Contato
com a natureza para formar cidadãos.
Por Camila Leporace, do Porvir –
Eden Project abriga um parque com espécies naturais
de todo o mundo e oferece atividades para crianças, além de material didático e
treinamentos especiais para escolas e professores.
O futuro da educação está na tecnologia, no uso de
recursos e ferramentas digitais, na programação e nos computadores e tablets.
Mas também está no contato com a natureza, na conscientização a respeito do
universo que nos cerca e no olhar que vai muito além das telas, sejam elas
grandes ou pequenas. Esse contato com o meio ambiente é a grande aposta
educacional do Eden Project, ou Projeto Éden.
O Eden Project é ligado a uma organização sem fins
lucrativos do Reino Unido, a Eden Trust, e se define como “uma organização
única e complexa” que é, ao mesmo tempo uma atração turística, uma organização
voltada para a assistência social e um empreendimento social. A atração
turística é um complexo localizado no condado de Cornwall (Cornuália), sudoeste
da Inglaterra, que busca reunir espécies naturais de todo o mundo preservadas
em estufas parecidas com grandes bolhas, que reproduzem biomas. O público tem
contato com diversas espécies vegetais. De maneira semelhante a um jardim
botânico, o espaço procura estimular seus visitantes a se conscientizarem sobre
a importância das plantas para a vida humana. O projeto tem programas de
pesquisa, educação e conservação.
O Eden realiza um trabalho bastante voltado para
crianças e jovens, oferecendo atrações e programação especial para os pequenos
no espaço físico de Cornwall e ainda material didático e treinamentos especiais
para escolas e professores, entre muitos outros recursos. O foco é na
sustentabilidade e na relação humana com a natureza. Segundo Sam Kendall,
gerente de Educação do Eden, colocar as crianças hiperconectadas de hoje para
aprender ao ar livre, fora do ambiente tradicional e fechado da sala de aula,
não é algo excludente, mas sim complementar, em relação ao uso das tecnologias.
Ela defende a importância de inserir o contato com a natureza no cotidiano dos
estudantes, e destaca que os efeitos são fáceis de serem percebidos.
“A questão é tornar normal a prática das atividades
ao ar livre, para que isso fique sendo parte do que acontece na escola. Como
acontece com qualquer atividade, algumas crianças amam esse tipo de prática e
outras nem tanto – mas durante essas atividades é comum ver habilidades e
talentos revelados que são difíceis de despontar na sala de aula. É claro que
tudo depende também dos estímulos – se criarmos experiências fantásticas,
atraentes, divertidas e poderosas, as crianças vão amar”.
Meio ambiente e atividades físicas
Pesquisas mostram que tem aumentado o percentual de
jovens diagnosticados com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH.
Sam Kendall traça um paralelo entre o crescimento dessa estatística e a falta
de atividades ao ar livre no cotidiano da maioria das crianças, e sobre isso
cita o trabalho da terapeuta ocupacional infantil Angela Hanscom, fundadora do
TimberNook – um programa desenvolvido para estimular a criatividade e as
atividades ao ar livre na Nova Inglaterra, Estados Unidos. Segundo Angela, as
crianças são forçadas a se sentar durante horas em sala de aula sem que estejam
preparadas para isso. E elas não estão preparadas porque a quantidade de
atividades físicas que fazem é muito menor do que precisariam fazer.
“Com seus sistemas sensoriais sem funcionar de
forma apropriada, as crianças são requisitadas a sentar e prestar atenção. Elas
naturalmente começam a ficar inquietas, de modo a conseguir o movimento que
seus corpos desesperadamente exigem e que não estão tendo o suficiente, para
que ‘liguem seus cérebros’. O que acontece quando as crianças começam a se
inquietar? Nós pedimos que elas se comportem, e assim seus cérebros novamente
‘adormecem’”, explica Angela.
