E o “verde”, como fica?
por André Trigueiro*
Nesta entrevista exclusiva, Izabella Teixeira
revela em que momento foi chamada para permanecer no Ministério do Meio
Ambiente, quais as prioridades acertadas com a presidente Dilma para os próximos
quatro anos, suas expectativas em relação aos novos colegas de primeiro escalão
– especialmente Kátia Abreu e Aldo Rebelo – e como vem recebendo as críticas
dirigidas a ela pelo movimento ambientalista.
Izabella Teixeira me disse que já havia se programado
para dar aulas em 2015 na Universidade de Stanford (EUA) como professora
visitante. Mas o projeto teve que ser adiado, segundo ela, por uma “convocação”
da presidenta Dilma. No último dia 18 de dezembro, logo após a cerimônia de
diplomação, Dilma avisou à Izabella que contava com ela à frente do Ministério
do Meio Ambiente por mais quatro anos. Pedido feito, malas desfeitas.
Sobre os rumores dando conta de que o senador
Jorge Vianna (PT-AC) seria o nome preferido de Dilma até que o irmão dele, o governador
reeleito do Acre, Tião Vianna, apareceu na lista de políticos denunciados na
Operação Lava-Jato, Izabella foi taxativa. “Em nenhum momento isso foi falado
comigo. Ela me convidou para darmos sequência àquilo que iniciamos no primeiro
mandato, com algumas novas atribuições, como o enfrentamento da crise hídrica e
a aprovação do novo marco de acesso a recursos genéticos”.
Um dos raros quadros técnicos do primeiro escalão
do governo, Izabella não representa nenhum partido político e aparece no seleto
grupo de mulheres (apenas seis) que figuram na foto oficial do ministério de
Dilma neste segundo mandato, dividindo espaço com 33 homens.
E é justamente neste núcleo feminino da Esplanada
que a presidenta reuniu duas protagonistas de uma antiga batalha política que
vem sendo travada há anos.
Agora, Izabella Teixeira e Kátia Abreu pertencem
ao mesmo time. A nova ministra da Agricultura – principal liderança do
agronegócio no Brasil – foi uma das principais defensoras do novo Código
Florestal (cujo texto final desagradou amplos segmentos do ambientalismo
brasileiro). Kátia Abreu também vem apoiando a mudança constitucional que prevê
a transferência do Poder Executivo para o Congresso Nacional (onde a bancada
ruralista é forte) da responsabilidade por novas demarcações de terras
indígenas e Unidades de Conservação. Esses não são os únicos pontos divergentes
entre ela e Izabella Teixeira. Guerra à vista? Não necessariamente.
“Eu já conversei com a ministra Kátia Abreu.
Estarei na cerimônia de posse dela. Nós nos falamos na cerimônia de posse da
presidenta Dilma e combinamos de nos reunir para acertarmos uma agenda de
trabalho comum. Kátia Abreu também considera prioridade a implementação do
Cadastro Ambiental Rural (CAR) e me disse que deseja modernizar a legislação
que rege a recuperação florestal.”
Outro colega de primeiro escalão com quem
Izabella Teixeira conversou no dia da posse, foi Aldo Rebelo, da Ciência,
Tecnologia e Inovação. Relator do Código Florestal – a quem dedicou aos
“agricultores brasileiros” – Aldo foi criticado por ambientalistas e cientistas
de apresentar um texto desprovido de embasamento científico e sem o aval de
importantes instituições referenciais para o setor, como a Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a
Agência Nacional de Águas (ANA).
A impopularidade de Aldo Rebelo junto aos
ambientalistas alcançou um ponto crítico em 2011 com a publicação de um texto,
assinado por ele, intitulado “A trapaça ambiental”. Nele, afirmou que “o
chamado movimento ambientalista internacional nada mais é, em sua essência
geopolítica, que uma cabeça de ponte do imperialismo.” Ao comentar o
agravamento do efeito estufa, foi taxativo: “Não há comprovação científica das
projeções do aquecimento global, e muito menos de que ele estaria ocorrendo por
ação do homem e não por causa de fenômenos da natureza”, opinião que contraria
frontalmente a posição histórica do Brasil nas negociações do clima.
O ministro do PC do B acaba de assumir um
ministério que vem subsidiando o governo brasileiro com informações
estratégicas nas negociações climáticas patrocinadas pela ONU e que buscam a
redução imediata das emissões de gases estufa. Negociações em que Izabella é
liderança ativa. E agora? Para que lado vamos?
“Aldo Rebelo manifestou interesse em conversar
comigo sobre a agenda do clima e os assuntos da biodiversidade. É bom lembrar
que foi a própria presidenta Dilma quem destacou o protagonismo do Brasil nas
negociações climáticas e que esse é um tema prioritário deste mandato. É uma
ação articulada de governo onde estamos todos envolvidos”, ressaltou a ministra
do Meio Ambiente.
Ao ser convidada por Dilma para permanecer no
cargo, Izabella ouviu da presidenta a lista de prioridades na área ambiental. A
posição brasileira na COP 21 – a Conferência do Clima que acontecerá em
dezembro deste ano em Paris – é uma delas. A expectativa é a de que o encontro
estabeleça novas metas e prazos para que todos os países – exceto aqueles mais
pobres – reduzam suas emissões de gases estufa. O Brasil promoverá consultas
públicas antes de fechar uma proposta.
