Um
balanço inquietante na área do meio ambiente.
Cientistas, ONGs, ex-ministros do Meio
Ambiente, médicos e empresários enviaram no início desta semana a uma comissão
especial da Câmara dos Deputados, em Brasília, um manifesto de repúdio ao
Projeto de Lei 1.013/2011, que pretende liberar no País a fabricação e venda de
automóveis movidos a diesel.
Por Washington Novaes*
Necessário e muito oportuno o manifesto, que
considera o projeto “um atentado aos interesses da sociedade brasileira e deve
ser arquivado”, para que não coloque o Brasil “na contramão da tendência
mundial de reduzir a poluição no setor de transportes”, dificultando o
cumprimento das metas nacionais no Acordo de Paris e encarecendo o transporte
de cargas, além de outros despropósitos.
Poluição do ar é uma das áreas chamadas de
“ambientais” que evidenciam a crise de valores em que vivem o Brasil e muitos
outros países. Estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a qualidade
do ar no planeta em 3 mil cidades de 103 países evidencia que 80% dos moradores
dessas cidades estão expostos a níveis de poluição bem acima dos admitidos (o
dobro, na verdade). No mundo, 55% da população urbana está, por isso, mais
sujeita a doenças coronarianas e pulmonares, que provocam 3 milhões de mortes
por ano – e serão 70% em 2050. Nos países europeus (OCDE), a poluição gerada
por automóveis responde por metade das mortes precoces.
Há pouco, quando se comemorava o Dia Mundial dos
Oceanos (8 de junho), mostrou-se que problemas “ambientais” dessa ordem não
estão apenas no ar das metrópoles.
Relatórios sobre Japão, França e Espanha
evidenciaram que orlas costeiras, praias e até o fundo de oceanos estão
cobertos de garrafas, sacos plásticos e tampas de garrafas. Os plásticos são
80% do lixo encontrado em muitas das locações estudadas – e não poderia ser de
outra forma, já que todos os dias milhões de toneladas de lixo, produto de
atividades humanas, acabam nos oceanos (Eco-Finanças, 18/4), onde já estão 150
milhões de toneladas. Estudo da revista Pnas estima em 580 mil as peças de
plástico por quilômetro quadrado no fundo de mares.
Nesse panorama, verifica-se também que a elevação
do nível do mar pode obrigar três vezes mais pessoas (13,1 milhões, até agora)
a se deslocarem para outros lugares. E cientistas controversos preveem elevação
de dois metros no nível das águas do mar nos próximos séculos. Nesse futuro,
95% do material plástico já estará em embalagens.
Carlton Hall, cientista-chefe de pesquisa
ecológica no Centro Espacial Kennedy, na Flórida (EUA), lembra que há algumas
décadas a praia ali tinha pelo menos 48 metros de largura de areia – que tem
sido levada pela elevação das águas. Até o fim deste século, diz ele, a
elevação das águas poderá ficar entre 1,5 metro e 2 metros, prejudicando até as
atividades de pesquisa espacial da Nasa na região.
Para todos os problemas, inclusive na
acidificação das águas oceânicas, contribui o desperdício humano no descarte de
embalagens logo após o primeiro uso: só 14% das embalagens plásticas são
recicladas; “plástico verde” contém biomassa na produção e emite menos gases do
“efeito estufa” que materiais advindos do petróleo; e um terço das embalagens
plásticas não é coletado pelos sistemas de limpeza; mas os vilões da história
se associam no lixo, a partir dos restos de alimentos que se decompõem com
facilidade.
E tudo poderia ter destinação melhor. O capitão
Marius Smit, um holandês que criou a Plastic Whale em Amsterdã (Eco21, abril de
2016), dedica-se a pescar garrafas plásticas e a levar turistas e habitantes da
cidade a bordo de um de seus sete barcos construídos com “plástico pescado em
mais de 100 canais da cidade”. Desde 2011 ele já “pescou” ali, nos canais, mais
de 50 mil garrafas plásticas e mais de 50 mil quilos de lixo.
Hoje, os problemas do desperdício mundial de alimentos
ainda são muito graves. Ele leva a que se percam 95% das embalagens do setor –
enquanto há perda de 55%, no caso do papel; e de 90%, no de ferro e aço. Outras
questões estão (Portal DBO, 10/6) na pecuária, em que também há perdas e
desperdícios que a Embrapa tem pesquisado. Uma dessas pesquisas já mostrou que
se usam 15.500 litros de água para produzir 1 quilo de carne. E o Brasil é o
maior exportador de carne para todos os continentes. A criação em confinamento
pode reduzir esses números, como pode baixar a geração de poluentes pelas
reses, que se concentram na atmosfera (mais de 50 quilos diários por rês). A
introdução de árvores nas áreas de pastagem por onde circula 1,2 boi por
hectare pode ajudar.
O balanço é inquietante em toda a área ambiental.
A revista Eco21 publicou, em abril deste ano, que quase 80% dos empregos no
mundo dependem da água, como repetiu no Dia Mundial da Água a ONU. Mas 2
bilhões de pessoas não têm ainda acesso a água de boa qualidade em sua casa. O
drama no esgotamento é ainda maior, já que 40% das pessoas não têm instalações
sanitárias para coleta de esgoto e encaminhamento a estações de tratamento.
Quanto ao desmatamento, no último balanço mundial ele respondeu por 13 milhões
de hectares anuais. As taxas vinham baixando, mas no último levantamento
voltaram a subir na Amazônia, em quase todas as áreas detectadas por satélite
para formação de pastagens.
A ONU não se cansa de alertar (28/5): “A
degradação ambiental causa 12,6 milhões de mortes prematuras por ano”. No
relatório lançado em conferência no Quênia ficaram evidentes as diferenças: os
países da OCDE responderam por 11% das mortes e o sudeste asiático, por 28%. A
poluição do ar é a principal causa, com 7 milhões de casos relacionados com o
meio ambiente; e diarreias também têm número alto. Na poluição do ar temos um
índice da OMS de 150 gramas de material particulado inalável por metro cúbico
no ar, quando a recomendação da OMS é de 50 microgramas. Se reduzirmos as
emissões de gases do “efeito estufa”, será possível salvar a vida de 2,4
milhões de pessoas por ano até 2030. Mãos à obra.
* Washington Novaes
é jornalista.
Fonte: O
Estado de S. Paulo
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