Produzir
alimentos ou conservar florestas.
Por Baher Kamal, da IPS –
Roma, Itália, 22/7/2016 – O mundo enfrenta um
enorme desafio: por um lado, a necessidade imperiosa de produzir alimentos para
a crescente população mundial, por outro, a pressão de frear e reverter o
desaparecimento das florestas, tão necessárias para a vida humana como cobrir
as necessidades de sua dieta.
Desmatamento. Foto: FAO
As florestas têm um papel fundamental no
desenvolvimento da agricultura sustentável por vários fatores: ciclos da água,
conservação de solos, sequestro de carbono, controle natural de pestes,
incidência nos climas locais, e preservação do habitat dos polinizadorese de
outras espécies.
Mas a agricultura responde pela maior parte do
desmatamento. Nas regiões tropicais ou subtropicais, a agricultura comercial e
a de subsistência são responsáveis por 50% e 33%, respectivamente, da conversão
de florestas, e os restantes 27% do desmatamento ocorre pelo crescimento
urbano, pela expansão da infraestrutura e da mineração.
Para conseguir os dois objetivos, as agências da
Organização das Nações Unidas (ONU) encarregadas da alimentação e da
agricultura oferecem dados específicos que falam por si mesmos. “A agricultura
continua sendo a principal responsável pelo desmatamento e é urgente a
necessidade de promover interações mais positivas entre ela e a silvicultura,
para construir sistemas agrícolas sustentáveis e melhorar a segurança
alimentar”, destacou a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO).
Essa foi a principal mensagem do informe O
Estado das Florestas do Mundo, apresentado no dia 18 deste mês, na abertura
da sessão do Comitê Florestal da FAO (Cofo), que termina hoje. “A Agenda 2030
para o Desenvolvimento Sustentável e o Acordo de Paris sobre mudança climática
reconhecem que não podemos pensar a segurança alimentar e a gestão dos recursos
naturais separadamente”, pontuou o diretor-geral da FAO, José Graziano da
Silva.
Foto: FAO
“Os dois acordos exigem um enfoque coerente e
integrado da sustentabilidade de todos os setores da agricultura e dos sistemas
alimentares”, apontou Graziano. “As florestas e a silvicultura têm um papel
importante nesse campo. A mensagem do Cofo é clara: não precisa desmatar para
produzir mais alimentos”, ressaltou. A agricultura ocupa um lugar importante na
retórica sobre as florestas, mas a FAO destaca que estas cumprem muitas funções
ecológicas vitais que beneficiam a própria agricultura, já que incentivam a
produção de alimentos.
“A segurança alimentar pode ser obtida pela
intensificação da agricultura e de outras medidas como proteção social, em
lugar da expansão das áreas cultivadas à custa das florestas”, disse Eva
Müller, diretora da Divisão de Recursos e Políticas Florestais da FAO.
“Precisa-se é de melhor coordenação entre os setores das políticas agrícolas,
florestais, de alimentação e de uso da terra, bem como melhor planejamento do
uso da terra, marcos legais efetivos e maior participação das comunidades e dos
pequenos agricultores”, afirmou.
Para Müller, os “governos deveriam garantir às
comunidades locais não somente a posse da terra, como também direitos sobre as
florestas. Um agricultor sabe como manejar seus próprios recursos, mas costuma
carecer dos instrumentos legais para isso”.
Melhorar a segurança alimentar frear o desmatamento
O fato é que as florestas bem administradas têm um
potencial enorme para promover a segurança alimentar. Além de sua vital
contribuição ecológica, diz o informe a FAO. As florestas são um meio de
subsistência para as comunidades rurais e uma forma de aliviar a pobreza, ao
permitirem a geração de renda mediante a elaboração de produtos florestais e
serviços ambientais.
