Mulheres
são essenciais para a ciência.
LakshmiPuri. Foto: IPS
Por Lakshmi Puri*
Nações Unidas, 25/2/2016 – Imagine-se um dia
inteiro sem acesso ao seu telefone celular, seu computador portátil, ou mesmo à
internet. Em nosso mundo de constantes mudanças, você poderia funcionar sem a
tecnologia ao seu alcance? Em todo o planeta, especialmente no Sul em
desenvolvimento, o uso da tecnologia e o acesso a ela nem sempre são fáceis.
Isso é particularmente certo para as mulheres e as meninas.
Nos países de rendas baixa e média, uma mulher tem
21% menos probabilidade de ter um telefone celular do que um homem, e o mesmo
ocorre com relação ao acesso à internet.Embora as possibilidades de progresso
científico e tecnológico sejam praticamente ilimitadas, as mulheres e as
meninas estão ausentes nesses campos, especialmente no que se refere à criação
e tomada de decisões nos setores que transformam nosso mundo cotidiano.
Em setembro de 2015, a Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas (ONU) declarou 11 de fevereiro Dia Internacional
da Mulher e da Menina na Ciência. Coincidindo com a adoção dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS), ou a Agenda 2030, e a convocação para a
igualdade de gênero em geral – que o Objetivo 5 inclui especificamente–, este
dia tem o potencial de repercutir em todo o mundo.
A ciência e a tecnologia têm a ver com o cotidiano.
Têm o poder de alterar e mudar as trajetórias, já que influem cada vez mais em
todos os aspectos da vida, como as oportunidades econômicas e a aplicação de soluções
em outros setores produtivos.A ciência e a tecnologia poderiam ajudar as
mulheres a criar empresas, melhorar os resultados sanitários (entre eles a
saúde sexual e reprodutiva), a energia, o ambiente e a gestão dos recursos
naturais, bem como o desenvolvimento da infraestrutura.
Vemos oportunidades, especialmente mediante a
tecnologia da informação e da comunicação (TIC), para melhorar a educação, as
oportunidades de aprendizagem e o desenvolvimento de aptidões, para o diálogo
com a juventude, a participação política e para que mulheres e meninas defendam
seus interesses, seus direitos e a transformação social.
As oportunidades econômicas são inúmeras.
Calcula-se que o valor dos setores da mudança climática e das tecnologias
limpas chegará,na próxima década, a US$ 6,4 bilhões, e que o valor da economia
digital, somente no Grupo dos 20 países industrializados, é de US$ 4,2 bilhões.
Existe uma grande disparidade de oportunidades com
relação aos trabalhadores qualificados digitalmente, de 200 milhões de pessoas.
Calcula-se que até 90% dos empregos do setor formal exigirão formação em TIC.
Na energia e na agricultura serão necessários, somente na África subsaariana,
2,5 milhões de engenheiros e técnicos para melhorar o acesso à água limpa e ao
saneamento.
A ciência e a tecnologia são intrínsecas ao
desenvolvimento sustentável, à cidadania e à capacitação pessoal. Os ODS
reconhecem essa realidade mediante a inclusão de um indicador de meio de
aplicação que oriente a comunidade mundial no sentido de “melhorar o uso da
tecnologia instrumental, em particular a tecnologia da informação e das
comunicações, para promover o empoderamento da mulher” (Objetivo 5b).
A capacidade das mulheres para terem acesso e se
beneficiarem desses setores, bem como de influir neles, terá um impacto direto
na possibilidade de conseguirmos nossos objetivos para um planeta 50:50 até
2030. Se as mulheres são excluídas dessas revoluções do século 21, não
conseguiremos a igualdade entre os gêneros.
O contexto do Financiamento para o Desenvolvimento
estabelece os vínculos adicionais entre a igualdade de gênero, o empoderamento
das mulheres, e a ciência e tecnologia. Com o estabelecimento do Mecanismo da
Tecnologia (que será guiado por um painel de alto nível, integrado em 50% por
mulheres), teremos a oportunidade de colocar em prática e promover o
aprendizado e o investimento em torno dessas conjunturas fundamentais.
