Mobilização internacional para
que o ecocídio seja considerado delito universal.
Ativistas se mobilizam pela instituição do ecocídio
para coibir crimes ambientais
IHU
As constantes agressões ao ambiente
natural cometidas por grandes grupos econômicos, com a complacência de
governos e dispositivos legais, têm levado a uma mobilização em nível
internacional para que o ecocídio seja
considerado delito universal. Esta é a proposta do jurista espanhol Baltasar
Garzón, para quem os ataques sistemáticos contra a natureza por parte de
corporações, que promovem explorações arbitrárias e abusivas, demandam novos
desafios, em um cenário em que os governos não avançam na formulação de
políticas e leis de proteção integral. Para que isso ocorra, é necessário uma
alteração do Estatuto de Roma, que criou a Corte Penal Internacional.
Isso se constitui em uma esperança para quem considera a natureza
como um sujeito de direitos.
A advogada escocesa Polly Higgins,
uma das mais renomadas ambientalistas do mundo, é uma das defensoras que os crimes
ambientais sejam tratados como ecocídio. Ela lembra
que em 1996, quando se discutiu o Estatuto de Roma (assinado
em 1998), os crimes ambientais foram incluídos, mas depois acabaram eliminados
da redação final por pressão de várias potências, como Estados Unidos,
Reino Unido e França, além de grandes
corporações multinacionais de agricultura, energia
nuclear e combustíveis fósseis. Para a advogada, é
preciso retomar o que foi perdido no Estatuto de Roma.
A falta de um ordenamento legal que trate desses
temas cria situações como a verificada no Equador em relação a
Texaco, que operou no país entre 1964 e 1992. A empresa, que atualmente integra
a norte-americana Chevron, deixou na Amazônia
equatoriana dejetos provenientes do vazamento ocorrido durante
exploração de petróleo. Estima-se que 500 mil hectares e a saúde de milhares de
pessoas foram afetados pelo resíduos.
Um grupo de índios iniciou uma disputa judicial
para obter reparação, mas a batalha nos tribunais já dura 24 anos, desde que a
empresa deixou o Equador, e quase nada se conseguiu. Em 2013,
os indígenas obtiveram uma importante vitória, quando um tribunal condenou a
Chevron a pagar 9,5 bilhões de dólares. No entanto, este valor não
pode ser cobrado, pois a empresa deixou o país e não há como executar a
sentença. O Equador tenta que Brasil, Argentina
e Canadá bloqueiem ativos da companhia para que a sentença
possa ser cumprida.
Garzón protesta que não há
estruturas internacionais fortes em condições de exigir a responsabilização da
matriz da empresa. Conforme o jurista, se hoje ocorrer um genocídio, haverá uma
resposta nacional ou na Corte Penal Internacional. “Essa
resposta internacional é o que falta nos casos de crimes contra o meio
ambiente“, defende.
Extrativismo
Extrativismo
Os problemas decorrentes da exploração dos
ambientes naturais são verificados em vários países da América Latina.
Na Argentina, por exemplo, o extrativismo está entre as
principais atividades econômicas, com o objetivo de abastecer mercados globais.
Isso vem devastando um volume expressivo de recursos do país, principalmente
por conta da mineração e das monoculturas.
Há uma peculiaridade no país, onde ocorrem quase
todos os tipos de exploração do ambiente: mineração, indústria
petrolífera, agricultura e pesca. O
resultado é uma forte subordinação à globalização e um
conjunto de impactos negativos na sociedade e na natureza, que superam os
benefícios advindos da economia.
O ambientalista Eduardo Gudynas
avalia que, frente a essa situação, é indispensável buscar alternativas para se
sair da dependência desse modelo e encontrar substitutos para os projetos
extrativistas. O país está começando a promover essas discussões, ao mesmo
tempo em que surgem posicionamentos de que essas críticas e resistências não
bastam, pois, sem mineração, não haveria desenvolvimento, ou ainda que, sem o
plantio de soja, a economia nacional entraria em colapso. O pós-extrativismo
obriga a reflexões políticas importantes, entre elas o questionamento do quanto
é uma alternativa passar de una mineração transnacionalizada para um modelo
estatal.
Gudynas, projetando uma
transição pós-extrativista, propõe alguns cenários possíveis levando em conta
não apenas a realidade da Argentina, mas também discussões
realizadas em países vizinhos. Na Argentina, o segmento extrativista mantém uma
fatia relevante da economia, situação que não pode ser deixada de lado na
discussão. Os commodities oriundos do extrativismo
respondem por 70% das vendas externas do país, sendo que 40% se referem à soja
e a outros cultivos agrícolas. Os números são tão expressivos que geraram um
superávit na balança de comércio exterior nos últimos anos.
Há um elevado custo ambiental. A mineração
e o plantio de soja, por exemplo, geram vários tipos de
impactos, entre eles, contaminação de solos e água, desflorestamento,
deterioração dos solos por conta da monocultura e danos
provocados em populações que vivem em áreas atingidas. Esse conjunto de
situações acaba gerando muitos conflitos locais, afetando o ambiente e a
qualidade de vida das pessoas. Para agravar o cenário, empresas e o Estado
hostilizam, criminalizam e judicializam a resistência das comunidades. O extrativismo
não melhorou a vida da população, mas não é oferecida nenhuma alternativa
econômica a longo prazo.
Retrocesso no Brasil
Retrocesso no Brasil
No Brasil, vários retrocessos
são verificados nos últimos anos em relação à defesa do ambiente natural.
Parlamentares antiindígenas conseguiram aprovar no Congresso Nacional
a Proposta de Emenda Constitucional 215, com a qual pretendem
não apenas impedir a demarcação das terras indígenas, mas também redefinir as
terras já regularizadas e abri-las para a exploração do latifúndio
e agronegócio. É o que afirma o Manifesto de Palmas em defesa
da vida e da Mãe Terra, publicado no dia 30 de outubro de 2015.
Mais recentemente, no dia 11 de julho, o
presidente Michel Temer sancionou a Medida Provisória
– MP 759/2016, também conhecida como MP da Grilagem.
Conforme o site do Senado, ela “dispõe sobre a regularização
fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos
aos assentados da reforma agrária e sobre a regularização
fundiária no âmbito da Amazônia Legal”.
Ambientalistas apresentam leitura distinta e temem pelos desdobramentos dessa
MP. O coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil,
Márcio Astrini, é taxativo: “Sua aprovação foi uma vitória de bancadas como a
ruralista”. Astrini conta que grande parte da MP foi redigida
por grupos de interesse instalados no próprio Congresso.
“Esses personagens há muito tempo querem ver aprovados retrocessos como os
contidos na 759, porém muitas de suas propostas sempre tiveram bastante
dificuldade para serem aprovadas, porque são débeis em apoio popular, em
justiça social e mesmo por afrontarem a Constituição”, rememora. “A diferença é
que agora seus autores encontraram um presidente servil a seus propósitos.”
Fonte: IHU On-line
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