sexta-feira, 4 de março de 2016

A insustentável democracia brasileira.
Foto: Shutterstock

O Carnaval acabou. Qual é a pauta? Voltamos a trabalhar para garantir emprego e renda aos brasileiros ou vamos seguir a tradição golpista da democracia brasileira?

Por Dal Marcondes*

Uma das mais importantes datas do calendário brasileiro é o Carnaval. Época em que milhões de brasileiros vão às ruas exorcizar seus demônios e recarregar as baterias para o ano que começa na quarta-feira de cinzas e, neste complexo 2016, não será diferente. Aos poucos as pessoas retomam a rotina do cotidiano e olham para frente, apesar dos tempos nublados que se avizinham. Exercícios de futurologia apontam em muitas direções, nenhuma delas, com o famoso “céu de brigadeiro”.

Enquanto nas páginas de economia os indicadores são expressos em números negativos, com empresas encolhendo ou fechando, câmbio oscilante e insegurança “nos mercados”, no horizonte político há uma robusta falta de confiança na capacidade dos políticos brasileiros em superar a crise em que se meteram. Sobra uma nesga de esperança na Justiça, um poder afeito a privilégios de classe, burocrático e lento em suas apreciações.

A história da República brasileira é uma sucessão de crises, todas com roteiros assinados por grandes nomes. As soluções em cada um dos casos quase sempre foram de ruptura. Getúlio Vargas versus Carlos Lacerda teve como último round o famoso “tiro no peito”. Jânio versus Jânio terminou com a renúncia de Jânio. João Goulart versus UDN se arrastou um pouco com a ajuda de Tancredo Neves, um improvisado primeiro-ministro, e teve como desenlace em 31 de março de 1964 (data antecipada para não cair no 1º de abril) o golpe que levou ao poder o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que prometeu entregar o poder nas eleições de 1965, mas que também foi ele próprio vítima de um “golpe branco”, o golpe dentro do golpe, que manteve os militares no poder com o general Arthur da Costa e Silva. Em seu mandato foi editado o Ato Institucional nº 5 que restringiu as liberdades democráticas e institucionalizou a ditadura militar brasileira.

Antes do final do seu mandato Costa e Silva sofre um derrame cerebral e a institucionalidade previa a posse de seu vice, o civil Pedro Aleixo. Acontece, então, mais um golpe dentro do golpe, os ministros militares da Marinha, Exército e Aeronáutica decidem que formariam uma Junta Militar para terminar o tempo do mandato de Costa e Silva. Para sucedê-los foi escolhido o general Emilio Garrastazu Médici, considerado o mais repressor de todos os generais presidentes, que governou de 1969 a 1974. Foi o primeiro presidente a completar seu mandato desde Juscelino Kubitscheck no final dos anos 1950.

A segunda fase do regime militar, que vai de 1974 a 1986, também teve seus percalços. O sucessor de Médici foi o general Ernesto Geisel, que apontou para uma “abertura lenta e gradual” do regime, com um horizonte de redemocratização. Essa promessa desagradou setores do Exército e mais um golpe dentro do golpe foi tentado, desta vez liderado pelo general Silvio Frota, considerado linha dura até mesmo pelos colegas de farda. Geisel demitiu Frota e nomeou seu sucessor o general João Figueiredo, ironicamente filho do general Euclides Figueiredo, reconhecido pela história como um democrata e legalista.

Figueiredo, o filho, terminou seu mandato em 1985 com inflação batendo em 243% ao ano, deveria ter entregue o poder ao eleito Tancredo Neves, mas novamente o destino fez das suas e Tancredo morreu antes de tomar posse, a Presidência da República ficou de herança para seu vice José Sarney, até poucos meses antes presidente da ARENA (Aliança Renovadora Nacional) base política da ditadura militar. Figueiredo considerava Sarney um traidor e se recusou a passar a faixa para o novo presidente, deixou o Palácio do Planalto pela porta dos fundos pedindo para ser esquecido.

Sarney, apesar de civil, foi eleito vice de forma indireta pelo Congresso, assumiu um país em frangalhos e depois de cinco ministros da Fazenda e de quatro planos econômicos entrega o país em 1989 com inflação bem próxima a 2000%. Foi o último dos presidentes indiretos.

As eleições diretas de 1989 foram disputadas pelos principais líderes políticos da história recente brasileira. Mario Covas, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola, Lula, Paulo Maluf, Guilherme Afif Domingos, Roberto Freire, Aureliano Chaves e outros. O vencedor, no entanto, foi o ainda desconhecido Fernando Collor de Mello, que em seu primeiro ato executivo confiscou a poupança de todos os brasileiros. Com dois anos no poder Collor deixou de ser o “queridinho da mídia” e sofreu um processo de impeachment. Antes do desfecho Collor renunciou em 29 de dezembro de 1992 e deixou o poder para seu vice Itamar Franco, que completou o mandato até o final de 1994, quando passou a faixa presidencial ao seu sucessor, eleito para cinco anos de mandato, Fernando Henrique Cardoso.

Depois disso é a história recente, Fernando Henrique conseguiu mudar a Constituição de 1988 e conquistou o direito à reeleição, com mandatos reduzidos para quatro anos. Graças a essa manobra, ele e os presidentes que o sucederam conseguiram permanecer no poder por dois mandatos consecutivos, sendo que a presidente Dilma está entrando em seu segundo ano do segundo mandato neste 2016.

A história recente do Brasil não é exatamente um exemplo de tradição democrática. Do suicídio de Getúlio para cá o normal é a ruptura. Qual será a lição que a atual geração de brasileiros deixará para o século 21?

* Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde e especialista em meio ambiente e desenvolvimento sustentável.


Fonte: ENVOLVERDE

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