quarta-feira, 29 de março de 2017

Navios do futuro poderão usar energia dos ventos.

O vento, energia que moveu as caravelas no século XVI, poderá ser a solução para um transporte marítimo mais eficiente no século XXI. A novíssima tecnologia de navios movidos a energia eólica será testada nos próximos dois anos pela Norsepower Oy Ltd., em parceria com a Maersk Tankers, o Energy Technologies Institute (ETI) e a Shell Shipping & Maritime.

A Maersk Tankers fornecerá um navio-tanque Long Range 2 (LR2) de 109.647 toneladas de peso-morto (DWT), que será adaptado com duas velas de rotor Norsepower de 30m de altura por 5m de diâmetro. Os cilindros altos e giratórios já foram usados ​​em embarcações menores no passado, mas esta é a primeira vez que alguém tenta colocá-los em um navio tão grande quanto um petroleiro de 245 metros. As velas do rotor serão instaladas durante o primeiro semestre de 2018 e os testes em alto mar devem acontecer em 2019.
Se os dispositivos economizarem tanto combustível como esperado – até 10% em média, em uma rota global típica – a Maersk Tankers poderia usá-los em seus navios maiores, disse Tommy Thomassen, diretor técnico da Maersk Tankers. O interesse justifica-se pela crescente proximidade das novas regras de controle da poluição marítima, que devem entrar em vigor em 2020. Elas exigem o uso de combustível com um teor de enxofre muito menor, que deve ser mais caro do que óleos combustíveis atuais. “Esse é um dos fatores de mercado que tornam este tipo de tecnologia de propulsão eólica muito mais interessante”, explica Tuomas Riski, CEO da Norsepower, empresa finlandesa que constrói as velas de rotor para o petroleiro Maersk. A Norsepower tem estudado várias idéias para cortar o uso de combustível marítimo ao longo dos anos, desde velas movidas a energia solar até pipas para rebocar embarcações.

Os cilindros de 30 metros são uma versão modernizada do rotor desenvolvida há quase um século pelo engenheiro alemão Anton Flettner. Eles aproveitam o vento usando o efeito Magnus, a força física que faz uma bola de tênis se desviar quando acertada com um topspin. Um motor ajusta os cilindros girando e quando o vento sopra, o fluxo de ar acelera em um lado da vela e retarda para baixo no oposto para criar uma diferença de pressão que gera o movimento, propelindo o navio através da água. Quando as condições de vento são favoráveis, os motores principais não são necessários, o que permite uma economia de combustível e redução nas emissões de gases poluentes sem afetar a programação. Mais detalhes técnicos podem ser consultados aqui e aqui.

O Energy Technologies Institute, um grupo de pesquisa financiado pelo governo britânico, responde pela maior parte dos 3,5 milhões de libras que estão sendo investidos no projeto. “As velas de rotor são uma das poucas tecnologias que permitirão melhorias percentuais de dois dígitos na economia de combustíveis marítimos”, explica Andrew Scott, Gerente de Programa de Energia Renovável Marinha e Offshore do Energy Technologies Institute.

Cortar o uso de combustíveis fósseis pode parecer um contra-senso para uma companhia petrolífera como a Royal Dutch Shell. No entanto, sua área de transporte marítimo e negócios marítimos, que está coordenando o projeto, tem 10 petroleiros e cerca de 40 transportadores de gás natural liquefeito. Por isso, a Shell atuará como coordenadora do projeto e prestará consultoria operacional e terminal / portuária à equipe do projeto, enquanto a Maersk Tankers fornecerá insights técnicos e operacionais.


Fonte: ENVOLVERDE
Uma política nacional de recuperação da vegetação nativa.
Marcelo Furtado e Severino Ribeiro*

A assinatura do decreto presidencial criando a Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Proveg), em janeiro, é fundamental para o cumprimento dos compromissos internacionais e nacionais assumidos pelo Brasil em favor da mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e da proteção à biodiversidade. É um sinal positivo em direção à implementação efetiva do Acordo do Clima, da Convenção da Biodiversidade, das adesões ao Desafio de Bonn e à Iniciativa 20×20 e da Lei de Proteção da Vegetação Nativa, conhecida como novo Código Florestal.

Em comum, esses acordos e a Proveg compartilham o objetivo de restaurar milhões de hectares de florestas. Além disso, a nova política contribuirá para a regularização ambiental das propriedades rurais, gerando ativos para os proprietários e permitindo que o Brasil lidere mundialmente ações de restauração e reflorestamento para mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Do fortalecimento da atividade florestal, advêm vantagens ambientais e sociais, como a preservação de nossa rica biodiversidade, a interligação de remanescentes naturais, a recuperação de solos degradados, o aumento da segurança hídrica e a geração de empregos, renda e tributos.
A Proveg determina a criação de um Conselho – sob liderança do Ministério do Meio Ambiente (MMA) – que integra Casa Civil e outros quatro ministérios (Agricultura; Planejamento; Fazenda; Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações), representantes de órgãos públicos das esferas estaduais e municipais e organizações não governamentais. Prevê também que, nos próximos seis meses, um Plano Nacional de Recuperação de Vegetação Nativa (Planaveg) seja elaborado.

Sua missão é acelerar o cumprimento de políticas públicas já existentes, estimular a criação de incentivos financeiros e de tecnologias de recuperação, promover a adoção de boas práticas agropecuárias e o estabelecimento de mercados para produtos e serviços gerados a partir da recuperação da vegetação nativa. A elaboração do Planaveg em um período tão curto parece um objetivo difícil de ser alcançado. E seria, se a discussão e ações concretas já não estivessem bastante adiantadas.

Desde 2013, mais de 45 organizações não governamentais e instituições de ensino e pesquisa vêm avaliando os fatores-chaves e construindo estratégias para o primeiro esboço do Planaveg, em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente. O resultado foi submetido à consulta pública em 2015, quando recebeu quase 200 contribuições técnicas vindas de centros de pesquisa, coletivos, instituições empresariais e ambientais. O resultado consolidado fornece uma base segura para a elaboração do Plano Nacional.

A boa execução da Proveg depende, por exemplo, da aplicação de instrumentos do Código Florestal, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), e de programas como o de Regularização Ambiental (PRAs), do Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas e Alteradas (PRADAs), das Cotas de Reserva Ambiental (CRAs), de conversão dos recursos originados de multas para Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e da possibilidade de restauração com fins econômicos para Reservas Legais (RLs) e Áreas de Preservação Permanente (APPs) de pequenos proprietários rurais. Tais medidas consolidam a visão de que preservar e restaurar valem a pena, tanto por aspectos ambientais quanto por benefícios econômicos e sociais.

