Sociedade civil critica acordo de livre comércio do
Pacífico Sul.
Organizações da sociedade civil da região do
Pacífico afirmam que é preciso cuidar da indústria local antes de os países se
lançarem em mais acordos de livre comércio. Foto: Catherine Wilson/IPS.
Por Catherine Wilson, da IPS –
Canberra, Austrália, 9/6/20/15 – Os 14 países que
integram o Fórum das Ilhas do Pacífico estão presos em negociações com seus
dois grandes vizinhos, Austrália e Nova Zelândia, sobre um novo acordo regional
de livre comércio chamado Pacer Plus, que, segundo seus promotores, permitirá
impulsionar o crescimento econômico.
Como as ilhas do Pacífico concentram apenas 0,05%
do comércio mundial, Edwini Kessie, assessor responsável do Fórum, disse à IPS
que o tratado permitirá que se integrem “a uma cadeia de fornecimento regional
e global e melhorem sua participação no comércio mundial”.
As negociações do Pacer Plus são a continuação do
Acordo do Pacífico sobre as Relações Econômicas Estreitas entre os mesmos
países. O documento atual procura ir além de um acordo comercial padrão para
incluir o movimento de bens, serviços (como educação e saúde) e investimentos,
com discussões adicionais sobre o aumento da mobilidade trabalhista e
assistência ao desenvolvimento para os pequenos Estados insulares.
Mas a Rede do Pacífico sobre Globalização, com sede
em Fiji, junto com outras 32 organizações da sociedade civil de países como
Papua-Nova Guiné, Vanuatu e Samoa, não estão convencidas do giro e protestam
com a campanha Tabu Pacer Plus.
“O Pacer Plus é apresentado como um acordo de
desenvolvimento para o Pacífico, mas as atuais propostas fazem com que o
Pacífico perca flexibilidades fundamentais que são aplicadas aos países menos
adiantados. Isto é, algumas das menores economias do mundo terão que adotar o
mesmo nível de restrições vinculantes sobre sua regulamentação que a de seus
vizinhos maiores”, afirmou Maureen Penjuelei, coordenadora da organização Pang,
em um comunicado divulgado em abril.
A Pang afirma que o acordo permitirá ampliar os
mercados para as nações da região conhecida como Australásia, com poucos
benefícios para os Estados insulares em desenvolvimento, que atualmente têm
suas mercadorias de exportação limitadas e indústrias locais pouco
desenvolvidas.
As negociações do Pacer Plus já duram sete anos e
se prevê que terminarão em meados do próximo ano. Mas a Pang exorta os governos
das ilhas do Pacífico a pôr fim às conversações.
“Um texto do acordo que vazou confirma muitos de
nossos temores sobre o que significa para as comunidades do Pacífico. Se não
assinarem o Pacer Plus, muitos países poderão desenvolver as indústrias locais,
como fizeram Austrália e Nova Zelândia, protegendo-as e cuidando delas até que
possam competir em escala global”, apontou à IPS um porta-voz da Pang.
Há um grande desequilíbrio comercial na região.
Entre 2009 e 2010, a Austrália importou das ilhas do Pacífico um total de 3,14
bilhões de dólares australianos (cerca de US$ 2,3 bilhões), mas as exportações
para esses países quase duplicaram, chegando a 5,7 bilhões de dólares
australianos (US$ 4,3 bilhões).
As principais exportações das ilhas são
matérias-primas como madeira, açúcar, óleo de palma, pescado, café, cacau e
recursos minerais dos países melanésios, com destino a Austrália, Estados
Unidos e países asiáticos, e os benefícios derivam do valor agregado. Com
limitados produtos manufaturados, os países insulares têm uma grande
dependência das importações, o que se reflete em um grande déficit comercial.
“Após mais de uma década de liberalização
comercial, que derivou em um amplo acesso ao mercado de bens, a maioria dos
países mantém o déficit comercial que possuem desde sua independência”, e, em
“um deplorável ambiente pouco desenvolvido, a nova competição estrangeira pouco
fará para gerar crescimento”, afirmou o Instituto do Pacífico de Políticas
Públicas (PIPP) de Vanuatu.
As ilhas do Pacífico tiveram franquias aduaneiras
com Austrália e Nova Zelândia desde 1981, no contexto do Acordo de Cooperação
Comercial e Econômica Regional do Pacifico Sul (Sparteca).
Competir em igualdade de condições no mercado
global é um desafio devido ao isolamento geográfico das ilhas dos mercados
principais e a falta de economias de escala na produção, exacerbado por uma
infraestrutura insuficiente e pouca força de trabalho.
Mas pode levar anos antes que as indústrias locais
sejam competitivas com seus vizinhos maiores. Mesmo nesse caso, é pouco
provável que a brecha entre o alto custo de produção no Pacífico e os preços
mundiais de serviços e produtos manufaturados diminua de forma drástica,
segundo o Banco Mundial.
As discussões comerciais procuram fomentar uma
assistência maior por parte dos doadores de Austrália e Nova Zelândia para
melhorar a capacidade de produção. No entanto, isso não é nada seguro, pois
nenhum desses países estará obrigado legalmente às promessas de mais ajuda ou à
mobilidade trabalhista, apesar de todas as partes assumirem compromissos
obrigatórios sobre o acesso a mercados de bens, serviços e investimentos.
Definitivamente, os habitantes das ilhas veem como
a pressão internacional leva à abertura de suas economias ao livre comércio
antes de estarem prontas. As consequências, segundo os ativistas, podem ser
maior desigualdade se o fluxo de bens importados baratos destruir as empresas
locais e aumentar o desemprego.
A falta de arrecadação do governo pela redução das
tarifas alfandegárias sobre importação também pode chegar a cerca de US$ 110
milhões ao ano em toda a região, diz o informe do PIPP, o que prejudicará os
recursos do Estado e os serviços públicos.
“O Pacer Plus, definitivamente, não é para
Papua-Nova Guiné. A destruição de recursos e vidas neste país é resultado de
acordos desse tipo, que não beneficiam as pessoas”, destacou à IPS John Chitoa,
coordenador do Grupo Bismarck Ramu, membro da Pang.
Papua-Nova Guiné atraiu os maiores níveis de
investimento direto estrangeiro na região, chegando à média de US$ 100 milhões
ao ano desde 1970. Mas a proporção de pessoas pobres cresceu de 29,5%, em 1981,
para 40%, atualmente, e a maioria da população carece de serviços básicos
adequados.
Kessie argumentou que o Pacer Plus permitirá aos
“países imporem rígidos padrões de saúde sobre os alimentos importados, com a
devida justificativa científica”. Mas os promotores da campanha Tabu Pacer Plus
pedem uma avaliação social, cultural, ambiental e de direitos humanos do
impacto do acordo antes que as negociações avancem.
Fonte: ENVOLVERDE
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