Pessoal
médico é vítima em zona de guerra.
As consequências de um bombardeio em Alepo, na
Síria, em fevereiro de 2014. Foto: FreedomHouse/ccby 2.0.
Por Thalif Deen, da IPS –
Nações Unidas, 15/2/2016 – O crescente bombardeio
indiscriminado em três dos países com mais conflitos – Afeganistão, Síria e
Iêmen – faz um grande número de vítimas entre o pessoal médico e humanitário,
além dos milhares de civis presos em meio aos enfrentamentos entre as forças
governamentais e rebeldes. As bombas lançadas pelos Estados Unidos, em outubro
de 2015, contra um hospital da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), em
Kunduz, norte do Afeganistão, e o ataque das forças regulares da Síria contra
centros de saúde são apenas dois exemplos dos perigos que rondam o pessoal humanitário.
Além disso, os ataques impedem que esses
trabalhadores atendam as populações assediadas que mais precisam deles. Quando
morrem trabalhadores que oferecem assistência médica, também fica em perigo a
saúde de muitas pessoas, lamentaram as organizações Médicos pelos Direitos
Humanos, Fundação Open Society e MSF. Com a destruição de hospitais e centros
de saúde, milhares de pessoas doentes e feridas não têm a quem recorrer,
afirmaram especialistas.
A assistente de programas da Médicos pelos Direitos
Humanos, Elise Baker, apontou à IPS que os cinco anos de guerra civil na Síria
se caracterizaram por campanhas deliberadas e orquestradas por forças
governamentais para destruir a infraestrutura de saúde e apontar contra o
pessoal médico nas zonas controladas pelos rebeldes. “É apenas mais um elemento
da campanha contra a população civil, que viola diretamente o princípio
fundamental de distinção e está previsto nas leis que regem as guerras e que
proíbem apontar contra objetivos e populações civis, como hospitais e escolas”,
ressaltou.
Outra prova de que os ataques contra centros
médicos fazem parte de uma campanha deliberada é que a assistência humanitária,
incluídos os suprimentos médicos e remédios, é distribuída principalmente por
Damasco, observouBaker. As forças governamentais obstruíram a distribuição de
suprimentos médicos e outros insumos vitais para as zonas controladas pela
oposição, ou só deixaram passar comboios dos quais confiscaram os produtos para
a saúde.
Segundo Baker, a organização Médicos pelos Direitos
Humanos registrou em um mapa os ataques contra hospitais, no qual incluiu os
que “se acredita foram acidentais ou, segundo o jargão militar, resultados de
danos colaterais”. A especialista acrescentou que a organização “está
profundamente preocupada com as denúncias de ataques contra hospitais no
Iêmen”, e explicou que não está claro se a coalizão encabeçada pela Arábia
Saudita aponta diretamente contra hospitais ou se estes são vítimas do
bombardeio indiscriminado, bem como a população e os objetivos civis.
O ano passado foi o pior em relação a ataques
contra centros de saúde na Síria, segundo a Médicos pelos Direitos Humanos, com
as forças governamentais sendo responsáveis pela maioria dos mais de cem
incidentes registrados. Entre março de 2011 e novembro de 2015, foram
documentados 336 ataques contra 240 centros de saúde na Síria, 90% deles
cometidos por Damasco e seus aliados, também responsáveis pela morte de 96% dos
697 trabalhadores da saúde.
O mapa interativo também inclui fotos e vídeos. Em
novembro, a organização divulgou o informe AlepoAbandonada: Estudo de Caso
da Atenção Médica na Síria, onde detalha os ataques do governo contra os
centros de saúde.O porta-voz da Organização das Nações Unidas (ONU),
StephaneDujarric, confirmou que esta recebeu uma carta de Riad pedindo que as
agências humanitárias abandonem com urgência as zonas controladas pelos
rebeldes hutis no Iêmen. “Houve uma troca de cartas entre a missão permanente
da Arábia Saudita e nossos colegas do Escritório de Assuntos Humanitários”,
afirmou.
“O que posso dizer é que a ONU continua pedindo a
todas as partes em conflito que permitam o acesso dos trabalhadores
humanitários aos locais forem necessários, e que o acesso seja livre e sem
condições, naturalmente também para os suprimentos humanitários”, acrescentou
Dujarric. O porta-voz afirmou que “também é importante assinalar que todas as
partes envolvidas nesse e em qualquer outro conflito devem fazer todo o
possível para proteger o pessoal humanitário”.
Bakerindicou à IPS que é ilegal as partes
beligerantes usarem armas de forma indiscriminada em zonas civis. Ela explicou
que esses atos violam outro princípio fundamental que rege as guerras,pelo qual
todo ataque deve ser proporcional e deve considerar o dano contra as populações
civis, porque os benefícios militares poderiam ultrapassar o dano contra
objetivos civis, e, “claramente, esse princípio não se aplica no Iêmen”.
Primeiro, o Conselho de Segurança da ONU deve
condenar todas as violações com a maior severidade possível, pontuou Baker.
Permitir que continuem afetará décadas de trabalho em leis destinadas a aliviar
o inferno que significam as guerras para a população civil,
acrescentou.Segundo, o Conselho de Segurança tem o poder de enviar esse tipo de
situação ao Tribunal Penal Internacional, mas, como temos visto, os cinco
membros permanentes do Conselho (China, Estados Unidos, Grã-Bretanha, França,
Rússia) preferem manter o impasse.
Baker disse que ,”no caso da Síria, China e Rússia
impedem a tomada de medidas mais fortes, e, no caso do Iêmen, os outros três
apoiam a coalizão árabe. “Por isso, o Conselho de Segurança, encarregado de
manter a segurança e a paz internacionais, fracassou estrepitosamente, e cabe à
população civil da Síria e do Iêmen, bem como de outros lados, pagar o preço,
frequentemente com vidas”, destacou.
Inclusive, acrescentou, sua organização documentou
incidentes nos quais forças do governo da Síria atacaram várias vezes o mesmo
hospital em um curto espaço de tempo, ou vários centros de saúde em uma pequena
área geográfica. O fato indica claramente que Damasco tenta destruir a atenção
médica nas áreas controladas pela oposição.
A Médicos pelos Direitos Humanos registrou sete
ataques contra o hospital M10, o principal centro de traumatologia de Alepo, quatro
deles ocorridos em dez dias, entre 23 de junho e 3 de julho de 2014. Os últimos
ataques aconteceram nos dias 28 e 29 de abril de 2015. O hospital estava
operacional antes do início da guerra e não fica em local escondido, detalhou
Baker.
No dia 7 de agosto de 2015, entre 10 horas da manhã
e uma da tarde, forças de Damasco bombardearam cinco hospitais na localidade de
Idlib. No dia seguinte, atacaram outro centro de saúde no mesmo lugar. E, nos
dias seguintes, as forças regulares lançaram outro ataque contra mais três
hospitais em Idlib. Os nove centros de saúde atacados em quatro dias ficam a
cerca de 48 quilômetros de distância entre si. E todos estavam a pelo menos
nove quilômetros de distância da primeira linha e nenhum perto de uma base ou
área militar. Além disso, cinco dos nove hospitais já haviam sofrido ataques
das forças regulares em outras oportunidades.
Fonte: ENVOLVERDE
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