O desenvolvimento de mecanismos financeiros e econômicos como suporte às políticas públicas de restauração de vegetação nativa é outro pilar para o sucesso da Proveg e deve estar contemplado no Plano. A recente adesão brasileira ao Desafio de Bonn e à Iniciativa 20×20 criou um ambiente favorável para a captação de investimentos e recursos de fundos dedicados à economia de baixo carbono, como o Green Climate Fund. Nesse cenário, o Plano ABC (Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), juntamente com o Plano Safra, que inclui o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), podem constituir passaporte para o desenvolvimento de arranjos institucionais e acesso a linhas de crédito voltados à restauração e ao reflorestamento em pequenas e médias propriedades rurais. Também há a perspectiva de cooperação entre BNDES, KfW, investidores de impacto e grupos internacionais de fomento para adequação ambiental e agrícola de propriedades produtoras de commodities, como soja, cana-de-açúcar e carne.

Outro desafio imediato será o desenvolvimento de políticas públicas que fortaleçam os elos produtivos da cadeia da restauração florestal. Significa assumir uma atitude proativa para a abertura de novos mercados e o incentivo à produção e ao comércio dos produtos e serviços gerados por ela. 

Uma das medidas mais estratégicas é o aprimoramento dos mecanismos de rastreamento online, coibindo a competição desleal de produtos oriundos do desmatamento ilegal. Investimentos em pesquisas de longo prazo e tecnologias também serão fundamentais para uma Política consistente e bem-sucedida, propiciando diminuição de custo, aumento de produtividade e qualidade e otimização dos sistemas produtivos. Um plano de pesquisa e desenvolvimento (P&D) para esse fim está em fase adiantada de construção pela Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura.

A criação da Proveg coloca o país na direção de uma nova economia de restauração, reflorestamento e baixo carbono. Os próximos passos serão ainda mais importantes para que, futuramente, nossos netos olhem para trás e nos reconheçam como “a geração da restauração”.

*Marcelo Furtado, facilitador da Coalização Brasil Clima, Florestas e Agricultura, e Severino Ribeiro, coordenador nacional do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica.


Fonte: ENVOLVERDE
A humanidade é uma anomalia!
João Vitor Santos | Tradução de Moisés Sbardelotto no IHU/Adital

A humana é uma “espécie anômala” – explodiu os mecanismos espontâneos de autorregulação das populações animais que habitam o nosso pequeno e frágil planeta. Entrevista especial com Giuseppe Fumarco

O papa Francisco vem denunciando um complexo estado de crises, não apenas ambiental, mas também civilizacional. O sociólogo Giuseppe Fumarco vai ao pensamento de Edgar Morin para tentar compreender esse estado. Segundo o professor, antes de pensar em saídas, é preciso compreender a complexidade em que estamos imbricados. Por isso, recupera o pensamento de Morin quando diz que “a complexidade não é uma receita que se oferece para nós, mas sim o apelo à ‘civilização das ideias’. A barbárie das ideias significa também que os sistemas de ideias são bárbaros uns em relação aos outros. As teorias não sabem dialogar umas com as outras. A palavra barbárie, de fato, quer dizer ‘fora de controle’”. Para Fumarco, o autor evidencia que “embora aparentemente progrida a ‘civilização’ de muitos povos, ao mesmo tempo, têm-se incríveis regressões”. É o caso do Ocidente, que vive seu fetichismo pelo consumo enquanto países do Oriente são destroçados.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line, o sociólogo também reflete sobre Donald Trump, alinhado como força contrária a Francisco. “A escolha de Trump nos permite entender o que significa quando se fala de ‘novas ignorâncias’. Como muitos ilustres pedagogos do século XX tinham previsto, sem uma sistemática ‘educação ao civismo’, a democracia só pode degenerar”, destaca. E, ainda, avalia a inabilidade da esquerda mundial para compreender crises. “A esquerda também aderiu aos desvios neoliberais, já que não amadureceu ao longo do tempo uma consciência intelectual que lhe torne capaz de enfrentar os desafios totalmente novos que a globalização coloca’, dispara.
Fumaco | Foto: Arquivo Pessoal

Giuseppe Fumarco é sociólogo na Itália, foi professor de Direito e Economia nas escolas superiores, formador de adultos em várias entidades e pesquisador do Istituti Regionali di Ricerca Educativa – IRRE Piemonte (ex-IRRSAE). Escreveu um livro de história do pensamento econômico sobre J. A. Schumpeter e dois estudos sobre a autonomia escolar e a profissão docente. Mais recentemente, ocupou-se do pensamento da complexidade, chegando, por fim, à vasta produção de Edgar Morin, sobre a qual realiza palestras e seminários.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – A partir de Edgar Morin [1], como compreender o conceito de globalização? E de que forma sua perspectiva pode iluminar compreensões sobre o nosso tempo e nossas crises?
Giuseppe Fumarco – Vou responder expondo por inteiro a definição que Morin nos dá da “idade do ferro planetária” que estamos vivendo:

“‘A idade do ferro planetária’ indica que entramos na era planetária na qual todas as culturas e todas as civilizações já estão em interconexão permanente. Mas indica também que, apesar de todas essas intercomunicações, estamos em uma barbárie total nas relações entre raças, culturas, etnias, potências, nações e superpotências. Nós estamos nesta idade do ferro, e ninguém sabe ‘se’ e ‘quando’ sairemos dela. A coincidência entre a idade do ferro planetária e a ideia de que estamos na pré-história da mente humana, na era da barbárie das ideias, não é uma coincidência fortuita. Pré-história da mente humana significa que, no plano do pensamento consciente, estamos apenas no início. Ainda estamos submetidos a modelos mutilantes e disjuntivos do pensamento e é bastante difícil pensar de modo complexo. A complexidade não é uma receita que se oferece para nós, mas sim o apelo à ‘civilização das ideias’. A barbárie das ideias significa também que os sistemas de ideias são bárbaros uns em relação aos outros. As teorias não sabem dialogar umas com as outras. A palavra barbárie, de fato, quer dizer ‘fora de controle’. Por exemplo, a ideia de que o progresso da civilização é acompanhado pelo progresso da barbárie é uma ideia totalmente aceitável apenas se compreendermos a complexidade do mundo histórico-social. A recente atomização das relações humanas (também resultantes dos processos de civilização urbana com todos os fatores de bem-estar que ela trouxe consigo) leva a agressões, à barbárie, a insensibilidades incríveis. É preciso superar as ilusões eufóricas do Progresso sem cair nas visões apocalípticas ou milenaristas; trata-se de entrever que estamos, talvez, no fim de certos tempos e, esperamos, no início de tempos novos.”

IHU On-Line – Como compreender a nova era que vivemos, o Antropoceno[2] ?

