Um novo
dia para as mulheres.
Por Maria Helena Masquetti*
“O que realmente querem as mulheres?”, “Dez passos
para entender as mulheres”, “As mulheres nunca estão satisfeitas”. Presentes na
literatura clássica ou especializada, nos programas de TV, na internet e nas
mais superficiais revistas expostas nas bancas, geralmente estas perguntas
continuam indo do nada a lugar nenhum por tentar convencer as mulheres de que
suas já tão banalizadas insatisfações se resumem a questões triviais. Na
verdade, a insatisfação é mais antiga. O dia 8 de março de 1857, que deu origem
ao Dia Internacional da Mulher, não fala de glamour nem de flores como convém
ao marketing, mas da repressão policial violenta a um movimento feito por
trabalhadoras de uma indústria têxtil de Nova Iorque pela igualdade de direitos
trabalhistas e pelo direito de voto.
Se a cultura da competição e a ignorância
cristalizaram tal desigualdade de direitos entre os sexos, isso não quer dizer
que a natureza tenha se adaptado à ideia. Entre as insatisfações atribuídas a
cada mulher, nobre ou pobre, reside latente e ancestral a inconformação sobre
os direitos que lhe têm sido roubados. Em números, eles estão representados
pela diferença de quase 30% a menos nos salários¹
em relação a homens em função similar; pelos 63 mil relatos de violência
doméstica registrados em menos de um ano²;
pelas diversas formas de assédio sofridos cotidianamente e pela média sinistra
de 500 mil mulheres estupradas no país por ano³,
das quais cerca de 70% são crianças e adolescentes. E urge somar aí os
interrogatórios constrangedores a que muitas são submetidas a ponto de se
calarem pelo medo de denunciar o crime.
Como pode uma espécie, ainda mais a humana,
discriminar justamente a outra (e única) parte responsável por sua própria
continuidade? E como classificar de guerra dos sexos uma luta onde, há séculos,
um lado perde continuamente por lutar praticamente sem armas, principalmente as
legais? E sem entender porque deveria, enfim, guerrear. Diante disso, tentar
responder sobre o que as mulheres realmente querem com argumentos frívolos e
mensagens comerciais oportunistas chega a ser mais uma violência contra a
dignidade feminina.
Foto: © DR
Desnecessário recorrer a pesquisas para constatar o
quanto as mulheres são habitualmente a maioria onde o futuro da raça humana
está em jogo. Que o digam as salas de aula do mundo onde, pelas mãos delas,
exércitos de meninas e meninos constroem uma parte fundamental de suas
historias! Que o digam as maternidades onde a cada segundo, uma mulher assegura
a continuidade da vida! Que o digam os lares onde, sob o desvelo maternal, as
crianças ensaiam seus primeiros passos! Que o digam a solidariedade, os colos
acolhedores, as lágrimas de compaixão e a oposição inflexível às guerras,
geralmente tão mais explícita na natureza materna! Como pode alguém tão
imprescindível ser tão subestimado somente a estupidez e a ganância podem
explicar.
Quando perguntada sobre o que era a mulher em seu
tempo, a escritora Virginia Woolf respondeu:
“Não acredito que alguém possa
saber até que ela tenha se expressado em todas as artes e profissões abertas à
habilidade humana”. Se ainda estivesse aqui, oitenta anos depois, Virginia
provavelmente se espantaria por ver o quão pouco o mundo evoluiu na equiparação
dos direitos entre mulheres e homens. Apesar disso, resta lembrar que esta
desigualdade foi forjada pela vontade humana e, sendo assim, do mesmo modo,
pode ser revogada por ela. A vontade da sociedade aliada à vontade política são
decisivas para nos transformar, como diria Ghandi, na mudança que queremos ver
no mundo.
Que não esteja longe, portanto, o dia em que, em lugar de parabéns
num dia 8 de março, as mulheres recebam de todas as partes do mundo um pedido
histórico de desculpas por meio de uma consciência global renovada, acompanhado
pelo ressarcimento, mesmo que apenas moral, de tudo o que a humanidade lhes
deve.
Referências
* Maria Helena Masquetti é graduada em Psicologia e
Comunicação Social, possui especialização em Psicoterapia Breve e realiza
atendimento clínico em consultório desde 1993. Exerceu a função de redatora
publicitária durante 12 anos e hoje é psicóloga do Instituto Alana.
Fonte: ENVOLVERDE
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