Crise
hídrica piora segurança alimentar.
A água deixou de ser abundante e as mulheres
precisam fazer fila em um poço de Bulawayo, no Zimbábue, que atravessa uma
grave crise de água subterrânea devido à escassez de chuvas. Foto: Ignatius
Banda/IPS.
O Zimbábue sempre apostou na irrigação com água
subterrânea em épocas de escassez de chuvas, mas o Ministério de Ambiente, Água
e Clima informou que secaram milhares de poços em todo o país, o que agrava a
situação da agricultura já carente de fundos e dependente das precipitações.
Por Ignatius Banda, da IPS –
Bulawayo, Zimbábue, 24/2/2016 – O zimbabuense
Sijabuliso Nleya há semanas se dedica a juntar areia, não para uma construção,
mas para encher poços de água secos. “A situação é terrível”, lamentou, em seu
terreno de Douglasdale, uma pequena comunidade agrícola nos arredores da cidade
deBulawayo,no Zimbábue. Junto com outros homens, ele cuida de encher os poços
secos na medida em que a água subterrânea escasseia, uma consequência da
mudança climática que faz faltar chuvas por períodos prolongados.
“Os poços agora são perigosos, apesar de antes
serem uma fonte de sustento. É melhor enchê-los com areia do que sonhar que
voltarão a dar água”, afirmouNleya.As fontes de água subterrânea mantinham a
agricultura, e era possível vender milho, tomate, couve e várias verduras,
inclusive páprica, na cidade. “Só funcionam alguns poucos poços, vimos como
evaporava nossa fonte de renda”, contou.
O Zimbábue sempre apostou na irrigação com água
subterrânea em épocas de escassez de chuvas, mas o Ministério de Ambiente, Água
e Clima informou que secaram milhares de poços em todo o país, o que agrava a
situação da agricultura já carente de fundos e dependente das precipitações.
Aqui em Bulawayo, centenas de hortas comunitárias, sustento das famílias de
baixa renda, são regadas com água de poço.
Agora que milhares de perfurações secam em todo o
país, as autoridades se preocupam com as consequências, não somente em matéria
de renda, mas de saúde, especialmente de pacientes com HIV/aids, que dependem
dessa produção para cobrir suas necessidades nutricionais.Segundo o ministro de
Ambiente, Água e Clima, OpphaKashiri, mais de 12 mil perfurações em todo o
território secaram, em um país que atravessa a pior seca dos últimos tempos.
“Nossos recursos hídricos secam nas sete bacias”, afirmou, no dia 4 deste mês.
O presidente Robert Mugabe declarou desastre
nacional em razão da seca, pois mais de um em cada quatro habitantes sofre
escassez de alimentos. As agências humanitárias indicam que cerca de 2,5
milhões de pessoas necessitam de assistência alimentar. O Ministério da
Agricultura informou que foi necessário descartar90% dos cultivos plantados no
ano passado e que dependem da chuva.
Segundo o programa de gestão da água subterrânea e
seca da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, aproximadamente 70% da
população da região depende da água subterrânea, e uma avaliação de 2015 indica
que a mudança climática exacerba a crise.A Autoridade Nacional de Água do
Zimbábue, vinculada do Ministério de Ambiente, indicou que cerca de 70% da
população reside em zonas rurais, onde a principal fonte de água está nas
perfurações e nos poços.
A escassez obriga as pessoas a compartilharem o
recurso com os animais. Além disso, mais pessoas nas cidades recorrem à água
subterrânea. E, embora a escavação de novos poços esteja proibida, a perfuração
descuidada continua e esgota as camadas freáticas. “É fundamental destacar que
a água subterrânea é um recurso muito finito, que pode esgotar facilmente se
não existir um equilíbrio entre a reposição e a extração”, alertou a Autoridade
da Água.
Essa agência acrescentou que,“devido à crescente
escassez de água e à maior dependência das perfurações das comunidades urbanas,
foram desatendidos os padrões mínimos de utilização da água subterrânea, o que
levou à rápida diminuição do lençol freático e, em alguns bairros, as
perfurações estão se esgotando”.
As medidas para criar um imposto aos usuários da
água subterrânea não conseguiu deter o generalizado uso doméstico da água de
poço, pois a capital carece de um adequado serviço e não há água nas torneiras.
A falta de chuvas só faz piorar a gestão adequada do lençol freático.Nesse
contexto, o vice-presidente, EmmersonMnagagwa, lançou, no dia 10 deste mês, um
pedido de US$ 1,5 bilhão para aliviar a seca, dos quais espera destinar US$ 350
milhões à reabilitação da infraestrutura de irrigação, que em grande parte se alimenta
de perfurações.
Um estudo realizado pelo Ministério da Agricultura
mostra que mais de 16 mil vacas morreram devido à seca. Antes, os criadores
recorriam à água subterrânea para garantir boas pastagens o ano todo, mas isso
acabou.O pesquisador e especialista Peter Makwanya, da Universidade Aberta do
Zimbábue, acredita que a solução pode estar na construção de mais depósitos
para coletar a água da chuva, pois em muitas partes do país há inundações
repentinas e são perdidos milhões de litros.
“Há numerosas alternativas sustentáveis para
guardar água da chuva. Agora que se esgota a subterrânea, não é bom incentivar
as pessoas a continuar explorando o recurso”, advertiuMakwanyaà IPS.Além disso,
“os agricultores podem reutilizar a água e isso pode ser muito útil para
conseguir a segurança hídrica. Esse líquido pode ser utilizado em pequena
escala para conseguir a sustentabilidade doméstica”, pontuou.
Nleya e milhões de agricultores de subsistência e
aldeões, que dependem da água subterrânea, constituem o rosto humano dos
estragos da mudança climática. “Nunca acreditamos que de fato a água pudesse
desaparecer sob a terra, porque sempre tivemos poços. Esperamos que chova
logo”, afirmou.
Fonte: ENVOLVERDE
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