Dados oficiais mostram que a
Europa não é o principal destino de refugiados.
Pesquisas refutam o senso comum sobre migração e
direitos humanos.
Dados oficiais mostram que a Europa não é o
principal destino de refugiados. Dossiê sobre o tema traz artigos, vídeo,
infográficos e cartuns e pode ser útil como material didático em escolas.
Por Valéria Dias, do Jornal/Agência USP.
Você liga a televisão e assiste a uma reportagem
sobre mais uma embarcação lotada de pessoas vindas de países africanos que
tentam atravessar o mar mediterrâneo rumo à Europa. O locutor usa palavras como
“crise”, “drama”, ou até mesmo “ameça”. No final da notícia, você chega à
conclusão de que a Europa é, atualmente, o principal destino de refugiados em
todo o mundo.
Com certeza é grande número de refugiados que
estão buscando o abrigo em países europeus e a situação deles realmente é
bastante delicada e exige muita atenção internacional. Principalmente quando
lembramos que muitas dessas embarcações já naufragaram, matando centenas de
pessoas. Porém, uma análise mais aprofundada dos números oficiais do Alto
Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) revela que a Europa não
é o principal destino dessas pessoas.
“Os dados revelam que 86% dos refugiados mundiais
se deslocam para países em desenvolvimento e com economias mais frágeis. E que
um em cada três vive em campos de refugiados”, conta Deisy Ventura,
professora do Instituto de Relações Internacionais (IRI) e da Faculdade de
Saúde Pública (FSP), ambos da USP.
Infográfico do Dossiê Migrações e Direitos Humanos. Concepção: Deisy Ventura e Natália Araújo (IRI). Design: Estúdio Kiwi. Disponível na edição 23 da Revista Internacional de Direitos Humanos (SUR).
Outros dados do ano de 2015 ajudam quebrar o
senso comum sobre as nações que mais receberam refugiados. Esses países foram:
Turquia (1,84 milhão), Paquistão (1,5 milhão), Líbano (1,2 milhão), Irã (982
mil) e Etiópia (702.500).
Já os países europeus receberam um número bem
menor: 562 mil (Alemanha), 319 mil (França), 198 mil (Suécia), 155 mil (Reino
Unido) e 142 mil (Itália). “A questão dos refugiados é um ônus para o mundo em
desenvolvimento e não para a europa”, destaca a docente.
Infográfico do Dossiê Migrações e Direitos Humanos. Concepção: Deisy Ventura e Natália Araújo (IRI). Design: Estúdio Kiwi. Disponível na edição 23 da Revista Internacional de Direitos Humanos (SUR).
Estas são algumas das informações reunidas no Dossiê Migração e
Direitos Humanos, disponível na edição 23 da Revista
Internacional de Direitos Humanos (SUR), publicada pela Conectas Direitos
Humanos (organização não-governamental internacional). A professora da USP foi
a editora convidada para este número, que reuniu nomes de alguns dos principais
acadêmicos e militantes nacionais e internacionais ligados ao tema. “A cada
edição, a revista elege um tema especial e convida alguém de fora para ser o
editor responsável”, explica a docente.
Deisy Ventura: os sete casos de ebola na Europa e nos EUA tiveram muito mais repercussão mundial do que os 28 mil notificados em países africanos – Foto: Arquivo pessoal
Deisy Ventura: os sete casos de ebola na Europa e nos EUA tiveram muito mais repercussão mundial do que os 28 mil notificados em países africanos – Foto: Arquivo pessoal
A professora Deisy Ventura participou da comissão que ajudou a redigir o anteprojeto da Lei de Imigrações do Brasil, que está para ser votada pela Câmara dos Deputados. Desde 2009, ela desenvolve junto ao IRI um projeto de extensão com algumas comunidade migrantes na cidade de São Paulo. A partir dele, surgiu o coletivo estudantil Educar para Mundo. Atualmente ela coordena, em parceria com a Prefeitura da capital paulista, o Cosmópolis, um portal em quatro idiomas (português, inglês, francês e espanhol) que reúne notícias, material acadêmico e oferece orientação e assistência à população migrante.
O dossiê, disponível em português, espanhol e
inglês, traz vários infográficos com dados oficiais da ACNUR que mostram os
países que mais geram e os que mais recebem refugiados. Desenvolvidos pela
professora Deisy e a pesquisadora do IRI, Natália Araújo, os gráficos
também explicam a diferença entre refugiado, imigrante, solicitante de refúgio
e deslocado interno, entre outros. A edição 23 da revista apresenta ainda
textos de diversos especialistas, cartuns, e um vídeo sobre a questão dos
refugiados. A docente destaca que os infográficos, principalmente, representam
um material muito rico e que pode ser bastante útil como recurso para abordar o
tema em sala de aula.
Além de organizar o dossiê e sugerir alguns dos
autores convidados da publicação, a professora Deisy contribuiu como o artigo
Impacto das crises sanitárias internacionais sobre os direitos dos migrantes,
onde apresenta a violação de direitos humanos em decorrência de crises
sanitárias, como a epidemia de ebola. No artigo, ela comenta sobre os sete
casos de ebola notificados no ocidente (quatro nos Estados Unidos, um na
Espanha, um na Itália, um no Reino Unido, com um óbito nos Estados Unidos).
Esses sete casos tiveram muito mais repercussão mundial do que os 28.616 casos
notificados (com 11.310 mortes, sendo muitos de profissionais de saúde) em
países africanos até maio de 2016.
Especialistas
Dentre os artigos do dossiê, a professora destaca
o da socióloga holandesa Saskia Sassen, da Universidade de Columbia: Três
migrações emergentes: uma mudança histórica – Examinar os recentes fluxos
migratórios oferece a oportunidade de entender as dinâmicas mais amplas que
impelem as pessoas a migrar.
Outro destaque é o artigo da socióloga francesa
Catherine Wihtol de Wenden, referência em estudos europeus sobre o tema, sob o
título As novas migrações – Por que mais pessoas do que nunca estão em
circulação e para onde elas estão indo?
O dossiê está disponível para consulta e download
neste endereço: http://sur.conectas.org/home/edicao-23/
Fonte: EcoDebate,
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