“Só com
educação jovens podem atender necessidades da economia”.
Cyril Desponts: “Os jovens são o ativo mais
importante do Brasil em um mundo que se movimenta rápido”. Foto: Shutterstock.
Para Cyril Desponts, designer do estudo global
Youthonomics , Brasil precisa de uma reviravolta nas políticas públicas para
que as perspectivas para os jovens melhorem.
Por Fernanda Nogueira, do Porvir –
A designer do estudo global Youthonomics, Cyril Desponts, é categórica ao
falar sobre o que é preciso para melhorar a situação da juventude no Brasil:
maiores investimentos em educação. Esse é o primeiro de uma lista de itens que
inclui promoção de treinamento profissional, acesso a políticas de moradia,
maior poder financeiro, controle das finanças públicas e aumento da
participação política. “Desenvolver oportunidades educacionais é fundamental
para assegurar que as competências adquiridas irão atender às necessidades da
economia brasileira”, diz ela em entrevista ao Porvir.
O caminho é longo e muitas dificuldades terão de
ser vencidas no país, de acordo com a designer, que se baseia nos dados usados
para construir o ranking Youthonomics Global Index, criado pelo ex-presidente
do Timor Leste e prêmio Nobel da Paz, José Ramos-Horta, e pelo ex-chefe de
comunicações do International Herald Tribune, colunista e ativista Felix
Marquardt.
O estudo avaliou dados de 64 países de acordo com o
potencial de prosperidade de pessoas entre 15 e 29 anos em cada um deles. O
Brasil ficou na 60a posição no índice geral, que leva em consideração 59
critérios, como taxas de desemprego entre os jovens, qualidade e custo da
educação, capacidade de moradia, déficit público, acesso à tecnologia,
liberdade religiosa e política.
O estudo tem como público-alvo eleitores, governos,
e instituições internacionais, como o Banco Mundial, o Fundo Monetário
Internacional e agências de risco. O objetivo é trazer os jovens de volta ao
centro do debate político mundial. Para isso, a equipe do índex fará campanha
nas Nações Unidas e no mundo para a adoção de um visto mundial, chamado Global
Youth Visa, que permita que pessoas com menos de 25 anos possam trabalhar por
até dois anos em qualquer país-membro.
Outro projeto é medir quanto as plataformas
políticas de candidatos a governos pelo mundo têm os jovens como foco. O grupo
quer ainda desenvolver um aplicativo para busca de empregos pelo mundo, além da
criar uma base anual de dados sobre a juventude.
O desempenho ruim do Brasil foi parecido com o de
outras grandes economias em desenvolvimento, como Rússia, Egito e África do
Sul. O país ficou à frente apenas de Uganda, Mali, África do Sul e Costa do
Marfim. O índice mostra uma clara divisão entre países desenvolvidos e nações
em desenvolvimento. As grandes economias mundiais lideram, como mostra a lista,
na ordem: Noruega, Suíça, Dinamarca, Suécia, Holanda, Austrália, Alemanha,
Finlândia, Áustria e Canadá.
O índice traz subíndices, como o que mede a
situação atual da juventude, o Youth Now, e o que mede perspectivas, chamado
Youth Outlook. O Brasil figura na 54a posição no subíndice que fala sobre o
presente. Os temas estudados foram educação básica, universidade e habilidades,
acesso ao emprego, trabalho e condições de vida, bem-estar e saúde.
No subíndice sobre perspectivas, o país se sai
pior, ficando em penúltimo lugar, na 63a posição, quando o assunto são finanças
públicas, oportunidades econômicas e peso político. O ranking considera estes
três temas para calcular a taxa de otimismo da juventude no país, o Youth
Optimism.
O Brasil ficou na 32a colocação.
Isso não quer dizer, no entanto, que o país têm
reais chances de melhorar a vida dos jovens, segundo Cyril. A posição significa
apenas que há países em situação pior. “O Brasil não se classifica bem em
otimismo. São outros países que se saem pior neste ranking, principalmente
porque estão atualmente bem posicionados”, explica a designer.
Um país ideal, o Youthtopia, criado pelos
pesquisadores para identificar boas práticas, teria características dos países
líderes de cada um dos nove pilares do estudo, como a educação básica da
Eslovênia, a universidade, as habilidades adquiridas e o acesso ao emprego da
Suíça, as condições de trabalho e vida e as finanças públicas da Noruega, o
bem-estar da Holanda, a saúde de Israel, as oportunidades da China, o peso
político de Gana e o otimismo de Uganda.
Nos próximos meses, a equipe do Youthonomics
pretende analisar as informações dos países de forma mais minuciosa e
desagregada para divulgar novos relatórios com dados específicos de cada país.