Giuseppe Fumarco – O termo “antropoceno” não foi cunhado por Morin, mas pelo químico holandês Paul Crutzen [3], no ano 2000. É composto pelo grego ἄνϑρωπος (“homem”), com o acréscimo do segundo elemento, “ceno”. Pode-se definir assim a época geológica atual em que o ambiente terrestre, no conjunto das suas características físicas, químicas e biológicas, é fortemente condicionado, tanto em escala local quanto em escala global, pelos efeitos da ação humana: com particular referência ao aumento das concentrações de CO2 na atmosfera, o derretimento das geleiras, o aumento tendencial médio da temperatura terrestre e a consequente elevação do nível dos mares, o desmatamento e a desertificação de algumas partes do planeta etc. E, mais em geral, a poluição de toda a biosfera. Na realidade, a classificação por eras geológicas à qual se atêm os especialistas desse setor continua nos colocando no Holoceno [4], que iniciou há 11 mil anos e ainda não se concluiu.

Antropoceno”, portanto, significa conotar uma época a partir da qual a presença e a intervenção do homem sobre a natureza e sobre os equilíbrios ambientais está se tornando cada vez mais “pesado” e alcança um limiar crítico para além do qual alguns desses aspectos de degradação ecológica tornam-se irreversíveis.

IHU On-Line – No que consistem e quais os desafios para se compreender a crise ecológica, definida pelo papa Francisco?

Giuseppe Fumarco – O desenvolvimento (evolutivo e involutivo, ao mesmo tempo) das nossas sociedades na era do antropoceno se “rapidizou” (em espanhol, “rapidación”), no sentido de que sofreu – particularmente depois da revolução industrial do século XX – um processo de aceleração devido à evolução da tecnociência que não tem nada a ver com os tempos dos processos biológicos e ecológicos naturais do planeta.

Como ressalta o Papa: “embora a mudança faça parte da dinâmica dos sistemas complexos, a velocidade que hoje lhe impõem as ações humanas contrasta com a lentidão natural da evolução biológica”, acrescentando, em um parágrafo posterior: “Depois dum tempo de confiança irracional no progresso e nas capacidades humanas, uma parte da sociedade está entrando em uma etapa de maior consciencialização. Nota-se uma crescente sensibilidade relativa ao meio ambiente e ao cuidado da natureza, e cresce uma sincera e sentida preocupação pelo que está acontecendo ao nosso planeta” (Laudato si’, par. 18 e 19].

A Encíclica [5] prossegue evidenciando a “cegueira da tecnologia” (par. 20), o problema da má eliminação dos resíduos, da poluição: “A terra, nossa casa, parece transformar-se cada vez mais em um imenso depósito de lixo” (par. 21). É essa “cultura do descarte” que deriva também da circunstância de que “ainda não se conseguiu adotar um modelo circular de produção” (par. 22).

Depois, é reproposta a problemática do aquecimento climático global, devido ao uso intensivo de combustíveis fósseis e à consequente necessidade, para a humanidade, de mudar de estilos de vida, de produção e de consumo (par. 23).

Círculos viciosos


A Encíclica também acena aos numerosos “círculos viciosos ambientais” (cfr. conceito de “recursividade” em Morin), dando o exemplo do derretimento das geleiras polares e das elevadas altitudes que são “efeito” do aumento global da temperatura e, ao mesmo tempo, “causa” de um aumento adicional dela (por redução do efeito de espelho da irradiação solar das geleiras, que, em consequência da sua reduzida superfície refletora, permanece ainda mais aprisionada na atmosfera). 

Depois, é citado outro círculo vicioso, ligado ao desmatamento selvagem que reduz a capacidade do patrimônio florestal global de capturar dióxido de carbono e liberar oxigênio, combatendo, assim, o aumento da toxicidade da atmosfera (par. 24). A Encíclica conecta tais comportamentos negativos ao estilo de vida “ocidental” com o seu impacto negativo sobre as populações mais pobres do planeta: 

“As mudanças climáticas dão origem a migrações animais e vegetais…”, que são muitas vezes recursos para as populações locais, as quais também se veem, assim, forçadas a emigrar: “É trágico o aumento de emigrantes em fuga da miséria agravada pela degradação ambiental” (par. 25).

Uma terra cada vez mais cinzenta e limitada


A Encíclica continua examinando criticamente a questão da água (por exemplo, a pobreza de água pública na África) (par. 27 e ss.), da perda da biodiversidade (par. 32 e ss.), do impacto ambiental das iniciativas econômicas “a serviço das finanças e do consumismo” (par. 34), da retirada descontrolada dos recursos hídricos (par. 40), e como tudo isso tem como consequência o fato de que “esta terra onde vivemos se torne realmente menos rica e bela, cada vez mais limitada e cinzenta”[6] .

IHU On-Line – É possível afirmar que a crise civilizacional é o núcleo do estado de crises que vivemos? Por quê?

Giuseppe Fumarco – Morin afirma: “Pré-história da mente humana significa que, no plano do pensamento consciente, estamos apenas no início. Ainda estamos submetidos a modelos mutilantes e disjuntivos do pensamento e é bastante difícil pensar de modo complexo. A complexidade não é uma receita que se oferece para nós, mas sim o apelo à ‘civilização das ideias’. A barbárie das ideias significa também que os sistemas de ideias são bárbaros uns em relação aos outros. As teorias não sabem dialogar umas com as outras. A palavra barbárie, de fato, quer dizer ‘fora de controle’. Por exemplo, a ideia de que o progresso da civilização é acompanhado pelo progresso da barbárie é uma ideia totalmente aceitável apenas se compreendermos a complexidade do mundo histórico-social”.

Esta última observação significa que, embora aparentemente progrida a “civilização” de muitos povos, ao mesmo tempo, têm-se incríveis regressões. Enquanto no Ocidente se vive no fetichismo mercantilista e no hiperconsumismo que desperdiça (sem, por isso, ter eliminado a pobreza e o desemprego, que, ao contrário, na última década, aumentaram quase por toda a parte), em outros contextos do mundo em desenvolvimento não foram resolvidos problemas essenciais, tais como o de saciar a todos ou garantir a todos o acesso à água potável. Além disso, observamos que alguns grandes países de antiga civilização da Ásia seguem insensatamente o modelo ocidental, com perigosas consequências para os equilíbrios ecológicos.

Em nível de “noosfera” (a esfera de pensamento e das ideias), quase inacreditavelmente, recuperaram vigor contrastes mortíferos que alguns autores definiram – em nossa opinião, erroneamente – como “choques de civilizações”. Basta ver aquilo que acontece em nível de nações de religiosidade muçulmana, tanto como conflitos internos (xiitas contra sunitas) quanto como “contradependência indesejada” desses países em relação ao Ocidente.

Psicopatologia das relações entre os povos


Em vez de buscar a unidade na diversidade e de salvaguardar a diversidade na unidade, ainda hoje, as relações entre os Estados e as nações são em nível de barbárie

Nas relações internacionais, particularmente, prevalecem lógicas imperialistas, de domínio, de prevaricação, de fanatismo e de extremização das diferenças religiosas e espirituais etc. Em vez de buscar “a unidade na diversidade” e de salvaguardar “a diversidade na unidade”, ainda hoje, em 2017, as relações entre os Estados e as nações são em nível de barbárie.

