segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Campanha da Fraternidade 2017 exige proteção dos biomas e discute a proibição do fracking no Brasil.

Por seus impactos ambientais, econômicos e sociais, a exploração do gás de xisto por fraturamento hidráulico é uma das grandes responsáveis pela destruição da Casa Comum.

Por Redação da Envolverde –

Inspirada pelos posicionamentos do Papa Francisco na Encíclica ‘Laudato Si’, a Igreja Católica do Brasil desenvolverá na Campanha da Fraternidade 2017 o tema ‘Biomas brasileiros e a defesa da vida’ e o lema ‘Cultivar e guardar a criação’.

“Devemos proteger as nascentes e cobrar a recuperação da mata ciliar, não permitir projetos econômicos em áreas de preservação permanente e lançar luzes sobre a questão do fracking, bem como criar um novo arranjo de convívio e de relacionamento dos humanos entre si e com a natureza”, afirmou o Bispo de Umuarama, Dom Frei João Mamede Filho, em coletiva na cidade para o lançamento da campanha realizada na manhã desta quinta-feira, 23.
Para Dom Mamede, além do aumento da população e do modo de viver em aglomerações, o crescente poder técnico-científico de intervenção da natureza e o desejo exacerbado de lucro são fatores que contribuem para destruição da Casa Comum. “Já não basta cuidar e proteger os espaços de forma fragmentada, é preciso incluir o ser humano nessa visão global, conforme ensina o Papa Francisco. Cada ferida e cada arranhão na natureza revelam a destruição do humano e da sociedade”, completa.

* Com informações da Assessoria de Imprensa da COESUS e 350.org Brasil e América Latina.


Fonte: ENVOLVERDE
Exploração petrolífera na foz do Amazonas ameaça comunidades locais.

Por Carolina Santos*

Da pesca ao açaí, as pequenas comunidades na costa do Amapá que dependem diretamente dos recursos naturais da região já se organizam para defender seus direitos e produzir de forma cada vez mais sustentável.

Antes da expedição que fez as primeiras imagens dos Corais da Amazônia, o navio Esperanza recebeu a bordo, ainda no porto de Santana, em Macapá, cerca de 40 representantes da sociedade civil, entre comunidades, organizações socioambientais e lideranças do Amapá. Em comum, o grupo compartilha o esforço de proteger a Floresta Amazônica.

A intenção de nosso encontro foi iniciar com eles as discussões sobre atividades que geram grandes impactos socioambientais na região, entre elas a exploração petrolífera planejada, a partir do ponto de vista de quem está na floresta e faz parte dela. Em breve, o Greenpeace realizará um seminário na região, com parceiros, para discutir temas como o uso da terra, a barragem do Rio Araguari, os impactos da mineração, além da própria exploração de petróleo.

Em tempos de ataques aos direitos das comunidades tradicionais por parte do Governo e do Congresso Federal, as iniciativas que estimulam o empoderamento e a autogestão dessas populações se tornam cada vez mais importantes. Nesse sentido, foi muito interessante conhecer a brilhante experiência de organização local do Bailique, por meio dos protocolos comunitários.

Qualidade e sustentabilidade na Foz do Amazonas

O Bailique é um arquipélago de oito ilhas a leste do estado do Amapá, onde vivem cerca de 11 mil habitantes distribuídos em 52 comunidades, e cujo acesso é exclusivamente fluvial. A principal atividade econômica é a pesca artesanal e o açaí.

Há cerca de três anos, a rede Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), em parceria com diversos colaboradores, como a Regional GTA do Amapá; o Conselho Comunitário do Bailique (CCB); a Colônia Z-5 de Pescadores; o Instituto Estadual de Florestas (IEF) do Amapá; e o DPG / CGEN) / MMA), iniciaram um projeto para desenvolver um “Protocolo Comunitário” no Bailique, a partir da aprovação da maioria das comunidades que habitam o arquipélago.

Segundo a Rede GTA, protocolos comunitários “são regras internas criadas pela própria comunidade que definem os procedimentos, critérios e instrumentos de gestão territorial e de manejo e uso de recursos naturais na região”. Os protocolos norteiam as atividades econômicas que serão desenvolvidas, mas o ponto mais importante é que eles devem refletir as características tradicionais, o modo como a comunidade se relaciona interna e externamente, o conhecimento local popular.

Assim, como explica a cartilha produzida pelo GTA, a construção de protocolos comunitários visa empoderar os povos e comunidades tradicionais para dialogar com qualquer agente externo de modo igualitário, especialmente na hora de fazer negócios com terceiros, fortalecendo o entendimento da comunidade sobre seus direitos e deveres e estabelecendo a importância da conservação da biodiversidade e de seu uso sustentável. Além disso é uma importante ferramenta de gestão de territórios, assim como do controle e da forma de uso de recursos naturais.
Comércio de Açaí no Mercado da Rampa de Santa Inês (Rampa do Açaí), em Macapá (Amapá). O açaí e a pesca artesanal são as principais atividades econômicas da região do Bailique. Foto: © Rogério Reis / Greenpeace

Depois de três anos do início desta articulação, muitas iniciativas caminham em direção à consolidação do Protocolo Comunitário, como a criação da Associação das Comunidades Tradicionais do Bailique (ACTB). Ela é a instância comunitária responsável pela participação social e a execução das ações estabelecidas no território.

