El Niño
abranda e La Niña chegará logo.
A região de Hararghe ocidental, na Etiópia, em
dezembro de 2015. Cerca de 10,2 milhões de pessoas sofrem insegurança alimentar
no contexto de uma das piores secas registradas nesse país africano em décadas.
Foto: Stephanie Savariaud/WFP
Por BaherKamal, da IPS –
Roma, Itália, 19/7/2016 – O fenômeno El Niño de
2015-2016 é um dos mais fortes até agora e o La Niña, que poderá golpear em
breve, agravaria a severa crise humanitária que afeta milhões de pessoas nas
comunidades mais vulneráveis de dezenas de países, especialmente na África e
Ásia Pacífico. El Niño é como se conhece o aquecimento do Oceano Pacífico
oriental equatorial que ocorre de forma cíclica a cada três a sete anos.
Este fenômeno, conhecido como El Niño-Oscilação do
Sul, eleva a temperatura da superfície do mar e altera os sistemas climáticos
do mundo, gerando chuvas copiosas em algumas regiões e seca total em outras, ao
contrário do que ocorre habitualmente.A fase de esfriamento, conhecida como La
Niña, gera chuvas intensas nas zonas afetadas pela seca durante o El Niño e
inundações onde já havia caído chuvas em abundância.
O El Niño destrói colheitas, mata o gado e afeta o
sustento de milhares de pessoas. Mas um dos maiores impactos é contra meninos e
meninas, porque “a fome, a má nutrição e as doenças seguem aumentando em razão
das secas e das inundações”, segundo o último informe do Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef).
A seca associada ao fenômeno El Niño afetou
severamente a comunidade Arsi, na Etiópia. Foto: Charlotte Cans/Ocha
Essa situação poderia piorar com o La Niña este
ano, alerta o estudo Ainda Não Terminou. As Consequências do El Niño Sobre
as Crianças. El Niño e La Niña são fenômenos cíclicos que nos últimos anos
ocorreram principalmente pelos efeitos da mudança climática, e os eventos
extremos associados, como secas e inundações, aumentaram em frequência e
gravidade.
“Milhões de meninos e meninas e suas comunidades
precisam de apoio para sobreviver e ajuda para se prepararem caso o La
Niñaaprofunde a crise humanitária. Também deverão redobrar a redução do risco
de desastre e se adaptar à mudança climática, que provoca eventos extremos mais
frequentes e intensos”, destacou o diretor de programas de emergência do
Unicef, Afshan Jan.
O informe do Unicef diz que, nas zonas mais
afetadas pelo fenômeno, as crianças passarão fome. Na África austral e
oriental, as regiões mais golpeadas, cerca de 26,5 milhões de crianças
necessitam de assistência, e um milhão delasprecisa de atenção médica por
desnutrição aguda e grave. “As mesmas crianças afetadas pelo El Niño e em risco
pelo La Niña estão na linha de frente diante da mudança climática”, advertiu
Jan.
O informe também destaca como os eventos climáticos
extremos perturbam o ano escolar, aumentam a ocorrência de enfermidades e a má
nutrição, além de prejudicarem o sustento das famílias. Nas áreas afetadas pela
seca, as crianças não vão à escola porque são as responsáveis por buscar água
potável e devem percorrer grandes distâncias, ou porque se mudaram com as
famílias por causa da perda de cultivos e gado.
As crianças não escolarizadas correm o risco
adicional de sofrer abusos, exploração e, em algumas áreas, serem vitimas do
casamento infantil, afirma o Unicef. Além disso, a má nutrição em menores de
cinco anos aumentou de forma alarmante nas áreas afetadas pelo fenômeno
climático, onde as famílias já viviam o dia a dia. Em muitos países, o El Niño
afeta o acesso a água potável e se relaciona com doenças como dengue, diarreia
e cólera, “grandes assassinas de crianças”.
A seca pode empurrar as adolescentes e mulheres à
prática do comércio sexual para sobreviverem.
Além disso, alerta o Unicef, a
mortalidade das crianças com HIV (vírus causador da aids) é de duas a seis
vezes maior para os que sofrem má nutrição severa.O Unicef não é a única
agência da Organização das Nações Unidas (ONU) que destaca as devastadoras
consequências de El Niño e La Niña. De fato, a falta de preparação e adaptação
à nova norma de crescentes emergências climáticas coloca em risco o cumprimento
dos objetivos de desenvolvimento e aprofunda o sofrimento humano em áreas já
golpeadas por inundações e secas, alertaram funcionários da ONU.
Agricultores da Etiópia. O Chifre da África é uma
das regiões mais prejudicadas pelo El Niño. Foto: TamiruLegesse/FAO
Os diretores das três agências da ONU com sede em
Roma – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO),
Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida) e Programa Mundial de
Alimentos (PMA) –, além do enviado especial para El Niño e o Clima, alertaram
que a projeção é de que mais de 60 milhões de pessoas no mundo, 40 milhões
delas na África austral e oriental, não terão segurança alimentar devido a esse
fenômeno climático.
Para atender a esses desafios, essas agências e
alguns colaboradores se reuniram no dia 6 de julho, na sede da FAO em Roma. O
diretor-geral da organização, José Graziano da Silva, destacou que as
consequências do El Niño na agricultura foram enormes e que, com o risco do La
Niña, a situação poderá piorar.“O El Niño causou principalmente uma crise
alimentar e agrícola”, afirmou o diretor, anunciando que a FAO mobilizará
fundos adicionais “para se concentrar em ações prévias, em particular na
agricultura, alimentação e nutrição, para mitigar as consequências dos eventos
e para fortalecer as capacidades de resposta de emergência, mediante
investimentos focados e destinados a ações de preparação”.
Por sua vez, a Oxfam Internacional informou que
cerca de 60 milhões de pessoas na África austral, no Chifre da África, na
América Central e zona do Pacífico veem como piora a fome e a pobreza devido à
seca e à perda de cultivos em 2014 e 2015, as quais se exacerbaram devido ao El
Niño. “Esse número provavelmente aumentará”, alertou a confederação de 17
organizações não governamentais.
A Oxfam divulgou uma pesquisa onde apresenta
depoimentos impactantes de algumas das pessoas com as quais trabalha na
Etiópia, Malawi, Zimbábue, El Salvador e Papua-Nova Guiné. “Nos disseram que
viveram tempos difíceis mas que esta seca é muito pior do que as anteriores”,
diz o informe O Que Será de Nós. Vozes de Diferentes Partes do Mundo
Comentam a Seca e o El Niño,elaborado por Debbie Hillier.
“Pessoas vão dormir de estômago vazio, trabalham em
seus campos ou vão à escola com a persistente dor da fome, e caminham ou
pedalam quilômetros tentando encontrar comida. Muitas pessoas reduziram as
refeições diárias para duas ou mesmo uma”, destaca o documento.A fome dói. Para
os pais, o esforço de colocar comida na mesa é especialmente doloroso, as
crianças choram de fome e os bebês mamam em peitos vazios, enfatiza o informe.A
Oxfam publicou uma resenha, El Niño e a Mudança Climática: Tudo o Que se
Deve Saber, que detalha a relação entre os dois fenômenos.
Fonte: ENVOLVERDE
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