Outra prioridade é a implementação do Código
Florestal, especialmente a conclusão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) que
hoje, segundo o governo, alcança 130 milhões de hectares dos 329 milhões de
hectares possíveis. Para que os proprietários de terra sejam cobrados em
relação ao cumprimento das regras de proteção ambiental, é preciso conhecer a
real situação de cada propriedade. Quem também procurou Izabella (na mesma
cerimônia de posse de Dilma) para unir forças na conclusão do CAR foi o
ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias.
Aperfeiçoar o licenciamento ambiental é outra
meta para os próximos quatro anos. O assunto incomoda aos ambientalistas, que
temem a flexibilização dos atuais protocolos em favor dos interesses
econômicos.
Em relação a esse ponto, Izabella lembra que a
maioria absoluta dos licenciamentos hoje é oferecida pelos Estados (no caso das
obras do PAC, 82% dos licenciamentos são estaduais) e diz que o Ibama se
modernizou e virou referência. Segundo ela, o órgão conta hoje com 400
funcionários concursados para cuidar dos licenciamentos federais em uma
estrutura mais ágil e informatizada. “Precisamos avançar nessa agenda. Não é
possível, por exemplo, encomendar um novo estudo de impacto ambiental a cada
dragagem de porto. Pode-se licenciar em blocos, como já se faz nas unidades de
exploração de petróleo, sem nenhum prejuízo ambiental”.
Outra questão importante, segundo ela, é “acabar
com o desmatamento ilegal em todos os biomas, e não apenas na Amazônia”.
Izabella garante que não faltarão recursos para isso, mesmo sabendo que 2015
será um ano de severas restrições orçamentárias para todo o governo. “Não sei
de quanto será o corte, mas nunca faltou dinheiro para fiscalização e combate
ao desmatamento. Quando assumi o Ministério, o orçamento era de 560 milhões de
reais por ano . Hoje é de aproximadamente 1,1 bilhão”.
Izabella lembra que conhece o atual dono do cofre
– leia-se, Joaquim Levy, novo todo-poderoso do Ministério da Fazenda – desde
que os dois participaram do governo Sérgio Cabral (ele na Secretaria de
Fazenda, ela na Secretaria do Ambiente). Vem de lá uma afinidade em relação aos
assuntos ambientais, muito por conta da militância da mulher de Levy, Denise, a
ambientalista da família, que trabalha no BID e mora em Washington.
Sem ser política profissional – portanto,
desamparada dos “apadrinhamentos” que aceleram processos e abrem caminhos nas
redes de interesses que orbitam o Poder Central – Izabella Teixeira desenvolveu
seus próprios métodos para tentar fugir do ostracismo em pleno exercício do
cargo. “O importante é o diálogo, não se isolar e definir pautas comuns entre
os ministérios”, diz ela, reconhecendo que é preciso comunicar melhor o
dia-a-dia do seu ministério junto à sociedade.
Para Izabella, as fortes críticas dirigidas ao
primeiro mandato da presidenta Dilma na área ambiental – principalmente as que
partem das próprias organizações ambientalistas – não levariam em consideração
um numeroso pacote de realizações que ela enumera, sem disfarçar uma certa
indignação. Um dos assuntos mais controversos, por exemplo, é a taxa de
desmatamento da Amazônia. “Registramos as quatro menores taxas de desmatamento
da Amazônia. Realizamos mudanças importantes nos mecanismos de fiscalização e
controle em parcerias com o Ministério da Ciência e Tecnologia e o INPE”.
Sobre as críticas de que Dilma foi a chefe de
Estado que menos criou Unidades de Conservação (UCs) desde os governos
militares, Izabella defende as novas diretrizes adotadas pelo governo. “Criar
Unidades de Conservação em áreas onde existam conflitos fundiários não adianta.
É preciso regularizar a situação primeiro. A propósito, nos últimos quatro
anos, nenhum governador da Amazônia criou novas UCs. E ninguém menciona isso.
Implementamos planos de manejo em 60 dessas unidades, mais do que foi feito nos
oito anos de governo Lula”.
A maioria das medidas citadas na entrevista – não
reproduziremos todas neste espaço – não teve visibilidade nem repercussão. O que
não quer dizer que não sejam importantes. Na lista de Izabella não aparece,
talvez por modéstia, a contribuição efetiva da delegação brasileira (chefiada
por ela) para que o mundo alcançasse depois de 18 anos de negociações o
Protocolo de Nagoya – o mais importante acordo ambiental internacional desde o
Protocolo de Kioto – que versa sobre as regras de uso e proteção da
biodiversidade. Também não mencionou a conquista do Prêmio Campeões da Terra,
que lhe foi oferecido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pnuma), na categoria “liderança política”, pelos “esforços bem sucedidos em
reverter o desmatamento da Amazônia”.
Leal a Dilma, Izabella sabe que o governo não
entende a sustentabilidade como “eixo matricial das políticas públicas”, conforme
tem defendido há décadas o colega e amigo jornalista Washington Novaes. Sabe
também que boa parte de seus colegas de primeiro escalão – a maioria absoluta,
vá lá – ainda vive, pensa e age como se não experimentássemos uma crise
ambiental sem precedentes na história da Humanidade. E aí, o que fazer?
A ex-ministra Marina Silva pediu demissão
alegando que perderia o pescoço, mas não o juízo.
O ex-ministro Carlos Minc bateu boca em público
com mais de um ministro que lhe deixou “verde” de raiva pelo atropelamento das
mais básicas cartilhas ambientais.
Izabella vai ficando. Que incomode bastante.
* André Trigueiro
é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje
leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de
Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo
Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um
dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia,
lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB,
em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e
Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador
voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
Fonte: Mundo
Sustentável
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