Uma dessas iniciativas é a capacitação técnica para o bom manejo florestal na produção do açaí. Com o apoio da Associação, do GTA, e da Oficina-Escola de Lutheria da Amazônia, 79 produtores de açaí da região receberam, em novembro do ano passado, a certificação FSC, após serem auditados pela equipe do Instituto de Manejo e Certificação Florestal (IMAFLORA). Isso atesta que o seu produto não está vinculado a degradação florestal.

Em janeiro deste ano, o Greenpeace foi convidado a participar do 9° Encontrão do Protocolo Comunitário. Foi um momento muito importante para os produtores, pois foi quando receberam em mãos o certificado emitido pela FSC.

Para o presidente da Associação das Comunidades Tradicionais do Bailique, Geová de Oliveira Alves, isso é importante pois o processo como um todo faz com que os produtores de açaí adotem uma postura diferente na forma de tratar seus recursos, sua cultura e meios de vida. “Eles passam a valorizar mais ainda o que cada um tem de melhor nas suas terras. E tendem a se capacitar mais para manter isso. É um processo de aprendizagem contínuo e com resultados excelentes, tanto para o homem quanto para a floresta”, avalia Alves.

Para ele, outra vantagem da certificação é que o processo produtivo como um todo ganha outro status: há maior agregação de valor. “O mundo passa a reconhecer que você tem um produto de altíssima qualidade, que respeita os valores comunitários, a natureza e os direitos de todos”.

Neste encontro, outras questões importantes foram discutidas, como a criação de uma cooperativa para garantir a melhor inserção do produto no mercado. Com a certificação em mãos, alguns desafios ainda preocupam os produtores, como o escoamento da produção, à procura de um mercado diferenciado para a aquisição do seu açaí certificado.

Benefícios para quem?

No modelo de desenvolvimento seguido em nosso país, a comunidade do Bailique pouco conhece seus bônus. Já os ônus são diariamente vivenciados pelos habitantes. O abastecimento de energia, por exemplo, é inadequado e deficiente, apesar de a população estar ao lado da barragem do Rio Araguari. Desta grande obra para a geração hidroelétrica, construída há três anos, o efeito mais marcante sentido pelos moradores locais do Bailique é a aceleração do processo de erosão na região.

A deficiência no abastecimento de energia, inclusive, afeta as duas principais atividades econômicas da região, a pesca e a produção de açaí, afetando a segurança alimentar dos habitantes.

O desenvolvimento a todo custo que é perseguido pelo país, traz agora uma nova ameaça socioambiental para a região: a possibilidade da exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. No caso de um acidente com vazamento, ele poderia ter graves consequências para o Bailique, que depende totalmente dos recursos naturais.

Porém, apesar dos desafios e da deficiência do Estado em garantir os direitos fundamentais dessa população, a comunidade do Bailique é um excelente exemplo de como uma população tradicional pode usar ferramentas e mecanismos para fazer a gestão de seu território. Ao mesmo tempo em que assegura a reprodução física e cultural do seu modo de vida e transmite seus saberes tradicionais, também conserva o seu meio, que é a Floresta Amazônica. São comunidades que estão buscando uma inserção diferenciada no mercado, mostrando que é possível, sim, produzir e se desenvolver economicamente em sintonia com o meio ambiente. Um sopro de esperança em tempos tão difíceis.

* Carolina Santos faz parte da campanha de Florestas do Greenpeace Brasil.


Abre alas, elas querem passar (sem assédio).

Por Clare Richardson*

Mulheres jogam luz sobre lado obscuro do Carnaval, num país onde 60% dos homens dizem que foliãs sozinhas não podem reclamar de assédio.

Ela não tinha nenhuma ginga no corpo, mas isso não impediu que Renata Rodrigues lançasse um bloco de Carnaval nas ruas do Rio de Janeiro dois anos atrás. Quando a mulher de 40 anos viu uma postagem viral no Facebook mostrando um cartaz que dizia “Eu não mereço mulher rodada”, ela ironizou a mensagem ao fundar um bloco feminista chamado “Mulheres Rodadas”.

A intenção é que o bloco fosse apenas uma brincadeira entre poucos amigos, mas quase uma centena de pessoas apareceu para o primeiro ensaio. Agora o bloco tem milhares de seguidores. Neste ano, o Mulheres Rodadas está se preparando para o seu terceiro Carnaval promovendo uma campanha de conscientização sobre assédio sexual usando a hashtag #CarnavalSemAssedio. O Rio é conhecido por suas atitudes sexuais liberais, que atingem o ápice durante os desfiles de Carnaval.

