sexta-feira, 1 de abril de 2016

Caminhos desiguais na produção elétrica.
O Projeto Hidrelétrico Reventazón entrará em funcionamento neste primeiro semestre de 2016 e aportará a quinta represa à matriz elétrica da Costa Rica. Foto: Instituto Costarriquenho de Eletricidade.

Diego Arguedas Ortiz, da IPS – 

São José, Costa Rica, 29/2/2016 – Na última década a América Central conseguiu reduzir sua dependência dos combustíveis fósseis na geração elétrica ao mesmo tempo em que aumentou sua cobertura, mas os caminhos que cada nação seguiu mostram as profundas disparidades que persistem dentro do istmo para o setor.A mescla entre grandes usinas hidrelétricas, projetos comunitários com painéis solares ou turbinas eólicas e centrais de carvão e petróleo provocam diferenças tanto em suas matrizes elétricas atuais como em seu planejamento futuro.

“O questão não é se atende ou não a demanda, mas quais são as fontes que estamos usando para gerar eletricidade”, destacou à IPS o pesquisador Diego Fernández, do Programa Estado da Região (PER), elaborado pelo Conselho Nacional de Reitores da Costa Rica (estatal). Cada vez mais centro-americanos são cobertos pelas redes de cada país,disse. O índice de eletrificação passou, em média, de 69%, em 2000, para 90%, em 2013, segundo um estudo conjunto entre o Estado da Região e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

“Os principais avanços da região (na questão energética) ocorreram no subsetor elétrico”, afirma esse informe, publicado em outubro de 2015.Entretanto, esse crescimento não é uniforme. Na própria eletrificação, os nicaraguenses ainda contam com uma cobertura próxima dos 75%, muito inferior à média, enquanto os costarriquenhos a superam, com 99%. As fontes escolhidas para gerar eletricidade mostram evidências mais claras das prioridades energéticas dos países.

A Costa Rica libera a geração com fontes limpas, com mais de 95% do total fornecido por esse tipo de fonte. Por outro lado, Honduras e Nicarágua ainda têm matrizes elétricas mais contaminantes, com cerca de metade de sua geração proveniente de usinas que em sua maioria utilizam bunker, um combustível resultante do destilado de hidrocarbonos com baixa qualidade e baixo preço, o que incide diretamente na saúde de seus habitantes e nas economias.

A evidência mais clara de que as decisões elétricas têm um impacto direto nas contas de cada país é a fatura petroleira, que é o dobro para os países que utilizam combustíveis fósseis para gerar eletricidade, em relação à daqueles com maior predomínio de fontes renováveis.“Nos países que produzem mais energia elétrica a partir de fontes renováveis, como a Costa Rica, a fatura petroleira é de quase 5% do produto interno bruto (PIB). Em Honduras e Nicarágua, essa fatura vem sendo de 12%”, apontou o pesquisador.

A América Central, com população global de 48 milhões de habitantes, é importadora de hidrocarbonos, utilizados principalmente para o transporte e em menor medida na geração de eletricidade. Assim, a conta do petróleo centro-americana passou de 3,5% do PIB, em 2000, para 8,5%, em 2014, segundo dados do PER e da Cepal. Apesar disso, o conjunto regional saiu à frente e, entre 2003 e 2014, a geração instalada foi do tipo renovável.
As disparidades na América Central mostram países, como Costa Rica, com matriz elétrica baseada quase totalmente em renováveis, e outros, como a Nicarágua, com metade de sua produção gerada a partirde combustíveis fósseis.

“Graças aos acordos regionais e políticas nacionais, aumentou a participação das energias renováveis, o que permitiu reverter a tendência de redução dessas energias e aumentar sua participação de 57% para 64%”, ressaltou à IPS o chefe da Unidade de Energia e Recursos Naturais da Cepal, Víctor Hugo Ventura.Este especialista, de origem guatemalteca, diz que a região ainda prioriza a hidroeletricidade, mas que os grandes e médios projetos são atrasados pela oposição social e ambiental. Mesmo assim, é complicado definir o estado da geração elétrica na região como um todo, ou mesmo em certos países.

