A mão
mais que visível do mercado.
Por Liliane Rocha*
Estamos vivendo um período peculiar da história
brasileira, e mundial. No Brasil, de um lado assolados pelo discurso latente
sobre a crise econômico-financeira que impacta fortemente os mais pobres. No
mundo, por outro lado com as ameaças de um futuro incerto dado as previsões,
que já começaram a se confirmar, das mudanças climáticas, crise dos refugiados,
estado islâmico, questões para além das fronteiras brasileiras, mas que em um
mundo interconectado, nos abalam, nos tocam e nos fazem repensar.
O mais intrigante de tudo isso é que em ambos os
casos fomos nós, os próprios seres humanos, que construímos todo este cenário
assustador, com o agravamento de problemas que há muito tempo relegamos a um
segundo plano em detrimento de vantagens imediatistas, sempre em torno do
individual.
E é exatamente neste momento conturbado que
comunidades, governos e sociedades começam a se questionar se não nos deixamos
levar tempo demais pelo “capitalismo selvagem” e pelas tais regras de mercado.
A mão invisível que, na verdade, é para lá de visível, tem nomes, interesses e
tem exercido poder em decisões que impactam toda a humanidade.
Estudando Finanças Públicas do Brasil, me chamou a
atenção o fato de que dos 2 trilhões de dívida pública liquida, 94,80% a União
deve para grandes empresas e detentores do capital privado. Pode incluir
pessoas físicas como eu e você, mas certamente o maior percentual é de grandes
empresas ou pessoas físicas acionistas destas grandes empresas. Somente 5,20%
da dívida é externa. Sendo que 23% desta dívida interna é para com as grandes
instituições financeiras. Alguma dúvida sobre o quanto o governo brasileiro,
está e não de hoje, nas mãos da iniciativa privada?
Foto: Shutterstock
Além disso, a concentração de renda no Brasil, em
diálogo com o dado acima é impressionante, segundo a Oxfam Brasil em
Conferência Ethos 2016, temos no Brasil 4.225 multimilionários com uma renda
mensal acima de 450 mil reais. Ainda segundo a Oxfam Global 8 pessoas tem mais
dinheiro que 50% da população mundial.
Como é que o Sistema de Produção Capitalista, que
teoricamente se mostrou como o mais eficiente, se estabeleceu em bases tão
insustentáveis, a ponto de em pleno século XXI estarmos ainda nos perguntando,
longe de consenso, qual é o papel das empresas em nossa sociedade?
Essa que parece ser uma pergunta tola, requer um
esforço extra para ser respondida, especialmente quando estamos mergulhados nas
sendas do sistema que nos imprime uma falsa sensação de que está tudo certo em
existir apenas para gerar lucro para alguns poucos.
Conforme aponta Charles Handy, em seu artigo “Para
que serve uma empresa”, a visão de que as empresas servem para gerar lucro,
garantindo a satisfação dos acionistas pura e simplesmente confunde uma
condição necessária com uma condição suficiente. Afinal, o propósito de uma
empresa deve ser o de obter lucro sim, porém, de modo que possa fazer algo
mais, ou melhor, sendo este algo a verdadeira justificativa da empresa.
Mais do que discussões acerca da melhoria de
políticas e procedimentos voltados à fiscalização das empresas e seus gestores,
o cerne das discussões está pautado exatamente sobre esta temática da
finalidade das corporações. Qualquer organização só faz sentido se servir a
humanidade como um todo, a melhoria das condições humanas e ao planeta. O
sistema capitalista pode ser o melhor caminho, mas para isso, teremos que ser
honestos, esmiúça-lo com visão crítica e melhorá-lo onde for possível.
* Liliane Rocha é diretora Executiva da
empresa Gestão Kairós (www.gestaokairos.com.br),
mestranda em Políticas Públicas pela Fundação Getúlio Vargas, MBA Executivo em
Gestão da Sustentabilidade na FGV, Extensão de Gestão Responsável para
Sustentabilidade pela Fundação Dom Cabral, graduada em Relações Públicas na
Cásper Líbero. Gestora com 11 anos de experiência na área de Responsabilidade
Social tendo trabalhado em empresas de grande porte – tais como Philips, Banco
Real-Santander, Walmart e Grupo Votorantim. Escreve mensalmente para a
Envolverde sobre Diversidade.
Fonte: ENVOLVERDE
Nenhum comentário:
Postar um comentário