Por que
tanto medo da sustentabilidade?
No Brasil, muitas práticas importantes de manejo têm sido usadas. Na foto,
feira de agricultura familiar em Brasília. Foto: Tony Winston/ Agência
Brasília/Fotos Públicas.
É estranha a pouca ousadia dos agricultores
brasileiros no uso de tecnologias poupadoras de solos, ambiente e bolsos.
Por Rui Daher*
Muitas vezes volto de Andanças Capitais certo de
que grande parte dos agricultores brasileiros pensa sustentabilidade como o
desejo pessoal de sustentar-se.
Viagem anual a Miami, caminhonete nova,
colheitadeira mais potente, toneladas de agroquímicos para aplicarem em suas
lavouras. Luxo, comodismo e tradição, enfim.
Maltrato-os? Verão que não. Tanto os mais
capitalizados como os que se valem de financiamento subsidiado pelo governo,
safra após safra, repetem os mesmos manejos nutricionais e fitossanitários de
altos custos, até cartelizados, sem que isso lhes garanta efetividade ou evite
riscos.
É estranha sua pequena ousadia no uso de
tecnologias poupadoras de solos, ambiente e bolsos.
Pode parecer fascínio pelo jogo. Driblar os humores
de Chicago, Nova York e o apetite chinês, emociona. Roleta girando! Preto:
“Ufa, mais um ano sustentável”. Vermelho: “Ferrou. Os EUA produziram muito, os
subsídios europeus nos massacraram, os chineses pousaram pesado, o clima não
colaborou, a infraestrutura e a Dilma também. Ficamos insustentáveis”.
Cada país cultiva e produz alimentos de acordo com
suas aptidões regionais e hábitos alimentares.
Este o motivo para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) medir a produção mundial dos mais de 250 países, através dos 20 principais alimentos lá produzidos.
Este o motivo para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) medir a produção mundial dos mais de 250 países, através dos 20 principais alimentos lá produzidos.
Em 2012 (o último divulgado), a produção global de
alimentos alcançou 9,2 bilhões de toneladas, época em que a população mundial
acabara de chegar aos sete bilhões.
Uma ração anual per capita de 1,3 tonelada,
confortável para ninguém passar fome. Sobrariam ainda alpiste para pássaros,
rãs para apreciadores e quinoa para veganos.
Nessa relativa fartura, contribuem: a União
Europeia (22%); China (15%); Brasil (11%); EUA (8%); e África (7%). Mais de
60%.
Se, de um lado, tais expressões produtivas são
repassadas às conquistas agroquímicas, de outro lado, elas começam a ser
percebidas como limitantes da produtividade agrícola futura. Embora milhares de
moléculas sejam patenteadas a cada ano, suas efetividades pouco acrescem aos
níveis já alcançados nas principais regiões de agricultura.
Em artigo no China Daily, Asia Weekly, os
pesquisadores em sustentabilidade agrícola e energética, Colin Osborne, Duncan
Cameron e Mark Sinclair, da University of Sheffield, no Reino Unido, afirmam:
“A união das práticas antigas à biotecnologia moderna é a chave para alimentar
a crescente população global”.
Essa a crítica aos nossos agricultores, submissos à
pressão dos grandes fabricantes de agroquímicos, equivocados por dois fatores.
A primeira é a de que produtos orgânicos e naturais se aplicam apenas em
cultivos de baixa escala. A segunda é a cegueira ambientalista de não os
permitirem associados às tecnologias minerais e de baixo impacto ambiental em
doses mais baixas.
São erros dos produtores rurais, principalmente os
grandes, coonestados por órgãos oficiais regulatórios, educacionais e dos
técnicos, consultores e agrônomos, indutores do discurso agroquímico de massa.
A China possui ao redor de 9% das terras
agricultáveis do planeta. Ainda assim, é exportadora líquida de alimentos e
supre um mercado interno que representa 21% da população global.
Tais resultados, até aqui, vieram da prática de
agricultura intensiva.
Reformulam. Perceberam os altos custos dessa
receita, os índices de erosão, poluição do solo, escassez de água e perda de
biodiversidade, daí decorrentes.
Pesadas adubações químicas provocam alto uso de
energia para obter suprimento de nitrogênio inorgânico (consumo de 5% da
produção mundial de gás natural); esgotamento das minas de fósforo; lixiviação
de nutrientes que poluem águas dos rios e costeiras; proliferação de algas que
exaurem a oxigenação da água e letais para a fauna aquática.
Segundo os autores, o Ministério de Proteção
Ambiental da China encontrou contaminantes em 20% das áreas agricultáveis, sem
que houvesse aumento de produtividade no país, estagnada há 15 anos.
O fato tem repercutido junto à comunidade acadêmica
chinesa e o governo lançou programas de manejo agrícola que conjugam métodos
antigos (orgânicos) e novos (biotecnologia).
Redesenham, pois, seu modelo agrícola para diminuir
a excessiva nutrição com fertilizantes artificiais e o controle tóxico de
pragas e doenças. Valem-se da simbiose com micróbios, benéfica à extração de
nutrientes e resistência das plantas.
Tornam assim o solo um sistema hidropônico, capaz
de retenção de água, fornecimento de nutrientes pelas trocas catiônicas,
minimizam a erosão.
Querem mais?
Ao argumento de que é impossível atender o consumo
mundial de alimentos apenas com manejos estritamente orgânicos, a resposta está
neles combinados. Em todos os sentidos.Aumentam a produtividade, diminuem a
expansão de áreas, têm menor impacto ambiental, limitam o esgotamento dos solos
e reduzem o custo por hectare.
No Brasil, muitas práticas importantes de manejo
têm sido usadas. Desde o bom e velho plantio direto na palha, passando pela
fixação de nitrogênio nas plantas através de leguminosas, e chegando à rotação
de culturas, ao uso crescente de resíduos orgânicos, e a integração lavoura,
pasto, floresta.
Por que, então, o medo?
O infinito exército de micróbios que habita os
solos vive a perguntar o que esperam para ativá-los? Serão os chineses mais
corajosos mesmo em condições edafoclimáticas piores?
* Rui Daher é colunista da Carta
Capital. Criador e consultor da Biocampo Desenvolvimento
Agrícola (ruidaher@yahoo.com.br).
Fonte: Carta Capital
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