O que
está por trás da desconfiança em relação aos partidos no Brasil.
Por Raphael Concli, da Agência USP –
Pesquisa
discute persistência de sentimento generalizado de descrença e seus efeitos nas
instituições políticas e eleitores.
As brasileiras e os brasileiros em sua maioria não
confiam em partidos políticos, independente de gênero, raça, escolaridade ou
idade. E quanto pior a avaliação dos cidadãos a respeito de fatores como
economia e corrupção, maior a desconfiança. Mas estas são constatações que a
literatura em ciência política já conhece.
Ocorre que mesmo quando a percepção é de que há
melhora nestes indicadores, isso não se traduz em confiança nos partidos,
apenas diminui a hostilidade em relação a eles. Partidos são vistos como
instituições que quebram as expectativas de que irão cumprir suas funções e
atender aos interesses daqueles que os elegeram.
Estas são conclusões obtidas pela pesquisa de
mestrado em Ciência Política Por que os brasileiros não confiam em
partidos políticos?, de Eduardo Alves Lazzari, defendido na Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Pesquisa mostrou que mesmo quando avaliação sobre
situação do País melhora, isso não se transmite aos partidos – Foto: Raphael
Concli
“Se a única coisa que uma avaliação positiva
provoca é a neutralização daquele indivíduo, isso reflete a dificuldade que
partidos políticos têm de se fazerem presentes e gerar algum tipo de apoio na
sociedade.”
Na abordagem da pesquisa, confiar é considerar que
seus interesses serão levados a cabo por aquele em quem se confia, mas é também
assumir um risco: o de que esta expectativa seja frustrada. Logo, quem
desconfia entende que seus interesses não serão representados e defendidos por
uma pessoa ou instituição, e que não vale a pena assumir o risco da confiança.
É disto que tanto partidos como os próprios políticos são alvos.
No Brasil é difícil encontrar índices que mostrem a
existência de confiança antes dos anos 1980. Isso impede que se fale em um
rompimento de confiança. Desde o final da ditadura civil-militar, a confiança
em partidos sempre foi baixa e só viria a decair ao longo dos anos.
“Se o arranjo político não é capaz de concretizar
todas as demandas que ele mesmo gera, a cada período eleitoral há um
aumento da insatisfação. Você tem a percepção reforçada de que pode votar, mas
que aquele candidato não irá entregar o que de fato está prometendo.” Esta
situação torna-se um círculo vicioso, gerando o que o pesquisador chama de
“cultura de desconfiança”, a qual torna bastante improvável que a percepção a respeito
dos partidos se altere.
Os dados utilizados pelo pesquisador vêm do
estudo Brasil, 25 Anos de Democracia – Balanço Crítico: Políticas
Públicas, Instituições, Sociedade Civil e Cultura Política, elaborado pelo
Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas (Nupps) da USP. Como
a pesquisa ressalta, trata-se de um momento em que se observa crescimento
exponencial da insatisfação dos brasileiros diante dos partidos, revelando um
quadro em que teria se tornado “cultural e normativamente defensável
desconfiar de partidos políticos”.
Partidos não sabem lidar com rejeição
Como autoridades políticas e partidos são as
principais figuras da política institucionalizada, a desconfiança quanto ao
partido atinge também os políticos, argumenta Lazzari. Um cenário como
este favorece a ascensão de figuras que, justamente, procuram se afastar da
figura do político tradicional, apresentando-se como algo “novo” e, portanto,
sem motivo para ser alvo de desconfiança. E os partidos não sabem lidar
com isso, considera o pesquisador.
Partidos
políticos mantém monopólio ao lançamento de candidaturas no Brasil, tensão a
ser enfrentada para que movimentos sociais institucionalizem suas preferências.
Foto: Raphael Concli.
Esta lógica já operava em candidaturas como a de
Marina Silva à presidência em 2014 com sua ideia de “nova política” ou a de
Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo em 2012, que também investia na ideia
de ser algo novo. Já a vitória de João Doria em São Paulo seria um exemplo mais
recente do fenômeno em que candidaturas se constroem em choque com seus
partidos.
“Ou os partidos investem no candidato que aparece
como gestor, e correm o risco de perder o controle do processo, ou investem em
figuras mais ligadas a políticas institucionalizadas, correndo risco de perder
a eleição”, diz Lazzari. No processo há grandes chances de que a própria
instituição partidária sofra rachas, como ocorreu com o PSDB e, nos Estados
Unidos, com o Partido Republicano.
Desconfiar de partidos é rejeitar a política?
Apesar da rejeição massiva aos partidos, observa-se
no Brasil grande apoio à democracia, segundo Lazzari. “Muito embora
haja um nível muito pequeno de pessoas que confiam em partidos políticos,
existe um nível elevado de pessoas que dizem que a democracia é a melhor
forma de governo a despeito de todos os seus defeitos.”
O apoio do cidadão sobre a democracia tem múltiplas
dimensões, como afirma o pesquisador, sendo possível ter pouca confiança em
partidos políticos, mas apoiar o regime democrático, o reconhecendo como melhor
forma de governo simultaneamente. Assim, ao invés de se distanciar da política,
o cidadão passa a se engajar para aprimorar, de alguma maneira, este regime,
sendo o que a literatura entende como cidadão crítico.
“Há interesse em algum tipo de engajamento
político. Mas ele não é feito por meio da política institucionalizada, por meio
de partidos políticos”, afirma Lazzari. ONGs ou movimentos sociais são alguns
dos espaços para onde este interesse se volta. Entretanto, mesmo estas
organizações não conseguem sempre escapar aos partidos ou à política institucionalizada,
com a qual precisam entrar em contato quando ganham volume e visam a
institucionalizar suas posições, pondera o pesquisador.
A pesquisa de Lazzari teve orientação do
professor Jose Álvaro Moisés.
Mais informações: e-mail eduardo.lazz@hotmail.com,
com Eduardo Alves Lazzari
Fonte: ENVOLVERDE
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