quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Porque plantar árvores para compensar emissões não reduzirá o aquecimento global.
Floresta amazônica em Uruará, no Pará. Foto: ©Otávio Almeida/Greenpeace.

Enquanto o mundo enfrenta as mudanças climáticas, alguns atores tentam promover falsas soluções. Uma delas é a ideia de que plantar e conservar florestas neutraliza as emissões de gases de efeito estufa que lançamos na atmosfera.

Por Pedro Telles e Márcio Astrini*

Conforme o mundo apresenta seus compromissos para enfrentar as mudanças climáticas, e ganha espaço na sociedade a ideia de uma economia de baixo carbono com redução das emissões de gases de efeito estufa, atores poderosos que não querem mudar suas práticas tentam promover falsas soluções. Isso depõe contra o já difícil esforço para evitar alterações do clima que trarão graves consequências a todos, principalmente às populações mais pobres.

Uma dessas falsas soluções é a sedutora – e enganosa – noção de que podemos continuar queimando combustíveis fósseis (como petróleo e gás natural) desde que protejamos e recuperemos florestas: a chamada “compensação de emissões”.

A ideia é mais ou menos a seguinte: já que árvores e plantas absorvem o gás carbônico da atmosfera para crescer, plantá-las em larga escala seria um passe livre para continuarmos emitindo gases de efeito estufa (dentre os quais o gás carbônico é o mais representativo). Desta forma, uma ação neutralizaria a outra. E ainda seriam geradas oportunidades econômicas a quem presta serviços de reflorestamento e proteção das florestas. É uma lógica atraente, porém falsa.

A ideia não funciona na prática, por razões simples. Primeiro, a absorção de carbono pelas árvores e outros vegetais é muito mais lenta e limitada do que o ritmo de queima de combustíveis fósseis pelos seres humanos. Hoje, estima-se que metade dos gases de efeito estufa liberados ficam na atmosfera por mais de cem anos. E cerca de 20%, por mais de mil anos. Ou seja, florestas não são capazes de absorver emissões na velocidade necessária para que o planeta aqueça no máximo 2ºC, limite para evitar que as consequências sejam drásticas e imprevisíveis.

A segunda razão para desbancar a compensação de emissões via florestas é o fato de ser difícil garantir as promessas. A história mostra que raramente podemos ter certeza que árvores serão de fato plantadas, e, se forem, que continuarão de pé no longo prazo. Não faltam exemplos de empresas e governos que assumiram o compromisso de preservar e reflorestar, mas que não cumpriram o acordo adequadamente.

Em suma, esse modelo de compensação é como um vale-emissão. Ele permite que sujemos o planeta à vista e, se tudo der certo, só vai realizar a promessa de limpeza depois de décadas ou séculos, quando for tarde demais. Simplesmente não é o caminho.

Vale lembrar também que o carbono acumulado em combustíveis fósseis debaixo da terra é diferente daquele que já foi emitido na atmosfera em algum momento. Enquanto está preso no subsolo, o carbono não tem a menor possibilidade de agravar o problema das mudanças climáticas. É o chamado “carbono passivo”. Uma vez consumido e emitido em forma de gás carbônico, ele não volta mais para o subsolo e se torna “carbono ativo”. Mesmo que seja incorporado por árvores ou absorvido de alguma outra forma, está mais suscetível a voltar para a atmosfera.

Proteger e recuperar florestas é fundamental para a superação do desafio das mudanças climáticas. Afinal, o desmatamento emite boa parcela dos gases de efeito estufa no mundo, por meio de queimadas e da decomposição de árvores. Mas não é correto acreditar, e muito menos defender, que isso é o suficiente para compensar as emissões vindas de outras atividades. A redução de emissões relacionadas a energia e outros setores da economia deve ser somada à preservação das florestas, e não substituída por ela.

Defender a compensação de emissões, como por vezes ocorre em negociações da ONU, é uma forma de prolongar o problema das mudanças climáticas e vender uma falsa solução. É um negócio que interessa apenas aos poucos que lucrariam com isso. Para a grande maioria, restariam apenas prejuízos. 

* Pedro Telles é coordenador do projeto de Mudanças Climáticas do Greenpeace Brasil, e Márcio Astrini é coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.


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