
requerer até US$ 1 trilhão por ano em investimentos adicionais, embora
atualmente os governos destinem apenas a metade dessa quantia.
Nos últimos anos o setor privado se afastou da
infraestrutura nos países em desenvolvimento e emergentes. Entre 2012 e 2013
somente, esses investimentos caíram quase 20%, passando para US$ 150 bilhões,
segundo o Banco Mundial. “Essa nova iniciativa reflete de modo muito positivo
uma leitura clara da evidência de que há gargalos e obstáculos em matéria de
infraestrutura, tanto no mundo em desenvolvimento quanto no industrial”,
afirmou à IPS Scott Morris, do Centro para o Desenvolvimento Global, um grupo
de especialistas com sede em Washington.
“Da perspectiva dos doadores, isto indica que se
ouve melhor o que os países realmente estão pedindo”, apontou Morris,
acrescentando que, de todo modo, não está claro quais serão exatamente os
resultados da Iniciativa de Infraestrutura Global. “O G-20 claramente busca
priorizar os investimentos em infraestrutura, mas é difícil ter uma ideia de
onde estão as prioridades”, pontuou.
A Iniciativa é o mais recente de uma série de novos
programas relativos à infraestrutura que foram anunciados no âmbito
multilateral nas últimas semanas.
No começo de outubro, o Banco Mundial anunciou um
projeto chamado Fundo para a Infraestrutura Mundial (GIF), que parece ter um
mandato muito semelhante à nova iniciativa do G-20. E, no final do mesmo mês, o
governo chinês anunciou a criação do Banco Asiático de Investimentos em
Infraestrutura (AIIB). Muitos sugerem que os anúncios do Banco Mundial e do
G-20 foram motivados pelo forçado ingresso da China nesse cenário. Porém, até
agora está pouco claro qual é a estratégia do projeto do G-20.
“Com tantas iniciativas discretas que
repentinamente são colocadas em marcha, me pergunto se o novo projeto do G2-0
não causa confusão”, observou Morris. “Neste momento, é muito difícil ver uma
divisão de responsabilidades entre os projetos de infraestrutura do G-20 e do
Banco Mundial. A diferença mais notória entre esses dois e o do AIIB é que os
chineses oferecem capital real para os investimentos”, ressaltou.
A ideia da nova iniciativa teve origem em uma
entidade empresarial que assessora o G-20 e conhecida como Business 20 (B-20),
que disse apoiar “plenamente” a nova Iniciativa de Infraestrutura Global. “Esse
é um passo crucial na abordagem do crescimento mundial e do desafio do emprego,
e a comunidade empresarial aprova firmemente os compromissos do G-20 quanto a
aumentar os investimentos de qualidade em infraestrutura”, declarou, no dia 17,
o presidente do B-20, Richard Goyder.
“O B2-0 estima que melhorar a preparação,
estruturação e entrega de projetos poderá melhorar a capacidade de
infraestrutura em (aproximadamente) US$ 20 trilhões até 2030”, disse Goyder,
que também se comprometeu em que o setor empresarial apoie “fortemente” os
novos projetos.
No entanto, preocupa a sociedade civil o fato de
não estar claro se a Iniciativa da Infraestrutura Global imporá condições aos
novos projetos para minimizar seus potenciais impactos. “É fundamental que a
Iniciativa e o Centro de Infraestrutura desenvolvam procedimentos e práticas
não só para promover o desenvolvimento de infraestrutura, como também para
garantir que os projetos sejam ambiental, social e economicamente sustentáveis
para os países e as comunidades anfitriãs”, afirmou Lise Johnson, do Centro de
Desenvolvimento Sustentado da Universidade de Colúmbia, entrevistada pela IPS.
Destacadas políticas multilaterais de salvaguardas,
como as usadas pelo Banco Mundial, não costumam ser aplicadas às associações
público-privadas, que provavelmente estarão na mira da nova iniciativa do G-20.
Além disso, as limitações regulatórias podem resultar muito espinhosas do ponto
de vista político para que o G-20 forje um novo acordo.
“Na avaliação de 2013 da iniciativa de
infraestrutura do G-20 realizada pelo Grupo de Trabalho sobre Desenvolvimento
do bloco, se ‘estancou’ um elemento de toda a agenda: o relativo às
salvaguardas ambientais”, enfatizou à IPS a diretora do programa de Governança
Econômica na Fundação Heirinch Böll, Nancy Alexander. O G-20 sempre afirmou que
“essas políticas são assuntos de soberania nacional”, acrescentou.
Agora o bloco espera que bilhões de dólares em
gasto de infraestrutura criem até dez milhões de empregos ao longo dos próximos
15 anos, disparando o crescimento econômico mundial. Mas Alexander se pergunta
se esse gasto será uma “fórmula mágica” ou uma “pílula envenenada”.
“Alguns de nós somos suficientemente velhos para
recordar a forma imprudente com que se gastava os petrodólares dos anos 1970 e
1980, especialmente em infraestrutura. Depois, prestamistas inescrupulosos
tentaram obter ganhos rápidos sem considerar as consequências sociais,
ambientais e financeiras, incluindo dívidas impagáveis”, apontou Alexander.
“Vendo a devastação que semeou a infraestrutura mal
concebida, muitos de nós trabalhamos para criar sistemas de transparência,
salvaguardas e recurso junto aos bancos multilaterais de desenvolvimento,
sistemas que agora se considera que consomem muito tempo, são caros e
imperialistas”, segundo Alexander.
Fonte: ENVOLVERDE
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