Cerca de 24 bilhões de pessoas usam lenha para
cozinhar e deixar a água potável. Além disso, as florestas oferecem proteínas,
vitaminas e minerais às comunidades e são uma alternativa em casos de escassez
de alimentos.Desde 1990, mais de 20 países conseguiram melhorar a segurança
alimentar porque mantiveram ou melhoraram sua cobertura vegetal, demonstrando
que não é necessário cortar árvores para produzir alimentos, segundo o informe
da FAO.
Os 12 países que aumentaram sua cobertura vegetal
são: Argélia, Chile, China, República Dominicana, Gâmbia, Irã, Marrocos,
Tailândia, Tunísia, Turquia, Uruguai e Vietnã. Seu êxito se baseou em um
conjunto de ferramentas: marcos legais efetivos, garantias na posse da terra,
medidas para regular a mudança de uso da terra, incentivos para a silvicultura
e a agricultura sustentável, fundos adequados e definições claras sobre papéis e
responsabilidades de governos e comunidades locais.
Foto: FAO
Casos de sucesso
O informe apresenta sete estudos de casos de
sucesso, de Chile, Costa Rica, Gâmbia, Geórgia, Gana, Tunísia e Vietnã. Esse
grupo de países, segundo o documento, ilustra as oportunidades de melhoria na
segurança alimentar, bem como o aumento ou a manutenção da cobertura vegetal.
Seis desses países conseguiram mudanças positivas entre 1990 e 2015 em dois
indicadores de segurança alimentar (prevalência de pessoas subalimentadas e o
número de pessoas subalimentadas), bem como no aumento da superfície
reflorestada.
No caso de Gâmbia, único país de baixa renda entre
os sete mencionados, se conseguiu o primeiro objetivo de reduzir pela metade a
proporção de pessoas com fome nesse período.O Vietnã, por exemplo, implantou
com sucesso uma reforma agrária para garantir a posse da terra, como forma de
impulsionar o investimento de longo prazo. O processo foi acompanhado de uma
mudança na gestão florestal, de uma silvicultura estatal para uma de múltiplos
atores, com a participação das comunidades locais, incluído o programa de
destinação de áreas florestais e contratos para sua proteção com os moradores
locais.
A reforma agrária também foi acompanhada de
instrumentos para aumentar a produtividade agrícola, como isenção de impostos,
empréstimos brandos, promoção da exportação, garantia de preços, apoio à
mecanização e redução das perdas de cultivos colhidos.
Na Costa Rica, o desmatamento atingiu seu máximo na
década de 1980, principalmente pela conversão de florestas em áreas de
pastagem. O país conseguiu reverter essa tendência graças a uma lei florestal
que proíbe mudanças no uso das florestas naturais e a um sistema de pagamento
por serviços ambientais, que oferece aos agricultores incentivos para plantar
árvores e apoio para a conservação florestal. Graças a essas medidas, a
cobertura florestal aumentou para quase 54% da superfície do país em 2015.
Na Tunísia, os planos de desenvolvimento nacional
reconhecem os benefícios das florestas em proteger a terra da erosão e da
desertificação. A produção agrícola aumentou com intensificação, que melhora o
uso das terras cultiváveis existentes mediante a irrigação, os fertilizantes, a
mecanização, melhores sementes e práticas agrícolas. Os incentivos para
fomentar o plantio de árvores incluem distribuição gratuita de sementes e
compensações pela perda de renda derivada da agricultura.
Os temas mais importantes da sessão do Comitê
Florestal da FAO buscavam responder diretamente aos acordos históricos de 2015
e pesquisar como as florestas e a gestão sustentável podem contribuir para o
sucesso dos objetivos de desenvolvimento acordados pela comunidade
internacional.
Na Semana Florestal Mundial, o Comitê avalia como
aproveitar melhor o potencial das florestas, incluída sua contribuição parao
sustento, a segurança alimentar, o emprego, a igualdade de gênero e muitos
outros dos objetivos de desenvolvimento incluídos na Agenda 2030 para o
Desenvolvimento Sustentável e no Acordo de Paris.
Fonte: ENVOLVERDE
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