Desconhecidos se beijando pelas ruas são parte da tradição. Mas o ambiente “ninguém é de ninguém” também abre a porta para o assédio sexual desenfreado. Mulheres são apalpadas, imobilizadas pelos braços e beijadas à força.

“Em festas em que as pessoas estão nas ruas, como o Carnaval, as pessoas estão mais vulneráveis a sofrerem assédio ou estupro”, afirma Renata Rodrigues.

Mas os brasileiros parecem não se preocupar muito com o problema. Uma pesquisa realizada em 2016 pelo instituto paulista Data Popular mostrou que 61% dos homens acreditam que uma mulher que vai pular o Carnaval sozinha não pode reclamar de assédio sexual, e 49% afirmaram que um bloco de Carnaval não é lugar para uma mulher decente.
Renata Rodrigues, do Mulheres Rodadas: ‘Nosso grupo começou como uma brincadeira, mas é muito sério’

“Carnaval sem assédio” tem o objetivo de conscientizar que ambas as partes em um Carnaval desinibido têm que consentir com o contato sexual. O Mulheres Rodadas espera educar os foliões de que “não” significa “não”. Assim será possível ensinar os foliões sobre a se proteger e a lidar com casos de assédio.

A ideia de que o Carnaval funciona como uma grande festa democrática que reúne pessoas independente do gênero, raça ou classe acaba mascarando o racismo e sexismo profundamente enraizados. Imagens lascivas de mulheres negras vestindo nada além de penas e lantejoulas são transmitidas para o mundo todo.

Hiperssexualização e preconceito

Nas residências brasileiras, a hiperssexualização das mulheres negras era até este ano encarnada por uma mulata que escolhida anualmente para interpretar o papel de “Globeleza” – uma junção do nome da emissora de TV Globo e a palavra “beleza”.

A escolhida era sempre uma mulher negra pintada com glitter. Durante a temporada de Carnaval, a Globeleza aparecia em diversas inserções televisivas com closes que destacavam suas partes inferiores. Neste ano, a emissora anunciou que não iria mais promover uma mulata e optou por mostrar diferentes foliões – usando mais roupas.

Mas muitas das mais populares marchinhas de Carnaval ainda refletem velhas atitudes. Elas incluem letras racistas e sexistas sobre mulatas como O teu cabelo não nega.

O problema vai, porém muito além do assédio e do que ocorre no Carnaval; o Brasil tem índices de chocantes de violência sexual. De acordo com relatório de segurança pública de 2014, uma pessoa é estuprada a cada 11 minutos no país – e o número real deve ser muito maior se forem considerados os casos que não são reportados.

O país também tem uma das mais altas taxas de homicídios contra mulheres no mundo. Ainda que o número de homicídios de mulheres brancas esteja em declínio, as estatísticas envolvendo mulheres negras dispararam.

Analba Brazão, uma ativista do SOS Corpo, uma organização feminista do Recife, afirma ser fã do Carnaval. No entanto, ela diz que a violência contra mulheres é amplificada em eventos de rua. “As mulheres no Brasil não têm a liberdade de estar na rua. Elas ficam expostas”, diz. “Nossa luta é pelo direito de pode sair em público e contar com segurança”.

Antigas mazelas

Daiane Monteiro, de 29 anos, estava tomando algo em um café quando o bloco Mulheres Rodadas passou pelo local na última sexta-feira para um ensaio de pré-Carnaval. A jovem, que toca um instrumento de sinos chamado agogô em uma das mais tradicionais escolas de samba do Rio, gostou da iniciativa do grupo, mas disse não achar que o assédio sexual ainda continua a ser um grande problema no Rio.

Grupo 2
‘Carnaval sem assédio’ tem o objetivo de conscientizar que ambas as partes têm que consentir com o contato

Ela apontou o crescimento da inclusão de mulheres em papéis tradicionalmente masculinos no Carnaval – por exemplo, a execução de instrumentos pesados como o surdo – como uma evolução positiva. “Temos a liberdade de exibir nossos corpos se quisermos”, afirma. “Agora nós podemos até mesmo tocar em escolas de samba. No passado isso era uma atividade mais masculina.”

No entanto, Daiane Rodrigues pensa que assumir novos papéis na música não é o bastante. “Mulheres estão por toda parte nos blocos e escolas de samba, mas elas não se tornam mestres de baterias, não conduzem as bandas e não tomam decisões”, conta.

Raquel Fialho, de 36 anos, vai tocar o xequerê com o Mulheres Rodadas pela primeira vez neste ano. “Eu vi eles no ano passado e fiquei encantada”, afirma. “Foi algo muito poderoso, bonito e colorido”. Ela sabe que as tradições do Carnaval contam com décadas de história e que mudar as atitudes será um longo processo: “Não podemos esperar mudar as ideias em apenas alguns anos.”

Muitos no Brasil também temem que direitos conquistados pelas mulheres estejam sob risco com o presidente Michel Temer, que lidera o governo mais conservador desde o fim do regime militar. Quando Temer anunciou o seu primeiro ministério após assumir interinamente, as pastas não incluíam nenhuma mulher.