A Comissão da Condição Jurídica e Social da Mulher
(em 2011 e 2014) e a revisão 20 anos depois da Plataforma de Ação de Pequim (2015)
abordaram esse complexo tema das meninas e das mulheres na ciência e na
tecnologia, e apresentaram várias recomendações.Foram identificadas boas
práticas novas e estabelecidas, mas temos a necessidade urgente de ampliar os
êxitos de todos os interessados e vincular os bons enfoques entre si, para
construir caminhos e soluções mais completos.
A revisão dos dez anos da Cúpula Mundial sobre a
Sociedade da Informação (CMSI) também reforçou os compromissos em torno da
igualdade de gênero e do papel da ONU Mulheres. Um plano de ação que sintetiza
os compromissos de gênero e as TIC,por meio de inúmeros marcos normativos,
incluída a CMSI, também foi apresentado para fomentar a participação dos
interessados. Não se pode subestimar a urgente necessidade de se acelerar a
aplicação de todos esses compromissos e recomendações.
A evidência mostra que os avanços não são
automáticos. O número de mulheres em ciência, tecnologia, engenharia e
matemática (CTIM) diminui progressivamente da escola secundária para a
universidade, nos laboratórios, no ensino, na formulação de políticas e na
tomada de decisões.Há grandes disparidades no acesso das mulheres à
participação e à liderança dentro dos setores de ciência e tecnologia, embora
ocupem os primeiros lugares no uso de energia, na adaptação à mudança
climática, na produção econômica e possuam extensos conhecimentos tradicionais.
No setor formal da ciência e tecnologia, as
mulheres em todo o mundo constituem menos de 10% do pessoal nos centros de
inovação, dos quais recebem fundos de investidores, e apenas 5% das integrantes
das academias nacionais em disciplinas científicas e tecnológicas.
É bem acentuadaa falta de conexão entre a interação
prática e habitual das mulheres com a ciência e tecnologia, e sua capacidade
formal para aproveitar esses setores e conseguir que seus conhecimentos, suas
perspectivas e sua liderança sejam valorizados. As razões dessa ausência de
conexão são muitas, e incluem falta de acesso a tecnologia, educação e
investimento, ambientes de trabalho com escasso apoio, crenças culturais e
estereótipos.
Em nível mundial, as meninas começam a se afastar
dos cursos de CTIM na escola secundária. As atitudes sociais e os preconceitos
são obstáculos à sua participação, já que ciência e tecnologia costumam ser
consideradas um domínio masculino.
A ONU Mulheres trabalha para que as mulheres e as
meninas participem desses setores, com muitos programas dedicados a aproveitar
o poder das TIC. Realizamos iniciativas de educação digital e desenvolvimento
de aptidões em TIC no Afeganistão, Guatemala e Jordânia, entre outros países, e
apoiamos sistemas de pagamento e de informação por celulares para os
agricultores e as mulheres de pequenas empresas em Papua-Nova Guiné e na África
oriental.
A ONU Mulheres também apoia o desenvolvimento de
aplicativos e jogos por celulares para sensibilizar sobre a violência de gênero
e apoiar as sobreviventes no Brasil e na África do Sul. Nos associamos com a
União Internacional de Telecomunicações para lançar um novo prêmio de
tecnologia internacional, que reconheça as contribuições de destaque de
mulheres e homens no aproveitamento das TIC para promover a igualdade de
gênero.No âmbito das políticas, nos dedicamos em nível mundial e nacional à
promoção das meninas e das mulheres nas CTIM.
No Dia Internacional da Mulher e da Menina na
Ciência, devemos celebrar os incríveis êxitos das mulheres na ciência,
tecnologia e inovação, mas também galvanizar a comunidade mundial para que se
esforce mais em conseguir que a participação feminina no setor formal não seja
a exceção, mas a norma, enquanto no setor informal, onde impera o engenho das
mulheres, estas sejam reconhecidas e tenham apoio.
*Laksmi Purié subsecretária-geral da
Organização das Nações Unidas (ONU) e diretora executiva adjunta da ONU Mulheres.
Fonte: ENVOLVERDE
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