segunda-feira, 16 de maio de 2016

“O ambientalismo é uma agenda vencedora.”
Roberto Waack acredita que o ambientalismo precisa rever suas práticas. Foto: © Divulgação.

Roberto Waack, atual presidente do Conselho Diretor do WWF-Brasil acredita que o ambientalismo precisa rever suas práticas, dialogar mais e, sobretudo, apontar como fazer a transição para um mundo com baixas emissões de carbono.

Por Jaime Gesisky, do WWF Brasil –

Ao completar 20 anos em 2016, o WWF-Brasil busca se reposicionar diante de um cenário em plena transformação. Os sinais dessa mudança vêm de todos os setores da sociedade. E eles apontam para profundas transformações, sejam elas tecnológicas, nos modelos de negócios, no papel das ONGs ambientalistas. Antenado com essas sinalizações, o atual presidente do Conselho Diretor da organização mais conhecida pela marca do Panda, Roberto Waack acredita que o ambientalismo precisa rever suas práticas, dialogar mais e, sobretudo, apontar como fazer a transição para um mundo com baixas emissões de carbono. Apesar dos desafios, ele aposta no ambientalismo como uma “agenda vencedora”. Waack tem formação ampla. Vai das artes à biotecnologia. É biólogo, empresário do setor florestal e um dos criadores da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – que agrega associações, empresas, sociedade civil e indivíduos. Nesta entrevista, ele indica como o WWF-Brasil se enxerga nesse contexto de rápidas mudanças e quais são as oportunidades para seguir à frente da nova onda global.

Que sinais são estes de que o senhor está falando?

O mundo está mudando. E rápido. A importância dos recursos naturais e o equilíbrio social são parte da expectativa da sociedade contemporânea. Um acidente ambiental como o de Mariana, com seus impactos e repercussão, o caso da Volkswagen que, devido a uma fraude no dispositivo de emissões de poluentes perdeu metade do seu valor de mercado, e o acordo de clima obtido em Paris são algumas dessas sinalizações. Há outras, mais próximas de nós. Vemos diariamente no Facebook movimentos se aglutinando em torno de formas mais compartilhadas de existir. Nas ruas, os ciclistas apontam para isso, ao buscar um jeito novo de se relacionar com a cidade, como os bike angels. No mundo institucional, esses valores ambientais e sociais estão cada vez mais presentes. No consumo também. As pessoas querem saber de onde vêm os produtos que compram, qual sua pegada ecológica. É preciso interpretar esses sinais.

E onde entra o WWF-Brasil nisso?

A nova atitude da sociedade só é possível hoje porque diversas organizações ambientalistas trabalharam para essa conscientização nas últimas décadas. E o WWF foi uma delas, junto com o Greenpeace e tantas outras, em escala global. No Brasil também temos tido uma posição de destaque. 

Neste sentido, o movimento ambientalista pode se considerar vencedor. A agenda ambiental vai prevalecer, apesar das perdas que sofremos. Isso nos faz olhar para frente e pensar qual o próximo passo.

E qual é?

É apontar como faremos a transição para a sociedade de baixo carbono. O papel das organizações ambientalistas mudou. O ambientalismo “as usual” não cabe mais. O WWF-Brasil passa a se pautar a partir de agora à luz do que a sociedade está indicando, ou seja, de modo mais interconectado. 

Seguiremos mais abertos ao relacionamento com outros atores da sociedade. O setor ligado ao uso da terra, os governos, as organizações com interesses afins, os doadores. Temos de nos conectar, pois ninguém conseguirá fazer essa transição sozinho.

No caso do Brasil, o senhor acha que ainda há resistências a serem vencidas, setores menos atentos a essa tendência?

Até os setores mais conservadores já entenderam que há boas oportunidades na mudança que vem aí. Ninguém vai conseguir dizer que é contra uma economia de baixas emissões, como alguns chegavam a dizer, no passado, que eram contra a globalização. Hoje vemos o tamanho desse absurdo.

Ainda há muita polarização na sociedade na hora de debater os temas ambientais?

