O Brasil,
as idéias e os fatos.
Foto: Shutterstock
Por Dal Marcondes*
A retomada da utopia Brasil deve ser prioridade
para a sociedade, que precisa desvincular definitivamente a avaliação das
Políticas Públicas dos ideários da política partidária –
Desde o início das apurações dos escândalos
envolvendo políticos e empresários no Brasil, em vários processos judiciais,
mas especialmente nas operações que desbarataram o Mensalão, a Lava-Jato e a
Zelotes, dezenas de políticos e empresários graúdos perderam a majestade e hoje
dividem quentinhas em prisões. Os jornalões manchetam todos os dias que mais um
foi apanhado e que outros estão por cair muito em breve. Certamente esse
é um período de grande provação para a democracia brasileira e para as instituições,
que ainda precisam se mostrar depuradas de “elementos” que fazem do próprio
bolso a profissão de fé.
Enquanto Justiça e Polícia Federal trabalham
livremente uma parte importante da sociedade alardeia todos os dias que o
Brasil é o “país da impunidade”, e que nada pode ser feito para reverter o
quadro de letargia política e econômica senão a sumária deposição da Presidente
da República. Isso sem uma proposição estruturada de como as duas crises,
política e econômica, que juntas formam a “tempestade perfeita”, podem ser
debeladas.
Não há uma “visão de país”, uma utopia a ser
seguida em busca de um horizonte onde o Brasil supera suas crises, retoma um
caminho de crescimento econômico e assume seu papel entre as dez mais
importantes economias do mundo. Nessa falta de visão crítica em relação aos
fatos está a razão da imobilidade de todas as forças políticas importantes do
País.
Nas redes sociais, elemento fundamental da política
do século 21, as opiniões se radicalizam e sacam das entranhas da sociedade um
ódio que não se julgava existir no Brasil. Despontam com vigor extremo o
fascismo e o racismo, disparados por pessoas que se julgam acima de qualquer
punição, que não acreditam que o ranço de suas opiniões sectárias possa ter eco
em delegacias e tribunais.
Na economia vigora nesses dias de desesperança o
bordão do “quanto pior, melhor”. Porque assim demonstra-se a incompetência da
presidente e a necessidade de uma solução radical, mesmo ao atropelo da
Constituição. De lado a lado existe a dificuldade em reconhecer algo positivo
na hoste alheia sob o risco de ser tomado como “petista” ou “coxinha”, os
pejorativos da moda.
Um exemplo dessa incapacidade de olhar crítico é a
Petrobras, empresa que, sem dúvida, foi saqueada por bandos de políticos e
empresários bandidos, a maior parte já presos ou sendo processados. Planos de
investimentos desenhados em 2014, com o barril do petróleo em 100 dólares não
são mais factíveis com o atual valor abaixo dos 30 dólares. O pré-sal , que já
produz quase 900 mil barris/dia não representa o desafogo para uma dívida
próxima a 500 bilhões de reais.
A origem do buraco não é a corrupção, como gostam
muitos de apontar. Apesar de ter sua parcela de responsabilidade. O problema
real teve origem em um imaginário de milhões de barris ao dia sendo
comercializados na faixa dos 100 dólares. O castelo de cartas se desmanchou e
as regras do jogo mudaram drasticamente, com a necessidade da empresa se
reciclar e buscar uma saída que resgate sua capacidade de inovação e desempenho
tecnológico. O impacto da crise da Petrobras sobre a economia do país neste
momento é uma queda da ordem de 2% no PIB.
No entanto, se os diretores bandidos já foram
afastados, se a empresa está em um processo de depuração de seus negócios, por
que ainda há ataques à sua gestão?
Uma parte dos críticos defende abertamente a
privatização da empresa, que já tem ações em bolsa e muitos acionistas
privados. Outra certamente está a lamuriar por ter “perdido a boquinha”. Mas há
ainda aqueles que apenas fazem eco a boatos e memes de redes sociais e não são
capazes de se apropriar de dados concretos, como a importância dos
investimentos da empresa não apenas em sua cadeia de fornecedores, mas, também,
no campo social, cultural e ambiental, onde seus programas de apoio a
organizações da sociedade civil tem um imenso papel transformador de realidades
em rincões do país.
A Petrobras, no entanto, é apenas um exemplo. Há
muitos outros, para o bem e para o mal, de cenários em que os brasileiros não
estão sendo capazes de superar preconceitos políticos e apontar para um
horizonte de superação e de retomadas das utopias.
Há epidemias de Dengue, Zica e Chicungunha se
alastrando pelo país e por todo o hemisfério americano. Governos de todos os
escalões não conseguem uma ação articulada de combate ao vetor das doenças, o
mosquito Aedes Aegypti se aloja, em grande parte, dentro das casas das pessoas.
Essa incapacidade de articulação política ameaça corromper o futuro de milhares
de jovens que já nascerão sequelados pela microcefalia.
Em alguns estados a polícia, que deveria ser o
porto seguro da sociedade se transveste em forças de repressão política no
melhor exemplo das grandes ditaduras do mundo e investem contra manifestantes
como se travassem uma batalha contra forças armadas. Nas redes sociais mais uma
vez a sociedade não sabe como reagir. Se for contra a violência pode ser
entendido como cúmplice de vandalismo.
A grande bobagem que perpassa os pensamentos de
muitos é que haverá um “salvador da pátria”. A história brasileira está repleta
de pessoas que deram seus nomes a correntes políticas, como getulismo,
lacerdismo, janismo, ademarismo, brizolismo, lulismo e assim vai. Dessa vez
nenhum “ismo” vai ajudar o país a sair da crise em que se meteu.
A crítica à Dilma e a pregação por sua deposição é
o caminho fácil de duas correntes, a dos que votaram nela e por um motivo ou
outro se arrependeram, e aqueles que não votaram nela e veem no arrependimento
alheio a oportunidade de tomar o poder que não conseguiram nas urnas.
Não há caminho fora da democracia! O povo, a
sociedade, os eleitores escolhem os rumos que desejam para o país. O Brasil
precisa reaver suas utopias. O primeiro passo para a superação dessa
crise é a sociedade brasileira retomar seu senso crítico e a correspondência
entre suas ideias e os fatos largamente documentados. Políticas públicas
devem ser desvinculadas de política partidária.
* Dal Marcondes é jornalista, diretor da
Envolverde e especialista em meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
Fonte: ENVOLVERDE
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