Além de ter a capacidade de devolver às crianças os
movimentos naturais de que seus corpos jovens precisam, de estimular esse gasto
de energia necessário para o seu equilíbrio e de ajudar a desenvolver habilidades
sociais, Sam destaca que as atividades ao ar livre têm, ainda, a capacidade de
formar cidadãos preocupados com as questões ambientais. Ela explica que, para
que essa conscientização surja, é necessário que os jovens conheçam o meio
ambiente. “Se as pessoas não desenvolverem, desde cedo, um relacionamento com a
natureza, elas serão menos propensas a se tornarem defensoras desses recursos”.
Um bom exemplo de como fazer com que as crianças se
envolvam e se sintam parte do meio ambiente é estimular que elas mesmas
transformem seus espaços de convivência, como, por exemplo, dando vida aos
pátios das escolas. “É uma lição de cidadania muito importante a de identificar
um problema (os pátios das escolas costumam ser monótonos), trabalhar com
outras pessoas para melhorar a situação (com adultos e outras crianças para
transformar os espaços para brincadeiras ou criar mais áreas verdes nos
pátios), e depois sentir o benefício de viver e brincar nesses espaços. É um
autêntico treinamento para a formação de um cidadão envolvido em moldar o mundo
em que ele deseja viver”, estimula Sam.
Complexo na Inglaterra reúne espécies naturais de
todo o mundo preservadas em estufas.
Conteúdo online para escolas
O Eden Project esclarece que, apesar de os
benefícios do contato com a natureza serem conhecidos, muitas vezes há dúvidas
por parte dos educadores sobre como promover essas atividades. Para ajudar, o
projeto criou uma espécie de cartilha, além de disponibilizar em seu site
diversos planos de aula (em inglês) para serem usados por professores que
tenham interesse em despertar seus alunos para o universo natural ao seu redor.
Algumas das dicas para os professores os encorajam
a não esperar o local perfeito para começar a levar os alunos para essas
atividades, e sim lançarem mão daquilo que está ao seu alcance, e os preparam
para o fato de que, inicialmente, as crianças provavelmente não irão associar
as atividades ao ar livre ao aprendizado e sim à diversão.
O Eden oferece formação presencial para escolas no
Reino Unido. Mas pessoas de qualquer lugar do mundo podem se beneficiar do
conteúdo oferecido online no site do projeto, que contém planos de aula e
ideias bastante inusitadas e criativas para atividades a serem feitas fora do
ambiente da sala de aula com as crianças. Há dicas bem simples sobre, por
exemplo, como fazer potinhos para sementes com
jornal; um plano de aula voltado para entender como alguns animais vivem na escuridão;
um plano para uma aula sobre fósseis, entre muitos
outros materiais. Ainda que não sejam realizadas exatamente como sugerido no
passo-a-passo, as atividades podem servir como inspiração para quem desejar dar
os primeiros passos com pequenos ao ar livre.
Mais sobre o Eden Project
O Eden Project foi inaugurado em março de 2001. Ele
recebe mais de 850 mil visitantes por ano e reverte o lucro adquirido com a
visitação em uma série de iniciativas voltadas para a educação, que procuram
explorar o espaço físico e a experiência de pesquisadores e toda a equipe que
trabalha para preservar o local. No Eden, sustentabilidade é a palavra de
ordem. Procura-se reaproveitar todos os recursos naturais, e o incentivo a essa
prática é relembrado a todo momento. Com mais de duas milhões de plantas para
preservar e recebendo tantos visitantes por ano, o reaproveitamento da água,
por exemplo, é uma das principais preocupações.
O projeto inclui programas educacionais em tópicos
como mudanças climáticas, alimentação, nutrição, saúde, biodiversidade e uso
sustentável de recursos biológicos. Milhares de visitas escolares são recebidas
todos os anos. Além disso, o projeto tem iniciativas envolvendo, por exemplo,
populações africanas, como o Gardens for Life, que promove a criação de jardins
em escolas do Quênia e Gâmbia para garantir que os alunos tenham ao menos uma
refeição completa e saudável por dia. A equipe do projeto oferece treinamentos
e uma infraestrutura inicial para a realização dessas hortas, como material
para compostagem e irrigação e estufas construídas com materiais que
disponíveis nos locais. Também é montada uma sala de aula ao ar livre, e as
escolas são orientadas sobre como integrar as hortas ao currículo escolar.
Fonte: Porvir
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