Especial
Ecoagência – Mortandade das Abelhas (terceira parte – final): Exceções estão
longe das lavouras.
por Ulisses Nenê – especial para a EcoAgência
Numa comprovação da relação dos agrotóxicos com a
mortandade das abelhas, os apicultores que não se queixam do problema são,
justamente, aqueles que mantém suas colmeias longe das lavouras.
É o caso dos que costumam vender o mel orgânico na
Feira Ecológica da Redenção, na capital, como Manoel Souza, 64 anos, que vem
aos sábados de Santo Antônio da Patrulha, onde reside, para negociar o produto.
Manoel
Souza e o filho Marcos, em Porto Alegre
Ele tem 300 colmeias espalhadas por São Francisco
de Paula, Taquara, Pantano Grande, Palmares do Sul, produzindo de seis a oito
toneladas por ano. Não teve nenhuma ocorrência, até hoje, de mortalidade de
abelhas acima do normal.
“Tem que escolher bem o local, nessas regiões não
têm grandes plantações, não tem nada que tenha pulverização (de agrotóxicos)”,
conta. O maior problema, na opinião dele, está nas plantações de soja, que
chegam a receber três ou quatro pulverizações de venenos por safra.
Por isso instala suas abelhas em lugares mais
isolados e trabalha no sistema de migração, que desloca os enxames de uma
região para outra a fim de garantir nutrição adequada para elas. Por exemplo,
de outubro a março ele mantém as colmeias na divisa de Taquara com São
Francisco. Quando a florada das plantas na Serra está terminando, ele
desloca-as para o Litoral, onde a florada está começando.
As abelhas são transportadas em caminhões
adaptados, protegidos por telas e sombrite. Se não fizer a migração, explica, a
colheita do mel cai à metade, por causa do clima e da vegetação inadequada para
as abelhas. Elas mal chegam à nova casa e já fazem o reconhecimento da área,
num raio de três quilômetros.
“Em apenas 20 minutos já estão produzindo mel”,
conta Marcos, 35 anos, filho de Manoel. Desta forma, na sua banca, eles colocam
à venda uma grande variedade do produto, como o tradicional mel de eucalipto e
também de quitoco, uva do japão e aroeira, entre outros.
João Luiz Freitas, 64 anos, de General Câmara,
também não teve ocorrência de mortandade das abelhas nas suas colmeias. Na
ausência dos agrotóxicos, os maiores riscos para as abelhas, segundo ele, são
os períodos chuvosos e a desnutrição, principalmente no outono, nas épocas em
que acontecem semanas seguidas de precipitação.
Outro vendedor da Feira Ecológica, Fernando
Presser, contudo, enfrentou um episódio de morte anormal de suas abelhas, com a
perda de 15 colmeias, ano passado. Elas ficaram fracas e morreram. Mas não é
possível afirmar que tenha sido por causa das plantações de soja nos arredores,
diz.
Em todo caso, Presser decidiu publicar num jornal
de Sertão Santana um alerta aos apicultores da região, para que mantenham suas
abelhas bem distantes das lavouras. “Tem que se retirar da soja, porque a
abelha é muito suscetível a qualquer fungicida ou veneno”, adverte.
Apoio ao setor
Segundo o coordenador da Câmara Setorial da
Apicultura e Meliponicultura (Casam), Nadilson Ferreira, foram tomadas diversas
medidas para apoiar os apicultores. Como exemplos ele cita o projeto de lei da
política para apicultura e meliponicultura que tramita na Assembleia
Legislativa, e a normativa para o transporte de abelhas, inédita no país,
publicada no Diário Oficial do Estado dia 26 de junho.
Também está acontecendo a reestruturação das
inspetorias veterinárias para atendimento do setor, com a capacitação de 30
técnicos que ocorreu em abril e uma nova turma que está prevista. Haverá ainda
uma campanha de esclarecimento sobre a morte das abelhas a ser lançada
brevemente, adianta.
