quarta-feira, 23 de março de 2016

Congresso Gife debate os dilemas do alinhamento entre o investimento social e o negócio.
Foto: Shutterstock

O que vinha se configurando como uma tendência nos últimos anos, ganhou corpo e, agora, se tornou uma agenda estratégica a ser debatida amplamente: a aproximação do investimento social privado (ISP) com o negócio é realidade e os impactos desse movimento já vêm sendo sentido pelos institutos, fundações e empresas.

Para colocar esse tema no centro do debate, o Gife irá promover, durante o 9º Congresso de 2016, a mesa “Entre o público e o privado: dilemas do alinhamento entre o investimento social e o negócio”. Na atividade, inclusive, a organização irá lançar um novo estudo sobre o assunto, dando início à série “Temas do Investimento Social Privado”.

A mesa contará com um representante da Fundação Getúlio Vargas (FGV), além de lideranças de institutos e fundações convidados para refletir a respeito dos resultados do estudo.

Ana Letícia Silva, gerente de Articulação do Gife, destaca a relevância desta discussão para a organização, que inseriu o tema ‘alinhamento entre investimento social e o negócio’ entre as agendas estratégicas de atuação do GIFE para os próximos anos.

“Entendemos que o investimento social privado é o ator estratégico para delinear melhor o sentido público da atuação social das empresas. Ou seja, é o lugar mais apropriado, qualificado e efetivo de aproximação do negócio com públicos mais distantes das empresas, como as comunidades, por exemplo. O que precisamos discutir é, num processo de alinhamento, como garantir a importância estratégica do investimento social privado, para que ele não seja totalmente absorvido pelo negócio ou se torne apenas um pedaço da responsabilidade social. Por isso, ele precisa ser estratégico e não um adendo”, ressalta.

Rafael Oliva, consultor na área e responsável pelo estudo do Gife, ressalta que essa aproximação entre investimento social privado e empresas reflete, inclusive, um novo ambiente no qual a sociedade brasileira vem sendo inserida nos últimos anos.

“Vemos, no Brasil, um movimento em busca pelo aumento da transparência e combate à corrupção. Hoje, cada vez mais, os cidadãos passam a olhar para a ação social das empresas de forma mais atenta, verificando seu comprometimento com temas socioambientais. Ou seja, há uma série de fenômenos que impulsionam e empurram para dentro dos negócios questões que, até então, ficavam de fora, e eram direcionadas para os institutos e fundações – considerados os ‘braços sociais das empresas’ – a lidar. O que está acontecendo agora é que as empresas estão percebendo que estas preocupações atravessam sim sua atuação enquanto negócio. E, com isso, o ISP não tem como ficar de fora”, explica o especialista.

Novo estudo

Mas, afinal, o que significa alinhar o ISP ao negócio? Existe uma única maneira de se fazer isso? Quais caminhos os investidores sociais têm encontrado para essa aproximação?

Essas são algumas das perguntas que nortearam o novo estudo, que será lançado pelo Gife sobre o tema. A organização partiu da percepção de que o setor não dispunha de uma compreensão única sobre o significado da própria expressão ‘alinhamento entre ISP e negócio’.

“O estudo foi pensado para endereçar essa percepção difusa de uma pluralidade de entendimento e também para trazer mais reflexão dos caminhos possíveis que vêm sendo vivenciados pelos diversos institutos e fundações nessa relação com as empresas. A proposta foi fazer um mapeamento conceitual e ver de que maneira isso se reflete nas práticas dos investidores sociais”, comenta Rafael.
O material é resultado de uma reflexão elaborada a partir de uma série de entrevistas realizadas com associados e também representantes das empresas.

O estudo aprofunda ainda informações captadas pelo Censo Gife, que nesta última edição incorporou questões sobre o tema por vários ângulos: ‘como o gestor leva em conta as atividades da empresa no processo de decisão do investimento social; como o investidor vê a sua atuação refletida nas próprias ações da empresa; e os riscos e oportunidades em relação ao alinhamento’.

No Censo, por exemplo, entre os vários aspectos observados neste item, um que se destacou foi o fato de que os investidores têm a percepção de que influenciam as práticas das empresas (60%) mais do que são influenciados por elas. E isso ocorre, principalmente, em questões mais ligadas à cultura das empresas do que diretamente relacionadas ao negócio como, por exemplo, no sentido da incorporação ou aprofundamento das práticas de sustentabilidade; ampliação dos impactos socioambientais positivos; princípios e valores da empresa; e melhoria do diálogo e relacionamento com a comunidade.

Possíveis aproximações

Rafael Oliva destaca que, a partir do estudo, foi possível perceber que, apesar do alinhamento ser um assunto presente no conjunto de associados do Gife, isso se dá realmente de forma heterogênea e as compreensões sobre o tema são mesmo diversificadas.

Há um grupo, por exemplo, que vê o ISP como um ator que pode influenciar na construção da visão estratégica da empresa, trazendo uma perspectiva socioambiental para o negócio.

O segundo grupo aponta que o ISP deve produzir e gerar valor para a empresa. Ou seja, ele precisa desenvolver iniciativas que possam produzir retornos tangíveis para o negócio, sejam eles de imagem, relacionamento, motivacionais etc. Há outra perspectiva que compreende os institutos e fundações como um lócus de inteligência social e, a partir disso, podem incentivar inovações de produtos e serviços para o negócio, inspiradas por preocupações socioambientais.

E, por fim, um grupo que resiste em fortalecer essa aproximação e defende a ideia de que as empresas e os institutos/fundações devem ser mantidos separados, a fim de que o ISP não seja colocado em risco.

“O que temos reforçado realmente é que não cabe falar num único modelo de alinhamento, pois há um leque de múltiplas possibilidades de se estabelecer essa relação. Algumas, claro, são mais potentes para prevalecer o sentido público do ISP e fortalecer a dimensão pública da ação empresarial e outras que podem enfraquecer a vocação pública do investimento social”, comenta Rafael.

Desta forma, a aposta, segundo o especialista, é que cada instituição identifique oportunidades frentes aos vários caminhos existentes e, partir da sua realidade, definam a maneira que pretendem estabelecer esse alinhamento, e se pretendem.


Fonte: Gife

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