Acordo
climático:“bom, mas não perfeito”.
As comunidades costeiras nas Ilhas Salomão, no
sudoeste do Oceano Pacífico, já sofrem as consequências da mudança climática
com o aumento do nível do mar e tempestades mais fortes.
Foto: Catherine
Wilson/IPS.
Por Catherine Wilson, da IPS –
Canberra, Austrália, 6/1/2016 – Numerosos líderes
de países insulares do Oceano Pacífico aclamaram o acordo alcançado na COP 21
para deter a mudança climática, por considerarem que reflete um momento sem
precedentes em matéria de solidariedade mundial em torno de um tema
caracterizado pelo fratura entre as nações em desenvolvimento e as
industrializadas. Entretanto, para esses países, que consideram o aquecimento
global a principal ameaça à sua existência, o acordo somente será um êxito se
as palavras forem seguidas por ações concretas.
“É um grande avanço e não creio que teria sido
possível sem as vozes dos indígenas dos países insulares do Pacífico, unidos e
reclamando ação e justiça”, afirmou à IPS a ativista e poeta Kathy Jetnil-Kijiner,
das Ilhas Marshall, que participou da 21ª Conferência das Partes (COP 21) da
Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), realizada
em Paris entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro. “Sou muito otimista
sobre o futuro”, acrescentou.
A COP 21 se caracterizou por intensos compromissos
e fortes negociações por parte dos 195 países, além da União Europeia (UE).Dame
Meg Taylor, secretária-geral do Fórum das Ilhas do Pacífico, destacou
que,“apesar de não estarem incluídos todos os assuntos identificados pelos
países da região no documento final, houve avanços substanciais”.Por exemplo,
“o reconhecimento da importância de se continuar os esforços para limitar o
aumento da temperatura em 1,5 grau Celsius, a inclusão de danos e perdas como
um elemento separado no acordo, bem como acesso simplificado e ampliado aos
fundos para a mudança climática”, pontuou.
Claire Anterea, da Rede de Ação Climática de
Kiribati, um atol de aproximadamente 110 mil habitantes, acrescentou que o resultado
foi “bom, mas não perfeito”, e destacou que o novo objetivo em relação ao
aumento da temperatura e o chamado para melhorar os fundos para o clima foram
particularmente importantes.
A Organização Meteorológica Mundial prognosticou
que 2015 terá sido o ano mais quente já registrado, com elevação da temperatura
global média um grau acima da era pré-industrial.Enquanto isso, os países do
Pacífico se preparam para um século com maior aumento da temperatura e do nível
do mar, para a acidificação dos oceanos e branqueamento dos corais. O aumento
máximo do nível do mar poderia chegar a 0,6 metros em muitos Estados insulares,
segundo o Programa Científico de Mudança Climática do Pacífico.
No melhor dos casos, Kiribati e Papua-Nova Guiné
poderiam registrar aumento de 1,5 grau na temperatura, mas com elevadas
emissões contaminantes, podendo chegar a dois graus em 2090. O aquecimento
global poderia levar a produção de batata doce, alimento básico em muitos
países, a diminuir mais de 50% em Papua-Nova Guiné e nas Ilhas Salomão até
2050, segundo estimativas do Banco de Desenvolvimento Asiático.
O peso de perder a produção agrícola recairá sobre
a população feminina dos países insulares, principais responsáveis pelo cultivo
e produção de alimentos, e busca de água.Os moradores dos Estados insulares
encabeçaram uma campanha em Paris, em 2015, para fixar um novo limite ao
aumento de temperatura de 1,5 grau. Argumentaram que isso é fundamental para
deter futuros golpes climáticos e também mitigar os deslocamentos forçados,
pois as ilhas se tornam cada vez mais inabitáveis devido à perda de alimentos,
água e terras.
Em um claro sinal da mudança de opinião nos países
industrializados, os Estados insulares contaram com apoio de numerosas nações
em desenvolvimento e ricas na Coalizão de Grande Ambição, surgida na segunda
semana da COP 21. Entre os países que expressaram sua solidariedade,
destacaram-se Alemanha, Brasil, Estados Unidos, México, Noruega e União
Europeia. O acordo final de Paris, que busca limitar o aumento global de
temperatura a menos de dois graus e “perseguir esforços” para reduzi-la outro
0,5 grau, foi um êxito da Coalizão.
O limite de “1,5 grau nem mesmo estava na mesa
antes do início da Conferência, por isso, na primeira vez que ouvi que havia
sido integrado ao texto, chorei aliviada. Mas a redação imprecisa
definitivamente me preocupou e sei que exigirá uma pressão contínua de todos
nós para que efetivamente esse objetivo seja alcançado”, destacou
Jetnil-Kijiner.Isso não diminuirá os enormes desafios que a região já enfrenta
para adaptar-se a um clima extremo, ao qual as pequenas economias insulares sem
acesso a fundos internacionais não poderão fazer frente.
Os governantes da região pediram à comunidade para
honrar seu compromisso de reunir US$ 100 bilhões por ano até 2020 para
financiar a adaptação nos países em desenvolvimento, objetivo fixado pela
primeira vez na COP 15, realizada em Copenhague em 2009.Desde então,as
avaliações sobre quanto se conseguiu reunir variam, mas o Banco Mundial
afirmou, em abril do ano passado, que ainda faltavam US$ 70 bilhões.
Taylor acredita que “é positiva a perspectiva dos
fundos climáticos para depois de 2020, pois o Artigo 9 do Acordo de Paris
identifica que, para os pequenos Estados insulares em desenvolvimento, os fundos
para a adaptação têm que ser públicos e baseados em concessões”.Debateu-se
sobre os mecanismos financeiros, como o Fundo Verde para o Clima, serem
concedidos a fundos livres ou empréstimos condicionados.
Anterea destacou que, para serem efetivos, os fundos
“precisam chegar às pessoas necessitadas por meio de um método simples de
processamento”.O reconhecimento das perdas e dos danos causados pelo clima
extremo e pelos desastres naturais no acordo final também foi um êxito,
acrescentou a secretária do Fórum das Ilhas do Pacífico, ainda que isso não
habilite as nações vulneráveis a reclamarem nenhuma dívida ou compensação aos
grandes contaminadores.
A maior esperança está nos compromissos vinculantes
contraídos pelas nações para fixar objetivos de redução de emissões e se
submeterem a um longo processo de controle e revisões, medida que vai acelerar
a transição global para as energias renováveis e dificultará mais a queima de
combustíveis fósseis, os maiores responsáveis pelas emissões contaminantes.
“Necessitamos de uma revisão de cinco anos como
passo fundamental para que os governos sejam responsáveis por nossos objetivos
e nossas metas”, ressaltou Jetnil-Kijiner. Se não se incentivar as nações a
melhorarem cada vez mais seus objetivos, o planeta poderá continuar rumo a um
aumento devastador de temperatura de 2,7 graus ou mais, concluíram os
especialistas.
A questão mais grave, depois que passou a euforia
pelo acordo global alcançado em Paris, é como serão implantadas essas nobres
promessas. Os habitantes dos países insulares do Pacífico dependem disso.
Fonte: ENVOLVERDE
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