Acordo de
Paris, início de longa viagem.
Segundo o Acordo de Paris, o mundo deve buscar uma
elevação da temperatura de 1,5 grau Celsius, uma proposta recente da sociedade
civil. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS.
Por Rajendra Kumar Pachauri*
Nova Délhi, Índia, 18/1/2016 – O acordo alcançado
em dezembro de 2015 na 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco
das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), realizada em Paris, é um
importante avanço na forma de lidar com o desafio da mudança climática. O fato
de quase todos os países do planeta terem assinado o Acordo de Paris é um êxito
importante, cujo crédito cabe em grande parte ao governo da França.
Entretanto, em termos científicos, embora o acordo
reúna todas as partes, em si os compromissos assumidos nas contribuições
previstas e determinadas em nível nacional (INDC) não bastam para limitar o
aumento da temperatura em dois graus Celsius até o final deste século em
relação aos níveis pré-industriais.
Todo acordo sobre mudança climática deve levar em
conta a avaliação científica dos impactos que o mundo enfrentará e dos riscos
que deverá suportar se não forem realizados esforços suficientes para mitigar
as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Também é preciso avaliação científica em nível de
mitigação que limite os riscos dos impactos consequentes a níveis aceitáveis. O
Quinto Informe de Avaliação (AR5) do Painel Intergovernamental de Especialistas
sobre Mudança Climática (IPCC) fornece uma avaliação clara sobre o rumo que o
planeta seguirá se não forem modificadas suas práticas habituais.
O AR5 estabelece claramente que, se não forem
feitos esforços de mitigação adicionais aos existentes hoje em dia, e inclusive
com a adaptação, o aquecimento do planeta no final do século 21 vai gerar riscos
muito altos de consequências graves, generalizadas e irreversíveis em nível
mundial.
Rajendra Kumar Pachauri. Foto:IPS
A adaptação e a mitigação são estratégias
complementares para reduzir e administrar os riscos da mudança climática. Em
consequência, uma redução considerável das emissões nas próximas décadas poderá
reduzir os riscos climáticos no século 21, e posteriormente aumentará as
possibilidades de uma adaptação eficaz, baixará os custos e os desafios da
mitigação no longo prazo e contribuirá com o desenvolvimento sustentável
mediante vias resistentes ao clima.
O AR5 inclui cinco motivos de preocupação (MDP)
sobre a mudança climática e ilustra as consequências que têm o aquecimento e os
limites à adaptação para os seres humanos, as economias e os ecossistemas em
todos os setores e todas as regiões.Os cinco MDP se referem a sistemas únicos e
ameaçados, fenômenos meteorológicos extremos, distribuição dos impactos,
aspectos acumulados mundialmente e eventos singulares em grande escala. Esses
MDP crescem em proporção direta ao grau de aquecimento projetado para os
diferentes cenários
Uma redução importante nas emissões de GEE nas
próximas décadas poderá reduzir consideravelmente os riscos da mudança
climática mediante a limitação do aquecimento a partir da segunda metade do
século 21. As emissões acumuladas de dióxido de carbono (CO2) determinarão em
grande parte o aquecimento médio da superfície do planeta até o final deste
século e posteriormente.
Reduzir os riscos dos MDP implicaria limitar as
emissões acumuladas de CO2. Esse limite exigiria redução gradual das emissões
até chegar a zero e que as emissões anuais se reduzissem nas próximas décadas.
Porém, alguns riscos de dano climático são inevitáveis, mesmo com mitigação e
adaptação.
Isso se deve à inércia do sistema pelo qual o aumento da
concentração de GEE na atmosfera terrestre terá consequências que já são
inevitáveis.
O Acordo de Paris é um passo extremamente
importante dado pela comunidade mundial, mas falta um nível muito mais alto de
ambição, em comparação com o atual representado pelas INDC, que obrigue todos
os países a agirem. O exame das INDC está previsto para 2018 e 2023. Isso pode
ser muito tarde, pois é urgente a necessidade de demonstrar um nível maior de
ambição, se o mundo quer reduzir as emissões de maneira significativa antes de
2030.
Atrasar a mitigação adicional até 2030 aumentará
consideravelmente os desafios associados com a limitação do aquecimento ao
longo do século 21 abaixo dos dois graus Celsius, em relação aos níveis pré-industriais.
E, se a comunidade internacional for séria sobre avaliar os impactos da mudança
climática dentro do limite de 1,5 grau acima dos níveis pré-industriais, então
será preciso adotar rigorosas medidas de mitigação muito antes de 2030.
Se não forem tomadas medidas logo, então será
necessária uma aceleração muito maior da energia baixa em carbono no período
2030-2050, com maior dependência na eliminação de dióxido de carbono no longo
prazo, e impactos econômicos de transição e no longo prazo mais fortes.
Em essência, o Acordo de Paris deve ser visto como
o começo de uma viagem.Se o mundo quer reduzir ao mínimo os riscos derivados
das consequências da mudança climática de forma adequada, então a população de
cada país deve exigir um conjunto muito mais ambicioso de medidas de mitigação
do que as que constam do Acordo de Paris.
Claramente, esse é o desafio que o mundo enfrenta,
e a comunidade internacional deve assumir com urgência a tarefa de divulgar
para o público os dados científicos relacionados com a mudança climática como
um acompanhamento do Acordo de Paris. Só assim conseguiríamos as medidas
adequadas para limitar os riscos em níveis aceitáveis.
*Rajendra Kumar Pachaurié diretor-geral do
Instituto de Energia e Recursos (Teri) e ex-presidente do Grupo
Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (2002-2015).
Fonte: ENVOLVERDE
Nenhum comentário:
Postar um comentário