Ele também aboliu o status de ministério das secretarias de Políticas para as Mulheres, de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, e de Direitos Humanos. As responsabilidades das pastas passaram a ser atribuição do Ministério da Justiça.

“Nosso grupo começou como uma brincadeira, mas é na verdade muito sério”, reforça Renata Rodrigues, a criadora do bloco. “O Carnaval é talvez a mais importante forma de protesto no Brasil.”
* Clare Richardson está no Brasil com uma bolsa do International Reporting Project (IRP).


Declarada guerra ao plástico nos oceanos.
Por Baher Kamal, da IPS – 

Roma, Itália, 24/2/2017 – A Organização das Nações Unidas (ONU) declara guerra aos plásticos que inundam os oceanos: mais de oito milhões de toneladas acabam em suas águas a cada ano, como se fosse despejado um caminhão desse material por minuto, o que causa estragos na vida marinha, na pesca e no turismo, e tem custo de aproximadamente US$ 8 bilhões.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), com sede em Nairóbi, capital do Quênia, lançou ontem uma campanha mundial para eliminar, até 2022, as principais fontes de contaminação marinha, como os microplásticos existentes em produtos cosméticos, e o desperdício de artigos descartados usados apenas uma vez.

Apresentada na Cúpula Mundial dos Oceanos, organizada pela revista The Economist, na cidade de Bali, na Indonésia, a campanha #MaresLimpos pede urgência aos governos no sentido de criarem políticas para reduzir o uso de plásticos, especialmente dirigidas à indústria, a fim de minimizar os envoltórios desse material e redesenhar suas embalagens, e aos consumidores para mudar seus hábitos de descarte, antes que haja um dano irreversível.
A maior limpeza de praias do mundo em Versova, na cidade indiana de Mumbai. Foto: Pnuma

“Já é hora de encararmos o problema do plástico que arruína nossos oceanos”, ressaltou Erik Solheim, diretor executivo do Pnuma. “A poluição por plásticos navega pelas praias indonésias depositando-se no solo oceânico do Polo Norte, e regressa por meio da cadeia alimentar para se instalar em nossa mesa. Esperamos muito tempo e o problema piorou. Precisa acabar”, enfatizou.

No contexto da campanha serão anunciadas novas medidas ambiciosas dos países, mas também das empresas, para a eliminação dos microplásticos dos produtos de higiene pessoal, proibição ou taxação dos sacos plásticos com apenas um uso e redução drástica de outros artigos plásticos descartáveis. A iniciativa mundial procura sensibilizar os governos, a indústria e os consumidores para que reduzam urgentemente a produção e o abuso de plásticos, que contaminam os oceanos, atentam contra a vida marinha e ameaçam a saúde humana.

O Pnuma procura transformar todas as esferas: hábitos, práticas, padrões e políticas em todo o mundo, com o objetivo de reduzir radicalmente o lixo marinho, bem como suas consequências negativas. Dez países já se uniram à campanha: Bélgica, Costa Rica, França, Granada, Indonésia, Noruega, Panamá, Santa Lúcia, Serra Leoa e Uruguai. A Indonésia se comprometeu a diminuir seu lixo marinho em 70% até 2025, o Uruguai anunciou que este ano taxará os sacos plásticos descartáveis, e a Costa Rica tomará medidas para reduzi-los rapidamente por meio de uma melhor gestão dos resíduos e da educação.

“Proteger os mares e a vida marinha do plástico é uma questão urgente para a Noruega”, segundo o ministro de Clima e Meio Ambiente desse país, Vidar Helgesen. “O lixo marinho aumenta rapidamente os riscos para a vida marinha, a segurança dos mariscos e peixes, e afeta de forma negativa a vida das populações costeiras de todo o mundo. Os oceanos já não podem esperar”, destacou.

Por sua vez, a ministra de Habitação, Ordenamento Territorial e Meio Ambiente do Uruguai, Eneida de León declarou: “Nosso objetivo é desestimular o uso de sacos plásticos mediante regulamentações, oferecer alternativas aos trabalhadores do setor do lixo e desenvolver planos de educação sobre o impacto do uso dos sacos plásticos em nosso ambiente”.
Nos banheiros de todo o mundo há pastas de dentes e esfoliantes faciais envasados com microplásicos, que ameaçam a vida marinha. Foto: Pnuma

No ritmo em que descartamos garrafas, sacos e copos plásticos, as estimativas revelam que até 2050 os oceanos terão mais plástico do que peixes e que aproximadamente 99% das aves marinhas terão consumido plástico. São esperados mais anúncios no contexto dessa campanha na Conferência sobre os Oceanos, que acontecerá na sede da ONU, em Nova York, entre os dias 5 e 9 de junho, bem como na Assembleia Geral da ONU para o Meio Ambiente, que acontecerá em Nairóbi no mês de dezembro.

