Melhores
práticas ajudam economia agrária.
É necessário proteger a renda das famílias rurais
de numerosos desafios, como a mudança climática e a redução da superfície dos
terrenos. Foto: Miriam Gathigah/IPS.
A agricultura climaticamente inteligente
implica identificar e aplicar as atividades mais apropriadas para responder a
desafios climáticos específicos em lugares específicos.
Por Miriam Gathigah, da IPS –
Rumuruti, Quênia, 24/3/2016 – Durante duas décadas
o queniano Kickson Kamau só cultivou milho em seu terreno de 0,5 hectare, o que
lhe valeu o apelido de Kamau wambembe (Kamau que tem milho) em sua
língua kikuyu, falada na maior parte do Quênia. “O negócio sempre foi muito
bom”, contou à IPS. “A boa produção e os ganhos eram suficientes para manter minha
família e pagar os estudos dos meus sete filhos até a universidade”, contou o
agricultor.
Seu milharal cresceu até se converter no principal
fornecedor nesse pequeno povoado de Rumuruti, no condado de Kaikipia,
localizado na região do Vale do Rift, no Quênia, a 266 quilômetros de Nairóbi.
Mas as consequências da mudança climática, especialmente o aumento das
temperaturas e o elevado custo de fertilizantes e pesticidas, bem como as
deficiências de armazenagem, quase lhe custaram seu negócio, há cerca de seis
anos.
“A agricultura depende principalmente das chuvas, o
que, somado ao aumento da temperatura e à irregularidade das precipitações,
criou um problema para os produtores sem instalações para armazenar água”,
explicou Mary Abukutsa-Onyango, professora de horticultura da Universidade
JomoKenyatta de Ciência e Tecnologia (JKUAT).O país também carece de
infraestrutura adequada para irrigação, ao ponto de haver apenas 105.800
hectares com um sistema adequado, segundo dados oficiais, em relação aos estimados
539 mil hectares que nada têm.
A experiência de Kamau é semelhante à de outros
agricultores desta nação da África oriental e, embora ele soubesse que
precisava realizar mudanças, como muitos de seus colegas, ficou apegado aos
velhos métodos familiares de cultivo porque os desafios pareciam insuperáveis.
“Quando comecei a plantar, funcionários de extensão agrícola nos visitavam
regularmente, mas, na medida em que aumentou o número de agricultores, as
visitas diminuíram e ficamos sem informação sobre novas práticas agrícolas”,
apontou.
Os padrões da Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO) recomendam um funcionário de extensão para
cada 400 agricultores, mas atualmente há apenas um para cada dois mil
produtores. Nesse contexto, e a fim de superar numerosas dificuldades que o
setor enfrenta, a FAO procura implantar iniciativas e práticas climaticamente
inteligentes.Segundo Roberto Allport, representante adjunto para a implantação
de programas da FAO no Quênia, as iniciativas visavam construir resiliência,
bem como conseguir segurança alimentar e alimentação saudável.
Abukutsa-Onyango considerou que as iniciativas da
agência são fundamentais porque o setor agrícola está repleto de desafios. “A
produtividade agrícola obedece ao pouco uso de insumos e práticas de gestão
hídrica e de solos insustentáveis, bem como à diminuição do tamanho dos
terrenos, porque os agricultores subdividem e vendem porções de suas terras”,
destacou.Estatísticas da FAO mostram que a agricultura é fundamental para a
economia do país, pois representa aproximadamente 26% do produto interno bruto
(PIB) e outros 27% por sua relação indireta com outros setores.
A agricultura emprega mais de 40% dos 44.300
habitantes do Quênia e mais de 70% da população rural do país. Nesse contexto,
a FAO atende aos diferentes desafios que se apresentam aos agricultores em
vários condados, entre os quais se destacam Laikipa, Nakuru e Siaya. A agência
trabalhou diretamente com mais de três mil famílias.“A mensagem foi clara e diz
que, se os produtores continuarem aferrados a métodos tradicionais de cultivo,
as variações climáticas matarão nossas propriedades”, ressaltouKamau,
beneficiário da FAO.
Allport pontuou que a agricultura climaticamente
inteligente implica identificar e aplicar as atividades mais apropriadas para
responder a desafios climáticos específicos em lugares específicos. Com a
intervenção da FAO, Kamau disse que a maioria dos produtores de milho que
costumam colher uma vez por ano, isto é, que ganhavam entre US$ 13 e US$ 15 por
saco de 90 quilos por estação, agora colhem duas vezes por ano.
“Quando se colhe uma única vez ao ano e os cultivos
não crescem devido às más condições climáticas, e pode demorar muito tempo para
o agricultor se recuperar das perdas, porque coloca todos seus recursos em uma
temporada”, explicou Kamau. Os agricultores também receberam diretrizes sobre
como diversificar e plantar cultivos. “Muitos de nós começamos a cultivar
batatas, além de milho, e usamos sacos de 80 quilos para guardá-las, que custam
entre US$ 20 e US$ 25”, afirmou.
O funcionário de extensão Patrick Muraguri explicou
que a produção agrícola é mais barata logo depois da colheita. “Um ou dois
meses depois, a mesma saca de milho sobe para US$22 a US$ 35 e a de batata
dispara para US$ 50”, afirmou.Segundo Kamau, a falta de armazenagem para
preservar a colheita faz com que os agricultores precisem vender sua produção
no curto prazo. “Inundamos o mercado com os mesmos produtos, o que gera excesso
de oferta, os preços caem ao ponto de não temos lucro”, lamentou.
A FAO considera que a bem-sucedida implantação das
práticas recomendadas permitiu aos agricultores duplicarem sua produtividade e
sua renda. “Mas muitas famílias não se beneficiam de intervenções e precisam
enfrentar os desafios para fortalecer o setor agrícola”, enfatizou Muraguri.
Fonte: ENVOLVERDE
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