Cacau na Amazônia: um caminho para a agricultura familiar sustentável.
por Eduardo Trevisan Gonçalves,
gerente de projetos do Imaflora –
Tem aumentado a importância da
agricultura familiar na geração de renda em estados e municípios
da Amazônia brasileira. Além da tradicional produção de
alimentos básicos, como mandioca, verduras, condimentos, leite e
derivados, têm ganhado destaque a produção de cacau, café e
guaraná em escala comercial.
O cacau é um caso emblemático e o
principal exemplo a ser observado, porque tem se tornado cada dia
mais relevante na vida das comunidades amazônicas, sobretudo na dos
agricultores familiares. Da sua semente, após fermentada e seca,
chamadas de amêndoas, pode se extrair subprodutos para a fabricação
de chocolates, biscoitos, cosméticos, entre outros. Por ser pouco
perecível, o produto se pode ser transportado por longas distâncias.
A expectativa da indústria
cacaueira é que, nos próximos 10 anos, a produção de cacau no
Brasil passe das atuais 200 mil toneladas para 400 mil toneladas. E
boa parte desse volume deve vir de plantações na Amazônia
brasileira. No Pará, destacam-se a região da transamazônica, com
diversos municípios produtores, e também a região sudeste do
Estado, no eixo entre Tucumã e São Felix do Xingu. O cacau também
cresce em Rondônia e Amazonas.
A evolução dessas plantações
acompanha um recente ciclo internacional de valorização da
commodity, assim como sua demanda no mercado interno, que tem
crescido e, em anos recentes, superou a capacidade de produção das
lavouras brasileiras, fazendo com que parte das indústrias
processadoras importasse as amêndoas de outros países. O mercado de
cacau especial, com qualidade superior e certificado, também evolui
com rapidez.
Por ser uma planta nativa da região
amazônica, o cacaueiro encontra condições climáticas favoráveis
para se desenvolver e, além disso, quando bem conduzidas, as
lavouras são consorciadas com árvores nativas, transformado áreas
degradadas, sobretudo pastagens, em agroflorestas – plantações
que se assemelham a uma floresta.
A geração de renda para as
comunidades locais e a recuperação de áreas degradadas em
agroflorestas parece ser – e deve ser – uma excelente estratégia
para o desenvolvimento da região. Muitas organizações estão
apostando e propagando essas ideias, sendo que o ritmo de plantio de
cacaueiros tende a aumentar nos próximos anos.
Embora a atividade seja bastante
promissora, a situação em muitas regiões do Brasil revela que o
produtor familiar ainda encontra dificuldades para tornar a prática
sustentável financeiramente. O principal meio de implantação das
lavouras de cacau é o financiamento pelo PRONAF (Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Alguns produtores também
utilizam recursos próprios e financiamentos bancários para iniciar
o plantio. Existe também a expectativa de novas formas de
financiamento, que envolvem Títulos Verdes (Green Bonds).
E com o escasso acesso à informação
sobre as boas práticas de produção, já que os órgãos públicos
de pesquisa, assistência técnica e fiscalização possuem
limitações financeiras para atendimento do grande número de
empreendedores, milhares de produtores veem sua produtividade ser
afetada. Muitos utilizam produtos químicos sem os cuidados
necessários, colocando em risco sua saúde e a dos ecossistemas que
habitam. Em alguns casos, também desmatam a floresta para plantio de
cacau.
Mesmo com alta liquidez, a
fragilidade de gestão das cooperativas locais, a grande quantidade
de intermediários e os altos custos logísticos fazem com que o
preço final da amêndoa fique abaixo do seu potencial de mercado,
subtraindo parte da renda que iria para os agricultores familiares.
Outro fator preocupante é a falta de investimento público ou
privado em questões básicas, como a educação de crianças e
jovens de áreas rurais, ou seja, das futuras gerações de
produtores.
O grande risco da ampliação da
produção de lavouras como cacau, café, dendê e outras, sem que
haja planejamento e parcerias que envolvam setores público, privado
e, sobretudo, os produtores e suas associações, é que pode haver
consequências insustentáveis aos territórios e às famílias que
vivem da terra, como a utilização de práticas degradantes como
trabalho infantil, desmatamento e utilização de agrotóxicos sem a
devida proteção e proliferação de atravessadores comerciais. Sem
que existam ganhos reais na qualidade de vida daqueles que vivem nas
regiões, não haverá viabilidade para a continuidade do crescimento
sustentável que se espera. É preciso investir em caminhos para a
agricultura familiar que incluam as lideranças e as necessidades das
comunidades.
Fonte: ENVOLVERDE
Nenhum comentário:
Postar um comentário