quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Trabalho decente contra pobreza e fome.
Um trabalhador de uma plantação de mandioca em Pesqueira, Estado de Pernambuco, no Nordeste do Brasil, mostra suas mãos destruídas, que denunciam seu trabalho em regime de escravidão. Foto: Alejandro Arigón/IPS.

Por Jomo Kwame Sundaram*

Roma, Itália, 9/11/2015 – Oito anos depois do início da crise financeira e econômica mundial, o desemprego aumentou, afetando mais de 200 milhões de pessoas no mundo, e se trata apenas de uma fração dos que vivem em condições de vulnerabilidade e insegurança. Na verdade, mais de quatro quintos da força de trabalho estão fora do setor formal, quase sem acesso a benefícios sociais.

Quando é preciso sobreviver sem proteção social, o desemprego não é uma opção para a maioria das pessoas pobres do mundo. Por outro lado, seu destino provavelmente se pareça mais com o dos trabalhadores pobres ou de baixa renda devido ao subemprego, à baixa produtividade ou às limitadas opções de sobrevivência.

Segundo as últimas estimativas do Banco Mundial, o número de pessoas em situação de extrema pobreza (renda de menos de US$ 1,25 por dia) diminuiu de 1,93 bilhão, em 1981, para 1,91 bilhão, em 1990, e para 1,01 bilhão, em 2011, com projeção para este ano de 835,5 milhões.

Com lentidão da economia global, especialmente após o colapso dos preços das matérias-primas agrícolas desde o final de 2014, muitos analistas se perguntam se as projeções do Banco Mundial têm sentido. É evidente que o crescimento da economia global registrado na metade da década anterior a 2008 não gerou postos de trabalho suficientes em quantidade e qualidade, catalisando um discurso do “crescimento sem emprego”.

Rapidamente, em 2009, os países ricos destinaram uma quantidade significativa de recursos para salvar seus sistemas financeiros, melhorar suas economias e fortalecer as redes de segurança social. Mas somente alguns deles evitaram uma excessiva austeridade fiscal. Ao que parece, outros com consumidores mistos imitaram tarde as exitosas medidas monetárias expansivas do Federal Reserve dos Estados Unidos.

Além do número crescente de desempregados ou subempregados, também se deterioram as condições dos empregados. O emprego informal e os contratos de curto prazo, que significam menos segurança trabalhista e direitos para os trabalhadores, se tornam a norma para muitas pessoas.

A terceirização e a subcontratação também se tornam mais comuns, gerando maior insegurança trabalhista para os profissionais, o que se conhece como “precariedade trabalhista”. A deterioração das condições de emprego ocorre em muitos países, e afeta especialmente os trabalhadores com menor formação e capacitação.

As políticas nacionais destinadas a enfrentar essas tendências e a reduzir o desemprego tiveram, no melhor dos casos, um êxito limitado. Em seu desejo de permanecerem ou se tornarem competitivos, governos e empregadores tomaram muitas medidas para aumentar a flexibilidade do mercado de trabalho e aumentaram a insegurança para a maioria dos trabalhadores. E essa flexibilidade exacerbou a insegurança econômica e a desigualdade, afetando as perspectivas de um emprego decente.

Por outro lado, a proporção do emprego no setor de serviços, em relação ao emprego total global, superou a da agricultura durante uma década. De fato, há décadas, o emprego no mundo está cada vez mais dominado pelo setor de serviços, no qual proliferam os trabalhos mal remunerados e precários, sem cobertura social, o que faz com que os benefícios por desemprego tenham deixado de ser um direito social para muitas pessoas nas nações ricas.

Embora esquivo para as pessoas mais pobres, o objetivo de um trabalho decente para todos, fixado pela Organização Internacional do Trabalho em 1999, significa empregos produtivos, gratificantes e seguros, com proteção social e renda justa para os empregados e suas famílias.

O trabalho decente implica igualdade de oportunidades e tratamento, e oferece boas perspectivas de desenvolvimento pessoal e de inclusão social. Também assegura liberdade para que as pessoas possam expressar suas preocupações, organizar e participar de decisões que afetam suas vidas.

As estratégias para promover o emprego produtivo e o trabalho decente devem atender as desigualdades de renda, entre outras. Também devem promover avanços sociais e garantir tratamento igual para todos, independente de gênero, cultura, idade ou nacionalidade, bem como proteger os direitos das pessoas deficientes.

As políticas nesse sentido devem assegurar que as condições trabalhistas melhorem de forma sustentada, especialmente para as pessoas de menor renda e que sofrem condições de emprego inaceitáveis e perigosas.

Os governos devem empregar os trabalhadores necessários para proporcionar serviços básicos, como construção de infraestrutura e manutenção, bem como serviços sociais, que as pessoas esperam e que são fundamentais para garantir os recursos humanos para o desenvolvimento sustentável. Também são necessários grandes incentivos para fomentar os investimentos privados, enquanto um marco normativo melhor pode contribuir para melhorar as oportunidades de emprego.

A sociedade civil e o setor privado devem desempenhar papéis vitais na promoção de um trabalho decente para todos. Os governos e o setor privado devem redobrar esforços para promover a responsabilidade social corporativa e ajudar a concretizar o trabalho decente para todos. Por meio do pleno emprego e do trabalho decente, os benefícios da recuperação econômica e do crescimento poderão ser melhor compartilhados, tanto entre os países como dentro de cada um.

Por fim, as pessoas julgarão as mudanças pelo que estas trazem para suas vidas. O emprego seguro e decente seguramente encabeça a agenda pessoal da maioria das pessoas, e também deve ser uma prioridade nacional e internacional. O trabalho decente também é a forma mais segura para que as pessoas escapem da pobreza e, portanto, deve ser uma prioridade de todo esforço sério para reduzir a fome e a pobreza de forma sustentada.

* Jomo Kwame Sundaram é coordenador de Desenvolvimento Econômico e Social da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).


Fonte: ENVOLVERDE

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