A luta dos Mundurukus contra a
invisibilidade.
por
Redação do Greenpeace
Indígena utiliza aparelho de GPS durante a
autodemarcação. Foto: © Greenpeace/Carol Quintanilha.
Enquanto o povo Munduruku realiza a autodemarcação
da Terra Indígena Sawré Muybu, ameaçada pela construção do complexo do Tapajós,
decisão do TRF vem na contramão e dificulta ainda mais o processo de demarcação
do local.
Empunhando foices, facões e aparelhos de GPS,
guerreiros Mundurukus limpam uma estreita faixa de floresta, no extremo norte
da Terra Indígena Sawré Muybu, demarcando por conta própria o limite de suas
terras.
No ato de tornar aparente a linha imaginária que
delimita o seu território de mais de 178 mil hectares, os Mundurukus tentam
escapar da invisibilidade que lhes tem sido imposta pelo governo – uma forma de
pedir não só o reconhecimento de sua existência, mas também de seus direitos.
A TI Sawré Muybu poderá ser alagada caso a usina
hidrelétrica São Luiz do Tapajós, a primeira do Complexo, cujo leilão está
previsto para o ano que vem – com potência de 8.040 MW -, torne-se realidade. A
demarcação, que se arrasta há mais de 13 anos e foi paralisada no ano passado,
seria uma forma de garantir a sua proteção e impedir que isso aconteça. De
acordo com o Artigo 231 da Constituição Federal, é vedada a remoção de grupos
indígenas de suas terras, salvo em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em
risco sua população, e garantindo o retorno imediato logo que cesse o risco.
A luta entre a anta e o jabuti
“Nós não vamos sair”, diz o cacique Juarez Saw
Munduruku, da aldeia Sawré Muybu, contando uma estória da cosmologia de seu
povo em que um pequeno jabuti vence uma enorme anta, que simboliza o governo
impondo a construção da obra e desrespeitando os que moram ali. Assim Juarez
pede apoio à luta pela proteção do rio: “A anta é grande, mas, juntos, podemos
derrotá-la”, afirma ele.
O complexo do Tapajós prevê cinco hidrelétricas na
região, cuja soma da área dos reservatórios ultrapassa o tamanho da cidade de
São Paulo. Mas, no lugar de uma selva de pedras, a área a ser coberta pela água
é rica em biodiversidade e abriga uma das principais porções de floresta
intacta do país, com unidades de conservação, terras indígenas e diversas
espécies ameaçadas de extinção. Isso sem falar nos povos indígenas e
ribeirinhos que vivem no local.
Após análise do Estudo de Componente indígena que
integra o Estudo de Impacto Ambiental da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós,
servidores públicos da Funai concluíram pela inviabilidade do empreendimento,
visto que a obra incidiria sobre terra indígena em processo de regularização.
Mas a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, de sustar o parecer da Justiça de Itaituba que obrigava a Funai a
publicar o relatório que confirma a ocupação tradicional pelos índios, vem
mostrar que as dificuldades que os Mundurukus enfrentarão estão só começando. O
documento que está parado, pronto desde 2013, é considerado fundamental ao
processo da demarcação.
“Para garantir a construção dessas hidrelétricas, o
governo vem ignorando sistematicamente a Constituição e negando aos Mundurukus
o direito de terem seu território demarcado. O Brasil pode deixar de construir
grandes hidrelétricas na Amazônia diversificando a matriz de energia e
investindo em fontes como energia eólica, solar e biomassa” afirma Danicley de
Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace.
A demora na demarcação da terra indígena só
aprofunda os problemas causados pela invasão da Sawré Muybu, como explica o
cacique Munduruku: “Decidimos fazer isso porque somos ameaçados, tanto por
madeireiros, garimpeiros, como pela barragem que está se aproximando”, diz ele.
“O relatório afirma que pertence a nós e o governo sabe disso”.
O governo sabe, mas passa por cima
Os 12 mil Mundurukus que vivem ao longo das margens
do Tapajós são os povos originários dessa região, e, portanto, segundo a
Constituição brasileira, têm direito a ela. Para eles, Sawré Muybu é muito mais
que um simples pedaço de chão. É lá que eles têm a base de sua cultura e obtém
alimentos por meio da caça, da pesca e do roçado. O Rio Tapajós é tão importante
que, na cosmologia, faz parte até da história da própria criação desse povo.
Mas, para o governo federal, que ignora a
diversidade dos “Brasis” que compõem o mapa do país, os Mundurukus só se tornam
visíveis quando protestam pelos seus direitos e o Tapajós é apenas mais um
lugar a ser transformado em um imenso canteiro de obras para a construção do
próximo megaprojeto de grandes hidrelétricas na Amazônia após Belo Monte.
Em recente entrevista à BBC Brasil, o Ministro
Chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, afirmou que o
governo não abrirá mão do empreendimento.
Veja abaixo entrevista em que o cacique Juarez
Munduruku fala sobre a autodemarcação:
Fonte: Greenpeace
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