quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

A nova legislação eleitoral resolverá?
Por Washington Novaes*
Com a comunicação ainda destacando notícias de eventual processo de impeachment presidencial no Congresso e de propostas para o País caminhar rumo ao sistema parlamentarista (se aprovado em referendo), começa-se também a mergulhar no noticiário sobre as próximas eleições locais de 2 de outubro em 5.561 municípios brasileiros – embora legalmente a campanha só possa começar 45 dias antes do pleito, em 16 de agosto, nas ruas e em 26 de agosto no rádio e na televisão (antes eram 90 dias). Nos meios eletrônicos haverá blocos de dez minutos diários, de segunda-feira a sábado; mas os candidatos a vereador só terão inserções ao longo da programação. E as pesquisas de intenção de voto devem ser registradas na Justiça Eleitoral.

Mesmo nas eleições municipais, entretanto, ainda são muitas as polêmicas, em particular quando se trata da proibição de empresas financiarem candidatos. Há quem pense que essa legislação vai favorecer candidatos já no exercício de mandato – na medida em que, para chegar lá, tiveram em outras eleições altos financiamentos empresariais e, por isso mesmo, já são mais conhecidos –, em detrimento de candidatos novos.

Outra crítica que vem sendo feita à nova legislação está no risco de serem ampliados, com essa proibição às empresas, os financiamentos do narcotráfico a alguns ou muitos candidatos, uma vez que estes não incluirão tais financiamentos em suas prestações de contas (se o fizerem, suas candidaturas serão impugnadas). Também surgem críticas aos limites de financiamentos proporcionais à população dos municípios: naqueles com até 10 mil eleitores, o limite de gastos estará em R$ 100 mil; nos de maior eleitorado, em 50% a 70% do maior gasto declarado nas últimas eleições para cada cargo (Estado, 11/12/2015).

Uma terceira vertente das restrições: candidatos que pertençam a coligações com fundo partidário também levariam vantagem.

Não será fácil o desfecho. Como tem observado o ministro Dias Toffoli, do Tribunal Superior Eleitoral (Estado, 25/12/2015), em 2012 nada menos que 75% das doações para as campanhas eleitorais saíram de empresas; em 2014, mais de 90% dos candidatos foram financiados por pessoas jurídicas. E isso num panorama complexo, em que saímos de cinco partidos em 1981 para 35 siglas partidárias em 2015; no Congresso estão parlamentares de 28 partidos, cada um dos candidatos querendo inserções nos horários eleitorais.

Para escapar a esse quadro complexo e confuso propõe o ministro Toffoli “adotar o sistema alemão”, em que o eleitor “vota duas vezes – primeiro no candidato do seu distrito, da região ou localidade e depois na lista de um partido; e esse voto em lista é que deve ser proporcional; metade das vagas é escolhida pelo voto em lista e outras metade pelo voto distrital”. Na sua opinião, o atual sistema eleitoral – “se não for atacado” – fragiliza os governos; em 2014 o partido que fez mais deputados obteve 12% das cadeiras do Parlamento. O sistema “continuará ingovernável”.

É inevitável que venha à memória do autor destas linhas o que testemunhou na década de 1990 em Paris – e que pode já ter relatado neste espaço. Era um domingo tranquilo e pacífico como qualquer outro, embora estivessem sendo realizadas ali eleições distritais. Não se via um cartaz, uma faixa, um outdoor, um panfleto. Nenhuma passeata, nenhum comício, nada. O prestígio dos candidatos devia-se ao conhecimento que os eleitores tinham, no seu dia a dia, de quem receberia seus votos e de suas propostas, sem necessidade de propaganda; sem necessidade de grandes verbas e financiamentos para torná-los conhecidos; sem verbas fabulosas.

Vale a pena citar informações divulgadas pelo jornal O Popular, de Goiânia (15/1). Na capital goiana, o limite gastos de candidatos a prefeito e vereador nas próximas eleições não poderá ultrapassar 70% da maior despesa declarada no primeiro turno da campanha de 2012; o teto será de R$ 4,24 milhões para candidatos a prefeito, ou R$ 5 por eleitor; na cidade vizinha de Aparecida de Goiânia, R$ 3,3,5 milhões, R$ 13 por eleitor; em Anápolis, R$ 434,2 mil, ou R$ 1,80 por eleitor; em Cristalina, R$ 1,47 milhão, ou R$ 49,15 por eleitor. Esses valores ainda serão atualizados pelo tribunal eleitoral em julho, seguindo a correção da inflação no primeiro semestre. Que explicaria diferenças tão grandes, a não ser o custo da propaganda sob várias formas?

Não têm sido apontadas até agora mudanças nos sistemas eleitorais que permitam corrigir as distorções mencionadas nestas linhas, e que não sejam a introdução do parlamentarismo em nível nacional e do voto distrital nas eleições para as câmaras legislativas. E ainda com a adoção do sistema de “recall”, em que o eleitor em cada distrito pode recorrer a esse instituto para, nas condições determinadas pela legislação, pedir a destituição do candidato eleito em quem votou. Isso exigirá que acompanhe dia a dia, passo a passo, o desempenho do candidato em quem votou, sua fidelidade às propostas que seduziram o eleitor – e as razões concretas de sua insatisfação.

Também levará o cidadão a aperfeiçoar seu conhecimento sobre os negócios públicos e não se limitar à condenação dos eleitos nos casos alegados de desonestidade, corrupção. Aperfeiçoará a formação política do cidadão e poderá até levá-lo a candidatar-se em algum momento. Implicará benefícios concretos para a comunidade.

A Constituição da República completou 27 anos, promulgada que foi em 5 de outubro de 1988, quando Ulysses Guimarães, com o texto aprovado pelo Congresso à mão, disse: “Declaro promulgado o documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social no Brasil. Que Deus nos ajude para que isso se cumpra.” Portanto, como diz o extraordinário constitucionalista José Afonso da Silva, “a Constituição Federal tem elementos para resolver essa crise dentro dos parâmetros democráticos”.

* Washington Novaes é jornalista (e-mail: wlrnovaes@uol.br).


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