Clima
extremo ameaça a Ásia meridional.
Um homem anda de bicicleta em um povoado afetado
pela seca na região de Mahavellithanne, 350 quilômetros a nordeste de Colombo,
capital do Sri Lanka, onde a temperatura máxima passou dos 38 graus Celsius na
primeira semana deste mês. Foto: Amantha Perera/IPS
A Ásia meridional necessita de aproximadamente US$
73 bilhões ao ano, de agora até 2100, para adaptar-se ao impacto negativo da
mudança climática, se for mantida a atual elevação de temperatura.
Por Amantha Perera, da IPS –
Polonnaruwa, Sri Lanka, 20/10/2016 – O Sri Lanka
está cozinhando, literalmente. Na primeira semana deste mês, o Departamento de
Meteorologia registrou temperatura máxima entre dois e cinco graus acima da
média em algumas zonas do país. Na província Central do Norte, uma região vital
para o cultivo de arroz,chegou a 38,3 graus Celsius. A seca prolongada já
afetou cerca de 500 mil pessoas, o que levou numerosas agências governamentais
e o exército a distribuir água potável em algumas áreas.
No entanto, quando a ajuda não é suficiente ou
demora, as comunidades dependem de fornecedores privados que cobram de US$ 0,03
a US$ 0,07por cada garrafa de um litro.“Essa situação se mantém há três meses”,
afirmou o agricultor Ranjith Jayarathne. E a situação acaba sendo irônica,
porque há três meses a região sofria inundações.No começo de maio as fortes
chuvas associadas ao ciclone Roanu deixaram vastas partes do país debaixo de
água, o que causou deslizamentos de terra, deixando meio milhão de pessoas
desamparadas e mais de 150 mortas ou desaparecidas.
Mas não é só o Sri Lanka que sofre as severas
consequências da variabilidade climática.Um estudo do Banco de Desenvolvimento
Asiático (BDA) concluiu que toda a região da Ásia meridional poderá perder 1,3%
do produto interno bruto (PIB) anual combinado até 2050, mesmo se a elevação da
temperatura global for mantida em dois graus. Depois dessa data, as perdas
poderão disparar até cerca de 2,5% do PIB.
Se a temperatura global aumentar acima de dois
graus, as perdas chegarão a 1,8% do PIB até 2050, e a arrepiantes 8,8% até
2100, segundo o estudo do BDA. Enfrentar essa realidade não sairá barato. A
Ásia meridional necessita de aproximadamente US$ 73 bilhões ao ano, de agora
até 2100, para adaptar-se ao impacto negativo da mudança climática, se for
mantida a atual elevação de temperatura.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação
e a Agricultura (FAO) disse que as chuvas de monção foram mais copiosas do que
o habitual este ano, o que somado a uma série de tufões e tempestades
tropicais, entre junho e começo de agosto, causaram graves inundações
localizadas em vários países e diversas regiões, que deixaram centenas de
mortos, milhões de deslocados e enormes prejuízos para a agricultura e a
infraestrutura.
Também foram registradas perdas na pecuária, de
alimentos armazenados e de outros bens. Os países mais afetados são Birmânia
(Myanmar), Bangladesh, Butão, China, Índia, Nepal, Paquistão e Sri Lanka.Se o
clima atual se mantiver, países como Bangladesh e Sri Lanka sofrerão graves
consequências. O estudo do BDA diz que as perdas econômicas no primeiro
chegarão a 2% do PIB anual até 2050, as quais também poderão disparar para 8,8%
até 2100.
Além disso, a produção anual de arroz poderá cair
23% até 2080 nesse país, onde a agricultura emprega metade da população
economicamente ativa, o que afetaria cerca de 60 milhões de pessoas.Inclusive,
Daca poderia perder 14% de seu território para as aguas se o nível do mar
aumentar um metro, podendo ser pior para a região de Khulna e para o delicado
ecossistema costeiro de mangues de Sundarbans, destaca o documento.
No leste de Bangladesh, várias mulheres esperam
pela entrega de água potável na aldeia de Chenchuri, a 300 quilômetros da
capital Daca. Foto: Amantha Perera/IPS
Os vizinhos de Bangladesh também correm cada vez
mais riscos, de acordo com a avaliação do BDA. O Nepal poderá perder até 10% do
PIB até 2100,por causa do derretimento das geleiras e outros eventos climáticos
extremos, enquanto na vizinha Índia a produção agrícola poderia cair 14,5% até
2050, diz o informe.
Além disso, os oito mil quilômetros de costa da Índia
também estão em perigo pelo aumento do nível do mar. Atualmente, 85% das
necessidades hídricas do setor agrícola são cobertos com métodos de irrigação,
e estas poderiam crescer com o aumento da temperatura, pois as reservas
subterrâneas poderão se esgotar.
Por sua vez, o Sri Lanka já sofreu flutuações na
produção de arroz e outros cultivos nos últimos anos pelas variações das
monções. O BDA alerta para a possibilidade de a fundamental produção de chá
cair pela metade até 2080.O Programa Mundial de Alimentos (PMA) diz que o
rápido desenvolvimento que o paíshavia registrado já acusou o golpe desferido
pela extrema variabilidade climática.
OSri Lanka figura entre os países de baixa e média
rendas desde 2010, mas “as melhoras no desenvolvimento humano e na situação
nutricional de meninas e meninos, adolescentes e mulheres permanecem
paralisadas. O aumento da frequência dos desastres naturais, como secas e
inundações repentinas, aumentam a insegurança alimentar e nutricional”, diz o
PMA.
Cerca de 4,7 milhões de pessoas estão
subalimentadas, aproximadamente 23% da população, segundo o documento Estado da
Insegurança Alimentar no Mundo de 2015. Além disso, quase uma em cada quatro
crianças tem baixo peso e anemia. E, segundo uma análise do PMA sobre o custo da
dieta, 6,8 milhões de pessoas, ou 33% dos mais de 20 milhões de habitantes do
Sri Lanka, não podem arcar com o custo mínimo de uma dieta nutritiva.
Os especialistas dizem que esse país ainda tem
lições a aprender sobre as perdas cíclicas de colheitas que sofreu na última
década pela irregularidade do clima.
“As pessoas ainda devem compreender o alcance dos
eventos climáticos extremos”, pontuou à IPS Kusum Athukorala, uma das
presidentes do Grupo Assessor de Gênero para o Desenvolvimento dos Recursos
Hídricos do PMA. O Sri Lanka precisa de um plano de gestão que vincule todos os
atores e um programa sólido para criar consciência sobre a importância da água,
acrescentou.
Em um claro exemplo de má coordenação, o
Departamento de Irrigação se mostra contrário a ceder água para irrigar os
arrozais nas áreas afetadas pela seca. Os funcionários desse órgão argumentam
que não podem se arriscar a uma escassez hídrica. Athukorala também destacou a
necessidade de uma gestão hídrica em escala local. “As soluções devem vir de
todos os setores”, enfatizou.
Especialistas como Athukorala afirmam que, com uma
boa coordenação entre as agências nacionais, não haveria essas desconexões.
Funcionários governamentais da Ásia meridional compreendem a gravidade da
situação, mas dizem que seus governos estão diante de um delicado equilíbrio,
entre desenvolvimento e resiliência climática.
“Atualmente, a prioridade é fornecer alimentos a
cerca de 160 milhões de pessoas” (em Bangladesh), declarou Kamal Uddin Ahmed,
secretário do Ministério de Florestas e Ambiente. “Precisamos garantir que
temos políticas climáticas corretas e que não se reduza o crescimento”, explicou.
Fonte: ENVOLVERDE
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