Raiz dos agrotóxicos está nos gases dos campos de concentração, diz Vandana Shiva.
Ativista relembra desastre em
indústria química há 34 anos; 3 de dezembro tornou-se o dia
de Luta Contra os Agrotóxicos.
A reportagem é de Nadine
Nascimento, publicada por Brasil de Fato,
em 03-11-2018.
Em 3 de dezembro de 1984, um
vazamento em um tanque subterrâneo da fábrica americana de
agrotóxicos Union
Carbide, na Índia, lançou ao ar 40 toneladas
do gás isocianato de metila e causou o mais
grave desastre industrial da história.
Em questão de poucas horas, uma
nuvem letal se dispersou sobre a densamente povoada cidade de Bhopal,
com 900 mil habitantes, matando mais de 8 mil pessoas e intoxicando
150 mil. As doenças
crônicas geradas pelo contato com a substância deixaram um
assombroso legado para gerações futuras. Por conta do episódio, o
3 de dezembro ficou conhecido como o Dia
Internacional de Luta Contra os Agrotóxicos.
A filósofa e física indiana,
Vandana
Shiva considera a data um monumento “àqueles que perdemos em
Bophal em 1984, e uma prestação de solidariedade
com aqueles que ainda sofrem as consequências, incluindo crianças
que nasceram com malformações décadas depois, e as mulheres que
nunca desistiram”.
A veterana ativista, que recebeu o
Prêmio Right Liverhood (conhecido como o Nobel
Alternativo) em 1993, é uma firme opositora das
monoculturas e das sementes tratadas geneticamente. Vandana
lembra que a raiz
dos agrotóxicos, amplamente utilizados nesse tipo de
agricultura, está nos gases dos campos de concentração da
Alemanhanazista.
“Bophal mostrou
que agrotóxicos
matam. O relatório da ONU sobre alimentos diz
que 200 mil pessoas morrem anualmente intoxicadas. Pesticidas
e agrotóxicos estão levando espécies à extinção”,
lamenta.
Para a ecofeminista, 3 de dezembro
mostra que apesar do grande poder do “Cartel do Veneno”,
referindo-se às multinacionais que comandam o mercado de
agrotóxicos, “a verdade sempre aparece”.
“Bayer
comprou a Monsanto
e, pouco tempo depois, soubemos do caso
de câncer de Johnson, que processou a empresa e a fez perder 35%
de seu valor de mercado.” A ambientalista se refere ao caso de
Dewayne
Johnson, paciente terminal de câncer que venceu uma batalha
judicial contra a Monsanto,
condenando-a a pagar US$ 289 milhões em danos para sua família, em
agosto deste ano. Segundo o zelador e jardineiro de uma escola na
Califórnia nos EUA, o herbicida
Roundup
da empresa, que usa o princípio
ativo glifosato, causou sua doença.
Alternativa
Em Sikkim, uma
pequena região da Índia localizada no Himalaia,
a realidade de Bophal é distante. O estado ganhou
em 2018 o prêmio de Políticas para o Futuro da FAO,
a Organização das Nações Unidas para a
alimentação, por se tornar o primeiro estado totalmente orgânico
do mundo.
Em 2015, Sikkim alcançou
o marco revolucionário depois de conseguir converter seus mais de 60
mil agricultores a adotarem práticas
agroecológicas, além de implementar a eliminação progressiva
de fertilizantes e pesticidas químicos e a proibição total da
venda e uso de agrotóxicos.
Shiva, que é
natural da região do Himalaia, acredita que o feito
de Sikkim e a produção de alimentos de maneira
sustentável estão diretamente relacionados à vontade política. “O
primeiro ministro do estado, Pawam Chamling, que
trabalhou para fazer Sikkim 100% orgânica, é comprometido em
proteger a natureza, a cultura de montanha do estado do Himalaia, os
meios de subsistência dos agricultores e a soberania alimentar”,
considera.
“Estamos trabalhando próximos a
ele para fazer o Himalaia
totalmente orgânico. Trabalhando também com movimentos ao redor
do mundo para que a gente produza uma agricultura e alimentos livres
de agrotóxicos em todo o planeta”, continua.
Em sua opinião, qualquer lei que
passa a reduzir o uso de agrotóxicos, como é o caso da Política
Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRA) do
Brasil – projeto de lei que aguarda votação em
Comissão Especial da Câmara de Deputados – “é uma lei para
proteger a vida e a terra, direitos dos agricultores, e a saúde
humana.”
Vandana estará no
Brasil em dezembro para I Seminário
Internacional e III Seminário Nacional:
Agrotóxicos, Impactos Socioambientais e Direitos Humanos, e
convida todos aqueles “preocupados com os direitos da Terra e os
direitos humanos” a participarem do encontro que será realizado na
cidade de Goiás (GO), entre os
dias 10 e 13.
Fonte: ENVOLVERDE
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