Trabalho
decente contra pobreza e fome.
Um trabalhador de uma plantação de mandioca em
Pesqueira, Estado de Pernambuco, no Nordeste do Brasil, mostra suas mãos
destruídas, que denunciam seu trabalho em regime de escravidão. Foto: Alejandro
Arigón/IPS.
Por Jomo Kwame Sundaram*
Roma, Itália, 9/11/2015 – Oito anos depois do
início da crise financeira e econômica mundial, o desemprego aumentou, afetando
mais de 200 milhões de pessoas no mundo, e se trata apenas de uma fração dos
que vivem em condições de vulnerabilidade e insegurança. Na verdade, mais de quatro
quintos da força de trabalho estão fora do setor formal, quase sem acesso a
benefícios sociais.
Quando é preciso sobreviver sem proteção social, o
desemprego não é uma opção para a maioria das pessoas pobres do mundo. Por
outro lado, seu destino provavelmente se pareça mais com o dos trabalhadores
pobres ou de baixa renda devido ao subemprego, à baixa produtividade ou às
limitadas opções de sobrevivência.
Segundo as últimas estimativas do Banco Mundial, o
número de pessoas em situação de extrema pobreza (renda de menos de US$ 1,25
por dia) diminuiu de 1,93 bilhão, em 1981, para 1,91 bilhão, em 1990, e para
1,01 bilhão, em 2011, com projeção para este ano de 835,5 milhões.
Com lentidão da economia global, especialmente após
o colapso dos preços das matérias-primas agrícolas desde o final de 2014,
muitos analistas se perguntam se as projeções do Banco Mundial têm sentido. É
evidente que o crescimento da economia global registrado na metade da década
anterior a 2008 não gerou postos de trabalho suficientes em quantidade e
qualidade, catalisando um discurso do “crescimento sem emprego”.
Rapidamente, em 2009, os países ricos destinaram
uma quantidade significativa de recursos para salvar seus sistemas financeiros,
melhorar suas economias e fortalecer as redes de segurança social. Mas somente
alguns deles evitaram uma excessiva austeridade fiscal. Ao que parece, outros
com consumidores mistos imitaram tarde as exitosas medidas monetárias
expansivas do Federal Reserve dos Estados Unidos.
Além do número crescente de desempregados ou
subempregados, também se deterioram as condições dos empregados. O emprego
informal e os contratos de curto prazo, que significam menos segurança
trabalhista e direitos para os trabalhadores, se tornam a norma para muitas
pessoas.
A terceirização e a subcontratação também se tornam
mais comuns, gerando maior insegurança trabalhista para os profissionais, o que
se conhece como “precariedade trabalhista”. A deterioração das condições de
emprego ocorre em muitos países, e afeta especialmente os trabalhadores com
menor formação e capacitação.
As políticas nacionais destinadas a enfrentar essas
tendências e a reduzir o desemprego tiveram, no melhor dos casos, um êxito
limitado. Em seu desejo de permanecerem ou se tornarem competitivos, governos e
empregadores tomaram muitas medidas para aumentar a flexibilidade do mercado de
trabalho e aumentaram a insegurança para a maioria dos trabalhadores. E essa
flexibilidade exacerbou a insegurança econômica e a desigualdade, afetando as
perspectivas de um emprego decente.
Por outro lado, a proporção do emprego no setor de
serviços, em relação ao emprego total global, superou a da agricultura durante
uma década. De fato, há décadas, o emprego no mundo está cada vez mais dominado
pelo setor de serviços, no qual proliferam os trabalhos mal remunerados e
precários, sem cobertura social, o que faz com que os benefícios por desemprego
tenham deixado de ser um direito social para muitas pessoas nas nações ricas.
Embora esquivo para as pessoas mais pobres, o objetivo
de um trabalho decente para todos, fixado pela Organização Internacional do
Trabalho em 1999, significa empregos produtivos, gratificantes e seguros, com
proteção social e renda justa para os empregados e suas famílias.
O trabalho decente implica igualdade de
oportunidades e tratamento, e oferece boas perspectivas de desenvolvimento
pessoal e de inclusão social. Também assegura liberdade para que as pessoas
possam expressar suas preocupações, organizar e participar de decisões que
afetam suas vidas.
As estratégias para promover o emprego produtivo e
o trabalho decente devem atender as desigualdades de renda, entre outras.
Também devem promover avanços sociais e garantir tratamento igual para todos,
independente de gênero, cultura, idade ou nacionalidade, bem como proteger os
direitos das pessoas deficientes.
As políticas nesse sentido devem assegurar que as
condições trabalhistas melhorem de forma sustentada, especialmente para as
pessoas de menor renda e que sofrem condições de emprego inaceitáveis e perigosas.
Os governos devem empregar os trabalhadores
necessários para proporcionar serviços básicos, como construção de
infraestrutura e manutenção, bem como serviços sociais, que as pessoas esperam
e que são fundamentais para garantir os recursos humanos para o desenvolvimento
sustentável. Também são necessários grandes incentivos para fomentar os
investimentos privados, enquanto um marco normativo melhor pode contribuir para
melhorar as oportunidades de emprego.
A sociedade civil e o setor privado devem desempenhar
papéis vitais na promoção de um trabalho decente para todos. Os governos e o
setor privado devem redobrar esforços para promover a responsabilidade social
corporativa e ajudar a concretizar o trabalho decente para todos. Por meio do
pleno emprego e do trabalho decente, os benefícios da recuperação econômica e
do crescimento poderão ser melhor compartilhados, tanto entre os países como
dentro de cada um.
Por fim, as pessoas julgarão as mudanças pelo que
estas trazem para suas vidas. O emprego seguro e decente seguramente encabeça a
agenda pessoal da maioria das pessoas, e também deve ser uma prioridade
nacional e internacional. O trabalho decente também é a forma mais segura para
que as pessoas escapem da pobreza e, portanto, deve ser uma prioridade de todo
esforço sério para reduzir a fome e a pobreza de forma sustentada.
* Jomo Kwame Sundaram é coordenador de
Desenvolvimento Econômico e Social da Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO).
Fonte: ENVOLVERDE
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