‘PL do Veneno’: Mudanças na lei de agrotóxicos no Brasil violariam direitos humanos, afirmam relatores da ONU.
Segundo
os especialistas da ONU, cinco dos dez pesticidas mais vendidos no
Brasil não são autorizados em diversos outros países devido a seus
riscos à saúde humana ou ecossistemas.
ONU
Relatores das Nações Unidas
enviaram no início de junho (13) um comunicado ao governo brasileiro
manifestando preocupações com as propostas de mudança da lei de
agrotóxicos
no país. Os especialistas alertaram que, caso aprovadas, tais
alterações violarão direitos humanos de trabalhadores rurais,
comunidades locais e consumidores dos alimentos produzidos com a
ajuda de pesticidas.
De acordo com os relatores, alguns
pontos do projeto de lei revisam as regulações para registro de
pesticidas e seu uso no Brasil com o objetivo de tornar as regras
mais flexíveis, facilitando o registro e a propaganda desses
produtos no país. Essas modificações podem enfraquecer a regulação
e o controle de pesticidas perigosos no Brasil, maior consumidor e
importador desses produtos no mundo.
Relatores das Nações Unidas
enviaram no início de junho (13) um comunicado ao governo brasileiro
manifestando preocupações com as propostas de mudança da lei de
agrotóxicos no país. Os especialistas alertaram que, caso
aprovadas, tais alterações violarão direitos humanos de
trabalhadores rurais, comunidades locais e consumidores de alimentos
produzidos com a ajuda de pesticidas.
Os especialistas manifestaram
preocupação com o Projeto de Lei 6.299/2002, que modifica a lei
número 7.802 de 11 de julho de 1989, que aborda pesquisa, teste,
produção, embalagem e rotulagem, transporte, armazenamento,
comercialização, publicidade comercial, uso, importação,
exportação, destinação final de rejeitos assim como registro,
classificação, controle e inspeção de pesticidas.
“As mudanças podem enfraquecer
significativamente os critérios para aprovação do uso experimental
e comercial de pesticidas, representando uma ameaça a uma série de
direitos humanos”, disseram os especialistas na carta ao ao
governo.
De acordo com os relatores, alguns
pontos do projeto de lei revisam as regulações para registro de
pesticidas e seu uso no Brasil com o objetivo de tornar as regras
mais flexíveis, facilitando o registro e a propaganda desses
produtos no país. Essas modificações podem enfraquecer a regulação
e o controle de pesticidas perigosos no Brasil, maior consumidor e
importador desses produtos no mundo.
De acordo com dados do Ministério
da Saúde citados pelos especialistas, o Brasil registrou 5.501 casos
de intoxicação em 2017 (quase o dobro do registrado dez anos
antes), uma média de 15 pessoas por dia. Mais de 150 pessoas
morreram no Brasil como resultado de envenenamento no ano passado.
“Trata-se de uma estimativa conservadora sobre os impactos adversos desses produtos na saúde humana, diante dos dados limitados disponíveis sobre envenenamentos e impactos na saúde de exposição crônica a pesticidas perigosos”, afirmaram.
“Trata-se de uma estimativa conservadora sobre os impactos adversos desses produtos na saúde humana, diante dos dados limitados disponíveis sobre envenenamentos e impactos na saúde de exposição crônica a pesticidas perigosos”, afirmaram.
Os especialistas da ONU também
relataram preocupações com a capacidade dos sistemas de
fornecimento de água de monitorar regularmente a poluição por
pesticidas. Apenas 30% das cidades brasileiras fornecem regularmente
informações sobre os níveis de contaminação à entidade nacional
que monitora a qualidade da água (SISAGUA), disseram os relatores.
Segundo os especialistas, cinco dos
dez pesticidas mais vendidos no Brasil (Atrazina, Acefato,
Carbendazim, Paraquat, Imidacloprida) não são autorizados em
diversos outros países devido a seus riscos à saúde humana ou
ecossistemas. Além disso, notaram que os padrões brasileiros
existentes permitem níveis mais altos de exposição a pesticidas
tóxicos do que os equivalentes na Europa.
Eles lembraram que, enquanto a União
Europeia limita em 0,1 miligrama por litro a quantidade máxima de
glifosfato a ser encontrada na água potável, o Brasil permite 5 mil
vezes mais, de acordo com dados da academia brasileira.
Registro, uso e comercialização de agrotóxicos
Registro, uso e comercialização de agrotóxicos
A proposta de emenda do artigo 3 da
lei número 7.802 altera a diretriz institucional para aprovação e
registro de novos pesticidas no Brasil. Atualmente, a aprovação e o
registro requerem aval das autoridades federais de saúde, meio
ambiente e agricultura – Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) e Ministério da Agricultura,
respectivamente.
A proposta de mudança concentra no
Ministério da Agricultura o mandato sobre os agrotóxicos
registrados no Brasil, enquanto Ibama e Anvisa penas homologariam a
decisão. O projeto de lei não especifica o que poderia acontecer
caso autoridades ambientais e de saúde discordem do registro do
produto.
“As preocupações se referem ao
fato de que as enormes capacidades financeiras do lobby da
agricultura no Brasil poderiam facilmente controlar as decisões
adotadas com este novo arranjo institucional”, disseram os
especialistas.
Segundo eles, a proposta reduz os
poderes das autoridades ambientais e de saúde no processo decisório,
levantando sérios questionamentos sobre como as evidências de
perigo e risco desses produtos seriam avaliadas nas decisões
regulatórias.