Os Estados Unidos persistem em uma visão unilateral das suas relações com o resto do mundo, e, assim, torna-se difícil mover-se rumo àqueles equilíbrios multipolares que, sozinhos, poderiam garantir paz e segurança para as gerações futuras. Nestes últimos anos, em particular, pode-se fazer uma leitura daquilo que acontece em nível geopolítico internacional nos termos de uma verdadeira “psicopatologia das relações entre os povos” causada, ao mesmo tempo, pelo comportamento paranoico de alguns importantes expoentes das classes políticas dirigentes nacionais e pelo comportamento hiperegoísta das classes que detêm o poder em nível econômico transnacional (a nova classe capitalista transnacional). Todos comportamentos que impulsionam “de facto” muitas nações a agirem umas em relação às outras na lógica bárbara e atávica do “amigo/inimigo” (ou você está comigo ou está contra mim).

IHU On-Line – Qual sua leitura de Laudato si’? Como analisa a forma que Francisco tece a teia de relações entre as crises até chegar à formulação de uma crise ecológica?

Giuseppe Fumarco – Só posso concordar plenamente com a análise do papa Francisco, assim como argumentado na minha intervenção publicada na newsletter do [Centro de Estudos] “Sereno Regis”: “A encíclica Laudato Si’, o pensamento de Edgar Morin, a complexidade da realidade” [7].
IHU On-Line – De que forma o documento apostólico pode inspirar outras concepções que levem a pensar para além da crise ecológica? E, nesse sentido, quais os limites do documento?

Giuseppe Fumarco – Um dos limites mais problemáticos da Laudato si’ consiste na circunstância de que o Papa, lá, não aborda a questão demográfica. No meu livro “Complexus” [8] , eu defendia:

“Partimos de uma primeira constatação banal: os 7 bilhões de indivíduos que povoam o planeta (entre os 8 e os 9 bilhões previstos para 2050) há muito tempo já superaram a capacidade do ecossistema que os sustenta. Cada alerta neste campo já é irremediavelmente tardio. A humanidade – em particular desde a Revolução Industrial – prosseguiu antropizando selvagem e destrutivamente a biocenose e o biótopo em que habitava e, assim, se metamorfoseou […]. Poderá (talvez) sobreviver, mas em condições psiquicamente alienadas. Para rastrear uma relação mais equilibrada com a natureza, devemos remontar para bem antes da Revolução Industrial.”

Devemos sempre recordar que todos os problemas que estamos elencando seriam de origem muito inferior se, em vez de sermos 7 bilhões, fôssemos, por exemplo, na ordem de alguns milhões sobre todo o planeta. No meu texto, eu citava o grande etólogo austríaco Konrad Lorenz [9], que, em um livreto publicado em 1973, intitulado Os oito pecados capitais da nossa civilização, colocava de forma significativa entre os dois primeiros “pecados” a “superpopulação mundial” e a consequente “redução/devastação do espaço vital”.

Pode-se estar de acordo ou não com o elenco das criticidades propostas por Lorenz (que aqui, por razões de espaço, não retomamos), mas o fato, significativo para nós, é que um etólogo atento às lógicas dos comportamentos animais coloca na raiz dos muitos desvios atuais da humanidade justamente o dado quantitativo do excessivo povoamento do planeta por parte da espécie Homo sapiens. A humana é uma “espécie anômala”, que fez explodir os mecanismos espontâneos de autorregulação das populações animais que habitam o nosso pequeno e frágil planeta.

A partir da denúncia do “Clube de Roma” [10] de Aurelio Peccei [11] (fim dos anos 1960), muitas foram as tomadas de posição de personagens renomados em favor da temática da redução da natalidade e das políticas de contenção da população.

IHU On-Line – Como pensar outro modelo de desenvolvimento global? E quais os desafios para conscientizar a humanidade de que cada um é parte do todo nessa construção de outro modelo civilizacional?

O homem não é só sapiens, mas também demens, isto é, destrutivo, agressivo.

Giuseppe Fumarco – Pergunta, por si só, “complicada” demais, mais do que complexa. Um novo “modelo de civilização”, por enquanto, é impensável. O homem não é só “sapiens”, mas também “demens”, isto é, destrutivo, agressivo etc. Sofre a hubris (desmesura, do grego) em consequência das contínuas turbas que irrompem no seu cérebro “triúnico” sujeito a uma dialética permanente entre paixões e racionalidade, instintos e emoções…

Quanto a pensar em um “novo modelo de desenvolvimento” (abriria mão do “global”), por enquanto, para mim, isso significa retornar para as questões não resolvidas que o século XX nos deixou. Uma acima de todas: qual deve ser o papel de um Estado “suficientemente” democrático (pois a democracia também é uma ideologia, eu diria muito “utópica”) para um novo “welfare state” que não tropece nas tesouras da dívida pública? A resposta keynesiana parecia adequada, mas, neste momento, os economistas sofrem maciçamente a nefasta influência do pensamento liberal neoclássico.

Por fim: não tenho respostas sobre a questão de como “conscientizar a humanidade” para fazer com que ela compreenda que “cada um é parte do todo”. As taxas de escolarização aumentaram um pouco em todos os países, mas, por enquanto, não parece que isso tenha tido um impacto tão positivo sobre as “tomadas de consciência”… A confusão e o “ruído” da hipercomunicação de massa atordoam as mentes, e novas ignorâncias, paradoxalmente, crescem precisamente agora.

IHU On-Line – O mundo vive um momento ímpar com a ascensão da “extrema-direita”, que prega o nacionalismo radical e recusa o outro, como exemplo a figura de Donald Trump[12] e suas propostas que recusam o enfrentamento da crise ecológica. Como chegamos a esse momento?

Giuseppe Fumarco – O “soberanismo” e o retorno ao “particular” constituem a lógica reação por parte dos povos que veem justamente na globalização (assim como ela está acontecendo) riscos, inseguranças, novos medos etc. A nova classe capitalista transnacional parece caracterizada por uma não eticidade impressionante. Novas injustiças na distribuição de renda desenham um mundo onde os ricos se tornam cada vez mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres. Sem sinais significativos de inversão dessas tendências, a humanidade certamente não terá um futuro “vivível”.

O caso estadunidense e a escolha de Trump nos permitem entender o que significa quando se fala de “novas ignorâncias”. Como muitos ilustres pedagogos do século XX tinham previsto, sem uma sistemática “educação ao civismo”, a democracia só pode degenerar e reabrir o caminho para todo tipo de neototalitarismos. Trump e a direita são os primeiros sinais. Jornalismo e meios de comunicação de massa têm uma grande parte de responsabilidade nessas regressões globais: muito poucos se movem contra a corrente.