Além dos oito milhões de toneladas de plástico lançados nos oceanos todos os anos, estes também sofrem sobrepesca, acidificação e elevação da temperatura da água devido à mudança climática. A ONU organizou uma reunião nos dias 15 e 16 deste mês em Nova York para preparar a Conferência de junho, no sentido de “contribuir para salvaguardar os oceanos e recuperar os problemas causados pelas atividades humanas”.

A ministra do Clima da Suécia, Isabela Lövin, afirmou em um vídeo postado no Twitter que a Conferência seria uma “oportunidade única na vida” para salvar os oceanos que sofrem um enorme estresse. Ela argumentou que “não precisamos negociar nada novo, só temos que agir para implantar o que já acordamos”, basicamente resumindo o sentimento da maioria da comunidade científica, ambientalistas e organizações da sociedade civil.

Lövin se referia à esperada “chamada à ação”, que surgirá da Conferência no que diz respeito à sobrepesca, à contaminação marinha e às circunstâncias especiais dos pequenos Estados insulares. No tocante ao objetivo de conseguir oceanos sustentáveis e preservar a vida debaixo da água, a ministra disse em entrevista à IPS que “o mundo avança em uma direção totalmente equivocada”.

“Se observarmos as tendências, vemos cada vez mais sobrepesca, cada vez mais contaminação, lixo plástico que chega aos oceanos, e também vemos o estresse que sofrem os oceanos por causa da mudança climática, da acidificação e do aquecimento da água e pela elevação do nível do mar. Tudo isso exerce uma tremenda pressão sobre nossos oceanos”, enfatizou a ministra.

Na reunião de Nova York, a ONU pediu compromissos voluntários para implantar o 14º dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), e, no dia 15 deste mês, lançou um registro de compromisso online, que já tem três compromissados: o governo da Suécia, o Pnuma e a organização não governamental Peaceboat. O site estará pronto ao final da Conferência, que começará em 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, durante a qual também será celebrado o Dia Mundial dos Oceanos, três dias mais tarde.

Os compromissos voluntários “destacam a necessidade de ação e soluções urgentes”, pontuou o secretário-geral adjunto para Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, Wu Hongbo, que será o secretário-geral da Conferência.


Fonte: ENVOLVERDE
Crise hídrica no DF realça importância das UCs.
Publicado: Quinta, 23 de Fevereiro de 2017, 18h25

Praticamente toda a água consumida em Brasília vem de fontes e barragens protegidas por unidades de conservação federais. Sem elas, a situação que já exige racionamento seria pior

Elmano Augusto
Brasília (23/02/2017) – As unidades de conservação (UCs) federais cumprem papel decisivo na manutenção dos recursos hídricos que abastecem o Distrito Federal. E essa importância fica mais evidente agora, quando Brasília, a capital federal, enfrenta a maior crise de abastecimento d´água de sua história, exigindo a adoção de medidas duras como o racionamento.

O diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Paulo Carneiro, destaca que quase 100% da água usada pelos mais de 2,5 milhões de brasilienses, incluindo residências, empresas e órgãos públicos, vem de reservatórios e pequenas captações protegidas por unidades de conservação federais, geridas pelo Instituto.

Pelo menos, quatro unidades de conservação do ICMBio têm relação direta com a conservação dos recursos hídricos no Distrito Federal: o Parque Nacional de Brasília, a Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio Descoberto, a Floresta Nacional (Flona) de Brasília e a Reserva Biológica da Contagem. 

APA e Flona

A APA do Descoberto e a Flona de Brasília são responsáveis pela sobrevivência das nascentes que irrigam a maior represa da região, a do Descoberto, responsável por aproximadamente 70% do abastecimento d´água do DF.

A barragem do Descoberto garante recursos hídricos para a mancha urbana mais populosa do DF, a que vai da Ceilândia ao Gama, abrangendo ainda cidades como Samambaia, Taguatinga e Recanto das Emas, além do Park Way e Águas Claras.

“Se não fosse a existência dessas duas unidades de conservação, a região da represa, que sofre muita pressão da agricultura e da ocupação humana, estaria hoje degradada, comprometendo ainda mais a captação de água”, diz Carneiro.

Parque

Do outro lado do quadrilátero do DF, no meio da vegetação de Cerrado conservada pelo Parque Nacional de Brasília, fica a segunda maior represa da região, a de Santa Maria, que responde pela água potável consumida por cerca de 30% da população.

Junto com a barragem do Torto, o sistema garante água para a região centro-norte, que vai do Plano Piloto ao Paranoá, passando pelos Lagos Sul e Norte e condomínios do Jardim Botânico, área que começou a ser habitada mais recentemente. A represa de Santa Maria está integralmente situada no interior da poligonal do parque.

“Um dos objetivos da criação do Parque Nacional de Brasília, em 1961, foi exatamente o de conservar as nascentes, riachos e rios que alimentam hoje o sistema Santa Maria-Torto. Essa visão de futuro permitiu a sustentabilidade do sistema de fornecimento de água durante anos”, afirma o diretor do ICMBio.