Além disso, no final de junho, a Secretaria da
Agricultura Pecuária e Irrigação (Seapi) anunciou a implementação do Sistema
Integrado de Gestão de Agrotóxicos (Siga), um sistema online que integra as
operações de comércio e utilização destes produtos. Teoricamente, ele vai
permitir a rastreabilidade do seu uso nos cultivos agrícolas, o controle da
emissão de receitas e o processo de coletas para análise de resíduos,
disponibilizando um banco de dados atualizado.
A fiscalização do uso de agrotóxicos proibidos,
contrabandeados, das misturas de produtos químicos não recomendados e o
controle do receituário agronômico é uma das recomendações do Grupo de Trabalho
da Mortandade das Abelhas.
Quanto à proibição dos agrotóxicos mais perigosos
para as colmeias (Clotianidina, Imidacloprid, Tiametoxam e Fipronil), como foi
sugerido, não consta nenhuma iniciativa neste sentido.
Veja o que apresentou o relatório do Grupo de
Trabalho da Mortandade das Abelhas como propostas:
1. A recomendação de que esta Câmara Setorial deva
solicitar aos órgãos competentes a proibição do uso das partículas
Clotianidina, Imidacloprid, Tiametoxam e Fipronil nas culturas agrícolas no
Estado, e sugerir que o mesmo se faça em todo o Brasil, tendo em vista a ameaça
que causam ao processo de polinização das culturas bem como ao extermínio das
abelhas.
2. Que os apicultores e meliponicultores sejam
informados sobre os programas e calendários de controle de pragas rotineiros da
sua região e quais produtos utilizados.
3. Os setores envolvidos: apicultores,
meliponicultores e agricultores formulem regras de convivência e acordos com
base em informações mútuas, pois polinização e flores são de interesse do
grupo.
4. Colocar nas caixas o nome e fone do apicultor e
ou meliponicultor para que o mesmo seja avisado com antecedência de alguma
prática envolvendo agrotóxico.
5. Na impossibilidade de uso de produtos não
tóxicos a abelha buscar o de menor ou Baixa toxidez.
6. Adotar, quando possível, métodos de aplicação
menos impactantes para os polinizadores.
7. Quando da aplicação de agrotóxico ver a
possibilidade de confinamento das abelhas com oferta de alimento e água.
8. Buscar horário de aplicação do produto químico
incompatível com o horário de atividade das abelhas.
9. Uso de programa integrado de controle de pragas
e produtos seletivos.
10. Cuidados com o descarte de resíduos e
embalagens de agrotóxicos.
11. Usar agrotóxicos só quando ocorrer Nível de
Dano Econômico (NDE).
12. Que o Estado intensifique a fiscalização do uso
de agrotóxicos proibidos, contrabandeados, misturas de produtos químicos não
recomendados, bem como maior controle do receituário agronômico.
13. Quando possível, locar os apiários e
meliponários distantes das áreas agrícolas, tomando como referência o diâmetro
de voo da espécie utilizada. Apis melífera 6,0 km; Meliponíneos em geral 2,0
km; Bombus e Xylocopa 10,0 km.
14. Manter, implantar ou recuperar áreas de
amortização, Reserva Legal, e APP.
15. Melhorar o pasto apícola e meliponícola nas
proximidades do apiário ou meliponário promovendo o efeito de fuga.
16. Incentivar a agricultura orgânica ou métodos
assemelhados.
17. Provocar os programas e projetos do Ministério
da Agricultura, Meio Ambiente e SEAPI e Frente Parlamentar para formação de um
Fórum de discussão de política agrícola para o uso racional de agrotóxicos ou
zoneamento das atividades com abelhas visando reduzir os impactos dos
agrotóxicos sobre os polinizadores, ambiente, aplicadores e consumidores.
Participantes
do GT:
1. Aroni Sattler
2. Édison Eckert Fauth
3. Ismael Horbach
4. Luis Fernando Wolff
5. Marli Kohler
6. Michele de Castro Iza
7. Péricles Boechat Massariol
8. Rogério Dalló
9. Valesca G. Finger
Coordenador: Sanderlei Pereira
Supervisor: Nadilson R. Ferreira.
Fonte: Ecoagência
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