IHU On-Line – E, por outro lado, em que medida é possível afirmar que a “esquerda” global é inábil na compreensão da complexidade da teia da vida, para muito além do paradigma do consumo e desenvolvimento?

Giuseppe Fumarco – A esquerda (salvo raras exceções minoritárias) também aderiu aos desvios neoliberais, já que não amadureceu ao longo do tempo uma consciência intelectual que lhe torne capaz de enfrentar os desafios e os pontos nodais totalmente novos que a globalização (ou, melhor: a “planetarização”) coloca. Além disso, na Europa, os chamados movimentos “populistas” pregam que não se pode mais pensar em termos de direita e de esquerda: erro muito grave, pois essa atitude ambígua e “agnóstica” aumenta o nível de confusão. O pós-ideologismo certamente não devia ser abordado em termos de simplificação, mas, sim, como aceitação do desafio da complexidade.

IHU On-Line – A maior das desigualdades de nosso tempo consiste em quê? E como enfrentá-la?

Giuseppe Fumarco – Há diversos níveis de desigualdades: a desigualdade das oportunidades desde o nascimento, as desigualdades entre os diversos países, as diversas nações e os diversos grupos étnicos, as desigualdades dentro dos países individuais e das nações individuais, as desigualdades de gênero etc. Temos diante dos nossos olhos um desconfortante panorama de desigualdades de todos os tipos.

Esta também é a minha tristeza mais profunda, que se liga a uma sensação pessoal negativa de impotência. Eu admiro o Papa pelo otimismo que ele consegue expressar e difundir ao seu redor. Mas temo que não seja suficiente: Francisco é escutado e aplaudido, mas os chamados poderes fortes e o establishment transnacional continuarão se movendo de modo automático de acordo com os próprios mecanismos endógenos perversos.

Infelizmente, o “desafio da complexidade” impunha a adoção de novos registros conceituais, de novos mapas mentais capazes de tentar, ao menos, enfrentar, senão resolver também e “sobretudo” esses problemas. A desigualdade em nível planetário – como bem escreveu o Papa – se liga à degradação ecológica. O “todo” é complexo precisamente por ser inter-relacionado, conectado… às vezes por fios invisíveis.

Ninguém tem nem terá, a meu ver, a coragem de enfrentar, no futuro próximo vindouro, o “desafio dos desafios”, o mais radical, que certamente não é a busca do igualitarismo absoluto, mas, pelo menos, de uma igual oportunidade para todos no nascimento. Hoje, isso é pura Utopia. Amanhã… quem viver verá (João Paulo II).

IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?

Giuseppe Fumarco – Bergoglio vem das minhas terras, de um vilarejo em Asti. Os meus parentes são “monferrinos” exatamente como os seus antepassados antes da migração para a Argentina. Eu ainda tenho parentes distantes na Argentina, com os quais às vezes estou em contato. Isso criou, desde já, um feeling subterrâneo com esse papa de ar tão bondoso; a minha gente, muitas vezes, foi definida pelos escritores justamente como que caracterizada por uma certa bondade natural.
Notas: 

[1] Edgar Morin (1921): sociólogo francês, autor da célebre obra O Método. Os seis livros da série foram tema do Ciclo de Estudos sobre “O Método”, promovido pelo IHU em parceria com a Livraria Cultura de Porto Alegre em 2004. Embora seja estudioso da complexidade crescente do conhecimento científico e suas interações com as questões humanas, sociais e políticas, se recusa a ser enquadrado na sociologia e prefere abarcar um campo de conhecimentos mais vasto: filosofia, economia, política, ecologia e até biologia, pois, para ele, não há pensamento que corresponda à nova era planetária. Além de O Método, é autor de, entre outros, A religação dos saberes. O desafio do século XXI (Bertrand do Brasil, 2001). Confira a edição especial sobre esse pensador, intitulada Edgar Morin e o pensamento complexo, de 10-09-2012. O IHU, na seção Notícias do Dia, em seu sítio, vem publicando uma série de textos e reflexões sobre o pensamento de Morin. (Nota da IHU On-Line)

[2] Antropoceno: termo usado por alguns cientistas para descrever o período mais recente na história do Planeta Terra. O sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU tem tratado dessa perspectiva em diversas publicações. Entre elas “Antropoceno: ou mudamos nosso estilo de vida, ou vamos sucumbir”. Entrevista especial com Wagner Costa Ribeiro, publicada nas Notícias do Dia, de 29-02-2016. (Nota da IHU On-Line)

[3] Paul Josef Crutzen (1933): químico holandês, laureado com o Nobel de Química de 1995, por seu estudo sobre a formação e decomposição do ozônio na atmosfera. Membro da Pontifícia Academia das Ciências em 25 de junho de 1996. É professor do Instituto Max Planck de Química em Mainz, Alemanha. O asteroide 9679 Crutzen é denominado em sua homenagem. Ele cunhou o termo antropoceno e desenvolveu a teoria a que este corresponde. (Nota IHU On-Line)

[4] Holoceno: divisão da escala de tempo geológico, é a última e atual época geológica do Quaternário. O começo de o Holoceno é definido na mudança climática correspondente à do final do episódio frio conhecido como o Dryas recente, após a última glaciação, e abrange os últimos 11.784 anos, tendo 2000 como referência de tempo base. Ele é um período interglacial em que a temperatura foi mais suave e diferentes calotas desapareceu ou diminuição do volume, o que causou uma elevação do nível do mar. (Nota da IHU On-Line)

[5] O entrevistado se refere a Encíclica Laudato Si’: encíclica do Papa Francisco, na qual critica o consumismo e desenvolvimento irresponsável e faz um apelo à mudança e à unificação global das ações para combater a degradação ambiental e as alterações climáticas. Publicada oficialmente em 18 de junho de 2015, mediante grande interesse das comunidades religiosas, ambientais e científicas internacionais, dos líderes empresariais e dos meios de comunicação social, o documento é a segunda encíclica publicada por Francisco. A primeira foi Lumen fidei em 2013. No entanto, Lumen fidei é na sua maioria um trabalho de Bento XVI. Por isso Laudato Sí’ é vista como a primeira encíclica inteiramente da responsabilidade de Francisco. A revista IHU On-Line publicou uma edição em que analisa debate a Encíclica. (Nota da IHU On-Line)

[6] As referências às afirmações do Papa Francisco são tiradas diretamente dos parágrafos numerados da encíclica “Laudato si’: Encíclica sobre o cuidado da casa comum”, Livraria Editora Vaticana, Roma, 2015. (Nota do entrevistado)

[7] O texto foi publicado em Português pelo IHU, no Cadernos Teologia Pública número 114. (Nota da IHU On-Line)

[8] “Complexus. Leggere il presente sulle orme di Edgar Morin”, Effetto Farfalla, 2013. Istituto per l’Ambiente e l’Educazione “Scholé Futuro”, Onlus, Turim. (Nota do entrevistado)

