Terrorismo
e lixo, os dramas nucleares.
Foto: Reprodução
Por Washington Novaes*
Ao se reunir no final da semana passada em
Washington com 52 chefes de Estado para mais uma Cúpula de Segurança Nuclear
(Estado, 30/3), o presidente Barack Obama estava diante de uma realidade
incômoda: sete anos depois de pedir em Praga “um mundo sem armas atômicas”, o
número de países que dispõem de materiais para armamentos nucleares caiu apenas
de 32 para 24, segundo organizações não governamentais . E, também grave, estava
ausente a Rússia, num momento de alta tensão com os EUA . No ar, o temor de que
esse tipo de arma ou material para construí-la caia em mãos de terroristas,
esse flagelo dos tempos modernos.
Ben Rhodes, conselheiro de segurança nacional da
Casa Branca, deixou claro: “Sabemos que organizações terroristas querem ter
acesso a esses produtos com componentes radiativos e/ou convencionais, que
podem estar espalhados por centenas de lugares, inclusive hospitais – além de 2
mil toneladas de urânio enriquecido e plutônio em instalações civis e
militares, que podem ser usados para 150 bombas atômicas”.
Há ainda questões diplomáticas a discutir. Como a
de que a Rússia prefere caminhos como os da Agência Internacional de Energia
Atômica (AIEA) – mas não cumpre nem mesmo os de um acordo bilateral de 1987,
que limita o arsenal de mísseis de longo alcance para norte-americanos e
soviéticos; e entende que a cúpula é “interferência indevida em organizações
multilaterais que já se dedicam à segurança nuclear”.
Nos últimos dois anos a Rússia fez testes proibidos
com mísseis. A Coreia do Norte recentemente também fez testes com ogivas
nucleares e está preparando outros com mísseis e bombas. A Coreia do Sul dá
sinais de disposição de se armar com equipamentos nucleares para enfrentar o
que julga serem ameaças da Coreia do Norte e da China. O próprio presidente
Obama teria dito ao jornal The New York Post (Estado, 1.º/4) estar disposto a
discussões para permitir reações defensivas de japoneses e sul-coreanos, de
modo a não dependerem da proteção dos EUA.
O presidente Obama voltou também a alertar na
cúpula que o sistema nuclear no mundo pode não estar protegido de maneira
adequada das ameaças terroristas ao arsenal de 2 mil toneladas de produtos
altamente perigosos (Estado, 2/4). Segundo ele, uma pequena quantidade de
plutônio – do volume de uma maçã – pode ser suficiente para matar ou ferir
centenas de milhares de pessoas.
Ainda neste ano três regiões do mundo ficarão
livres de materiais atômicos, por decisão da cúpula: América Latina
(Argentina), Europa Central e Sudeste da Ásia. Nos últimos sete anos foi
eliminado urânio enriquecido em 50 instituições de 30 países, suficiente para
150 bombas atômicas. Mas o presidente Obama afirma (The Washington Post, 1.º/4)
que “nosso enorme arsenal da guerra fria não é adequado às ameaças atuais”. E
UA e Rússia – que juntos detêm 90% das armas nucleares do mundo – “devem
negociar uma nova redução de seus arsenais”, para que até 2018 fiquem no nível
da década de 1950.
Contraditório, porque admite implicitamente que não
há outros riscos, incluído o do lixo nuclear. Mas um banco internacional de
combustível está sendo implantado no Casaquistão, “para que países possam ter a
energia que procuram” (83% do urânio e plutônio no mundo estão em programas militares).
Contraditório também com a posição explicitada pelo ministro brasileiro do
Exterior na cúpula, Mauro Vieira, para quem a conferência “não pode prejudicar
o direito de cada Estado desenvolver o uso da energia nuclear para fins
pacíficos, na geração de energia elétrica, fins medicinais, aplicações na
agricultura e meio ambiente” (Estado, 1.º/4).
Poucos dias antes de iniciar-se a cúpula, o governo
de Bagdá ainda promovia (Reuters, 18/2) buscas de material radiativo “altamente
perigoso”, roubado no final do ano passado e que possa estar em mãos de membros
do Estado Islâmico: uma simples caixa “do tamanho de um laptop”, com uma fonte
altamente radiativa de IR-192, de apenas 10 gramas, que desapareceu em Basra,
se usada, pode ter efeitos dramáticos.
Na Alemanha (New Scientist, 6/2), está sendo
perfurado um canal de mil metros de profundidade para receber lixo atômico,
apesar de não haver destino seguro para lixo nuclear.
Já foi até contado neste espaço que o autor destas
linhas foi há alguns anos, quando gravava documentário, a uma área no Estado de
Nevada (EUA) onde também se cavava um depósito sob a montanha para receber lixo
radiativo. Depois de ser conduzido ao fundo do poço por um técnico do governo
norte-americano, veio a questão inevitável: por que se construía um depósito
perigoso como aquele numa área submetida a frequentes abalos sísmicos? O
técnico não hesitou: já haviam sido registrados ali abalos de até 5,3 graus na
escala Richter sem prejuízo para a obra. Perguntou-se: e se houver abalos mais
fortes, quem garante? E o técnico, apontando para o céu com o dedo indicador:
“Ele”.
No entanto, há menos de um ano, diante de
relatórios que apontavam os riscos, o governo norte-americano fechou o projeto,
sem uso, depois de haver gasto ali US$ 12 bilhões. E sabendo que 36 dos 99
reatores em atividade nos EUA terão de ser fechados até 2015, sem terem
destinação para o lixo nuclear.
Ainda assim, a brasileira Eletronuclear já
selecionou 40 áreas para novas usinas nucleares por aqui (Hoje em Dia, 21/1).
Seis seriam implantadas até 2030, pelo menos uma delas utilizando água do Rio
São Francisco para resfriar seus reatores. De que vale a experiência?
P. S. – Informa a Abrelpe que os números anuais
sobre gestão de resíduos sólidos no País, mencionados no artigo da semana
passada (1.º/4), devem ser estes: 78,6 milhões de toneladas de resíduos sólidos
gerados em 2014 (os dados mais recentes) e 29,6 milhões de toneladas dispostas
em lixões e aterros controlados.
* Washington Novaes é jornalista.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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