As propostas de mudanças também
estabelecem um período máximo para decisões sobre o registro de
produtos. Seriam 12 meses para decisões sobre o registro de um novo
pesticida, abrindo a possibilidade de registro temporário nos casos
em que a análise não foi concluída pelas autoridades no tempo
estabelecido.
As emendas estabelecem a
possibilidade de autorizações temporárias automáticas para
produtos que estão registrados para cultivos semelhantes em ao menos
três países-membros da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), sem qualquer análise complementar
feita no Brasil.
Finalmente, as mudanças propostas
aos artigos 9, 10 e 11 concentram toda a autoridade para as
restrições e controles de registro e uso de pesticidas no governo
federal, eliminando o atual reconhecimento da capacidade das cidades
e dos estados de propor padrões de proteção adaptados a
circunstâncias e desafios locais.
Pesticidas relacionados a câncer, defeitos de nascença e outros riscos à saúde
Pesticidas relacionados a câncer, defeitos de nascença e outros riscos à saúde
O artigo 3 da lei existente
explicitamente proíbe o registro de pesticidas com elementos
considerados teratogênicos, cancerígenos, mutagênico, disruptores
endócrinos ou que representem riscos ao sistema reprodutivo.
Muitas dessas substâncias
representam riscos incalculáveis a crianças durante períodos
sensíveis de desenvolvimento. Na proposta de mudanças, pesticidas
perigosos só serão proibidos quando for demonstrado cientificamente
um risco inaceitável.
De acordo com os relatores da ONU,
essa abordagem rejeita a aplicação de boas práticas sobre gestão
de risco dos pesticidas, tais quais adotadas na União Europeia, em
favor de uma definição genérica de “risco inaceitável”,
segundo eles profundamente problemática tendo em vista os reduzidos
poderes das autoridades ambientais e de saúde sob o novo arranjo
institucional.
Os relatores lembraram lições de
outros países, que mostram como os padrões baseados na
aceitabilidade de riscos falham em proteger adequadamente aqueles em
mais risco de exposição a químicos tóxicos, como comunidades de
baixa renda, minorias, trabalhadores e crianças.
“Além disso, a proposta de
emendas injetam incertezas adicionais que reduzem a precisão das
avaliações de risco que podem ser conduzidas. A nova regra permite
que o uso de pesticidas para propósitos preventivos (antes da
ocorrência das pestes), aumentando as incertezas sobre os tipos e
volumes de pesticidas aplicados e o risco de exposição para
trabalhadores e comunidades locais.”
Os especialistas alertaram que as
emendas propostas limitariam a aplicação de Lei 7.802, regulando os
pesticidas apenas no ambiente rural. Isso significaria que os
ambientes urbanos e industriais ficariam descobertos ou regulados
apenas pela lei de saúde 6.360 que está desatualizada e não tem
cláusulas específicas sobre o registro e uso de pesticidas,
incluindo medidas protetivas, disseram.
Os relatores disseram ainda que o
Brasil continua permitindo que fabricantes estrangeiros de produtos
químicos explorem padrões baixos de proteção no país, exportando
pesticidas perigosos proibidos em seus mercados domésticos. Muitos
desses países dos quais os pesticidas são importados têm sistemas
de proteção ambiental e de saúde mais restritivos que o Brasil,
alertaram.
Incentivos fiscais
Incentivos fiscais
Os especialistas disseram que
governo brasileiro continua a estimular o uso de agrotóxicos por
meio de incentivos fiscais. Segundo eles, experiências de outros
países mostraram benefícios do caminho justamente oposto —
estabelecer incentivos fiscais para minimizar o uso de pesticidas
perigosos e outros químicos tóxicos.
O decreto 7.660 de dezembro de 2011
estabeleceu um total de isenção fiscal para produtos
industrializados para a produção e venda de pesticidas, e o acordo
100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) reduz
em 60% a base usada para calcular impostos sobre a circulação de
bens e serviços para produtos utilizados na agricultura, como
pesticidas.
Além disso, os relatores notaram
que um projeto de lei alternativo (PL6670/2016), que estabelece uma
política nacional de redução de pesticidas, proposta dois anos
atrás pela sociedade civil e organizações acadêmicas, recebeu um
baixo nível de prioridade do Congresso Nacional. Uma comissão para
analisar a proposta só foi estabelecida em maio deste ano,
afirmaram.
“Estamos preocupados com o fato de
que as múltiplas mudanças propostas às diretrizes legais e
institucionais existentes para os pesticidas no Brasil enfraqueçam
significativamente os mecanismos de proteção que são vitais para
garantir os direitos humanos dos trabalhadores da agricultura, das
comunidades vivendo em áreas onde os pesticidas são usados e da
população que consome alimentos produzidos com o apoio desses
produtos químicos”, concluíram os especialistas.
O comunicado foi enviado ao
chanceler brasileiro, Aloysio Nunes Ferreira, e ao presidente da
Câmara, Rodrigo Maia. É assinado pelo relator especial para a
questão das obrigações de direitos humanos relacionadas à
garantia de um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, John
Knox; pelo relator especial para o direito à alimentação, Hilal
Elver; pelo relator especial para os direitos humanos e substâncias
e resíduos perigosos, Baskut Tuncak; pelo relator especial para o
direito de todos aos maiores padrões de saúde física e mental,
Dainius Puras; e pelo relator especial para o direito humano ao
saneamento e à água potável segura, o brasileiro Léo Heller.
Fonte: ONU
Brasil
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