[9] Konrad Zacharias Lorenz (1903-1989): foi um zoólogo, etólogo e ornitólogo austríaco. Foi agraciado com o Nobel de Fisiologia ou Medicina de 1973, por seus estudos sobre o comportamento animal, a etologia. Em 1935 descreveu o processo de aprendizagem nos gansos e criou o conceito de “imprinting”. Este é um fenômeno exibido por vários animais filhotes, principalmente pássaros tais quais pintinhos e patinhos. Após saírem dos ovos seguirão o primeiro objeto em movimento que eles encontrarem no ambiente, o qual pode ser a mãe, mas não necessariamente. (Nota da IHU On-Line)

[10] Clube de Roma: é um grupo de pessoas ilustres que se reúnem para debater um vasto conjunto de assuntos relacionados a política, economia internacional e, sobretudo, ao meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Foi fundado em 1966 pelo industrial italiano Aurelio Peccei e pelo cientista escocês Alexander King. Tornou-se muito conhecido a partir de 1972, ano da publicação do relatório intitulado Os Limites do Crescimento, elaborado por uma equipe do MIT, contratada pelo Clube de Roma e chefiada por Dana Meadows. O relatório, que ficaria conhecido como Relatório do Clube de Roma ou Relatório Meadows, tratava de problemas cruciais para o futuro desenvolvimento da humanidade, tais como energia, poluição, saneamento, saúde, ambiente, tecnologia e crescimento populacional, foi publicado e vendeu mais de 30 milhões de cópias em 30 idiomas, tornando-se o livro sobre ambiente mais vendido da história. (Nota do IHU On-Line)

[11] Aurelio Peccei (1908-1984): foi um estudioso e industrial italiano, mais conhecido como o fundador e primeiro presidente do Clube de Roma – uma organização que Levantou a atenção pública considerável em 1972 com seu relatório os limites ao crescimento. (Nota da IHU On-Line)

[12] Donald John Trump (1946): é um empresário, ex-apresentador de reality show e presidente eleito dos Estados Unidos. Na eleição de 2016, Trump foi eleito o 45º presidente norte-americano pelo Partido Republicano, ao derrotar a candidata democrata Hillary Clinton no número de delegados do colégio eleitoral; no entanto, perdeu no voto popular. Trump tomou posse em 20 de janeiro de 2017 e, aos 70 anos de idade, é a pessoa mais velha a assumir a presidência. Entre suas bandeiras estão o protecionismo norte-americano, por onde passam questões econômicas e sociais, como a relação com imigrantes nos Estados Unidos. Trump é presidente do conglomerado The Trump Organization e fundador da Trump Entertainment Resorts. Sua carreira, exposição de marcas, vida pessoal, riqueza e modo de se pronunciar contribuíram para torná-lo famoso. (Nota da IHU On-Line).


Fonte: ENVOLVERDE
Automóveis, poluição, doenças. Como mudar?
Washington Novaes* – 

Por que dar incentivos fiscais e subsídios para um equipamento ocioso em 80% do tempo?

No mesmo dia em que alguns jornais divulgavam a notícia de que o Brasil é o país onde o proprietário passa mais tempo dentro do automóvel – 4 anos e 11 meses de vida, ante 4 anos e 3 meses do argentino, 4 anos do europeu, 3 anos e 1 mês dos chineses (CSA Research, 3/3) –, informou-se que o item mais importante para a redução de 20% nos acidentes (no Estado de Goiás, por exemplo) foi o uso do farol, tanto no caso de acidentes com vítimas como nos sem vítimas. Nos acidentes com vítimas de morte a redução num mesmo período de 2016 e 2017 foi de 37,9%; nos acidentes com outras vítimas, redução de 7,55%; e nos casos sem vítimas, de 29,6%. As estatísticas também foram favoráveis nos casos de colisão e em mais de mil casos de atropelamento. São números importantes num país onde os acidentes dessa ordem costumam ser altos.

Já a poluição atmosférica no Estado de São Paulo, na visão de pesquisa coordenada pelo professor Paulo Saldiva, poderá explicar 15% dos casos de enfarte. Se reduzida em 10%, poderá evitar a morte em mais de 10 mil casos, além de se obterem avanços no tratamento de centenas de milhares de casos de asma e reduzir a perda de milhões de horas de trabalho.

“Ambientes poluídos e insalubres matam 1,7 milhão de crianças por ano” em todo o mundo, de acordo com relatório divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMC) nesta semana. Uma em cada quatro mortes de crianças com menos de 5 anos está relacionada com ambientes poluídos e insalubres. Poluição do ar e da água, fumo passivo, falta de saneamento básico e de infraestrutura adequada de higiene também são fatores muito relevantes. E a maior parte deles poderia ser evitada. Principalmente com o acesso ao saneamento básico e o uso de combustíveis limpos.
Além disso, enfatiza o relatório, a exposição a ambientes insalubres pode começar durante a gravidez, aumentando o risco de partos prematuros. E as crianças expostas à poluição atmosférica e ao fumo passivo podem ter mais risco de contrair pneumonia e de desenvolver doenças respiratórias crônicas, como a asma.

Serra Leoa é o país com a maior incidência dessas doenças. Ali morrem 780,6 crianças de até 5 anos de idade por 100 mil habitantes, por causa de doenças atribuídas ao meio ambiente. No Brasil, a taxa é de 41,38 mortes. O principal problema é a falta de saneamento básico. Segundo a OMS, a situação não é tão alarmante como a da China e da Índia. Há um esforço para melhorar a qualidade do ar. A situação da água melhorou nos últimos anos, “mas não é a ideal”.

O que mais impressionou os pesquisadores, em quase todos os lugares, foi o impacto da poluição atmosférica dentro dos lares na saúde infantil. E sob esse ângulo, a poluição advinda da energia é um fator relevante. Precisa ser atacado, substituindo o querosene por lâmpadas solares; o fogão a lenha pode ser substituído por fogões elétricos, tão eficientes quanto os fogões a lenha, sem causar poluição. Quase 600 mil crianças morrem a cada ano por causa da poluição, principalmente a gerada dentro dos lares, ressalta a OMS.

Lixo eletrônico é outro problema que expõe as crianças a toxinas que podem danificar os pulmões e levar ao câncer, além de redução no desenvolvimento cognitivo e déficit da atenção.

Segue o relatório da OMS relatando problemas com mudanças climáticas, como o aumento da temperatura e de níveis de dióxido de carbono na atmosfera, que favorecem a liberação de pólen pelas plantas, que está associado ao desenvolvimento da asma. Entre 11% e 14% das crianças abaixo de 5 anos são as maiores vítimas da asma, 44% relacionadas com o ambiente.

