Publicidade
infantil: o começo do fim.
A tendência é que a coibição da publicidade
infantil aumente com o tempo.
Superior Tribunal de Justiça (STJ) toma decisão
histórica e coíbe venda casada de produto dirigido às crianças.
Por Reinaldo Canto*
Está lá, no artigo 227 da Constituição brasileira,
a defesa e a proteção dos direitos das crianças e adolescentes. Entre seus
pontos principais pontos, destaco: “livrá-las de toda forma de violência,
exploração, crueldade e opressão”.
Não é de hoje que se condenam anúncios dirigidos
aos menores. Sutilezas, como o apelo às fantasias e personagens conhecidos, tem
sido usados em profusão para manipular as cabecinhas ainda em formação para que
se tornem, antes do tempo, plenos consumidores de produtos de todos os tipos, inclusive
daqueles que lhes farão mais mal do que bem.
A princípio, pareceria óbvio a adoção de medidas
firmes para coibir tais abusos. Pressões de quilates variados tem dificultado,
porém, a tomada de ações sérias nesse sentido.
Recentemente, uma decisão emblemática foi tomada
pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em relação a uma campanha
da empresa Pandurata, dona da marca Bauducco , intitulada “É Hora de Shrek”.
Na campanha, de 2007, as crianças aquiriam um
relógio com os personagens da animação após juntar cinco embalagens de produtos
da linha “Gulosos da Bauducco” e pagar mais cinco reais.
Alegando venda casada, a campanha publicitária foi
questionada por meio de uma Ação Civil Pública do Ministério Público de São
Paulo, demandada originalmente pelo acompanhamento do projeto Criança e
Consumo, do Instituto Alana.
Em 2013, a Pandurata foi alvo de uma decisão
condenatória do Tribunal de Justiça de São Paulo. De acordo com a decisão, a
empresa deveria pagar R$300 mil de indenização pelos danos causados à
sociedade. A Pandurata, porém, não concordou com a sentença e recorreu ao STJ.
A decisão dos ministros do Superior Tribunal de
Justiça não deixou dúvidas quanto à condenação dessa campanha. Relator do
recurso, o ministro Humberto Martins afirmou em seu voto que: “o consumidor não
pode ser obrigado a adquirir um produto que não deseja”.
Outro ministro, Herman Benjamin, foi ainda mais
longe ao condenar de maneira geral a publicidade dirigida às crianças: “nenhuma
empresa comercial e nem mesmo outras que não tenham interesse comercial direto,
têm o direito constitucional ou legal assegurado de tolher a autoridade e bom
senso dos pais. Este acórdão recoloca a autoridade nos pais”.
Essa decisão foi uma vitória importante para o
Instituto Alana. Com uma década de existência, a organização tem o combate à
publicidade infantil como uma de suas principais bandeiras.
Responsável pelo projeto Criança e Consumo,
Isabella Henriques afirma que trata-se de uma mudança de paradigma. “É o
reconhecimento da criança como prioridade absoluta, inclusive nas relações de
consumo. Esse é um grande marco para nós e traz, certamente”.
Em março, tivemos outra boa notícia para as
crianças (dessa vez baseada apenas no bom senso): sem maiores polêmicas e por
livre e espontânea vontade, a Associação Brasileira das Indústrias de
Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir) decidiu não mais dirigir a
propaganda de seus produtos às crianças.
A entidade tem entre seus associados, as maiores
empresas do setor de bebidas, nada menos do que a Ambev, a Coca-Cola e a Pepsi,
entre outros.
Sem dúvida, uma decisão corajosa, mas também
inteligente dos fabricantes de refrigerantes, pois se antecipa a futuras ações
legais que coíbam esse tipo de publicidade dirigida às crianças.
A obesidade infantil já é uma das doenças que mais
cresce no Brasil. Segundo dados do Ministério da Saúde, uma em cada três
crianças brasileiras na faixa etária entre 5 e 9 anos está acima do peso. Parte
desse problema pode ser colocada na conta da ingestão indiscriminada de
refrigerantes.
Seja por meio da via judicial ou por iniciativa
própria, as restrições à publicidade infantil tendem a ser cada vez maiores,
como já apontam exemplos vindos dos países mais desenvolvidos.
A proteção à infância saudável implica em deixar
nossas crianças livres da ganância e de manipulações comerciais, entre outros
abusos conhecidos.
Com o tempo e a partir de uma idade mais madura,
certamente, esses jovens serão capazes de se tornar consumidores mais
conscientes e responsáveis. A sociedade como um todo só tem a ganhar com isso.
* Reinaldo Canto é jornalista especializado
em Sustentabilidade e Consumo Consciente e pós-graduado em Inteligência
Empresarial e Gestão do Conhecimento. Passou pelas principais emissoras de
televisão e rádio do País. Foi diretor de comunicação do Greenpeace Brasil,
coordenador de comunicação do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente e
colaborador do Instituto Ethos. Atualmente é colaborador e parceiro da
Envolverde, colunista de Carta Capital e assessor de imprensa e consultor da
ONG Iniciativa Verde.
Fonte: Carta Capital
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