Olimpíada
2016: o que descobrimos.
A Agência Pública acaba de lançar o Projeto
100, o maior levantamento multimídia já feito sobre as remoções
ocorridas no Rio de Janeiro por conta das obras para a Olimpíada deste ano.
Foram quatro meses de apuração, e o trabalho é resultado do primeiro
laboratório Transmitia da Casa Pública – o primeiro Centro Cultural de
Jornalismo do Brasil.
O projeto 100 é uma verdadeira maratona
jornalística
Esta reportagem especial busca investigar o que
aconteceu após as remoções causadas pelas grandes obras construídas para a
Olimpíada de 2016. É o momento em que a sede jornalística pelo fato noticioso
tende a murchar, deixando de lado uma parte vital da história: para onde as
famílias foram removidas? As vidas das pessoas melhoraram? As promessas do
poder público foram cumpridas?
As expulsões olímpicas deixaram um legado difícil
de esconder: violências psicológicas e físicas, relações sociais dilaceradas,
moradores endividados e sujeitos ao controle das milícias da zona oeste do Rio.
Não existem dados oficiais detalhados e
verificáveis sobre as remoções olímpicas no Rio, que se somam às massivas
demolições ocorridas em nome da Copa do Mundo em 2014. Diante da falta de
informações sobre essa penosa política, decidimos fazer o óbvio: escutar as
famílias expulsas de suas casas.
Para isso, usamos como parâmetro a estimativa do
Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro a respeito de três obras listadas como Legado dos Jogos Olímpicos – o BRT
Transolímpica, o BRT Transoeste e o Porto Maravilha – e as obras para reforma
do estádio do Maracanã, palco de partidas de futebol durante o evento
esportivo. O comitê identificou 2.548 famílias removidas apenas para esse
conjunto de obras. Decidimos ouvir 100 delas, uma amostra significativa do
total (cerca de 4%). Trata-se do mais extenso levantamento já feito com essas
vítimas de remoção, de interesse para pesquisadores, jornalistas, gestores de
políticas públicas e qualquer um que queira ouvir seus relatos. Uma base de
dados viva, e interativa.
Não foi fácil. Nossa equipe de reportagem, composta
por quatro jornalistas mulheres, passou meses buscando contatos a partir de ex-moradores,
lideranças, ONGs, o Comitê Popular, pastorais. Batemos também de porta em porta
em conjuntos habitacionais construídos para receber esse contingente, os
condomínios do programa Minha Casa Minha Vida.
Aos poucos, essas famílias foram abrindo suas
portas e as suas vidas para nós. Muitas venceram o medo impingido por condições
assustadoras – como a constante vigilância de milícias nos condomínios – para
nos contar o que aconteceu depois da remoção, quando os gravadores e as câmeras
das TVs já estavam desligados. O conjunto de histórias apresentado aqui revela
padrões assustadores que serão sem dúvida um dos maiores legados das remoções
forçadas por causa do megaevento. A síntese dessas revelações está na
reportagem “O que descobrimos”.
Em maio, tivemos a ajuda de 19 alunos da
universidade ESPM Rio, graças a uma parceria coordenada pela professora Monica
Mourão e o coordenador de Jornalismo, Pedro Curi. Os intrépidos estudantes aprenderam
em pouco mais de duas semanas como nós, da Pública, fazemos reportagens: com os
pés na rua. Encararam as longas viagens de transporte público, lama nos
sapatos, visitas a locais insalubres, muitos “nãos” e muitas lágrimas durante a
apuração.
Também colaboraram a repórter Lena Azevedo e o
fotógrafo JV Santos, que cederam histórias apuradas anteriormente a este
projeto. E os fotógrafos AF Rodrigues e Luiz Baltar nos brindaram com seu
cuidadoso olhar – são deste último as imagens do vídeo de abertura.
Graças ao empenho dos nossos repórteres,
conseguimos entrevistar pessoalmente e registrar 62 histórias contadas pelos
próprios moradores. Elas foram produzidas em formato multimídia e dispostas
pela equipe da editora criativa Olga Lucía Lozano neste especial online, no
qual cada usuário pode navegar como preferir, permitindo uma multiplicidade de
leituras e descobertas. O design é da colombiana Lorena Parra e o
desenvolvimento do iraniano Babak Fakhamzadeh. Conheça aqui
toda a equipe que tornou esse projeto realidade.
Agora, os 38 depoimentos que faltam só serão
concluídos se o público se engajar. Por isso, lançamos um chamado a moradores
removidos, jornalistas, midialivristas, estudantes de jornalismo, ativistas,
pesquisadores que queiram contribuir com essa maratona, nos ajudando a
completar nosso pódio de expulsões e violações de direitos humanos, o maior
Legado da Olimpíada de 2016: 100 histórias, 100 expulsões olímpicas.
O projeto 100 ultrapassa, ainda, este site na
internet. Ele é mais que um projeto de jornalismo multimídia. Ele se completa
com objetos artísticos dispostos na Casa Pública, o primeiro centro cultural de jornalismo do
Brasil, em Botafogo, na capital fluminense, numa transposição do jornalismo
para novas linguagens – a arte, a fotografia, a instalação – que juntas formam
o primeiro especial transmídia da Agência Pública.
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