Para o Brasil, Cyril deixa um alerta. “Será preciso uma real reviravolta na
política para que as perspectivas para os jovens melhorem”. Confira a
entrevista com a designer:
Porvir – O que você acha da posição do Brasil no
índice?
Cyril Desponts – A situação da juventude no Brasil é extremamente
preocupante, já que acumula três categorias gerais de problemas. Primeiro, tem
questões características de países em desenvolvimento: maus resultados em
saúde, educação e universidades. Segundo, a atual geração jovem sofre com
problemas econômicos conjunturais: alto índice de desemprego entre jovens e
altas taxas de jovens sem emprego, sem educação e sem treinamento, assim como
baixo crescimento atual e esperado. Terceiro e último, há problemas parecidos
com os de economias avançadas: a situação das finanças públicas é preocupante –
a dívida atual e o déficit são altos, mas, além disso e mais importante, gastos
futuros em saúde e pensões irão pesar fortemente sobre a próxima geração de
pessoas ativas, que terá de financiá-los: a juventude. O Brasil tem ainda o
pior resultado da amostra em relação à vulnerabilidade financeira da juventude.
Será preciso uma real reviravolta na política para que as perspectivas para os
jovens melhorem.
Porvir – Qual sua opinião sobre as informações do
Brasil relacionadas à educação?
Desponts – Quando falamos sobre educação pré-universitária, o
que as informações disponíveis sobre o Brasil parecem sugerir é que as crianças
vão à escola, mas a educação é de baixa qualidade.
Após a educação secundária,
as informações sugerem que poucos jovens brasileiros prosseguem por muito tempo
nos estudos, enquanto que a qualidade desta educação não é das melhores. A
educação profissional também não é muito difundida, e desenvolver estas
oportunidades educacionais é fundamental para assegurar que as competências
adquiridas irão atender às necessidades da economia brasileira. Embora tenham
crescido na última década e meia, os gastos públicos com educação ainda são baixos
quando comparados com a quantidade de jovens, e o maior investimento em
educação é fundamental para aumentar a qualidade da educação. O Brasil tem
poucas informações comparáveis sobre educação disponíveis. Coletar e publicar
este tipo de dado poderia também ser um passo importante para uma melhor
análise das necessidades do sistema educacional, e melhores políticas para os
jovens.
Porvir – Que tipo de políticas para a juventude
você vê como mais urgentes no Brasil?
Desponts – Até agora, o índice global Youthonomics, por meio
de seus subcomponentes (pilares e subpilares), identificou áreas de
vulnerabilidade, nas quais a análise será aprofundada gradualmente.
Com
comparações entre países, o Youthonomics irá identificar as melhores práticas
em políticas para a juventude ao redor do mundo, que poderão ser reproduzidas
por países como o Brasil. Elas podem incluir, mas não se limitam a apenas estes
itens: maiores investimentos em educação; promoção de treinamento profissional,
para adaptar melhor as habilidades dos jovens às necessidades do mercado de
trabalho; acesso a políticas de moradia; maior poder financeiro, principalmente
por meio de incentivos ao empreendedorismo; contabilidade geracional nas
finanças públicas para garantir que passivos financeiros deixados para os
jovens não constituam uma dificuldade maior do que eles serão capazes de
suportar; políticas voltadas para o aumento da participação política dos
jovens.
Certamente, não há uma “pílula mágica”, já que a solução reside, em
parte, no crescimento econômico, na criação de empregos e melhores condições de
vida para o país como um todo, mas as políticas precisam assegurar que os
jovens tenham e terão sua parte de forma justa.
Porvir – Nos últimos meses, tivemos no Brasil um
movimento de ocupação de escolas públicas no estado de São Paulo, criado pelos
próprios alunos. Eles decidiram protestar contra mudanças definidas pelo
governo, como o fechamento de escolas e a mudança de estudantes para outros
locais. Depois de muitos protestos, eles ganharam a batalha e o governador
desistiu da mudança. Você acha que este tipo de movimento é capaz de melhorar a
vida dos jovens?
Desponts – Este tipo de movimento surge porque os estudantes
se sentem excluídos do processo decisório nacional. Nesses casos, é importante
que eles tenham suas vozes ouvidas por meio deste tipo de movimento já que
formas convencionais, como as urnas, deixaram de lhes fornecer uma
representação adequada. O movimento fala em nome de uma geração que corre o
risco de falhar por causa das elites políticas. Então eles precisam perceber
quanta energia produzem, os jovens são o sangue vital da economia das nações, a
base de seu potencial inovador, a chave para sua competitividade e para o
futuro dos países. Eles são o ativo mais importante do Brasil em um mundo que
se movimenta rápido. Maltratar a juventude não é só injusto e imoral. É uma
visão perigosamente curta. Este tipo de movimento é capaz de ajudar a levar os
jovens de volta ao centro do debate político.
Fonte: Porvir
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