Gafanhotos
invadem Iêmen e outros países.
Gafanhotos do deserto jovens, sem asas. Foto: G.
Tortoli/FAO.
Por Kareen Ezzat, da IPS –
Cairo, Egito, 25/4/2015 –A invasão do temido
gafanhoto do deserto se converteu na nova ameaça que se ergue sobre o Iêmen, onde
há um ano começou um conflito civil que causou um desastre humanitário nesse
país da península arábica.“As infestações de gafanhotos do deserto descobertas
recentemente no Iêmen, onde o conflito armado é um obstáculo grave às operações
de controle, representam uma ameaça potencial para os cultivos da região”,
alertou a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura
(FAO).
No dia 12 deste mês, a FAO exortou os países
vizinhos, como Arábia Saudita, Irã e Omã, a tomarem todas as medidas necessárias
para evitar que os insetos destruidores cheguem às zonas de reprodução situadas
em seus respectivos territórios. O gafanhoto do deserto é uma séria ameaça não
só para a região austral do Golfo, mas também para o norte da África, segundo a
organização.
A FAO alertou que Argélia e Marrocos também
poderiam se converter em possíveis criadouros desses insetos, procedentes do
Saara ocidental e da Mauritânia. A mudança climática é uma das principais
causas da praga destruidora, já que pelo menos um enxame se formou na costa
austral do Iêmen, onde houve fortes chuvas associadas com os ciclones tropicais
Chapala e Megh, em novembro de 2015.
“A magnitude da atual reprodução de gafanhotos do
deserto no Iêmen não é completamente conhecida, já que as equipes de estudo não
podem ter acesso à maioria das áreas. Porém, na medida em que a vegetação seca
ao longo da costa, é provável que se formem mais grupos e enxames menores”,
observou Keith Cressman, funcionário da FAO.Existe um risco moderado de o
gafanhoto se deslocar para o interior do sul do Iêmen e que, talvez, alcance na
primavera zonas de reprodução no interior do centro da Arábia Saudita e no
norte de Omã, acrescentou.
O deslocamento poderia se estender aos Emirados
Árabes Unidos, onde pequenos enxames poderiam aparecer e atravessar o país,
antes de chegar a zonas com recentes precipitações no sudeste do Irã.O
escritório regional da FAO para o Oriente Médio e o norte da África, com sede
no Cairo, informou que a organização assiste as equipes técnicas do Ministério
de Agricultura e Irrigação do Iêmen na realização de operações de controle nas
zonas costeiras infestadas.
A FAO também alertou que na região leste do norte
da África é possível que pequenos grupos e talvez alguns enxames tenham
encontrado áreas de reprodução na Argélia, no Marrocos e na Mauritânia, bem
como em menor escala no sudoeste da Líbia. No norte de Mali e de Níger, no
sudoeste da Líbia, sudeste do Egito e nordeste de Omã há apenas uma presença
baixa de gafanhotos adultos.
Mesmo sem asas, os jovens gafanhotos do deserto
podem formar grandes grupos em terra que, com o tempo, se transformam em
enxames de animais adultos que, reunidos e em dezenas de milhões, podem voar
até 150 quilômetros por dia com vento. As fêmeas podem pôr até 300 ovos durante
sua vida, enquanto um inseto adulto pode consumir o equivalente ao seu próprio
peso em alimentos frescos por dia, aproximadamente dois gramas. Um pequeno
enxame come em um dia a mesma quantidade que 35 mil pessoas.
O impacto devastador dos gafanhotos sobre os
cultivos é uma grande ameaça para a segurança alimentar, especialmente em zonas
que já são vulneráveis. Acredita-se que as medidas de controle, de alerta e
prevenção do gafanhoto foram importantes na redução da frequência e duração das
pragas desde 1960. Entretanto, atualmente a mudança climática gera fenômenos
meteorológicos extremos mais frequentes e imprevisíveis, o que apresenta novas
dúvidas sobre a forma de abordar a atividade desses insetos.
Os gafanhotos podem devastar cultivos e pastagens.
Foto: Giampiero Diana/FAO.
A FAO opera um Serviço de Informação sobre o
Gafanhoto do Deserto que recebe dados dos países afetados. Estes são analisados
periodicamente, junto com informação e imagens via satélite sobre o clima e o
habitat, para avaliar a situação, fazer prognósticos com até seis semanas de
antecedência e emitir alertas.
O serviço também realiza missões de avaliação de
campo e coordena operações de análises e controle, bem como a assistência em
situações de emergência. Suas três comissões regionais proporcionam capacitação
periódica e fortalecem as capacidades nacionais nesse sentido.
O ano de 2015 foi desastroso para o Iêmen, onde
vivem 27 milhões de pessoas em uma superfície aproximada de 528 mil quilômetros
quadrados. O recrudescimento da insurgência huti e os bombardeios das forças
lideradas pela Arábia Saudita, destinados a erradicá-la, provocaram um desastre
humanitário no país mais pobre da península arábica. Depois, em novembro, a
pior tempestade em décadas afetou as regiões costeiras, o que provocou
inundações e o deslocamento de milhares de habitantes.
A agricultura equivale a 7,7% do produto interno
bruto do país, embora no passado tenha chegado a gerar entre 18% e 27% do
total. Essa porcentagem diminuiu devido à emigração da mão de obra rural, entre
outras causas. Porém, a maioria dos iemenitas trabalha na agricultura. O sorgo
é o cultivo mais comum, junto com algodão e árvores frutíferas, sendo a manga a
fruta mais valiosa.
Um ano depois de começar o conflito armado no país,
dezenas de milhares de habitantes morreram ou foram feridos, 10% foram
deslocados, e quase toda a população tem urgente necessidade de ajuda, afirmou
Jamie McGoldrick, coordenador humanitário da Organização das Nações Unidas
(ONU) no país, no dia 22 de março. “Foi um ano terrível para o Iêmen, durante o
qual uma guerra salpicada de ataques aéreos, bombardeios e violência causou
estragos no país, por si só já empobrecido”, destacou.
Segundo McGoldrick, os bombardeios de portos e
aeroportos, que provocam bloqueios e congestionamento, estão entre as causas da
crise humanitária. Além disso, os trabalhadores da saúde não podem chegar aos
pacientes e 90% da comida deve ser importada. “O país tinha níveis extremamente
altos de pobres antes da guerra, e atualmente a guerra se intensificou, em um
entorno por si só frágil”, ressaltou.
A guerra matou cerca de 6.400 pessoas no último
ano, metade delas civis, mais de 30 mil estão feridas e 2,5 milhões deslocadas,
segundo dados da Organização Mundial da Saúde. Além disso, mais de 20 milhões
de pessoas, ou 80% da população, requerem algum tipo de ajuda. Cerca de 14
milhões de habitantes necessitam de alimentos, e ainda sofrem escassez de água
ou saneamento.
A ONU pediu US$ 1,8 bilhão para cobrir as
necessidades de alimento, água, serviços sanitários, moradia e proteção, mas
apenas 12% foram financiados até o momento.BettinaLüscher, funcionária de
comunicações do Programa Mundial de Alimentos (PMA), pontuou recentemente em
Genebra, que a escassez obrigou a agência a reduzir o conteúdo de suas rações
para 75% do habitual, para que um número suficiente de pessoas pudesse comer.
“O Iêmen não deve ser esquecido, agora que toda a atenção está centrada na Síria”,
enfatizou.
Fonte: ENVOLVERDE
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