O caso guatemalteco é exemplar: entre 2009 e 2014, conseguiu aumentar sua porcentagem de energia renovável de 50,7% para 56,1%, segundo a Cepal, mas ainda investe em usinas a carvão, a energia mais contaminante.Em 2014 começou a funcionar nesse país a usina de carvão mineral de propriedade da Jaguar Energy Guatemala, subsidiária da companhia norte-americana Ashmore Energy International, que, com custo estimado de US$ 750 milhões e capacidade instalada de 300 megawatts (MW), se converteu na maior usina elétrica do país.

Ventura destaca que essa iniciativa não necessariamente implica uma diversificação para o carvão, mas uma falida decisão conjuntural, tomada quando o preço do petróleo subiu em 2007. “Problemas nos geradores obrigaram a parar as operações, e atualmente não produz eletricidade. Às vezes o barato sai caro”, explicou.O especialista prevê um aumento do consumo centro-americano de gás natural, que também é um combustível fóssil, na próxima década.

Entretanto, a região centro-americana (composta por Belize, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e Panamá) recebe há anos pedidos para reduzir sua dependência dos combustíveis fósseis para geração elétrica.A região, em sua maioria, atendeu o pedido, mas continua dando vida a usinas de carvão e bunker, algo que os informes internacionais criticam. “O cenário é muito favorável para a energia eólica, cuja capacidade cresceu quase dez vezes durante o presente milênio”, diz o informe conjunto do PER e da Cepal.

Três países têm importantes centrais desse tipo: Costa Rica, Honduras e Nicarágua, sendo que, neste último, a energia solar representava,em 2013, 14,8% da produção interna de eletricidade. Essas fontes não convencionais permitem também eletrificar as comunidades isoladas e em zonas rurais, onde a organização comunitária tem um papel importante.“Pode-se mencionar vários casos de instalação de painéis solares, nos quais a instalação e manutenção ficam nas mãos de mulheres empresárias treinadas na Índia”, afirmou Ventura do escritório sub-regional da Cepal no México.

Entretanto, tampouco a inclusão de novas energias renováveis é perfeita e os centro-americanos devem ter em conta a variabilidade e a mudança climática em seus planejamentos de longo prazo, especialmente em usinas hidrelétricas, ao mesmo tempo em que consideram suas emissões de gases-estufa.

“A mudança climática representa grandes desafios para a região, onde também devemseeconsiderados os efeitos e impactos desse fenômeno nos recursos renováveis e sua disponibilidade para gerar energia menos contaminante”, pontuou à IPS a advogada especialista em sustentabilidade,AlejandraSobenes, representante junto ao Conselho Nacional de Mudança Climática e ex-vice-ministra de Recursos Naturais da Guatemala.

Em seu país, assegurouSobenes, é reconhecida a necessidade de se tomar medidas para evitar um déficit no abastecimento elétrico a partir de 2026. “Mas sempre deve serconsiderado o compromisso de se reduziras nossas emissões em pelo menos 11,2%, ou 22,6% em um cenário mais ambicioso. Isso tornará relevante rever o uso de carvão”, afirmou, da capital guatemalteca.

Outro problema supõe a própria inconsistência das fontes mais acessíveis: vento e sol. “Agora, com a energia solar e a eólica, se facilita muito a inserção de fontes renováveis na matriz elétrica da região, mas com um problema: essas fontes, embora sejam renováveis, têm a variabilidade como inconveniente”, observou à IPS o diretor de planejamento elétrico do estatal Instituto Costarriquenho de Eletricidade, Javier Orozco.

Cada país enfrenta a variabilidade como pode: uma estratégia é recorrer à energia geotérmica, abundante na região e ainda pouco explorada. Outra opção é construir enormes represas que permitam liberar água quando falharem o sol e o vento, e uma alternativa final que é queimar combustíveis fósseis.“Na Costa Rica decidimos pela solução tecnológica mais adequada: as represas hidrelétricas, onde armazenamos energia, ou água, e a liberamos quando necessário”, enfatizou Orozco.


Fonte: ENVOLVERDE

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