Rebio da Contagem

Já a Reserva Biológica (Rebio) da Contagem, ao lado do parque nacional, guarda um conjunto de nascentes de onde a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) faz captações (em torno de 1% dos recursos hídricos locais) que levam água para parte de Sobradinho e dos condomínios horizontais que despontaram nos últimos anos na região norte de Brasília.

Por tudo isso, o diretor do ICMBio chama a atenção para o papel das UCs. “Ainda valorizamos pouco os serviços ambientais prestados pelas unidades de conservação. É hora de repensar a ocupação dos territórios e hábitos do dia a dia. Valorizar as unidades que protegem nossas nascentes é, certamente, um desses passos”, conclui Paulo Carneiro.

Comunicação ICMBio - (61) 2028-9280

Fonte: ICMBIO

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

“É preciso declarar guerra ao desmate”

Por Claudio Angelo, do OC –

Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas retoma atividades em março após anos na geladeira no governo Dilma; secretário-executivo defende repressão na Amazônia.

Alfredo Sirkis nunca foi conhecido por estar do lado dos vencedores na história. Mas seu novo emprego é uma bucha até mesmo para alguém que participou da luta armada, fundou o Partido Verde, foi deputado federal na minguada bancada ambientalista e engajou-se nas campanhas de Marina Silva: Sirkis é o secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, criado para discutir o tema no governo federal. Entre suas tarefas está a de tentar soprar a agenda de clima no ouvido de ninguém menos que o presidente Michel Temer.

O fórum surgiu em 2000 para ser um órgão de assessoramento do Presidente da República. Teve seu período áureo no governo Lula, quando seu então secretário, o físico Luiz Pinguelli Rosa, liderou as discussões que culminaram no Plano Nacional de Mudanças Climáticas, em 2008.

A partir de 2011, sob Dilma Rousseff, o colegiado foi essencialmente jogado às traças. Dilma reuniu-se com o fórum apenas duas vezes em cinco anos – e, na primeira, em 2012, declarou de maneira célebre que energias renováveis eram “fantasia”. “Os processos decisórios passavam totalmente ao largo do fórum”, lembra Sirkis. Mesmo assim, Pinguelli renunciou ao posto em maio de 2016, em protesto contra o impeachment. O fórum ficou seis meses acéfalo – mas pouca gente percebeu.

Aos 66 anos, o jornalista e político carioca, que se diz um filiado “não-praticante” do PSB, assumiu o secretariado do fórum novembro, num momento dramático para a agenda de combate ao aquecimento global. Após saborear a vitória em 2015 com o Acordo de Paris, o mundo encara uma perspectiva de retrocesso significativo com Donald Trump nos EUA.

No Brasil, não há até o momento nenhuma indicação de que Temer vá dar mais prioridade ao assunto do que sua antecessora. Ao contrário: da Casa Civil, cujo ministro-chefe é investigado por variados crimes ambientais, têm vindo tentativas de torpedear essa agenda, como um sinal verde para a aprovação de um projeto de licenciamento ambiental feito pela bancada ruralista e uma recepção amigável a uma proposta que pode liberar 1 milhão de hectares na Amazônia à grilagem. Todas essas medidas vão na contramão dos compromissos brasileiros de corte de emissões. Há risco de retrocessos na demarcação de terras indígenas (importantes para conter o desmatamento e as emissões) e no Código Florestal.

A principal conquista brasileira no clima, a redução da taxa de desmatamento na Amazônia, também começa a virar abóbora: a devastação cresceu 60% nos últimos dois anos e, segundo dados recentes do Imazon, já é maior no período de agosto de 2016 a janeiro de 2016 do que no mesmo período anterior.

“É preciso declarar guerra ao repique do desmatamento”, afirma Sirkis, ao ser questionado sobre suas prioridades à frente do fórum. As nove câmaras temáticas do colegiado começam a se reunir em março, e o secretário-executivo pretende iniciar os trabalhos com debates sobre florestas. De imediato, ele afirma ser a favor de um aumento nas ações de repressão. “Está claro que há um aproveitamento oportunista da fraqueza do Estado brasileiro, que foi sinalizada pela crise institucional, pela crise nos Estados.”

Para ter qualquer peso, porém, o fórum terá de conquistar a atenção de Temer, com cujo governo Sirkis afirma não ter ligação política. O secretário diz que o presidente garantiu presença na primeira plenária do fórum, que deve acontecer ainda neste semestre.
Alfredo Sirkis durante a Marcha pelo Clima no Rio, antes da COP21. Foto: arquivo pessoal

Leia a seguir a entrevista que Sirkis concedeu ao OC.

Ao longo de toda a história do fórum, sua relevância tem sido dada pelo grau de prioridade que o Presidente da República atribui ao assunto. Como o sr. acha que será com Temer, já que até aqui ele não tem demonstrado atenção à mudança do clima?

