A
insustentável democracia brasileira.
Foto: Shutterstock
O Carnaval acabou. Qual é a pauta? Voltamos a
trabalhar para garantir emprego e renda aos brasileiros ou vamos seguir a
tradição golpista da democracia brasileira?
Por Dal Marcondes*
Uma das mais importantes datas do calendário
brasileiro é o Carnaval. Época em que milhões de brasileiros vão às ruas
exorcizar seus demônios e recarregar as baterias para o ano que começa na
quarta-feira de cinzas e, neste complexo 2016, não será diferente. Aos poucos
as pessoas retomam a rotina do cotidiano e olham para frente, apesar dos tempos
nublados que se avizinham. Exercícios de futurologia apontam em muitas
direções, nenhuma delas, com o famoso “céu de brigadeiro”.
Enquanto nas páginas de economia os indicadores são
expressos em números negativos, com empresas encolhendo ou fechando, câmbio
oscilante e insegurança “nos mercados”, no horizonte político há uma robusta
falta de confiança na capacidade dos políticos brasileiros em superar a crise
em que se meteram. Sobra uma nesga de esperança na Justiça, um poder afeito a
privilégios de classe, burocrático e lento em suas apreciações.
A história da República brasileira é uma sucessão
de crises, todas com roteiros assinados por grandes nomes. As soluções em cada
um dos casos quase sempre foram de ruptura. Getúlio Vargas versus Carlos
Lacerda teve como último round o famoso “tiro no peito”. Jânio versus Jânio
terminou com a renúncia de Jânio. João Goulart versus UDN se arrastou um pouco
com a ajuda de Tancredo Neves, um improvisado primeiro-ministro, e teve como
desenlace em 31 de março de 1964 (data antecipada para não cair no 1º de abril)
o golpe que levou ao poder o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que
prometeu entregar o poder nas eleições de 1965, mas que também foi ele próprio
vítima de um “golpe branco”, o golpe dentro do golpe, que manteve os militares
no poder com o general Arthur da Costa e Silva. Em seu mandato foi editado o
Ato Institucional nº 5 que restringiu as liberdades democráticas e institucionalizou
a ditadura militar brasileira.
Antes do final do seu mandato Costa e Silva sofre
um derrame cerebral e a institucionalidade previa a posse de seu vice, o civil
Pedro Aleixo. Acontece, então, mais um golpe dentro do golpe, os ministros
militares da Marinha, Exército e Aeronáutica decidem que formariam uma Junta
Militar para terminar o tempo do mandato de Costa e Silva. Para sucedê-los foi
escolhido o general Emilio Garrastazu Médici, considerado o mais repressor de
todos os generais presidentes, que governou de 1969 a 1974. Foi o primeiro
presidente a completar seu mandato desde Juscelino Kubitscheck no final dos
anos 1950.
A segunda fase do regime militar, que vai de 1974 a
1986, também teve seus percalços. O sucessor de Médici foi o general Ernesto
Geisel, que apontou para uma “abertura lenta e gradual” do regime, com um
horizonte de redemocratização. Essa promessa desagradou setores do Exército e
mais um golpe dentro do golpe foi tentado, desta vez liderado pelo general
Silvio Frota, considerado linha dura até mesmo pelos colegas de farda. Geisel
demitiu Frota e nomeou seu sucessor o general João Figueiredo, ironicamente
filho do general Euclides Figueiredo, reconhecido pela história como um
democrata e legalista.
Figueiredo, o filho, terminou seu mandato em 1985
com inflação batendo em 243% ao ano, deveria ter entregue o poder ao eleito
Tancredo Neves, mas novamente o destino fez das suas e Tancredo morreu antes de
tomar posse, a Presidência da República ficou de herança para seu vice José
Sarney, até poucos meses antes presidente da ARENA (Aliança Renovadora
Nacional) base política da ditadura militar. Figueiredo considerava Sarney um
traidor e se recusou a passar a faixa para o novo presidente, deixou o Palácio
do Planalto pela porta dos fundos pedindo para ser esquecido.
Sarney, apesar de civil, foi eleito vice de forma
indireta pelo Congresso, assumiu um país em frangalhos e depois de cinco
ministros da Fazenda e de quatro planos econômicos entrega o país em 1989 com
inflação bem próxima a 2000%. Foi o último dos presidentes indiretos.
As eleições diretas de 1989 foram disputadas pelos
principais líderes políticos da história recente brasileira. Mario Covas,
Ulisses Guimarães, Leonel Brizola, Lula, Paulo Maluf, Guilherme Afif Domingos,
Roberto Freire, Aureliano Chaves e outros. O vencedor, no entanto, foi o ainda
desconhecido Fernando Collor de Mello, que em seu primeiro ato executivo
confiscou a poupança de todos os brasileiros. Com dois anos no poder Collor
deixou de ser o “queridinho da mídia” e sofreu um processo de impeachment.
Antes do desfecho Collor renunciou em 29 de dezembro de 1992 e deixou o poder
para seu vice Itamar Franco, que completou o mandato até o final de 1994,
quando passou a faixa presidencial ao seu sucessor, eleito para cinco anos de
mandato, Fernando Henrique Cardoso.
Depois disso é a história recente, Fernando
Henrique conseguiu mudar a Constituição de 1988 e conquistou o direito à
reeleição, com mandatos reduzidos para quatro anos. Graças a essa manobra, ele
e os presidentes que o sucederam conseguiram permanecer no poder por dois
mandatos consecutivos, sendo que a presidente Dilma está entrando em seu
segundo ano do segundo mandato neste 2016.
A história recente do Brasil não é exatamente um
exemplo de tradição democrática. Do suicídio de Getúlio para cá o normal é a
ruptura. Qual será a lição que a atual geração de brasileiros deixará para o
século 21?
* Dal Marcondes é jornalista, diretor da
Envolverde e especialista em meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
Fonte: ENVOLVERDE
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