Não gosto de dividir o mundo em lados distintos, mas vamos lá. Mesmo entre os que estão nesse outro campo, digamos, há importantes lideranças extremamente atentas às questões de competitividade. Isso vale para o biocomércio, o setor financeiro, os governos. No caso do agronegócio, há uma enorme oportunidade de trabalhar de modo integrado ao capital natural, à produção de baixo carbono. E se o mundo vai nessa direção, como tudo indica, o Brasil é o país com maior vantagem comparativa. E isso deve se transformar em vantagem competitiva. E mais uma vez, é na integração com a sociedade civil, com as ONGs ambientalistas particularmente, que os demais setores da sociedade vão encontrar meios de seguir o fluxo.

Por quê?

Porque são organizações como a nossa que detêm o conhecimento sobre a interação mais adequada entre capital natural e conservação. Boa parte do saber sobre as boas práticas nesse campo está com a sociedade aberta. As universidades são fundamentais, mas é nas ONGs que está a chave. E isso é oportunidade para nós também. Temos de seguir indicando como fazer as coisas.

Por exemplo?

No caso do setor madeireiro, que eu conheço bem, há uma enorme ilegalidade. A economia florestal pode ajudar o Brasil a sair da crise, mas precisamos de uma economia com sólida base legal para poder expandir e espalhar benefícios econômicos e sociais. Organizações como o WWF-Brasil têm mostrar, de forma cirúrgica, quais os ajustes críticos que precisam ser feitos para melhorar o sistema. 

Por exemplo, é preciso garantir a origem legal da documentação da madeira que circula por aí. Tem também a concessão das licenças para o manejo das florestas, que hoje está na mão dos estados. Só que não há transparência nestes dois casos. Então, aprimorar o monitoramento da madeira, melhorar a medição da qualidade das operações florestais e a rastreabilidade têm de ser uma pauta das organizações como a nossa. Temos uma experiência muito proveitosa com o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) na moratória da soja, com ajuda das imagens dos satélites. Interagir com esses atores da tecnologia, nos unirmos a outras ONGs, como Imazon, para monitorar o que está acontecendo na floresta poderá induzir à legalidade no setor florestal. Não é só pressionar os governos. Mas apontar saídas.

Quais são outros desafios urgentes para as ONGs ambientalistas no Brasil?

O país tem uma meta assumida diante das demais nações do mundo. Foi apresentada no âmbito da Convenção do Clima da ONU. São nossas contribuições voluntárias para enfrentar as mudanças climáticas – INDC –, que preveem, entre outras medidas, recuperar pelo menos 12 milhões de hectares de florestas. A meta é ambiciosa, mas falta definir como isso vai acontecer. De onde virão as mudas? Como implementar os plantios? Não basta enterrar a árvore no mato e deixar lá. Conduzir essa agenda não é nada trivial. Por outro lado, é uma oportunidade enorme para o Brasil no fornecimento de fibras no instante em que o mundo usa cada vez mais árvores para substituir plásticos, combustíveis, têxteis. Uma das maiores empresas do mundo tem dito que o que se faz hoje com derivados de petróleo, poderemos obter de uma árvore amanhã. Estamos falando essencialmente de fontes de carbono, de organização de moléculas de carbono. E a oportunidade que vem dos novos biomateriais e biocombustíveis vai se refletir na agenda da restauração. Isso não quer dizer que toda floresta terá finalidade produtiva. Tem espaço para a regeneração natural, para a conservação. E todo o conhecimento associado a isso está ancorado em organizações como o WWF-Brasil. É uma onda em que devemos surfar.

Qual é a missão do WWF-Brasil agora?

Nossa tarefa agora é olhar para os eixos ligados a florestas, alimentos, oceanos, vida selvagem, clima e energia e água doce. É ver onde vamos focalizar nossa ação. É o que estamos fazendo neste momento. O WWF é uma rede mundial, e cada país dará ênfase em algum destes aspectos. 

Certamente as questões de uso do solo, água e floresta estarão no nosso radar aqui no Brasil. O que não quer dizer, de maneira alguma, que vamos abrir mão das outras agendas que julgamos importantes. Só temos que ver como e com quem iremos continuar a tocar tais temas. Não dá para fazer tudo sozinho. A diferença é que estamos passando por um processo decisório interno que requer amadurecimento, desenhando uma estrutura mais eficiente, melhorando gestão em nossos processos e definindo quem vai poder entregar conosco aquilo que nos propomos a fazer. É o que os doadores querem de nós. É o que a sociedade espera de nós. E esses sinais também já estão no ar.


Fonte: WWF Brasil

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