O fórum foi criado, em 2000, no governo FHC, e o Fabio Feldmann foi seu secretário-executivo. Reunia-se com frequência, o presidente comparecia com alguns ministros e discutia diretamente conosco. No governo Lula, o fórum teve, mais que relevância, visibilidade, porque em algumas ocasiões o presidente usou-o para fazer anúncios importantes com a Marina e depois o Carlos Minc.

No governo Dilma o fórum teve menos visibilidade e alguns momentos bizarros, como aquele discurso dela descascando em cima das energias limpas. Os processos decisórios passavam totalmente ao largo do fórum, mesmo aqueles que foram conduzidos a bom termo, como o resultou na nossa INDC [Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida, hoje apenas NDC] e que foi bem conduzido, ao final, pela Izabella Teixeira.

Na conversa que tive com o Temer, quando aceitei a indicação, no dia da ratificação [do Acordo de Paris, em 12 de setembro], notei que ele, embora não conhecendo a fundo o assunto, lhe atribuía importância. Tinha acabado de estar no G20 e percebera a centralidade do clima nos discursos dos outros chefes de Estado. Percebi um interesse em conhecer mais, ouvir. Isso é melhor do que tentar interagir com quem já sabia tudo, não é?

O fórum não se reúne com o presidente desde o primeiro mandato de Dilma e ficou acéfalo por quase seis meses. Quais foram os prejuízos decorrentes dessa inatividade?

Perdemos tempo no que é a grande missão do fórum, que é criar as bases para um novo tipo de governança climática mais eficiente e participativa e que siga uma estratégia coerente, um roadmap que nos é dado pelo Acordo de Paris, pela nossa NDC e por certos desafios de adaptação que devemos enfrentar.

Quais são as suas prioridades à frente do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas?

Quero envolver o fórum no processo de uma nova governança climática participativa. Para isso temos de começar de baixo para cima, a partir das câmaras temáticas com uma agenda comum a todas e muito clara.

A agenda é: 1) Que ações de curto prazo, como o enfrentamento imediato do repique do desmatamento? 2) Implementação da NDC em cada setor da economia. 3) Primeiro ciclo de revisão da NDC. 4) Estratégia de descarbonização drástica para a segunda metade do século. 5) Questões de adaptação relativas a cada setor. 6) Questões de inovação tecnológica e financiamento da transição para a economia de baixo carbono/carbono neutra.

A primeira plenária será neste semestre ainda, e terá que responder ao primeiro ponto, que são ações de curto prazo, e aí volto a insistir: é preciso declarar guerra ao repique do desmatamento.

De que forma?

A curto prazo tem de ser por meio de operações de repressão. Porque está claro que há um aproveitamento oportunista da fraqueza do Estado brasileiro, tanto na esfera federal quando na estadual, que foi sinalizada pela crise institucional, pela crise nos Estados. A curto prazo tem de haver retomada das operações do Ibama juntamente com a Polícia Federal, se necessário com apoio das Forças Armadas. A médio prazo é evidente que são necessários mecanismos econômicos, sobretudo nas áreas onde existe a possibilidade do desmatamento legal, como o cerrado. Ali tem de haver pagamento por serviços ambientais.

O sr. defenderá desmatamento zero no fórum?

Eu estou lá para fomentar a discussão e apresentar as propostas que sejam consensuadas nas câmaras temáticas. A câmara temática de florestas e agropecuária, terá liderança da Coalizão [Brasil Clima, Florestas e Agricultura]. Teremos um grupo que terá todos os lados do segmento e que vai produzir determinados posicionamentos, que eu vou defender como coordenador do fórum. Agora, eu, pessoalmente, sou favorável. Mas minha posição pessoal não será a que vai necessariamente prevalecer.

O país tem uma governança de clima em tese muito boa, com uma política nacional, um plano nacional, um comitê interministerial chefiado pela Casa Civil. Na prática, porém, o Ministério do Meio Ambiente faz quase tudo sozinho. Fracassou a tentativa de tratar o clima como tema transversal?

No período anterior alguns ministérios se boicotavam mutualmente e disputavam poder entre si. E a parte mais decisiva do governo, a área econômica, passava – e ainda passa – totalmente ao largo da questão climática. A cúpula da Fazenda, do Banco Central, do BNDES, os outros bancos públicos, do planejamento, todos têm que estar profundamente envolvidos com a questão da mudança climática. 

Não é uma questão meramente “ambiental”: ela é de desenvolvimento, ela é civilizatória.

Há uma guerra de facções no governo em relação ao inventário de emissões do Brasil, feito pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e questionado pelo Meio Ambiente. Como o fórum pode mediar esse conflito?