Nesse panorama, é muito preocupante a notícia divulgada pelas indústrias de automóveis de que até o final desta década o número de carros nas ruas dobrará. Essa perspectiva está levando a muitos programas de enfrentamento – BRTs e vias para bicicletas em Buenos Aires, trens de alta velocidade em 6.800 quilômetros nos EUA, espaços compartilhados por veículos e pessoas em vários países, pagamento de pedágio por automóveis em vias urbanas.

Mas fica a pergunta para vários países, incluído o Brasil: por que conceder incentivos fiscais e subsídios para automóveis, equipamento que permanece ocioso em 80% do tempo?

De Roma, vem a notícia (Plurale, 2/3) de que o papa Francisco aceitou a doação de uma instituição e “passará a usar um carro 100% elétrico durante um ano, como parte de um projeto-piloto que visa a demonstrar que essa tecnologia é boa para o ambiente e a economia. A consultoria doadora também doou quatro estudos sobre como transformar o Vaticano num dos primeiros Estados do mundo a usar 100% de energias renováveis, num ambiente com 100% de mobilidade livre de emissões”.

Há muitos outros ângulos. A ONU, por exemplo, fez um estudo em Barcelona, preocupada com os espaços urbanos, a perda de espaços públicos, calçadas, praças, e com a insuficiência dos transportes públicos. Sua recomendação é manter políticas participativas, tratar de relações entre bairros antigos e mais novos, que têm necessidades diferentes. Hoje o espaço público tem, no máximo, 30% da área total das cidades.

Mas é preciso lembrar que a população no mundo chegará a 10 bilhões de pessoas em 2050 (hoje já são mais de 3,9 bilhões). E lembrar o desafio, já presente, das megacidades. Tóquio tem 38 milhões de pessoas; Délhi, 25 milhões; a Grande São Paulo já passou de 20 milhões. E no centro de toda a questão está o problema da mobilidade urbana, a presença do automóvel.

A cidade de Goiânia, por exemplo, que foi concebida para ter, no máximo, 100 mil habitantes, hoje tem 1,43 milhão e uma frota de 1,15 milhão de veículos. Não é muito diferente de outras capitais de Estados e grandes cidades – até porque, em geral, não temos políticas para áreas metropolitanas.

Fonte: ENVOLVERDE
Títulos Verdes no Brasil.
Por Marina Grossi, do Cebds – 

A consciência crescente dos consumidores tem levado as empresas a aumentar constantemente o grau de transparência dos processos de produção. Cada vez mais quem compra determinado produto quer saber em que condições ele foi produzido, se respeitou as regras de boa gestão ambiental, se não envolveu nenhuma ação que afrontou princípios de justiça social, se a empresa tem imagem positiva em termos de responsabilidade sócio ambiental.

Guardadas as óbvias diferenças, algo semelhante vem acontecendo no universo do financiamento empresarial. Recentemente um grupo de gestores de investimentos, liderados pela Climate Bonds Initiative e responsáveis pela alocação de cerca de R$ 1,6 trilhão emitiu declaração no sentido de reafirmar seu compromisso de que, diante das ameaças  presentes e futuras  decorrentes dos efeitos das mudanças climáticas, é  urgente estruturar, a exemplo do que já existe em outras  partes do mundo, o mercado brasileiro de títulos verdes, ou green bonds , na expressão inglesa que ainda predomina.

Assinam essa declaração alguns dos mais importantes agentes do mercado financeiro como BTG Pactual, BB DTVM, Itaú Asset Management, Santander Asset Management, Sul América Investimentos e UBS Brasil.
Os títulos verdes nada mais são do que títulos em tudo semelhantes a qualquer outro tipo de título de dívida mas que, como característica diferenciadora, carregam uma marca ecológica por destinarem-se ao financiamento de atividades comprovadamente relevantes na defesa dos valores ambientais. São títulos que exigem um alto grau de transparência da parte das empresas, já que são sempre submetidos a avaliação externa.

Esses títulos ainda são novidade por aqui, mas já fazem grande sucesso em várias partes do mundo. Para impulsionar este mercado no país, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) e a Febraban lançaram, em outubro do ano passado, Guia para Emissão de Títulos Verdes no Brasil.

O potencial de mercado para títulos assim em nosso país é extraordinariamente grande, seja em função da gigantesca dimensão dos ativos ambientais que poderiam ser objeto de ações lastreadas por esses títulos, seja porque são várias as empresas brasileiras que desenvolvem atividades capazes de ganhar o rótulo verde, uma vez que estejam bem orientadas sobre os mecanismos  que regulam a atividade.

Justine Leigh Bell da Climate Bonds Initiative estima que para o corrente ano de 2017 há um  potencial de cerca  de R$ 16 bilhões em projetos passíveis de serem financiados sob a rubrica verde. Eficiência energética e manejo florestal são exemplos de áreas em que já foi possível realizar captações bem sucedidas e com muito grande procura da parte dos investidores.

A Suzano Papel e Celulose, primeira empresa brasileira a desvendar essa seara em mercado brasileiro, realizou uma emissão de US$ 500 milhões para papéis focados em restauração florestal, gestão hídrica e energia renovável. O sucesso foi tamanho que a demanda superou a oferta em três vezes. Há um mercado ávido por associar-se a iniciativas bem estruturadas, iniciativas capazes de gerar retorno não penas na dimensão financeira, mas também em credibilidade e imagem. A BRF e a Fibria foram as outras duas empresas brasileiras que já emitiram esses papeis, mas no exterior, registrando semelhante sucesso.

As regulamentações próprias desse mercado devem exceder aquelas que já, de forma tão detalhada, normatizam os mercados de capitais em geral. Títulos com a marca da sustentabilidade são depositários de esperanças que devem se cumprir. Transparência e viabilidade são fundamentais. 

Além do mais, é preciso tomar em consideração as especificidades nacionais e as dos diversos segmentos de negócios.

De todo modo, o que se vê no comportamento demonstrado pelo mercado, são perspectivas muito concretas de que a retomada dos investimentos e, consequentemente, do desenvolvimento em nosso país pode ocorrer incorporando a dimensão ambiental de forma muito mais efetiva do que ocorria até o advento da crise.

Texto publicado originalmente no Projeto Colabora em 27 de março.


Fonte: ENVOLVERDE

segunda-feira, 27 de março de 2017

Anjos dos negócios.
Por Dal Marcondes, da #Envolverde – 

Estudo realizado por dois anos com algumas das maiores empresas que atuam no Brasil mostra como elas se relacionam com as startups locais.

