O clima
bate à porta, já é hora de mudar.
Por Washington Novaes*
Mudanças climáticas ameaçam a segurança
alimentar na América Latina e no Caribe.
Na mesma semana em que o mundo se reunia no Rio
de Janeiro, na Olimpíada 2016, registrava-se (cdn.com.br) o Dia da Sobrecarga
da Terra (8/8), quando se calculou que em pouco mais de sete meses deste ano
esgotamos os recursos naturais suficientes para atender às necessidades de
consumo de todo o mundo em 12 meses. E, mais complicado, evidenciou-se que a
cada ano esse esgotamento se dá mais cedo (em 2015 foi no dia 13 de agosto).
Feito pela Global Footprint Network, com dados da ONU, da Organização Mundial
do Comércio e dos países, o cálculo avalia a “pegada ambiental global” e diz
que precisaríamos de 1,6 planeta Terra para suprir o consumo de hoje no planeta
e atender ao crescimento da população, confrontados com a capacidade da
natureza de prover recursos e reciclar organicamente os resíduos.
Desde 2000 a sobrecarga de recursos usados
dobrou. Mas foi possível também ver que isso já vinha desde 1970 – começou a
ocorrer no dia 23 de dezembro e a cada ano era mais cedo, com poucas exceções.
Para reverter o processo será preciso reduzir as emissões de carbono em 30%
sobre os níveis atuais, conforme estabelecido na Conferência do Clima da ONU.
Além de baixar o consumo, será indispensável reduzir o desperdício de energia
elétrica, de carne e os transportes movidos a combustíveis fósseis, entre
outros itens.
Relatório do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente (geodireito.com, 31/7) aponta a “exploração predatória” da Terra,
a retirada triplicada da biomassa nas últimas quatro décadas, a extração de
minerais, o uso de combustíveis fósseis como algumas das causas mais graves
desse problema. Um brasileiro, em média, consome recursos 1,8 vezes mais do que
o planeta pode oferecer; um norte-americano, 4,8 vezes mais; um australiano,
5,4 vezes.
Tratar de temas como esses costuma levar muitas
pessoas a chamar de “profetas do apocalipse” ou coisas assim cientistas que
fazem advertências. Mas não há como fugir. A Organização das Nações Unidas para
a Alimentação e a Agricultura (FAO-ONU), por exemplo, adverte (2/8 ) que
mudanças climáticas já ameaçam a segurança alimentar na América Latina e no
Caribe. Estudo da Cepal afirma que o setor agrícola é a atividade mais afetada
pelas mudanças, pois responde por 5% do produto bruto e 23% das exportações
regionais, ao mesmo tempo que emprega 16% da população ocupada. O Noroeste
brasileiro será uma das regiões mais afetadas.
Como avançar, nesse cenário, com a erradicação da
fome, que exigirá maior produção de alimentos? E sabendo que as mudanças
climáticas aumentarão tanto a seca como o volume de chuvas? Como enfrentar esse
quadro se o último balanço (SBPC na ECO 21, maio de 2016) adverte que as
emissões brasileiras de dióxido de carbono aumentaram de 2,1 bilhões de
toneladas anuais (2005) para 2,73 bilhões de toneladas, embora o compromisso
nacional seja de reduzi-las em 37% até 2025 e até 43% em 2030, sobre os números
de 2005?
Será necessário um conjunto de soluções. O Jornal
Dia de Campo (5/7), por exemplo, assegura que o plantio direto na agricultura
“mitiga a emissão de gases do efeito estufa”, conforme estudo da Embrapa
Cerrados desde 2001, divulgado pela Nature/Scientific Reports. Os estoques de
carbono no solo nesse sistema de plantio podem equiparar-se no longo prazo aos
valores originários em solos do Cerrado nativo. Além disso, o acúmulo de
carbono promove aumento da qualidade do solo dos pontos de vista químico,
físico e biológico. A acumulação de carbono no solo entre 11 e 14 anos variou
entre 1,48 e 1,61 megagramas por hectare/ano. Essa é uma tarefa que precisa ser
considerada prioritária pelos governos em toda parte no País.
Outro estudo, divulgado por Rita Silva
(avivcomunicacao, 26/7), lembra que estão entre as maiores ameaças ao clima
planetário os “gases que usamos para nos refrescar”, conhecidos como
hidrofluorcarbonetos, ou HFCs, “mais poderosos para o aquecimento da Terra que
o dióxido de carbono”. Um desses gases, o HFC-134a, permanece 13,4 anos na
atmosfera e leva a um aquecimento 1.300 vezes maior que o do dióxido de carbono
ao longo de cem anos. Esses gases estão em aparelhos de ar-condicionado,
geladeiras e aerossóis. No ritmo atual, em 2015 os HFCs poderão contribuir com
até 10% das emissões globais dos gases do efeito estufa. Desde 1990, o uso
deles aumentou 258%.
A esperança é que em reunião a ser realizada em
Ruanda, em outubro, se chegue a acordo entre os países para reduzir o uso dos
HFCs e o aquecimento global em O,5% até o final do século. Até já existem
alternativas para esses gases, como o propano, que pode ser usado em pequenos
aparelhos de ar-condicionado. Quase cem países em desenvolvimento querem sustar
o nível de crescimento dos HFCs em 2021. O custo total para eliminá-los estaria
entre US$ 8 bilhões e US$ 10 bilhões em três décadas – ou 8 a 10 centavos de
dólar por tonelada de dióxido de carbono equivalente.
O Centro de Estudos em Sustentabilidade, da
Fundação Getúlio Vargas, está divulgando nestes dias os inventários de emissão
de gases do efeito estufa no Brasil em 2015, por 136 organizações membros – um
“primeiro passo para a transição para a economia de baixo carbono, fruto do
Acordo de Paris”.
A urgência de mudanças nessa área é exemplificada
por Ana Lúcia Azevedo (9/4) com a Chapada Diamantina, “conhecida como a Caixa
d’Água da Bahia” (80% dos rios do Estado nascem ali e fornecem água inclusive
para 60% dos habitantes de Salvador). Mas a água escasseia por lá, “à medida
que se concretizam previsões sobre o impacto das mudanças climáticas na
região”. Ou em várias partes da Amazônia.
São alguns dos casos mais em evidência na área do
clima no País, que estão acontecendo em todas as regiões. Cuidemo-nos para
evitar quadros piores. Informações e advertências não faltam.
* Washington Novaes
é jornalista (e-mail: wlrnovaes@uol.com.br).
Fonte: O
Estado de S. Paulo
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