Antes de assumir o fórum eu já estava tentando fazer esse meio de campo. Antes, eu tinha uma dificuldade no MCTI com o Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Embora no passado ele tenha manifestado posições negacionistas climáticas, não tentou imprimir essa orientação e o ministério bancou dois excelentes trabalhos, o 3o Inventário e o Opções de Mitigação, coordenado pelo Prof. Roberto Schaeffer. Houve, no entanto, uma disputa de espaço de Aldo com Izabella e havia também uma questão pessoal entre as duas equipes técnicas do MMA e do MDIC que precisa ser superada, pois ambas são constituídas por técnicos de primeiríssima qualidade. O fórum pode de fato ajudar a superar essas questões, que demandam um mediação sensível, respeitosa e inteligente.

O Brasil tem, pela primeira vez, um plano nacional de adaptação, mas este não dialoga com o Brasil 2040, o principal estudo sobre vulnerabilidade da economia brasileira à mudança do clima. Como incorporar o 2040 ao planejamento de governo e dar dentes ao plano de adaptação?

Teremos um subfórum só para adaptação, incorporando o dever de casa de adaptação setorial de cada uma das câmaras temáticas e fazendo uma síntese de longo prazo. Adaptação abarca uma infinidade de questões, e a maioria delas exige uma concertação com os níveis regional e local. O Brasil 2040 precisa de fato orientar a ação nacional de adaptação.

O sr. é o principal defensor no Brasil da chamada precificação positiva do carbono, que diz ser o único jeito de mobilizar finanças em quantidade suficiente para atingir as metas do Acordo de Paris. É possível falar nisso sem falar em preço de carbono no Brasil?

Penso que as duas modalidades de precificação são necessárias e complementares. A precificação “real”, na qual atribuímos preço à tonelada de carbono para poder taxá-la é, fundamental para que os preços incorporem as externalidades negativas – tanto climáticas quando ambientais locais – dos produtos e serviços. No Brasil a taxação de carbono teria de ser compensada por uma redução análoga de outros tributos. Não podemos aumentar a carga tributária.

Já a precificação positiva do carbono reduzido é uma revolução no mundo econômico na proporção do tamanho do problema que estamos enfrentando. Se a mudança climática é o maior problema contemporâneo porque agrava todos os outros e representa uma ameaça existencial para a espécie humana, isso deve se refletir nos sistema de abstrações sobre qual se constrói a economia.

Se podemos calcular, com uma boa margem de segurança, que “x” trilhões de dólares será o prejuízo infligido à economia mundial pelos efeitos das mudanças climáticas, até, digamos, 2050, podemos também calcular o valor de cada tonelada de carbono reduzida ou removida. O carbono-menos é como o novo ouro.

O fórum pretende discutir tecnologias de emissão negativa, como o bio-CCS com captura de carbono? Qual é sua opinião sobre a adoção disso no Brasil?

Se queremos começar a pensar em 1,5oC, ou mesmo em 2oC, emissões negativas é o nome do jogo. 

Há muita coisa interessante sendo pesquisada pelo mundo afora e o Brasil precisa desesperadamente superar seus entraves burocráticos, cartoriais e a falta de importância concede à pesquisa e à inovação. O Brasil tem um potencial enorme para diversas modalidades de tecnologias de emissão negativa. Mas só dá tiros no pé.
De que tipo?

Você tem um sistema hipercartorializado e razoavelmente mafioso. Tenho recebido denúncias de pessoas com invenções na área de biocombustíveis e outras coisas que são sistematicamente barradas por verdadeiras máfias cartoriais que existem. Isso é um ponto de estrangulamento terrível para o Brasil, independentemente da questão climática. Na câmara temática de ciência e tecnologia vamos tentar fazer um levantamento de todos os obstáculos que existem no Brasil para um fluxo maior da inovação.

Um dos riscos que vêm sendo apontados com Donald Trump é o de outros países discretamente tirarem o pé do acelerador de seus compromissos no Acordo de Paris, mesmo mantendo no discurso o famoso “tamo junto”. O sr. acha que o Brasil corre esse risco?

Mesmo que os EUA não saiam do Acordo de Paris, vai haver um retrocesso na regulamentação interna de caráter nacional – vários Estados norte-americanos vão resistir – e no apoio que os EUA vinham dando à regulamentação internacional via Convenção do Clima. A via diplomática vai ficar mais difícil por um bom tempo. Isso reforça a noção de que a descarbonização precisa virar um viés da economia global. Penso que tanto a taxação do carbono quando a precificação positiva assumem importância particular nesse momento.

O que aconteceu nos EUA é simplesmente tenebroso, no pior momento possível. Mas é o que é. É o terreno em que teremos de dar combate. O Brasil corre todo os riscos. Somos uma sociedade totalmente esgarçada, numa crise econômica brutal, grande descrédito nas instituições e na própria capacidade da democracia superar essa situação. Mais que o risco de um novo surto autoritário de tipo clássico, vejo o perigo da síndrome dos Estados falidos. Precisamos de causas que nos unam. 

Enfrentar a crise climática foi até agora a única que logrou essa façanha. A ratificação do Acordo de Paris foi aprovada em tempo recorde nas duas casas legislativas e sancionada pelo presidente. Foi um momento raro de união nacional. Devemos preservar e cultivar isso.