Empreender nem sempre é um caminho pavimentado por rosas, ao contrário, na maior parte das vezes o calçamento é feito de espinhos. No entanto, isso não necessariamente é ruim, porque os desafios e obstáculos são parte importante do processo de construção de novas empresas. Ao se superar as “dores do nascimento” startups inovadoras tornam-se visíveis em um novo ecossistema, o dos investidores anjos e empresas que buscam projetos para incorporar aos seus negócios.
Magnus Arantes, presidente do HBS Alumni Angels of Brazil

Na primeira quinzena de março tomamos contato no Brasil com o estudo How Corporations are Connecting With the Startup Ecosystem (Como as Corporações Estão se Conectando com o Ecossistema de Startup), um projeto inspirado em similares realizados na Harvard Business School e em outras entidades de referência. Segundo Magnus Varassin Arantes, um brasileiro que atua junto à Universidade de Harvard e tornou-se, nos últimos anos, um Investidor Anjo e cofundador do HBS Alumni Angels of Brazil, organização de ex-alunos da Harvard que desde 2012 atua no fortalecimento do ecossistema de empreendedorismo inovador no Brasil.

O estudo, que foi feito em 2012 e apresentado em São Paulo em 16 de março passado, aponta que o Brasil, entre as oito maiores economias do mundo naquele ano, estava em último lugar em investimentos em pesquisa, com apenas 1,16% do PIB, enquanto o primeiro lugar era ocupado pela Coreia do Sul, com 4,36% do PIB. Essa posição pode ter caído ainda mais por conta da crise econômica que assola o país desde 2015.  Magnus, que é um ativo investidor e pesquisador em startups no Brasil e na América Latina, explica que o aporte de recursos em pesquisa é um dos principais geradores de inovação, e que nos países que mais investem a maior parte do esforço vem sendo desenvolvido pela iniciativa privada. “É parte da estratégia de crescimento das empresas buscar novos caminhos para seu negócio a partir da pesquisa e da aquisição de startups promissoras”, explica.

O estudo apresentado teve metodologia baseada em análise qualitativa a partir de um questionário composto por 95 perguntas feitas às grandes empresas participantes. “Nossa metodologia apresenta a capacidade de identificar vários objetivos das empresas no relacionamento com startups, indo além da simples perspectiva financeira”, explica Magnus.

O estudo procurou atuar em três objetivos primários:

1 – Mapear a intensidade de relação entre grandes empresas e startups no Brasil:
2 –  Desenvolver um padrão para medir os diferentes estágios de intensidade das corporações;
3 – Identificar arquétipos confiáveis e seus modelos, para guiar empresas nesse ecossistema.

Cinco objetivos mapeados nas empresas na relação com Startups:

1 – Financeiro – busca de resultados;
2 – Inovação – Busca de produtos, serviços ou tecnologias;
3 – Cultural – Busca de incorporação de modelos de ação;
4 – Marketing – Marcas e relações externas;
5 – Testar e aprender – Buscar informações e mapeamento de riscos e oportunidades;
Entre os resultados da pesquisa chama a atenção que, em 53% dos casos de incorporação de startups por grandes empresas, a motivação foi estratégica, enquanto em 15% se buscava resolver problemas do negócio e, apenas em 3% dos casos o objetivo era meramente financeiro. Isso mostra que esse ecossistema está mais voltado para a incorporação de inovação do que meramente ampliar faturamento.

A pesquisa é extensa e tem uma avaliação detalhada da relação entre as startups e grandes empresas de diversas áreas e mostra que o aprofundamento na relação entre essas organizações e iniciativas iniciantes podem render bons frutos. “A maioria das empresas somente investe nas startups já em operação e poucas aportam recursos nos primeiros momentos”, explica Magnus. Ele aponta que isso é uma oportunidade perdida pelas empresas que desejam projetos inovadores, uma vez que boas Iniciativas podem não chegar ao amadurecimento, apesar de terem produtos ou serviços absolutamente inovadores, simplesmente por não terem o capital ou a capacidade de gestão necessários.

Uma das lições que fica para as startups brasileiras é que o sonho de empreender não pode estar baseado apenas em uma boa ideia de produto, serviço ou tecnologia. É preciso, segundo apontou Magnus Varassin Arantes em entrevista à Envolverde, ter uma sólida base de gestão, de forma a atrair o interesse de possíveis grandes parceiros a partir de uma posição já reconhecida em seu mercado. Como mostra o quadro acima, a empresa iniciante tem de apresentar um valor estratégico para o possível investidor, ou ao menos ser capaz de resolver um problema inerente ao negócio do grande parceiro.

Outros valores são importantes, mas têm mostrado, segundo o estudo, um interesse apenas moderado por parte dos possíveis interessados. Fica também o alerta de que o ecossistema da inovação entre pequenas empresas carece ainda, no Brasil, de uma sistemática capacidade de reconhecimento pelos principais atores econômicos. “As empresas perdem muito ao não se se adiantarem em investir em projetos promissores”, explica o Magnus, mas alerta que o estudo mostrou que boa parte das iniciativas de parcerias não alcançam os resultados esperados, e que as empresas alegam que há poucas iniciativas que realmente valem o investimento de esforço e recursos para a construção de uma relação de negócios.


Fonte: ENVOLVERDE
ONU alerta sobre assassinatos e lideranças em Direitos Humanos.

O Sistema das Nações Unidas no Brasil divulgou nesta sexta-feira (24) uma nota sobre os assassinatos de dois defensores de direitos humanos no Brasil. Waldomiro Costa Pereira, militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi assassinado dentro da UTI de um hospital na cidade de Parauapebas, no Pará. Em Ronda Alta, no Rio Grande do Sul, o cacique Antonio José Mig Claudino foi assassinado com cinco tiros dentro de um bar numa aldeia onde há disputa de terras.

O Sistema das Nações Unidas no Brasil divulgou nesta sexta-feira (24) um comunicado sobre os assassinatos de dois defensores de direitos humanos no Brasil.
Waldomiro Costa Pereira

Waldomiro Costa Pereira, militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi assassinado dentro da UTI de um hospital na cidade de Parauapebas, no Pará. Ele estava internado depois de ter sido baleado três dias antes durante invasão do sítio dele, próximo de Eldorado do Carajás.

Em Ronda Alta, no Rio Grande do Sul, o cacique Antonio José Mig Claudino foi assassinado com cinco tiros dentro de um bar numa aldeia onde há disputa de terras.

Segue a íntegra da nota:

“O Sistema das Nações Unidas no Brasil recebeu com preocupação as notícias dos assassinatos de Waldomiro Costa Pereira, militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e do Cacique Antonio Mig Claudino, defensores de direitos humanos, que ocorreram no último dia 20 de março, em Parauapebas, Pará, e na Terra Indígena Serrinha, Rio Grande do Sul.

O Sistema das Nações Unidas no Brasil insta as autoridades brasileiras a investigar, processar e punir os autores dos assassinatos e se solidariza com os familiares e amigos das vítimas.

É importante fortalecer os esforços para proteger defensores e defensoras de direitos humanos no país. As Nações Unidas no Brasil se colocam à disposição para apoiar as ações nessa temática.”


Fonte: ENVOLVERDE