Leguminosas
contra insegurança alimentar.
Agricultoras mostram orgulhosas parte de sua
colheita em uma aldeia vizinha à capital de Zâmbia. Foto: Busani Bafana/IPS.
As leguminosas são essenciais para a segurança
alimentar e nutricional na África. Além de serem fonte de renda, em particular
para as mulheres responsáveis pela alimentação de suas famílias.
Por Busani Bafana, da IPS –
Masvingo, Zimbábue, 14/10/2016 – A zimbabuense
Elizabeth Mpofu é uma aguerrida agricultora que se destaca entre os que
consideram que a segurança alimentar implica lutar contra a fome e evitar
práticas agrícolas que prejudicam o ambiente e empobrecem as pessoas,
especialmente as mulheres. Ela cultiva milho, leguminosas e diferentes tipos de
feijão em seu terreno de dez hectares em Masvingo, província que fica 280
quilômetros a sudeste de Harare, capital do país.
Apesar da seca que golpeia essa região, Mpofu
colheu cerca de 150 quilos de feijões secos este ano. É muito menos do que
obtém em uma boa temporada, mas as ervilhas e os feijões secos permitem que os
agricultores como ela enfrentem a insegurança alimentar e nutricional.A ervilha
e o feijão são leguminosas fundamentais, que propiciam vários benefícios, pois
são ricos em proteínas, resistentes à seca e constituem uma fonte de renda e de
combustível.
As leguminosas são um alimento perfeito para a
África, onde há muita gente malnutrida e com deficiência de nutrientes,
especialmente menores de cinco anos. O Programa Mundial de Alimentos (PMA) diz
que a África é o continente com maior proporção de pessoas famintas no mundo,
com uma em cada quatro com malnutrição e mais de uma em cada três crianças com
atraso no crescimento.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação
e a Agricultura (FAO) define leguminosas como sementes secas comestíveis, com
baixo teor de gorduras, como grão-de-bico, feijões,lentilha, fava e muitas
outras. As que são usadas como verdura, como a vagem, ou das que se extrai
óleo, como soja e amendoim, não são classificadas como leguminosas.
“As leguminosas são essenciais para a segurança
alimentar e nutricional na África, considerando a crise climática que vive o
continente”, destacou Mpofu à IPS. “Posso preparar vários alimentos para minha
família e também são importantes para melhorar o estado do solo, especialmente
para promover um sistema de cultivo agroecológico”, acrescentou.
Mpofu integra o Comitê de Coordenação Internacional
da Via Camponesa, organização internacional com milhões de agricultores
membros. Além disso, está entre os seis embaixadores especiais designados pela
FAO na África, para conscientizar sobre os benefícios das leguminosas para a
segurança alimentar, a mudança climática, a saúde humana e o bom estado do
solo.
“Sem leguminosas, uma mulher não pode se considerar
mãe, porque não pode completar um prato para sua família. É importante criar
consciência sobre sua importância para que as mulheres pressionem pela criação
de políticas que promovam a agroecologia e a soberania alimentar”, opinou
Mpofu. “Os princípios de manter e produzir sementes autóctones são nossa forma
de defender a soberania alimentar, promovendo nossas sementes e nossos métodos
de cultivo agroecológico”, apontou.
Posto de venda de leguminosas em um mercado de
Bulawayo, no Zimbábue. Esse cultivo de bom rendimento favorece a segurança
nutricional e econômica dos agricultores africanos. Foto: Busani Bafana/IPS.
Além disso, “as leguminosas servem para promover o
cultivo e o consumo de leguminosas na África, onde temos insegurança
alimentar”, ressaltou Mpofu. Como forma de destacar a importância das
leguminosas para a segurança alimentar e nutricional, bem como para a
sustentabilidade ambiental, a 68ª sessão da Assembleia Geral da Organização das
Nações Unidas (ONU), em 2013, declarou que 2016 seria o Ano Internacional das
Leguminosas (IYOP).
O diretor-geral da FAO, José Graziano da Silva,
pontuou, no lançamento do IYOP em 2015, que as leguminosas são importantes para
a segurança alimentar de milhões de pessoas na América Latina, África e Ásia, onde
fazem parte da dieta tradicional e costumam ser cultivadas por pequenos
agricultores.
No Malaui, Janet Mingo não passa fome, mesmo quando
tem uma colheita ruim de milho, o que ocorre com frequência devido à seca,
porque intercala esse cultivo com o de feijão-guandu (Cajanuscajan),
rico em proteínas, em seu terreno de quatro hectares na aldeia de Chikalogwe,
no distrito de Balaka, uma das regiões mais áridas do país.O guandu ajuda a
fixar o nitrogêniono solo e também é uma fonte de renda:ela colhe a cada
temporada cerca de 1.500 quilos e, graças ao que consegue com sua venda, pode
comprar milho e cobrir outras necessidades do lar.
O encarregado da Divisão de Desenvolvimento
Agrícola de Machinga, no sul do Malaui, Mphatso Gama, afirmou à IPS que os
agricultores que dependiam do milho se diversificaram e incorporaram o feijão
guandu, o que lhes permitiu melhorar sua alimentação e renda.
Gavin Gibson, ex-diretor executivo da Confederação
Mundial de Leguminosas, explicou à IPS que estas são parte da dieta tradicional
da maior parte dos povos mais pobres do mundo. Das 60 milhões a 65 milhões de
toneladas de leguminosas produzidas por ano, até há pouco tempo apenas entre
sete milhões e dez milhões eram comercializados entre os países. O restante
ficava para consumo interno dos países onde seu cultivo é tradicional,
acrescentou.
A Índia, onde as leguminosas são parte da
alimentação básica há milhares de anos, é o maior produtor e consumidor do
mundo. A África ainda tem problemas para aumentar sua produção, mas consegue
avanços. O Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA), que
desenvolveu mais de 80% das variedades de feijão-caupi distribuídas entre
agricultores da Nigéria, destaca que as leguminosas são uma fonte alternativa
de proteínas e mais barata do que a animal.
O feijão-caupi, cultivado tanto para consumo humano
como animal nas zonas semiáridas tropicais da África e da Ásia, é um dos
cultivos mais tolerantes à seca e se adapta a solos de má qualidade.As
leguminosas são estratégicas para se alcançar a segurança alimentar na África,
mas não tem seu cultivo priorizado, enfatizou Charles Govati, especialista em
desenvolvimento e presidente do Consórcio de Serviços de Suprimento Agrícola no
Malaui.
“As leguminosas são o alimento perfeito para a
África, mas sua produção é difícil porque não são implantadas boas políticas”,
ressaltou Govati à IPS. “Fala-se muito das leguminosas, mas há várias
dificuldades a superar, como baixa produção, mau estado dos solos, as pestes e
doenças que as prejudicam”, detalhou. “Os produtores se concentram mais em
plantar para gerar renda e menos para sua alimentação. Além disso, precisamos
de mercados estruturados na África para impulsionar a produção,se queremos
seriamente garantir a segurança alimentar”.
*Este artigo faz parte da cobertura especial da IPS
por ocasião do Dia Mundial da Alimentação, celebrado em 16 de outubro.
Fonte: ENVOLVERDE
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